« Home | Portugal 13 - 108 Nova Zelandia » | A ver vamos » | É hoje, às 12 Horas » | A Foto da Semana » | Uma história muito comovente. E instrutiva. » | Nem sequer para idiota útil dá » | Uma recordação de infancia » | As solidariedades do PCP » | Confiança no nevoeiro » | Ainda a ASAE »

sábado, setembro 15, 2007

A benzedura

A Cosntituição da República diz que Portugal é um Estado laico.
A Lei da Liberdade Religiosa, que o PS aprovou, no seu ponto 2 do artigo 4, determina: " Nos actos oficiais e no protocolo de Estado será respeitado o princípio da não confessionalidade."

Esta foto, tirada na inauguração de um qualquer Centro Escolar oficial, e publicada pelo "Público" na passada semana ( só a descobri agora através dos "Devaneios desintéricos" ) não deveria, portanto, existir.
Mas também não deveria existir porque, além de ilegal e anti-constitucional, soa a hipócrita. Aquele ar constrangido do Primeiro-ministro enquanto se benze, soa de tal forma a falso, que a foto pode ser ilegal e anti-constitucional, mas acaba por nos fazer sorrir...em dias de boa vontade o sorriso é a melhor resposta à falta de principios e de vergonha.

Etiquetas:

49Comenta Este Post

At 9/15/2007 2:43 da tarde, Blogger Daniel Arruda escreveu...

ISabel, pior que isso é que conseguiste por a Ministra da Educação duas vezes lado a lado.
Agora a sério. Já alguém liga ás trapalhadas do Sócrates. Ou melhor.Será que ele alguma vez se acreditou que a canstituição era para cumprir. Só quando lhe dá jeito.

 
At 9/15/2007 10:36 da tarde, Blogger Isabel Faria escreveu...

Ainda bem que escreveste logo a seguir...assim a ministra já veio cá para baixo!!
Mas Daniel, aquilo não são apenas trapalhadas. Para além da violação da lei é a cara de fingimento, de propósito para sair no boneco, que me enoja.

 
At 9/15/2007 11:59 da tarde, Anonymous Anónimo escreveu...

"a foto pode ser ilegal e anti-constitucional"???!!!

 
At 9/16/2007 10:27 da manhã, Blogger Isabel Faria escreveu...

Anónimo, a foto retrata um acto. Mas dever-lhe-á ser algo díficil entender...é demasiado complicado...deveria ter tudo escritinho, tipo com boneco e tudo. Está bem, para a próxima você avisa-me que vem cá e eu faço o desenho. Valeu???
Também quer que lhe expique aquela da foto não dever existir!!!??? Vá lá, eu tento...

 
At 9/17/2007 2:42 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

AS CRIANÇAS E A MÍDIA (II PARTE):
ACEITAR O DESAFIO EDUCATIVO


O tema da 41ª Jornada das Comunicações Sociais, «As crianças e os meios de comunicação: um desafio para a comunicação», nos convida a refletir a respeito de dois aspectos particularmente importantes. O primeiro é a formação das crianças, para que estejam em condições de receber de maneira crítica aquilo que vêem. O segundo é a formação à consciência e ao uso consciente da mídia, que está em contínua transformação tecnológica.
De fato, é o que especifica Bento XVI no início de sua mensagem, de 20 de maio de 2007, para a Jornada: «Os complexos desafios que a educação contemporânea deve enfrentar são muitas vezes ligados à grande influência dos meios de comunicação no nosso mundo. Como aspecto do fenômeno da globalização e estimulados pelo rápido desenvolvimento da tecnologia, os meios de comunicação delineiam fortemente o ambiente cultural (cf. João Paulo II, O rápido desenvolvimento, nº3). Na realidade, há quem afirma que a influência formativa da mídia está em competição com aquela da escola, da Igreja e, quem sabe, até com aquela da própria família».
De fato, como salienta o Pontifício conselho para as Comunicações Sociais, «para muitas pessoas, a realidade corresponde àquilo que os meios de comunicação definem como tal». Episódios recentes, como a utilização do celular na filmagem de violências nas salas de aula, abusos sofridos por pessoas deficientes, fenômenos de trote e de violência generalizada, demonstram como as crianças que crescem passando uma média de quatro horas por dia diante da televisão, sozinhos em casa, absorveram a lógica do «estou no vídeo, logo existo». Os psicólogos, os pedagogos e os estudiosos dos meios de comunicação estudam há tempos sobre as relações entre o consumo televisivo e o comportamento violento dos menores. Uma grande quantidade de pesquisas realizadas em muitos países ocidentais demonstra como esta correlação seja realmente inegável.


NOVAS LINGUAGENS

O fato que muitas crianças vivem completamente inseridas no mundo dos velhos e novos meios de comunicação, que estão cada vez mais frequentemente em correlação entre eles, é confirmado pela popularidade de alguns modelos televisivos, considerados tão efêmeros quanto penosos «momentos de glória», presentes nos programas com os maiores índices de audiência, dos «reality» aos «talk show», sem falar do «trash», que hoje se tornou um gênero de espetáculo.
Dentre as preferências demonstradas pelos adolescentes italianos que assistem televisão mais do que três horas por dia, encontramos, em primeiro lugar, a figura da «veline» (Ndt: misto de corista e coadjuvante na apresentação de programas populares da televisão italiana), enquanto outros da mesma idade se concentram no mais clássico exemplo, o do jogador de futebol. De toda maneira, a coisa mais importante é aparecer, pouco importa por qual motivo, de ser «alguém» ou «alguma coisa» no Olimpo mediático, mesmo que seja apenas por um instante.
Estes são os exemplos mais negativos dos condicionamentos derivados de um excessivo e acrítico uso dos meios de comunicação. Encontramo-nos diante de uma nova geração que cresceu na frente da televisão, capaz de usar as novas tecnologias que os próprios pais, que as adquiriram e as tornaram disponíveis, muitas vezes se encontram despreparados para utilizá-las.
Tanto é verdade que hoje em dia os filmes são vistos diretamente nos celulares e a televisão pode ser assistida na tela do computador. Hoje se telefona através da internet e graças ao download se descarrega os CDs e DVDs mais recentes, se filma e se faz foto com o celular, e assim por diante.
Nas casas, o vocabulário familiar se reduziu ao gênero dos sms e se fala tendo o som da televisão no fundo, se comunica através de e-mail, se faz «visita virtual» via computador, se percorre através de bibliotecas virtuais, tanto que as fichas e arquivos de papel evocam imagens do outro século, completamente em desuso.
A situação dos nossos filhos é diversa daquela da geração precedente, pois eles abriram seus olhos tendo diante de si estes cenários de profunda, contínua e envolvente transformação tecnológica. Eles se constituem aquela que os estudiosos chamam de geração nascida «com seis dedos»: além dos cinco dedos normais da mão, o sexto é o mouse do computador.
Com o aparecimento do mundo «virtual» da internet e dos videogames criou-se uma defasagem em relação à realidade verdadeira e própria. As duas dimensões parecem muitas vezes, e para muitos jovens, como universos paralelos, com conseqüências não indiferentes no plano do processo de amadurecimento. Têm grande sucesso os sites nos quais se prevê uma segunda vida (basta verificar os milhares de registros nos poucos meses de existência do site italiano de «Second Life», que em todo o mundo já tem sete milhões de inscritos), onde a simulação reproduz todas as situações da vida real. Apenas que tudo é falso, a começar da nova identidade, que pode ser escolhida e com ela se inicia a fazer parte deste mundo fora do mundo, onde se pode ser um «qualquer coisa». Isto é, ninguém.
Assim, o grande desafio cultural de hoje é propriamente a redefinição dos limites, que muitas vezes se apresentam demasiadamente instáveis. Isto é, redefinição dos limites entre o real e o virtual, superando a divisão digital que hoje separa as gerações adultas daqueles mais jovens.


OS JOVENS: PROTAGONISTAS OU VÍTIMAS DAS MUDANÇAS?

A linguagem deles é pobre, muitas vezes recheada de termos tirados do dicionário do internauta: clicar, chatar, messagiar, deletar, são alguns dos neologismos que fazem parte de seu vocabulário quotidiano. Falta uma dimensão humana da tecnologia que esteja em condições de traçar o perímetro cultural entre o real e o virtual. Assim a aldeia global difundiu uma quantidade de modelos comportamentais desviados, ou pelo menos discutíveis.
Desta maneira, os jovens que vivem a milhões de quilômetros de distância jogam o mesmo videogame, vêem o mesmo filme, assim como, de maneira transversal, absorvem modelos e comportamentos semelhantes. Muitas vezes os adultos têm menos domínio no uso das novas tecnologias e observam, com uma preocupação resignada diante de suas próprias limitações, as crianças que navegam facilmente na internet.
As raízes das dificuldades neste campo educativo são muito bem explicadas por Marina D’Amato, professora de sociologia da Universidade de Roma, que salienta: «Cada geração tem necessidade de se encontrar também em um mundo fantástico, que serve a interiorizar o paradigma do bom e do belo, do justo e do errado, do oportuno e do útil, também em relação aos exemplos que procedem da narrativa. Hoje nos encontramos em uma condição na qual os avós e os pais contam cada vez menos histórias aos filhos e aos netos, e este papel foi assumido pela televisão. Mas, na realidade, a televisão “exila” e “con-funde”, isto é, funde os modelos morais que são frutos de ânsias e problemas mal resolvidos, muito mais que de certezas. Embora estes se transformem com freqüência, a cada três ou quatro anos, o fato de serem repropostos continuamente faz com que se justaponham uns aos outros» (ver Come mediare i media, de Mario Russo).
Se for verdade que a televisão é o meio mais usado até a adolescência, imediatamente depois surge a grande atração pela internet. Esta passagem nasce de uma sintonia com a linguagem televisiva, que na idade infantil muitas vezes é ouvida durante muitas horas no dia. Esta linguagem se baseia em uma mediação da realidade e desta maneira ela ativa um processo de recepção que é de tipo emotivo.
Neste registro emocional é mais fácil acabar envolvido por situações e figuras capazes de se proporem como modelos identificadores, preservadores de sentido e de comportamentos a serem imitados.
O poder de concentrar uma vontade emulativa em alguns personagens, que correspondem particularmente às necessidades interiores do jovem (necessidades na maioria das vezes induzidas pela publicidade ou por modelos estimuladores), tem uma forte relação com a quantidade de horas que o jovem passa utilizando os novos ou os velhos meios de comunicação.


EDUCAÇÃO NECESSÁRIA

«A formação adequada a um uso correto dos meios de comunicação é essencial para o desenvolvimento cultural, moral e espiritual das crianças… Educar as crianças a serem seletivas no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja, da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos. Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia, com a certeza de que este difícil, embora gratificante, aspecto da condição de pais, é apoiado por toda a comunidade.»
As palavras do discurso de Bento XVI definem com grande clareza o paradigma de uma justa relação entre a mídia e os menores. Uma clareza que devemos agradecer ao magistério da Igreja, no momento em que o mundo da mídia parece ignorar a verdadeira problemática educativa das crianças e as expectativas de qualidade e de segurança exigidas pelas famílias no que se refere ao uso desses meios, seja do cinema aos videogames, da televisão à internet.
Diante da utilização destorcera do meio televisivo, o mais difundido dentre os meios de comunicação, a Igreja se interroga sobre o porquê da televisão não ter um papel educativo e por que os meios de comunicação não podem ser companheiros confiáveis para os jogos na fase de crescimento da criança. O anúncio de uma recente campanha sobre o uso da mídia, promovida pelo Ministério das Comunicações, mostra os vários membros da família que estão vendo a televisão ao lado de uma criança.
Que se trate do avô ou da mãe, a mensagem é a mesma: não deixar uma criança sozinha diante de um meio que, sem o apoio crítico educativo de um adulto, pode transmitir conteúdos inadequados à idade e à maturidade daquele que o vê. Sem esquecer as responsabilidades dos produtores televisivos, empenhados na organização dos programas, o papel da família é realmente insubstituível.
Se realmente o objetivo de quem administra a sociedade de produção televisiva, ou das multinacionais produtoras de videogames ou das operadoras de celulares, é o de promover e vender o produto, o bem estar psicofísico da criança está no centro do interesse dos educadores, sejam eles os professores ou, em primeiro lugar, os pais.
Isto explica bem a mensagem do Papa, que continua a sua análise, salientando que «educar as crianças a serem seletivos no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja e da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos (ver João Paulo II, «Familiaris Consortio», 76). Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia.»


CONTEÚDO DA MÍDIA

No panorama de uma revolução da multimídia, que está modificando transversalmente os hábitos, a mentalidade, os modelos e as linguagens, deve voltar ao centro do debate a tutela daquilo que é melhor para os menores. Sem acusar a «mídia», que enquanto tal não é nem boa nem má, o importante é partir de uma a análise do produto, para assim poder individuar conteúdos que sejam de melhor qualidade para as crianças e os adolescentes. Porque a televisão é um instrumento que abre janelas de conhecimento para o mundo e, se bem utilizada, de «má professora» pode se tornar uma preciosa fonte de estímulo para o crescimento humano e cultural.
A mesma coisa vale, e com mais razão, para a «rede» que engloba e compreende tudo, e para os videogames, onde, ao invés de violência e monstros, poderia se dedicar a produzir (e isso já ocorre em certos casos) histórias instrutivas e de conteúdo interessante.
Bento XVI coloca justamente em evidência as enormes possibilidades para que seja melhorado o conteúdo deste grande campo de produção multimídia: «A educação através da mídia deveria ser positiva. Colocando as crianças diante de um meio estética e moralmente excelente, estas recebem uma ajuda para que desenvolvam a própria opinião, a prudência e a capacidade de discernimento. É importante aqui reconhecer o valor fundamental do exemplo dos pais e as vantagens de introduzir os jovens aos clássicos da literatura infantil (…). A beleza, quase um espelho do divino, inspira e vivifica os corações e as mentes juvenis, enquanto a feiúra e a vulgaridade têm um impacto deprimente sobre os comportamentos». Diante de uma decadência geral do produto televisivo, a questão da qualidade aparece ainda mais forte e vibrante em grande parte de um público formado de famílias, que pede para não ser apenas um exército indistinto de ouvintes silenciosos, mas um público em condições de exprimir suas preferências por conteúdos formativos e informativos de bom nível.
A mensagem de Bento XVI continua, com algumas importantes indicações: «Como a educação em geral, aquela da mídia requer também uma formação ao exercício da liberdade. Trata-se de uma responsabilidade que compromete. Muitas vezes a liberdade é apresentada como uma incansável procura do prazer ou de novas experiências (…). Este desejo, sentido profundamente pelos pais e educadores, que é o de educar as crianças no caminho da beleza, da verdade e da bondade, pode ser apoiado pela indústria da mídia somente na medida em que se promove a dignidade fundamental do ser humano, o verdadeiro valor da vida familiar, as conquistas positivas e as metas da humanidade. A partir disso, a necessidade de que os meios de comunicação estejam empenhados na efetiva formação e no respeito da ética deve ser vista com interesse particular e com urgência não apenas pelos pais, mas também por aqueles que têm responsabilidade cívica».
Na realidade, nos encontramos na situação de ter que reconhecer que na Itália falta uma verdadeira «cultura da criança»: a situação é tão séria que no âmbito institucional procura-se dar uma nova organização geral para verificar e controlar os conteúdos dos setores de entretenimento, como os videogames, que até agora estão submetidos apenas a códigos de auto-regulamentação, feitos e codificados para uso e consumo pelas indústrias produtoras.
Uma vez mais, o primeiro e indispensável apoio à criança só pode vir da família e de uma relação mais estreita com os professores e educadores, exatamente como salienta Bento XVI, lembrando-nos que a preocupação educativa dos pais não deve se tornar uma preocupação genérica, mas uma atenção constante a tudo aquilo que diz respeito aos filhos.

A INDÚSTRIA DA MÍDIA

1) A TELEVISÃO

Se a televisão convencional se apresenta como um ramo de atividade já «maduro», no entanto se apresenta no horizonte a situação da mídia digital (satélite ou a cabo), também como uma plataforma que consente a ligação entre televisão, internet e outro tipo de mídia através do computador. No que se refere à qualidade da programação, apesar dos inúmeros bons propósitos anunciados no âmbito institucional, parece pequena a atenção às exigências dos menores em suas diversas faixas etárias. A programação para os menores, na realidade é confinada em redes e horários particulares, enquanto o resto da programação na faixa horária considerada «para todos» muitas vezes apresenta conteúdos inadequados aos jovens. Mas, quais são as expectativas das gerações de jovens no que se refere à televisão? É realmente verdade que preferem o «trash», os jogos com prêmios absurdos e as «velines»?
A partir de uma pesquisa recente feita pelo instituto Censis sobre «Comunicação, pluralismo social, sociedade aberta» (2005) surge que a relação entre os menores, e em particular dos adolescentes entre os 14 e 18 anos de idade, e a televisão é determinada por elementos de forte contradição e de passividade. Nessa faixa etária, 100% deles vêem televisão praticamente todos os dias, 86% acompanham um pouco de tudo, com uma relevante predileção pelos filmes (72%), por esporte (32%) e pelos «reality shows» (18%).
No entanto, a amostragem entrevistada não está realmente satisfeita com aquilo que vê. De fato, 36% dos adolescentes denunciam a vulgaridade difundida nos programas e 25% criticam a superficialidade. Dentre eles, 46% consideram a televisão como um meio que «invade», ao mesmo tempo em que é interessante notar que 25% consideram que em geral a programação televisiva alimenta nas crianças menores uma visão consumista da vida. Destes dados surge o contraste entre a procura de distração e a reprovação daquilo que lhes é proposto pela programação. Isto significa que o alto índice de procura não é um indicador de satisfação.
Considerando o axioma de que a televisão seja onipresente, fica claro que são os próprios jovens a pedirem uma maior atenção aos conteúdos: menos violência e menos vulgaridade. A exigência de uma regulamentação diversa, diz claramente o relatório do Censis, «não vem somente daqueles, pais e educadores, que estão preocupados pela possível influência negativa sobre os menores, mas se exprime nitidamente também através dos adolescentes, pelo menos de uma parte mais esperta e consciente dentre eles».
Para tutelar melhor os direitos dos menores, desde 2002 foi instituído junto ao Ministério das Comunicações um código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual aderiram os produtores de televisão, seja no âmbito nacional como local. Baseando-se nos princípios sobre a matéria existentes na Constituição italiana e na Convenção dos direitos da criança, estabelecida em 1989 pela ONU, a comissão que controla sua aplicação avaliou em todos estes anos de atividade os milhares de casos em que foram violadas as normas de tutela, que prevêem a transmissão de programas e imagens adequadas a um público de menores de idade durante aquela que é chamada de «faixa protegida» da programação televisiva (das 7h30 às 22h30), intervindo com denúncias e sanções, que nos casos mais graves foram aplicadas pela Autoridade de garantia no setor das comunicações. Para o futuro, esta comissão deverá se transformar em um organismo mais amplo de controle, que se chamará «Mídia e menores», que além da televisão deverá monitorar também os setores dos vídeos-telefone e dos videogames, além da internet, que é o campo de maior risco.

REGRAS DE TUTELA EM OUTROS PAÍSES

É diversa a situação em outros países, como por exemplo na Grã Bretanha, onde o sistema de regulamentação da mídia é estruturado e complexo e foi atualizado nas últimas décadas, com uma particular atenção à tutela dos menores. As inovações tecnológicas neste setor levaram as normativas inglesas a uma série de novas disposições, como por exemplo, a visão em casa de vídeo exclusivamente para adultos, e que fora de casa seriam vetados aos menores, ou o combate à praga mundial dos sites internet para os pedófilos, que contenham material pornográfico ou com conteúdos que possam esconder o aliciamento de menores (ver a Protection Childres Act, de 1978).
A programação televisiva é regulamentada pelo Broadcasting Act (1996), de onde deriva a instituição da Broadcasting Standard Commission (BSC), um órgão independente de controle que estabelece as normas de avaliação e classificação dos programas, também no que se refere aos conteúdos violentos ou que possam ofender a decência pública (site oficial www.bsc.org.uk). Este organismo BSC funciona internamente à estrutura do Broadcasting, supervisionando e regulamentando todas as emissoras de televisão e de rádio, via cabo ou por satélite. Sua tarefa é a de elaborar os códigos de conduta e de aplicação de modelos que respeitem a justiça, além de monitorar os modelos, verificando que respeitem as leis. Com a transmissão de programas com conteúdos considerados inadequados aos menores de várias idades, há alguns anos a televisão inglesa adotou o sistema «watershed», um «separador de águas» entre um horário de programação familiar e outro para os adultos. Todo o sistema televisivo inglês se apóia sobre a responsabilização das famílias, pois sem a colaboração delas qualquer código de modelos para os programas é praticamente inútil.
Na França, está vigorando já há anos um código através de sinais televisivos, que entra em função para assinalar os programas inadequados aos menores. A avaliação do programa televisivo é feita pelo Conseil Supérieur de l’Audiovisuel (CSA), uma autoridade administrativa independente, que controla a difusão dos filmes e outras transmissões em vários canais privados, nacionais, regionais ou locais. A normativa francesa (lei 719/2002) veta a transmissão de programas que possam prejudicar gravemente a integridade física, mental e moral dos menores, porque divulgam conteúdos de pornografia ou de violência gratuita. As transmissões são classificadas por um código de sinais que, em conjunto com um sistema organizado de faixas horárias de programação, garante às famílias mais clareza sobre os programas destinados aos menores.
Na Alemanha, o tema da infância tem particular atenção da legislação, que considera desde o nascimento o início dos direitos fundamentais do cidadão. A tutela é disciplinada no âmbito público pela JSchG (desde o dia 26 de fevereiro de 1985), enquanto a lei GjSM se ocupa do controle sobre a difusão de publicações e conteúdos mediáticos considerados danosos para os menores. A regulamentação no setor televisivo é feita segundo as normas do acordo sobre a radiodifusão dos Lander federais, que as entidades para a mídia nesses Lander adotaram por base para o estabelecimento das diretivas que tutelam o interesse dos menores nas emissoras privadas. Não são admitidas transmissões que incitem o ódio racial, que exaltem a violência ou a guerra, que ofendam a dignidade do homem, que sejam de gênero pornográfico, que mostrem pessoas moribundas ou com sofrimentos que ofendam a dignidade humana. Os responsáveis pela programação, escolhendo os horários das transmissões, devem cuidar para que os menores não vejam programas que podem prejudicar o seu bem estar psíquico, físico ou mental. As transmissões inadequadas às crianças menores podem ser transmitidas somente depois da autorização da entidade competente do Land interessado.
Os responsáveis pela organização dos programas televisivos em âmbito nacional devem nomear encarregados pela tutela dos menores, que atuam no momento da aquisição, da projeção e da realização dos programas. As emissoras privadas fundaram em 1993 uma associação de autocontrole voluntário da televisão («Freiwillige Selbskontrolle Fernsehen», FSF), à qual devem ser apresentados programas particulares, antes da sua transmissão, e suas avaliações consideradas nas decisões das entidades de controle da mídia nos Lander federais. Existe ainda o órgão comum do cidadão para a tutela dos menores, dos programas, da competência mediática e controle da mídia (GSJP), do qual faz parte um integrante da entidade para a mídia nos Lander federais, que dá o seu parecer a respeito de algumas séries, filmes e espetáculos mais ou menos adequados aos menores. Este órgão, o GSJP, decide sobre pedidos de mudança de horários de transmissão de filmes proibidos para menores, controla a forma de novos programas e experimenta novas disposições para a tutela dos menores na televisão digital. A peculiaridade da jurisdição alemã, seja no setor televisivo como no cinematográfico e da mídia em geral, é a minuciosa atenção às exigências com o desenvolvimento do menor e aos riscos que este pode correr com a observância incorreta das leis.
Nos Estados Unidos, é possível consultar via internet um «guia televisivo para os pais» (ver o site www.mpaa.org), que prevê algumas categorias de audiência aplicadas aos programas televisivos transmitidos a todo o público. Este guia organiza várias siglas para identificar a categoria de audiência para cada transmissão: vai-se do TVY (para todas as crianças) ao TVG (para todos), através de várias faixas etárias, que correspondem à passagem da primeira à segunda infância e desta à adolescência. Depois tem o TVPG («parental guidance», visto na presença de um dos pais), o TV14 («parent strongly cautioned», séria advertência aos pais), para os programas que contêm cenas de sexo e de violência. Enfim, há o TVMA, que prevê um «mature audience only», ou seja, destinado a um público de idade superior a 17 anos, última fronteira para os conteúdos considerados «restricted».
Estas avaliações foram elaboradas baseando-se nas opiniões dos próprios pais e são fáceis de serem encontradas e compreendidas. Esta linha de «guia de televisão para os pais» pode ser usada juntamente ao «v-chip», que é um dispositivo de filtro instalado na maior parte dos mais recentes modelos de aparelhos de televisão, para permitir aos pais de bloquear os programas inadequados.

FICHA 1
Brasil: «O que eu penso da tv»
No Brasil, a audiência infantil é muito alta: aproximadamente 30 milhões de crianças vêem televisão pelo menos durante três horas por dia. Explica a profa. Rosália Duarte, do departamento de Ciência da Educação, da PUC do Rio de Janeiro, que «as crianças são muito perspicazes, mas nós podemos e devemos ajudá-las a ampliar o seu quadro de referências, para que possam discutir ainda melhor sobre o conteúdos daquilo que vêem. Para isso temos necessidade, antes de tudo, de ouvir aquilo que elas têm a dizer sobre o assunto e de dialogar com elas. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e muito mais freqüente, a outras atividades culturais». No âmbito de uma pesquisa feita através de um questionário distribuído nas escolas, intitulado «O que eu penso da tv», apareceu que «as crianças querem seriamente ser ouvidas sobre aquilo que pensam da tv, mas sentem que sua opinião é considerada pouco importante e não estão contentes com o excesso de imagens de violência exibidas na televisão, principalmente a violência “real”, definida como aquela transmitida nos telejornais. Eles adoram ver televisão e não importa o que os adultos pensam e dizem a respeito disso. A eles agradam quase todos os tipos de programas transmitidos: novelas, desenhos animados, programas de humor, filmes, seriados, mas isso não faz deles espectadores “idiotas”, pois fazem críticas muito interessantes, pertinentes e bem elaboradas sobre o que consideram feio ou inadequado na televisão. Para a maior parte deles, a televisão se oferece como principal opção de divertimento (em alguns casos, a única), o que significa um dado muito preocupante. Mas, o que chamou mais a nossa atenção é o grau de experiência com o qual essas crianças analisam a televisão: são expertos e demonstram conhecer a televisão também do lado de dentro, inclusive as linguagens que ela utiliza, a sua estrutura de produção, a sua lógica interna e as suas maneiras de intervenção».
As crianças aprendem os valores e os não-valores através da televisão, não resta dúvida, mas demonstram ter senso crítico a respeito deste assunto, quando afirmam nos textos que os programas transmitidos na tv podem lhes ensinar «a serem bons, a ter coragem e a fazer o bem, a cuidar da natureza e de si mesmos, a serem honestos e a lutar por aquilo que desejam», mas também «a serem cruéis e mentirosos, a roubar e matar, a não respeitar os pais e a comprar tudo aquilo que não têm necessidade». Falando sobre a validade do ensino através da mídia, a profa. Duarte salienta a necessidade de «ouvir aquilo que têm a dizer sobre o assunto e a dialogar com eles. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e mais freqüente, a outras atividades culturais».

FICHA 2
Observadores internacionais
Os dados examinados em janeiro de 2006 pelo OssCom, que é um centro de pesquisa da mídia, deixam evidente a tendência a realizar uma forma de co-regulamentação, onde a ação legislativa dos Estados membros se integra com medidas de auto-regulamentação por parte dos produtores, broadcasters e profissionais da comunicação sob o efeito de controles e sanções. São dois os instrumentos mais utilizados no âmbito europeu, observando-se as diretivas previstas no artigo 22 de «Televisão sem fronteiras»: a definição de faixas horárias protegidas (watershed) e os sinais mostrados na tela (determinados por um sistema de «rating»). Apesar disso, aos campos tradicionalmente problemáticos da violência e da pornografia se juntam novos campos de risco para os menores: a vulgaridade, abusos e dependências de substâncias, linguagem e comportamento vulgares, discriminações e abusos, violações e ofensas à dignidade humana. Os critérios de avaliação dos programas se constituem um problema que é partilhado por muitos países da União européia, ao mesmo tempo em que se prepara uma uniformização internacional dos sistemas de classificação (ver mais adiante, Nicam), baseados na visualização de cinco ícones que ilustram simbolicamente qual é a problemática do programa que está sendo analisado e para quais idades ele é desaconselhado.
Deve ser assinalada a atividade online da European Medi@culture. O projeto é promovido pela Comissão Européia, em Bruxelas, no quadro das iniciativas «e-Learning», administrado pelo centro mediático de Baden-Württemberg. O site apresenta informações sobre a educação à mídia na Europa, particularmente na França, Áustria, Finlândia e Alemanha. A seção de projetos de multimídia agrupa os projetos sobre a mídia desenvolvidos por escolas e associações de jovens ao longo do tempo (ver http://www.european-mediaculture.org).

FICHA 3
África do Sul: Encontro mundial sobre a mídia para a infância
Este encontro trienal se realizou no último mês de março em Johannesburg, na África do Sul, com a participação de expertos do setor representando diversos países. Em conjunto se discutiu sobre a necessidade de uma programação adequada às crianças, procurando entender de que modo a violência na mídia pode influir sobre a psíquico dos menores.
Mas, no 5º Encontro mundial sobre a mídia para a infância apresentaram-se também muitas crianças provenientes de todo o mundo e empenhadas em discutir sobre o difícil tema da «Mídia como instrumento de paz e de democracia global». Vieram guiados por grupos de adultos, dentre eles as diversas organizações católicas que há anos trabalham para promover regras para o bem da infância, a serem respeitadas nas transmissões de rádio e televisão através de códigos de regulamentação que devem ser redigidos ou, como em alguns casos, apenas atualizados. Em muitos países do sul do mundo as novas tecnologias de multimídia já estão muito disseminadas e seu uso merece uma atenção particular para tutelar o público mais jovem.
Especialmente na África, explicou o organizador do encontro, Firdoze Bulbulia, começa-se a examinar o projeto de um «Media center» para as crianças, que possa produzir e distribuir transmissões de rádio e de televisão destinadas ao público mais jovem, com o objetivo de realizar um canal televisivo pan-africano dedicado à infância. Os organizadores do encontro estão também trabalhando no projeto de uma aliança africana dos meios de informação e de comunicação, seguindo o modelo daquela já existente na América latina.

2) INTERNET

Na Itália, 47% das famílias italianas têm um computador em casa, um dado relevante mas sempre muito baixo em relação à média dos outros países europeus. O uso da internet por parte dos adolescentes e jovens, e a familiaridade que têm com tudo aquilo que pode ser digitado ou «descarregado» da internet, apresenta não poucos problemas. Pela sua própria natureza de rede de comunicação global, o problema se apresenta em ótica internacional, procurando garantir a tutela dos menores através de precisos acordos com os provedores para um efetivo controle de conteúdo. No campo italiano, até 2006, a tutela dos menores tinha sido deixada nas mãos dos próprios provedores, que em 19 de novembro de 2003 assinaram um acordo de auto-regulamentação: o Codice Internet e Minori. Embora o acordo tenha sido estipulado entre os representantes dos vários provedores diante do Ministério para a Inovação e a Tecnologia, no entanto ele permanece um acordo privado, com lacunas, principalmente no que se refere às sanções que muitas vezes devem ser aplicadas. Em 2006, na seqüência de numerosos casos de violência sobre menores, muitos dos quais realizados através da difusão de material pedo-pornográfico (quando não se tratava de verdadeiro e próprio aliciamento de menores via internet), foi promulgada a lei 38 de 6 de fevereiro de 2006: «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet».
Enfim, como aplicação da lei 38/2006, em fevereiro da 2007 foi publicado um decreto determinando os requisitos técnicos dos instrumentos de filtragem que os provedores da rede internet devem utilizar para impedir o acesso aos sites já assinalados pelo Centro nacional contra a pedo-pornografia. Mas, isso não basta para superar as dificuldades e impedir que os menores possam navegar de maneira arriscada na «rede das redes».
Atualmente foi reativada a comissão anti-pedofilia e desvios de menores através da internet, o «Ciclope», que tinha sido instituída junto ao Ministério para a Eqüidade, do governo italiano, e que ficou inativa por um ano, até a sua reestruturação junto ao Ministério da Família. Está também para entrar em função um site dedicado ao uso da internet, junto ao Ministério das Comunicações, e um número telefônico de emergência gratuito, organizado pelo mesmo ministério e por «Save the children», que poderá ser utilizado por qualquer cidadão que queira assinalar algum abuso, desvio ou pedo-pornografia. Dentre as iniciativas mais recentes, deve ser assinalado o site www.tiseiconnesso.it criado pelo Ministério das Comunicações italiano, sempre em colaboração com «Save the children», onde é colocada à disposição uma série de informações sobre o conteúdo de certos sites, seja para os pais como para as próprias crianças, em conjunto com a campanha televisiva que tem como slogan «A melhor maneira de ajudar o seu filho a não usar incorretamente as novas tecnologias é conhecê-las».
Deve ser salientado também o fato de como a rede se tornou um grande mercado online. Para alguns produtores, o «e-commerce» de brinquedos corresponde já a 4% das vendas, e apenas em 2005 as vendas online corresponderam a 37.600 ações de compra. As razões para investir no processo online são múltiplas: desde a possibilidade de evitar as dificuldades logísticas de distribuição dos produtos, à ampliação de ofertas diferentes de produtos e também a possibilidade de envolvimento do cliente através de campanhas de mala direta e a criação de comunidades virtuais em torno de alguns produtos.

FICHAS:
Pedo-pornografia e internet
Em março de 2006, entraram em vigor as novas medidas diretas de combate e repressão ao fenômeno de exploração sexual dos menores e a pedo-pornografia, estabelecidas pela lei 38/2006 – «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet» foi publicada no Diário oficial em 15 de fevereiro de 2006, nº.38 – com a qual foram substancialmente modificados e integrados os artigos 600bis e seguintes do Código Penal italiano.
A lei confirma os artigos 527, 528, 529 e 725 do Código Penal italiano, que punem os «atos obscenos em local público, publicações, espetáculos obscenos, desenhos ou figuras que ofendem a decência pública».
Porque em muitas publicações, transmissões televisivas e anúncios publicitários, mesmo que não tenham declaradamente um caráter pornográfico, imagens de crianças e adolescentes são apresentadas de maneira explícita ou mais ou menos sutilmente ilusória e de forma falsa, pede-se um novo empenho das instituições competentes para que sejam observadas as normas em vigor e, se preciso for, que façam apelo aos órgãos de Polícia, o Instituto de autodisciplina publicitária, o Ministério das Comunicações, a Polícia postal ou a «Comissão tv e menor».

3) CINEMA

Confirmando as disposições da Constituição italiana, no que se refere ao direito e ao dever das famílias de serem protagonistas na educação de seus filhos, para muitos é chegada à hora de reelaborar a legislação que define o conceito de «censura» (a lei 161/1962 prevê a possibilidade de negar a autorização de abertura às salas de cinema ou de fazer cortes nos filmes, mesmo em função de um público adulto), que hoje está superado. É preciso com urgência estabelecer um critério de tutela dos menores não apenas no que se refere aos filmes que vêem nos circuitos cinematográficos, mas também sucessivamente em casa, muitas vezes em horários acessíveis na programação da televisão.
Uma avaliação correta e preventiva de um filme permite à família ter à sua disposição os instrumentos para escolher se um espetáculo é mais ou menos oportuno, conhecendo a trama, os eventuais conteúdos mais sensíveis, a classificação que a obra recebeu em outros países, etc. Por isso, é justo que a legislação seja revista, uma operação que requer atenção e perspicácia da parte das instituições em um momento de transição da mídia, como este que estamos vivendo, quando esta se tornou realmente um importante componente na educação dos menores.
Não faltam filmes que atraem o público por causa de seu conteúdo de violência, e no entanto entram no circuito cinematográfico sem qualquer restrição de idade. Para um filme que é notícia nos jornais, existem muitos outros com conteúdos duvidosos ou até mesmo perigosos que conseguem passar através do filtro da comissão de revisão cinematográfica, que atualmente funciona junto ao departamento de cinema do Ministério dos Bens Culturais.
Ao mesmo tempo em que existe um projeto de lei do ministro dos Bens culturais, que deve ainda iniciar os trâmites parlamentares, novas situações se apresentam na Itália, com a autocensura de filmes, feita pelos produtores ou distribuidores cinematográficos, com a introdução de novas e mais específicas faixas etárias para as restrições visando os menores a partir dos 10 anos de idade. As restrições serão feitas baseando-se em uma avaliação classificatória dos conteúdos das obras e sucessivamente serão ainda analisadas por uma comissão de psicólogos, educadores e pais.
Este sistema se inspira no modelo americano da Motion Picture Association of America (MPAA), que há 40 anos representa os interesses da indústria do audiovisual americana no mundo. Funcionando a partir de regras bem precisas (estabelecidas ao longo dos anos, também segundo as sentenças dos tribunais federais nos vários Estados americanos e em base aos protestos dos cidadãos), a autocensura americana prevê a existência de uma única comissão competente para determinar as restrições do PG12 ao «restricted» 17 anos. Esta comissão é composta exclusivamente de pais, considerados os primeiros depositários da educação dos filhos, e representam transversalmente a audiência. Importantes sanções econômicas asseguram que o mecanismo de autocertificação corresponda efetivamente aos interesses dos cidadãos. No site da Motion Picture estão disponíveis aos pais os pontos de referência para a avaliação das obras de entretenimento e são publicadas as restrições aplicadas a cada filme que está em exibição nas salas de cinema. Geralmente as avaliações parecem muito mais severas em relação a outros países. Tudo isso, nos vários anos de sua aplicação, deu uma qualificação à indústria americana e seu correto serviço prestado aos ouvintes. Qualquer estrada que se pretenda seguir na Itália, é importante para as famílias que seja estimulado um mercado de produção adequado à infância: é justo que o mecanismo da indústria cinematográfica continue com o seu ritmo de produção, mas não é justo confundir as classificações de acesso ao produto, como qualquer indústria sabe muito bem.
No que se refere às normas européias de classificação dos filmes, e em geral de todo «entertainment» (neologismo anglo-saxão, que, no entanto encontra sua raiz etimológica na relação entre educação e jogo) acessível aos menores, deve ser citado o sistema NICAM, que funciona na Holanda há alguns anos. Fundado em 1999, o NICAM (Nederlands Instituut voor de Classificatie van Audiovisuele Media) se baseia na lei Media Act, onde os programas de grupos que tiveram a autorização para atividades de «broadcasting» não devem incluir obras audiovisuais que prejudiquem o desenvolvimento físico e psicológico de pessoas com menos de 16 anos de idade, seguindo as diretivas da União européia («Televisão sem fronteiras» IV).
O sistema de classificação preventiva funciona também na Grécia, com a lei 1.597, de maio de 1986, que prevê que antes da projeção nas salas de cinema, cada filme seja submetido pelo produtor ou pela sociedade de importação à Comissão para a juventude, que classifica o filme seja como adequado aos menores, ou proibido aos menores de 13 anos, ou de 17 anos ou ainda, nos casos mais graves, severamente inadequado aos menores. Esta comissão é um órgão do Ministério da Cultura e foi concebida procurando-se estabelecer certa proporcionalidade, sendo composta de representantes do Estado (Ministério da Cultura), das categorias ligadas ao cinema, de psicólogos especializados na educação, de sociólogos, dos jovens, dos educadores e dos pais.
Na Áustria, está em vigor um sistema de avaliação complexo, instituído em base a um princípio constitucional federal que confia a tutela dos menores, no que se refere ao cinema e em geral aos meios de comunicação de massa, à competência específica dos Lander. A lei nacional que engloba a regulamentação da mídia é a ORF-ACT, ou seja, a Austrian Broadcasting Corporation nº. 379/1984, que estabelece quais os critérios sobre os quais deve se basear a proteção aplicada a programas e filmes transmitidos na televisão ou através de outros canais mediáticos. No que se refere à exibição dos filmes, a avaliação preventiva das obras cinematográficas, para que sejam decididas as faixas etárias adequadas, é regulamentada pela lei austríaca para a tutela dos menores, a «Jugendschutzgesetz», aplicada através das leis dos Lander federais. Esta lei estabelece nove faixas de restrições de público a partir dos seis anos de idade, com uma sucessiva graduação que prevê restrições para 10, 12, 14 e 16 anos de idade. Para supervisionar o sistema de classificação cinematográfica, existe uma comissão junto ao Ministério da Educação, em Viena, que comunica seu parecer sobre a idoneidade dos filmes às autoridades locais. Geralmente e de maneira individual os Lander adotam as decisões da comissão, e é em âmbito local que se decide de sua aplicação.
Na Espanha, o artigo 20 da Constituição reconhece o direito do cidadão a exprimir e difundir livremente seu pensamento, suas idéias e suas opiniões através de qualquer meio de divulgação. Se por um lado o exercício de tais direitos «não pode ser restrito através de nenhum tipo de censura prévia», o mesmo artigo especifica que «estas liberdades têm o seu limite no respeito dos limites reconhecidos pelas normativas que exprimem este respeito, especialmente no direito à honra, à privacidade, à própria imagem e à proteção da juventude e da infância».
Baseando-se neste princípio, a qualificação dos filmes (Real decreto 81/1997) e das obras audiovisuais é feita antes de sua difusão, através do Instituto de cinematografia e das artes audiovisuais (ICAA), uma entidade autônoma, mas ao mesmo tempo ligada ao Ministério da Educação e Cultura através da secretaria de Estado para a cultura (ver site www.mcu.es).
A subdireção geral de fomento à indústria cinematográfica e do audiovisual, que faz parte do ICAA, se ocupa, dentre outras funções, da classificação em faixas etárias dos filmes e das outras obras audiovisuais em vista de sua exibição pública e para a sua distribuição. A comissão se encarrega de divulgar as informações sobre os filmes e programas audiovisuais, com classificação que vai desde as «salas X» até as restrições para cada faixa etária do público.
Os filmes de caráter pornográfico não podem receber subvenções do Estado e sua projeção nas salas prevê uma taxa suplementar, destinada em parte para estimular um fundo de proteção cinematográfica. A projeção destes filmes pode ser feita somente nas «salas X», onde não podem ser apresentados outros tipos de obras cinematográficas e onde é proibido o ingresso de menores de 18 anos.

CINEMA NA TV

Devido ao alto consumo de programas de televisão por parte dos menores e levando-se em conta as diretivas da União européia, que promovem a auto-regulamentação no âmbito nacional das emissoras de tv e a participação das famílias nesta obra educativa, há alguns anos estão em vigor na França, na Holanda, na Grã-Bretanha, na Grécia e na Itália os códigos de sinais, que servem para identificar tanto os filmes projetados na salas de cinema como aqueles transmitidos na televisão. A tutela dos menores no âmbito da televisão foi também feita adotando-se o chamado sistema «watershed» (separador das águas), que funciona segundo uma seleção de faixas horárias protegidas, algumas aconselhadas à visão dos menores, outras aconselhadas a todos e outras ainda, principalmente na programação noturna, indicadas somente a um público adulto.
A faixa de idade determinada pela classificação preventiva dos filmes tem obviamente uma repercussão na programação das chamadas faixas horárias protegidas ou distintas nas emissoras de televisão pública em todos os países europeus. A definição das linhas de conduta comuns está à base dos acordos de auto-regulamentação e de co-regulamentação dos programas de televisão, estabelecendo-se um código de procedimento comum para as emissoras tanto públicas como privadas. Criou-se assim uma base normativa, que é assumida pela autoridade do Estado e que recebe a confiança dos consumidores das emissoras públicas ou privadas que adotam este sistema de auto-regulamentação.
Para tornar visível aos adultos as classificações dos programas apropriados aos menores, muitas emissoras européias adotaram um sistema de sinais que através de símbolos, números, cores e sinais acústicos advertem ao público a respeito daquilo que está para ser transmitido.
Mas, apenas este sistema, assim como o de filtragem (tipo v-chip), não basta para garantir uma verdadeira tutela dos menores diante de um conjunto de imagens difíceis de serem decodificadas por um jovem. Deve-se pensar às imagens de guerra dos telejornais, dos filmes escabrosos ou às informações sobre os crimes hediondos, que muitas vezes têm como ambiente o próprio núcleo familiar.
É na colaboração entre Estado, produtores de programas audiovisuais e famílias que pode ser fundamentado um autêntico respeito dos menores que encoraje o crescimento positivo da criança em base aos valores fundamentais da pessoa humana.

4) CELULARES COM VÍDEO

Hoje a difusão dos celulares com vídeo chegou à Itália ao índice se 134%, o que significa que muitas pessoas possuem pelo menos dois celulares, inclusive os jovens e as crianças, que recebem este instrumento dos próprios pais. De fato, de duas crianças entre 8 e 13 anos de idade, uma delas tem um celular no bolso. Aquele que poderia ser um instrumento para controlar melhor os deslocamentos e as necessidades dos filhos, se revela no entanto um perigoso meio que pode expor a outro tipo de utilização por parte dos menores, que não se separam nunca do próprio celular, nem mesmo durante as aulas, como lamentam vários professores. Apesar do código de auto-regulamentação assinado pelas principais operadoras (Código de conduta para a oferta de serviços a pagamento em tutela dos menores), na realidade os novos serviços opcionais do celular o tornaram um «personal computer» capaz de permitir novos usos que antes não tinham.
Os desenvolvimentos tecnológicos que estão se verificando no campo da telefonia móvel – particularmente no que se refere à sinergia com a internet e a adoção dos sistemas DVB de vídeos-telefone – contribuem a aumentar a oportunidade de comunicação também para as novas gerações e, ao mesmo tempo, repropõem em novos termos a questão da tutela dos menores. As evoluções já previstas ulteriormente para os próximos anos e o número sempre crescente de pessoas envolvidas, pedem uma grande consciência social e uma constante atenção das pessoas e órgãos encarregados de garantir os direitos dos cidadãos.
Neste contexto devem ser reafirmados os direitos dos menores no campo da comunicação, dentre os quais certamente não está em último lugar aquele que se refere também à segurança diante dos riscos de indução a comportamentos ilícitos ou de acesso a conteúdos nocivos ou indesejados. Também neste campo é essencial o papel dos pais e, em geral, de todos aqueles que são chamados a ter uma função educativa. A maior segurança das crianças e dos jovens quanto ao acesso a conteúdos ilegais é um ponto que deve merecer atenção também através da maior conscientização dos pais e das mães, que devem se capacitar a conhecer e utilizar estes meios.
Para a «alfabetização» dos pais na utilização da mídia devem colaborar também as instituições públicas, promovendo um uso positivo das novas possibilidades tecnológicas. Às empresas cabe a responsabilidade de colocar no mercado um produto que dê garantias no que se refere à sua utilização pelos menores, superando os limites estabelecidos pelo código de auto-regulamentação assinado pelas operadoras de celulares. Devem também oferecer maiores informações aos adultos que assinam um contrato de utilização, como por exemplo a adoção de bloqueios automáticos de acesso a conteúdos nocivos, se o celular passa às mãos de um menor de idade.

5) VIDEOGAMES

Trata-se de uma indústria global, que conquistou os jovens e não apenas eles. Os números relativos à difusão repentina dos videogames indicam que existem 250 mil sites de videogames, cada um deles propõe uma série de títulos, muitos deles recheados de cenas de sexo e de violência. Uma pesquisa recente do Instituto italiano de medicina social (IIMS) coloca em evidência, entre outras coisas, a escassa informação por parte dos adultos a respeito dos videogames utilizados pelos filhos, o predomínio de temas violentas em mais de 30% de títulos não aconselhados aos menores, o predomínio de personagens virtuais normais que podem se tornar especiais, realizando ações extraordinárias.
Mas, o ponto de risco mais elevado se refere aos pequenos jogadores de videogames, crianças entre seis e nove anos de idade que se submetem a entrar tão intensamente no jogo virtual que chegam a formas de dissociação da realidade e solicitam um monitoramento muito atento da parte dos adultos. A mesma pesquisa indica a presença de videogames em 25% das famílias com crianças de três a cinco anos de idade e em 65,2% das famílias com crianças entre seis e 10 anos de idade. O que produz efeitos negativos no âmbito cognitivo das crianças não parece ser especificamente o meio, mas muito mais os elementos que criam a excitação, tais como a velocidade de produção do estímulo e da resposta, a velocidade das imagens, os efeitos especiais, os contrastes, a fragmentação da história, o binômio rumor-ação. O uso prolongado do jogo inibe, segundo alguns psicólogos, a área da capacidade crítica, provocando passividade e ao mesmo tempo agressividade na criança. Mas, não queremos demolir os videogames, porque existem aqueles que são muito adequados aos mais jovens, com valores de informação e de educação, seja também porque o uso deste meio é na realidade um passo na preparação da criança ao sucessivo e mais sofisticado, que é o uso da internet.
De qualquer maneira, os dados relativos à venda destes produtos de entretenimento mostram um crescimento em todos os lugares e a difusão deste meio é acompanhada de uma aceitação social (ou seria uma resignação?) sempre maior.
É urgente ampliar o percurso de conhecimento e das estratégias internacionais, para monitorar um mercado que está cada vez mais vasto. Parece urgente estabelecer modalidades operativas para o controle dos conteúdos e do sistema de sanções, seja para o produtor como para o vendedor dos serviços. O código de auto-regulamentação Pegi (derivado em 2003 do sistema de avaliação e classificação holandês, Nicam, que assinala os conteúdos inadequados aos menores), adotado pelos industriais de «entertainment» que produzem videogames, é a única forma de auto-regulamentação existente atualmente e que prevê sanções (raramente aplicadas, mesmo diante de casos graves evidentes) para os produtores que colocam no comércio os jogos com indicações de faixas etárias apenas aproximativas.
O código Pegi, ao qual a associação européia Isfe adere em 2002, é evidentemente insuficiente na sua função declarada de «fornecer aos consumidores as informações mais oportunas» e expostas no selo de produção. E, como o setor dos videogames tem hoje um volume de negócios que ultrapassa os 740 milhões de euros, envolvendo 24 milhões de jogadores (43% da população a partir dos quatro anos de idade), com uma venda dos produtos classificados para maiores de três anos de idade que chega aos quase 48% dos consumidores. É um dado que define o impacto deste gênero de meio sobre a infância e a adolescência, mostrando toda a sua periculosidade, seja pelo consumo de conteúdos inadequados, seja pelo excessivo número de horas dedicado neste passatempo, muitas vezes solitário e sem a presença de um adulto ao lado. Se for verdade, como sustenta a indústria, que a produção de videogames violentos é apenas uma mínima parte do mercado, é também verdade que esta representa a fatia mais importante do retorno econômico.
O interesse pelos videogames é alimentado pela sinergia com os filmes que inspiram o jogo homônimo e que torna sempre mais atrativo este gênero, principalmente para os adolescentes. Desta maneira é importante também neste campo o estabelecimento de regras precisas em defesa dos consumidores dentre o público jovem, mais exposto aos riscos destas novas formas de entretenimento cada vez mais sofisticadas e envolventes, por causa da combinação entre narrativa e efeitos gráficos.

6) PUBLICIDADE

O problema da tutela dos menores diante da publicidade se apresenta como um corolário, dentro do quadro mais amplo que regulamenta a difícil relação entre a mídia e as crianças. A televisão, e portanto também a publicidade, se constitui em uma fonte de perigo para os menores, isto é, para a maior parte das crianças, principalmente em idade pré-escolar, que devem saber fazer a diferença entre a publicidade e o resto da programação, e entre os programas de ficção e a realidade. Com essas considerações não significa que exista uma acrítica rejeição da publicidade em si mesma – à qual se reconhece, no entanto, onde proceda corretamente, uma função positiva no processo de formação, de crescimento crítico e de socialização do menor –, mas existe a necessidade de prever um sistema de regras destinado a garantir-lhe um uso adequado.
O efeito dos anúncios publicitários é tão grande que em alguns países estão sendo tomadas medidas drásticas a respeito. No Reino Unido, por exemplo, recentemente foram vetados os anúncios publicitários durante os programas destinados às crianças até nove anos de idade, a partir de 1º de janeiro de 2008 a medida se estenderá à programação para os jovens até 15 anos de idade e até o final de 2008 serão vetados em todos os canais dedicados aos menores. Apesar de se reconhecer que a publicidade serve para financiar os programas, aqueles dedicados às crianças terão que recorrer a outras fontes. Também na França começa a se impor uma «linha dura» a esse respeito: visto a alta incidência de publicidade de merendas, de sucos e doces em geral, a partir de agora os anúncios dedicados às crianças deverão ser precedidos de uma espécie de aviso, que orientará para uma alimentação adequada.
Mas, por que as crianças são tão frágeis diante dos apelos da publicidade? Na Itália, explica Paolo Landi, secretário geral da Adisconsum (Associação de defesa dos consumidores e do ambiente»), em um capítulo de seu estudo «Crianças da multimídia»: «Se consideramos que a publicidade não faz outra coisa que veicular um conhecimento imediatamente concretizável em um “ter”, ou em um “ser”, ou em um “fazer”, a criança absorve sem dificuldades os três componentes que são a obsessão dos expertos de marketing, isto é, o componente cognitivo (como fornecer informações indeléveis sobre um produto ou um serviço), o componente afetivo (como fazer o consumidor reagir de maneira emotiva) e o comportamental (como colocar o pequeno consumidor em movimento na direção da aquisição). A partir deste ponto de vista a criança é o público ideal, o consumidor a quem se pode vender qualquer coisa».
Na Itália está em vigor um código de autodisciplina publicitária que surgiu em 1966, em base a um acordo entre os profissionais do setor. Esta primeira forma de tutela, em grande parte com origem comunitária, tem como protagonistas entidades administrativas independentes: a Autoridade de controle da concorrência e do mercado de setor e a Autoridade de garantia para as comunicações e a editoria. Enquanto isso, para a auto-regulamentação, orientada pelas normas que constam do Código de autodisciplina publicitária, e agora também, embora com força jurídica diferente, pelo Código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual se reconhece um poder de decisão e de sanção, emanando uma ordem e intimando seu cumprimento.
Em todos os países onde a televisão serve de veículo às mensagens publicitárias, o mundo empresarial é plenamente consciente do enorme poder de influência que a publicidade tem sobre as crianças.



NORMATIVA INTERNACIONAL

O assunto relativo à tutela dos menores na mídia é um dos mais debatidos, seja no que se refere às normas nacionais, seja no âmbito internacional. Encontra-se diante da situação de precisar acertas as contas com toda a extensão da rede global da internet. O exemplo que, neste momento de transição, coloca mais em evidência a necessidade de estabelecer leis que estejam em condições de controlar o acesso e uso dos conteúdos nocivos para os menores, é exatamente o da internet. Qualquer pessoa no mundo pode abrir um site considerado «arriscado», contendo elementos ilegais e acessíveis a consumidores despreparados, disponibilizados por quem está do outro lado do mundo.
No que se refere aos princípios gerais no âmbito do direito internacional, é preciso recorrer principalmente à convenção da ONU sobre os direitos da criança, com sede em New York, ratificada pelo Parlamento italiano através da lei nº.176/1991. Esta garante à criança uma «consideração proeminente» também a respeito da liberdade, seja no se refere à expressão, seja quando tutela os conteúdos recebidos. Esta mesma convenção, em seu artigo 17, fala da relação entre menor e televisão, desejando «um sistema normativo que tutele o menor-consumidor, mesmo com todas as dificuldades que se apresentam», seja para individuar os fenômenos que devem ser monitorados, seja sobre as normativas possíveis.
No direito da União européia, tal tutela foi recentemente confirmada pela Carta dos direitos fundamentais da União, aprovada em Nice em 2000, cujo artigo 24 salienta que «os Estados membros reconhecem a importância da função exercida pelos meios de comunicação de massa e cuidam para que a criança possa ter acesso às informações e materiais... com a finalidade de promover o seu bem estar social, espiritual e moral, além de sua saúde física e mental». A normativa seguinte, 89/552/CEE, previu algumas restrições, seja no que se refere aos programas como para as mensagens publicitárias destinadas a este público». O artigo 22 desta normativa conduz a impedir a transmissão de programas que contenham cenas pornográficas ou de violência gratuita, ou outros programas inadequados a este público. Não podemos esquecer de mencionar a determinação expressa de «Televisão sem fronteiras», que está hoje em sua quinta versão atualizada, que o tema da tutela dos menores está relacionado com o estatuto geral dos direitos dos menores e corresponde ao disposto nos artigos 50 e 31 da Constituição italiana.
Se for claro que os princípios normativos são todos a favor da tutela dos menores, é também verdadeiro que uma tecnologia em contínua evolução colocou em crise as velhas regras do jogo. Mas também é claro que não se pode mais adiar a necessidade de estabelecer novos parâmetros normativos, para que as crianças possam utilizar os meios de comunicação próprios de seu tempo, com aproveitamento e serenidade também para as famílias.~

EDUCAÇÃO À MÍDIA NO MUNDO: PARA SABER MAIS

A difusão da educação à mídia é uma resposta à necessidade de se informar sobre as novidades no campo dos novos meios de comunicação. Em seguida citamos apenas alguns sites que em vários países oferecem maiores informações sobre como aprender a usar melhor a mídia, enfrentando a problemática da tutela dos menores e da alfabetização às novas tecnologias por parte dos adultos.
«The Media Awareness Nework-Réseau éducation médias» é uma organização canadense sem fins lucrativos, pioneira no desenvolvimento de programas sobre a educação à mídia. Com esta finalidade ela produz programas online em colaboração com organizações internacionais, convicta que, para interpretar as mensagens de informação, de entretenimento e comerciais, os jovens têm necessidade de instrumentos críticos válidos. Por isso é importante formar também os adultos (famílias e professores) sobre como funciona a mídia e como ela determina o estilo de vida.
A organização realiza uma ação contínua de monitoramento em relação à mídia (televisão, cinema, videogames, imprensa, publicidade, etc.), e sua seção dedicada aos pais oferece uma série de elementos para que estes reflitam com os filhos sobre esses meios, além da seção para os educadores, que inclui lições e materiais de apoio. Uma outra seção é dedicada à análise das questões ligadas à mídia, como a difusão de estereótipos, as representações de violência e da diversidade, a privacidade, a publicidade dirigida aos menores. Seu site é em inglês e francês (http://www.media-awareness.ca).
«Quai des images» é o site dedicado ao ensino de cinema e audiovisual organizado pelo Ministério da Educação francês. Ele propõe atividades ligadas à educação à imagem e de análise dos filmes em consonância com os programas escolares, agrupa os textos oficiais a respeito dos meios audiovisuais, oferece uma série de instrumentos de análise e de estudo completos sobre alguns filmes específicos e sobre certos autores em particular, informa sobre conferências, seminários, cursos e festivais sobre o mundo audiovisual e sua utilização em âmbito educativo e didático. Entre outras coisas, reúne também as propostas e as experiências feitas por professores e seus alunos nas escolas secundárias francesas no campo da educação à imagem, além de organizar um fórum de discussões aberto a todos sobre a educação à mídia (http://www.ac-nancy-metz.fr).
Sempre na França, está em funcionamento o blog «Zéro de conduite», organizado pelos professores e destinados a educadores, pais e estudantes. Promove o uso do cinema como instrumento pedagógico, dedicando-se especialmente à atualidade cinematográfica, mas sem esquecer os clássicos e os documentários. Com várias seções e espaços de aprofundamento, se propõe como um local de discussão de temas em um debate aberto (http://cinema-ducation.fluctuat.net).
A Universidade de Massachussetts organizou o Media Education Foundation – MEF, mídia de desafio, que produz e distribui documentários destinados a estimular o pensamento crítico e o debate sobre a relação entre aqueles que detêm o poder sobre a mídia, os conteúdos da mídia comercial, a exigência democrática de um livre fluxo de informações, as diversas representações de idéias e pensamentos e o direito dos cidadãos de informar e serem informados. Alguns destes temas são abordados criticamente, como a identidade do gênero na publicidade, a imagem de sexo nos videoclipes, o papel da mídia na construção da identidade cultural, mídia e saúde, etc. (http://www.mediaed.org/).

(a cura di M. F. D’A.)

 
At 9/17/2007 2:42 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

AS CRIANÇAS E A MÍDIA (II PARTE):
ACEITAR O DESAFIO EDUCATIVO


O tema da 41ª Jornada das Comunicações Sociais, «As crianças e os meios de comunicação: um desafio para a comunicação», nos convida a refletir a respeito de dois aspectos particularmente importantes. O primeiro é a formação das crianças, para que estejam em condições de receber de maneira crítica aquilo que vêem. O segundo é a formação à consciência e ao uso consciente da mídia, que está em contínua transformação tecnológica.
De fato, é o que especifica Bento XVI no início de sua mensagem, de 20 de maio de 2007, para a Jornada: «Os complexos desafios que a educação contemporânea deve enfrentar são muitas vezes ligados à grande influência dos meios de comunicação no nosso mundo. Como aspecto do fenômeno da globalização e estimulados pelo rápido desenvolvimento da tecnologia, os meios de comunicação delineiam fortemente o ambiente cultural (cf. João Paulo II, O rápido desenvolvimento, nº3). Na realidade, há quem afirma que a influência formativa da mídia está em competição com aquela da escola, da Igreja e, quem sabe, até com aquela da própria família».
De fato, como salienta o Pontifício conselho para as Comunicações Sociais, «para muitas pessoas, a realidade corresponde àquilo que os meios de comunicação definem como tal». Episódios recentes, como a utilização do celular na filmagem de violências nas salas de aula, abusos sofridos por pessoas deficientes, fenômenos de trote e de violência generalizada, demonstram como as crianças que crescem passando uma média de quatro horas por dia diante da televisão, sozinhos em casa, absorveram a lógica do «estou no vídeo, logo existo». Os psicólogos, os pedagogos e os estudiosos dos meios de comunicação estudam há tempos sobre as relações entre o consumo televisivo e o comportamento violento dos menores. Uma grande quantidade de pesquisas realizadas em muitos países ocidentais demonstra como esta correlação seja realmente inegável.


NOVAS LINGUAGENS

O fato que muitas crianças vivem completamente inseridas no mundo dos velhos e novos meios de comunicação, que estão cada vez mais frequentemente em correlação entre eles, é confirmado pela popularidade de alguns modelos televisivos, considerados tão efêmeros quanto penosos «momentos de glória», presentes nos programas com os maiores índices de audiência, dos «reality» aos «talk show», sem falar do «trash», que hoje se tornou um gênero de espetáculo.
Dentre as preferências demonstradas pelos adolescentes italianos que assistem televisão mais do que três horas por dia, encontramos, em primeiro lugar, a figura da «veline» (Ndt: misto de corista e coadjuvante na apresentação de programas populares da televisão italiana), enquanto outros da mesma idade se concentram no mais clássico exemplo, o do jogador de futebol. De toda maneira, a coisa mais importante é aparecer, pouco importa por qual motivo, de ser «alguém» ou «alguma coisa» no Olimpo mediático, mesmo que seja apenas por um instante.
Estes são os exemplos mais negativos dos condicionamentos derivados de um excessivo e acrítico uso dos meios de comunicação. Encontramo-nos diante de uma nova geração que cresceu na frente da televisão, capaz de usar as novas tecnologias que os próprios pais, que as adquiriram e as tornaram disponíveis, muitas vezes se encontram despreparados para utilizá-las.
Tanto é verdade que hoje em dia os filmes são vistos diretamente nos celulares e a televisão pode ser assistida na tela do computador. Hoje se telefona através da internet e graças ao download se descarrega os CDs e DVDs mais recentes, se filma e se faz foto com o celular, e assim por diante.
Nas casas, o vocabulário familiar se reduziu ao gênero dos sms e se fala tendo o som da televisão no fundo, se comunica através de e-mail, se faz «visita virtual» via computador, se percorre através de bibliotecas virtuais, tanto que as fichas e arquivos de papel evocam imagens do outro século, completamente em desuso.
A situação dos nossos filhos é diversa daquela da geração precedente, pois eles abriram seus olhos tendo diante de si estes cenários de profunda, contínua e envolvente transformação tecnológica. Eles se constituem aquela que os estudiosos chamam de geração nascida «com seis dedos»: além dos cinco dedos normais da mão, o sexto é o mouse do computador.
Com o aparecimento do mundo «virtual» da internet e dos videogames criou-se uma defasagem em relação à realidade verdadeira e própria. As duas dimensões parecem muitas vezes, e para muitos jovens, como universos paralelos, com conseqüências não indiferentes no plano do processo de amadurecimento. Têm grande sucesso os sites nos quais se prevê uma segunda vida (basta verificar os milhares de registros nos poucos meses de existência do site italiano de «Second Life», que em todo o mundo já tem sete milhões de inscritos), onde a simulação reproduz todas as situações da vida real. Apenas que tudo é falso, a começar da nova identidade, que pode ser escolhida e com ela se inicia a fazer parte deste mundo fora do mundo, onde se pode ser um «qualquer coisa». Isto é, ninguém.
Assim, o grande desafio cultural de hoje é propriamente a redefinição dos limites, que muitas vezes se apresentam demasiadamente instáveis. Isto é, redefinição dos limites entre o real e o virtual, superando a divisão digital que hoje separa as gerações adultas daqueles mais jovens.


OS JOVENS: PROTAGONISTAS OU VÍTIMAS DAS MUDANÇAS?

A linguagem deles é pobre, muitas vezes recheada de termos tirados do dicionário do internauta: clicar, chatar, messagiar, deletar, são alguns dos neologismos que fazem parte de seu vocabulário quotidiano. Falta uma dimensão humana da tecnologia que esteja em condições de traçar o perímetro cultural entre o real e o virtual. Assim a aldeia global difundiu uma quantidade de modelos comportamentais desviados, ou pelo menos discutíveis.
Desta maneira, os jovens que vivem a milhões de quilômetros de distância jogam o mesmo videogame, vêem o mesmo filme, assim como, de maneira transversal, absorvem modelos e comportamentos semelhantes. Muitas vezes os adultos têm menos domínio no uso das novas tecnologias e observam, com uma preocupação resignada diante de suas próprias limitações, as crianças que navegam facilmente na internet.
As raízes das dificuldades neste campo educativo são muito bem explicadas por Marina D’Amato, professora de sociologia da Universidade de Roma, que salienta: «Cada geração tem necessidade de se encontrar também em um mundo fantástico, que serve a interiorizar o paradigma do bom e do belo, do justo e do errado, do oportuno e do útil, também em relação aos exemplos que procedem da narrativa. Hoje nos encontramos em uma condição na qual os avós e os pais contam cada vez menos histórias aos filhos e aos netos, e este papel foi assumido pela televisão. Mas, na realidade, a televisão “exila” e “con-funde”, isto é, funde os modelos morais que são frutos de ânsias e problemas mal resolvidos, muito mais que de certezas. Embora estes se transformem com freqüência, a cada três ou quatro anos, o fato de serem repropostos continuamente faz com que se justaponham uns aos outros» (ver Come mediare i media, de Mario Russo).
Se for verdade que a televisão é o meio mais usado até a adolescência, imediatamente depois surge a grande atração pela internet. Esta passagem nasce de uma sintonia com a linguagem televisiva, que na idade infantil muitas vezes é ouvida durante muitas horas no dia. Esta linguagem se baseia em uma mediação da realidade e desta maneira ela ativa um processo de recepção que é de tipo emotivo.
Neste registro emocional é mais fácil acabar envolvido por situações e figuras capazes de se proporem como modelos identificadores, preservadores de sentido e de comportamentos a serem imitados.
O poder de concentrar uma vontade emulativa em alguns personagens, que correspondem particularmente às necessidades interiores do jovem (necessidades na maioria das vezes induzidas pela publicidade ou por modelos estimuladores), tem uma forte relação com a quantidade de horas que o jovem passa utilizando os novos ou os velhos meios de comunicação.


EDUCAÇÃO NECESSÁRIA

«A formação adequada a um uso correto dos meios de comunicação é essencial para o desenvolvimento cultural, moral e espiritual das crianças… Educar as crianças a serem seletivas no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja, da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos. Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia, com a certeza de que este difícil, embora gratificante, aspecto da condição de pais, é apoiado por toda a comunidade.»
As palavras do discurso de Bento XVI definem com grande clareza o paradigma de uma justa relação entre a mídia e os menores. Uma clareza que devemos agradecer ao magistério da Igreja, no momento em que o mundo da mídia parece ignorar a verdadeira problemática educativa das crianças e as expectativas de qualidade e de segurança exigidas pelas famílias no que se refere ao uso desses meios, seja do cinema aos videogames, da televisão à internet.
Diante da utilização destorcera do meio televisivo, o mais difundido dentre os meios de comunicação, a Igreja se interroga sobre o porquê da televisão não ter um papel educativo e por que os meios de comunicação não podem ser companheiros confiáveis para os jogos na fase de crescimento da criança. O anúncio de uma recente campanha sobre o uso da mídia, promovida pelo Ministério das Comunicações, mostra os vários membros da família que estão vendo a televisão ao lado de uma criança.
Que se trate do avô ou da mãe, a mensagem é a mesma: não deixar uma criança sozinha diante de um meio que, sem o apoio crítico educativo de um adulto, pode transmitir conteúdos inadequados à idade e à maturidade daquele que o vê. Sem esquecer as responsabilidades dos produtores televisivos, empenhados na organização dos programas, o papel da família é realmente insubstituível.
Se realmente o objetivo de quem administra a sociedade de produção televisiva, ou das multinacionais produtoras de videogames ou das operadoras de celulares, é o de promover e vender o produto, o bem estar psicofísico da criança está no centro do interesse dos educadores, sejam eles os professores ou, em primeiro lugar, os pais.
Isto explica bem a mensagem do Papa, que continua a sua análise, salientando que «educar as crianças a serem seletivos no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja e da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos (ver João Paulo II, «Familiaris Consortio», 76). Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia.»


CONTEÚDO DA MÍDIA

No panorama de uma revolução da multimídia, que está modificando transversalmente os hábitos, a mentalidade, os modelos e as linguagens, deve voltar ao centro do debate a tutela daquilo que é melhor para os menores. Sem acusar a «mídia», que enquanto tal não é nem boa nem má, o importante é partir de uma a análise do produto, para assim poder individuar conteúdos que sejam de melhor qualidade para as crianças e os adolescentes. Porque a televisão é um instrumento que abre janelas de conhecimento para o mundo e, se bem utilizada, de «má professora» pode se tornar uma preciosa fonte de estímulo para o crescimento humano e cultural.
A mesma coisa vale, e com mais razão, para a «rede» que engloba e compreende tudo, e para os videogames, onde, ao invés de violência e monstros, poderia se dedicar a produzir (e isso já ocorre em certos casos) histórias instrutivas e de conteúdo interessante.
Bento XVI coloca justamente em evidência as enormes possibilidades para que seja melhorado o conteúdo deste grande campo de produção multimídia: «A educação através da mídia deveria ser positiva. Colocando as crianças diante de um meio estética e moralmente excelente, estas recebem uma ajuda para que desenvolvam a própria opinião, a prudência e a capacidade de discernimento. É importante aqui reconhecer o valor fundamental do exemplo dos pais e as vantagens de introduzir os jovens aos clássicos da literatura infantil (…). A beleza, quase um espelho do divino, inspira e vivifica os corações e as mentes juvenis, enquanto a feiúra e a vulgaridade têm um impacto deprimente sobre os comportamentos». Diante de uma decadência geral do produto televisivo, a questão da qualidade aparece ainda mais forte e vibrante em grande parte de um público formado de famílias, que pede para não ser apenas um exército indistinto de ouvintes silenciosos, mas um público em condições de exprimir suas preferências por conteúdos formativos e informativos de bom nível.
A mensagem de Bento XVI continua, com algumas importantes indicações: «Como a educação em geral, aquela da mídia requer também uma formação ao exercício da liberdade. Trata-se de uma responsabilidade que compromete. Muitas vezes a liberdade é apresentada como uma incansável procura do prazer ou de novas experiências (…). Este desejo, sentido profundamente pelos pais e educadores, que é o de educar as crianças no caminho da beleza, da verdade e da bondade, pode ser apoiado pela indústria da mídia somente na medida em que se promove a dignidade fundamental do ser humano, o verdadeiro valor da vida familiar, as conquistas positivas e as metas da humanidade. A partir disso, a necessidade de que os meios de comunicação estejam empenhados na efetiva formação e no respeito da ética deve ser vista com interesse particular e com urgência não apenas pelos pais, mas também por aqueles que têm responsabilidade cívica».
Na realidade, nos encontramos na situação de ter que reconhecer que na Itália falta uma verdadeira «cultura da criança»: a situação é tão séria que no âmbito institucional procura-se dar uma nova organização geral para verificar e controlar os conteúdos dos setores de entretenimento, como os videogames, que até agora estão submetidos apenas a códigos de auto-regulamentação, feitos e codificados para uso e consumo pelas indústrias produtoras.
Uma vez mais, o primeiro e indispensável apoio à criança só pode vir da família e de uma relação mais estreita com os professores e educadores, exatamente como salienta Bento XVI, lembrando-nos que a preocupação educativa dos pais não deve se tornar uma preocupação genérica, mas uma atenção constante a tudo aquilo que diz respeito aos filhos.

A INDÚSTRIA DA MÍDIA

1) A TELEVISÃO

Se a televisão convencional se apresenta como um ramo de atividade já «maduro», no entanto se apresenta no horizonte a situação da mídia digital (satélite ou a cabo), também como uma plataforma que consente a ligação entre televisão, internet e outro tipo de mídia através do computador. No que se refere à qualidade da programação, apesar dos inúmeros bons propósitos anunciados no âmbito institucional, parece pequena a atenção às exigências dos menores em suas diversas faixas etárias. A programação para os menores, na realidade é confinada em redes e horários particulares, enquanto o resto da programação na faixa horária considerada «para todos» muitas vezes apresenta conteúdos inadequados aos jovens. Mas, quais são as expectativas das gerações de jovens no que se refere à televisão? É realmente verdade que preferem o «trash», os jogos com prêmios absurdos e as «velines»?
A partir de uma pesquisa recente feita pelo instituto Censis sobre «Comunicação, pluralismo social, sociedade aberta» (2005) surge que a relação entre os menores, e em particular dos adolescentes entre os 14 e 18 anos de idade, e a televisão é determinada por elementos de forte contradição e de passividade. Nessa faixa etária, 100% deles vêem televisão praticamente todos os dias, 86% acompanham um pouco de tudo, com uma relevante predileção pelos filmes (72%), por esporte (32%) e pelos «reality shows» (18%).
No entanto, a amostragem entrevistada não está realmente satisfeita com aquilo que vê. De fato, 36% dos adolescentes denunciam a vulgaridade difundida nos programas e 25% criticam a superficialidade. Dentre eles, 46% consideram a televisão como um meio que «invade», ao mesmo tempo em que é interessante notar que 25% consideram que em geral a programação televisiva alimenta nas crianças menores uma visão consumista da vida. Destes dados surge o contraste entre a procura de distração e a reprovação daquilo que lhes é proposto pela programação. Isto significa que o alto índice de procura não é um indicador de satisfação.
Considerando o axioma de que a televisão seja onipresente, fica claro que são os próprios jovens a pedirem uma maior atenção aos conteúdos: menos violência e menos vulgaridade. A exigência de uma regulamentação diversa, diz claramente o relatório do Censis, «não vem somente daqueles, pais e educadores, que estão preocupados pela possível influência negativa sobre os menores, mas se exprime nitidamente também através dos adolescentes, pelo menos de uma parte mais esperta e consciente dentre eles».
Para tutelar melhor os direitos dos menores, desde 2002 foi instituído junto ao Ministério das Comunicações um código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual aderiram os produtores de televisão, seja no âmbito nacional como local. Baseando-se nos princípios sobre a matéria existentes na Constituição italiana e na Convenção dos direitos da criança, estabelecida em 1989 pela ONU, a comissão que controla sua aplicação avaliou em todos estes anos de atividade os milhares de casos em que foram violadas as normas de tutela, que prevêem a transmissão de programas e imagens adequadas a um público de menores de idade durante aquela que é chamada de «faixa protegida» da programação televisiva (das 7h30 às 22h30), intervindo com denúncias e sanções, que nos casos mais graves foram aplicadas pela Autoridade de garantia no setor das comunicações. Para o futuro, esta comissão deverá se transformar em um organismo mais amplo de controle, que se chamará «Mídia e menores», que além da televisão deverá monitorar também os setores dos vídeos-telefone e dos videogames, além da internet, que é o campo de maior risco.

REGRAS DE TUTELA EM OUTROS PAÍSES

É diversa a situação em outros países, como por exemplo na Grã Bretanha, onde o sistema de regulamentação da mídia é estruturado e complexo e foi atualizado nas últimas décadas, com uma particular atenção à tutela dos menores. As inovações tecnológicas neste setor levaram as normativas inglesas a uma série de novas disposições, como por exemplo, a visão em casa de vídeo exclusivamente para adultos, e que fora de casa seriam vetados aos menores, ou o combate à praga mundial dos sites internet para os pedófilos, que contenham material pornográfico ou com conteúdos que possam esconder o aliciamento de menores (ver a Protection Childres Act, de 1978).
A programação televisiva é regulamentada pelo Broadcasting Act (1996), de onde deriva a instituição da Broadcasting Standard Commission (BSC), um órgão independente de controle que estabelece as normas de avaliação e classificação dos programas, também no que se refere aos conteúdos violentos ou que possam ofender a decência pública (site oficial www.bsc.org.uk). Este organismo BSC funciona internamente à estrutura do Broadcasting, supervisionando e regulamentando todas as emissoras de televisão e de rádio, via cabo ou por satélite. Sua tarefa é a de elaborar os códigos de conduta e de aplicação de modelos que respeitem a justiça, além de monitorar os modelos, verificando que respeitem as leis. Com a transmissão de programas com conteúdos considerados inadequados aos menores de várias idades, há alguns anos a televisão inglesa adotou o sistema «watershed», um «separador de águas» entre um horário de programação familiar e outro para os adultos. Todo o sistema televisivo inglês se apóia sobre a responsabilização das famílias, pois sem a colaboração delas qualquer código de modelos para os programas é praticamente inútil.
Na França, está vigorando já há anos um código através de sinais televisivos, que entra em função para assinalar os programas inadequados aos menores. A avaliação do programa televisivo é feita pelo Conseil Supérieur de l’Audiovisuel (CSA), uma autoridade administrativa independente, que controla a difusão dos filmes e outras transmissões em vários canais privados, nacionais, regionais ou locais. A normativa francesa (lei 719/2002) veta a transmissão de programas que possam prejudicar gravemente a integridade física, mental e moral dos menores, porque divulgam conteúdos de pornografia ou de violência gratuita. As transmissões são classificadas por um código de sinais que, em conjunto com um sistema organizado de faixas horárias de programação, garante às famílias mais clareza sobre os programas destinados aos menores.
Na Alemanha, o tema da infância tem particular atenção da legislação, que considera desde o nascimento o início dos direitos fundamentais do cidadão. A tutela é disciplinada no âmbito público pela JSchG (desde o dia 26 de fevereiro de 1985), enquanto a lei GjSM se ocupa do controle sobre a difusão de publicações e conteúdos mediáticos considerados danosos para os menores. A regulamentação no setor televisivo é feita segundo as normas do acordo sobre a radiodifusão dos Lander federais, que as entidades para a mídia nesses Lander adotaram por base para o estabelecimento das diretivas que tutelam o interesse dos menores nas emissoras privadas. Não são admitidas transmissões que incitem o ódio racial, que exaltem a violência ou a guerra, que ofendam a dignidade do homem, que sejam de gênero pornográfico, que mostrem pessoas moribundas ou com sofrimentos que ofendam a dignidade humana. Os responsáveis pela programação, escolhendo os horários das transmissões, devem cuidar para que os menores não vejam programas que podem prejudicar o seu bem estar psíquico, físico ou mental. As transmissões inadequadas às crianças menores podem ser transmitidas somente depois da autorização da entidade competente do Land interessado.
Os responsáveis pela organização dos programas televisivos em âmbito nacional devem nomear encarregados pela tutela dos menores, que atuam no momento da aquisição, da projeção e da realização dos programas. As emissoras privadas fundaram em 1993 uma associação de autocontrole voluntário da televisão («Freiwillige Selbskontrolle Fernsehen», FSF), à qual devem ser apresentados programas particulares, antes da sua transmissão, e suas avaliações consideradas nas decisões das entidades de controle da mídia nos Lander federais. Existe ainda o órgão comum do cidadão para a tutela dos menores, dos programas, da competência mediática e controle da mídia (GSJP), do qual faz parte um integrante da entidade para a mídia nos Lander federais, que dá o seu parecer a respeito de algumas séries, filmes e espetáculos mais ou menos adequados aos menores. Este órgão, o GSJP, decide sobre pedidos de mudança de horários de transmissão de filmes proibidos para menores, controla a forma de novos programas e experimenta novas disposições para a tutela dos menores na televisão digital. A peculiaridade da jurisdição alemã, seja no setor televisivo como no cinematográfico e da mídia em geral, é a minuciosa atenção às exigências com o desenvolvimento do menor e aos riscos que este pode correr com a observância incorreta das leis.
Nos Estados Unidos, é possível consultar via internet um «guia televisivo para os pais» (ver o site www.mpaa.org), que prevê algumas categorias de audiência aplicadas aos programas televisivos transmitidos a todo o público. Este guia organiza várias siglas para identificar a categoria de audiência para cada transmissão: vai-se do TVY (para todas as crianças) ao TVG (para todos), através de várias faixas etárias, que correspondem à passagem da primeira à segunda infância e desta à adolescência. Depois tem o TVPG («parental guidance», visto na presença de um dos pais), o TV14 («parent strongly cautioned», séria advertência aos pais), para os programas que contêm cenas de sexo e de violência. Enfim, há o TVMA, que prevê um «mature audience only», ou seja, destinado a um público de idade superior a 17 anos, última fronteira para os conteúdos considerados «restricted».
Estas avaliações foram elaboradas baseando-se nas opiniões dos próprios pais e são fáceis de serem encontradas e compreendidas. Esta linha de «guia de televisão para os pais» pode ser usada juntamente ao «v-chip», que é um dispositivo de filtro instalado na maior parte dos mais recentes modelos de aparelhos de televisão, para permitir aos pais de bloquear os programas inadequados.

FICHA 1
Brasil: «O que eu penso da tv»
No Brasil, a audiência infantil é muito alta: aproximadamente 30 milhões de crianças vêem televisão pelo menos durante três horas por dia. Explica a profa. Rosália Duarte, do departamento de Ciência da Educação, da PUC do Rio de Janeiro, que «as crianças são muito perspicazes, mas nós podemos e devemos ajudá-las a ampliar o seu quadro de referências, para que possam discutir ainda melhor sobre o conteúdos daquilo que vêem. Para isso temos necessidade, antes de tudo, de ouvir aquilo que elas têm a dizer sobre o assunto e de dialogar com elas. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e muito mais freqüente, a outras atividades culturais». No âmbito de uma pesquisa feita através de um questionário distribuído nas escolas, intitulado «O que eu penso da tv», apareceu que «as crianças querem seriamente ser ouvidas sobre aquilo que pensam da tv, mas sentem que sua opinião é considerada pouco importante e não estão contentes com o excesso de imagens de violência exibidas na televisão, principalmente a violência “real”, definida como aquela transmitida nos telejornais. Eles adoram ver televisão e não importa o que os adultos pensam e dizem a respeito disso. A eles agradam quase todos os tipos de programas transmitidos: novelas, desenhos animados, programas de humor, filmes, seriados, mas isso não faz deles espectadores “idiotas”, pois fazem críticas muito interessantes, pertinentes e bem elaboradas sobre o que consideram feio ou inadequado na televisão. Para a maior parte deles, a televisão se oferece como principal opção de divertimento (em alguns casos, a única), o que significa um dado muito preocupante. Mas, o que chamou mais a nossa atenção é o grau de experiência com o qual essas crianças analisam a televisão: são expertos e demonstram conhecer a televisão também do lado de dentro, inclusive as linguagens que ela utiliza, a sua estrutura de produção, a sua lógica interna e as suas maneiras de intervenção».
As crianças aprendem os valores e os não-valores através da televisão, não resta dúvida, mas demonstram ter senso crítico a respeito deste assunto, quando afirmam nos textos que os programas transmitidos na tv podem lhes ensinar «a serem bons, a ter coragem e a fazer o bem, a cuidar da natureza e de si mesmos, a serem honestos e a lutar por aquilo que desejam», mas também «a serem cruéis e mentirosos, a roubar e matar, a não respeitar os pais e a comprar tudo aquilo que não têm necessidade». Falando sobre a validade do ensino através da mídia, a profa. Duarte salienta a necessidade de «ouvir aquilo que têm a dizer sobre o assunto e a dialogar com eles. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e mais freqüente, a outras atividades culturais».

FICHA 2
Observadores internacionais
Os dados examinados em janeiro de 2006 pelo OssCom, que é um centro de pesquisa da mídia, deixam evidente a tendência a realizar uma forma de co-regulamentação, onde a ação legislativa dos Estados membros se integra com medidas de auto-regulamentação por parte dos produtores, broadcasters e profissionais da comunicação sob o efeito de controles e sanções. São dois os instrumentos mais utilizados no âmbito europeu, observando-se as diretivas previstas no artigo 22 de «Televisão sem fronteiras»: a definição de faixas horárias protegidas (watershed) e os sinais mostrados na tela (determinados por um sistema de «rating»). Apesar disso, aos campos tradicionalmente problemáticos da violência e da pornografia se juntam novos campos de risco para os menores: a vulgaridade, abusos e dependências de substâncias, linguagem e comportamento vulgares, discriminações e abusos, violações e ofensas à dignidade humana. Os critérios de avaliação dos programas se constituem um problema que é partilhado por muitos países da União européia, ao mesmo tempo em que se prepara uma uniformização internacional dos sistemas de classificação (ver mais adiante, Nicam), baseados na visualização de cinco ícones que ilustram simbolicamente qual é a problemática do programa que está sendo analisado e para quais idades ele é desaconselhado.
Deve ser assinalada a atividade online da European Medi@culture. O projeto é promovido pela Comissão Européia, em Bruxelas, no quadro das iniciativas «e-Learning», administrado pelo centro mediático de Baden-Württemberg. O site apresenta informações sobre a educação à mídia na Europa, particularmente na França, Áustria, Finlândia e Alemanha. A seção de projetos de multimídia agrupa os projetos sobre a mídia desenvolvidos por escolas e associações de jovens ao longo do tempo (ver http://www.european-mediaculture.org).

FICHA 3
África do Sul: Encontro mundial sobre a mídia para a infância
Este encontro trienal se realizou no último mês de março em Johannesburg, na África do Sul, com a participação de expertos do setor representando diversos países. Em conjunto se discutiu sobre a necessidade de uma programação adequada às crianças, procurando entender de que modo a violência na mídia pode influir sobre a psíquico dos menores.
Mas, no 5º Encontro mundial sobre a mídia para a infância apresentaram-se também muitas crianças provenientes de todo o mundo e empenhadas em discutir sobre o difícil tema da «Mídia como instrumento de paz e de democracia global». Vieram guiados por grupos de adultos, dentre eles as diversas organizações católicas que há anos trabalham para promover regras para o bem da infância, a serem respeitadas nas transmissões de rádio e televisão através de códigos de regulamentação que devem ser redigidos ou, como em alguns casos, apenas atualizados. Em muitos países do sul do mundo as novas tecnologias de multimídia já estão muito disseminadas e seu uso merece uma atenção particular para tutelar o público mais jovem.
Especialmente na África, explicou o organizador do encontro, Firdoze Bulbulia, começa-se a examinar o projeto de um «Media center» para as crianças, que possa produzir e distribuir transmissões de rádio e de televisão destinadas ao público mais jovem, com o objetivo de realizar um canal televisivo pan-africano dedicado à infância. Os organizadores do encontro estão também trabalhando no projeto de uma aliança africana dos meios de informação e de comunicação, seguindo o modelo daquela já existente na América latina.

2) INTERNET

Na Itália, 47% das famílias italianas têm um computador em casa, um dado relevante mas sempre muito baixo em relação à média dos outros países europeus. O uso da internet por parte dos adolescentes e jovens, e a familiaridade que têm com tudo aquilo que pode ser digitado ou «descarregado» da internet, apresenta não poucos problemas. Pela sua própria natureza de rede de comunicação global, o problema se apresenta em ótica internacional, procurando garantir a tutela dos menores através de precisos acordos com os provedores para um efetivo controle de conteúdo. No campo italiano, até 2006, a tutela dos menores tinha sido deixada nas mãos dos próprios provedores, que em 19 de novembro de 2003 assinaram um acordo de auto-regulamentação: o Codice Internet e Minori. Embora o acordo tenha sido estipulado entre os representantes dos vários provedores diante do Ministério para a Inovação e a Tecnologia, no entanto ele permanece um acordo privado, com lacunas, principalmente no que se refere às sanções que muitas vezes devem ser aplicadas. Em 2006, na seqüência de numerosos casos de violência sobre menores, muitos dos quais realizados através da difusão de material pedo-pornográfico (quando não se tratava de verdadeiro e próprio aliciamento de menores via internet), foi promulgada a lei 38 de 6 de fevereiro de 2006: «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet».
Enfim, como aplicação da lei 38/2006, em fevereiro da 2007 foi publicado um decreto determinando os requisitos técnicos dos instrumentos de filtragem que os provedores da rede internet devem utilizar para impedir o acesso aos sites já assinalados pelo Centro nacional contra a pedo-pornografia. Mas, isso não basta para superar as dificuldades e impedir que os menores possam navegar de maneira arriscada na «rede das redes».
Atualmente foi reativada a comissão anti-pedofilia e desvios de menores através da internet, o «Ciclope», que tinha sido instituída junto ao Ministério para a Eqüidade, do governo italiano, e que ficou inativa por um ano, até a sua reestruturação junto ao Ministério da Família. Está também para entrar em função um site dedicado ao uso da internet, junto ao Ministério das Comunicações, e um número telefônico de emergência gratuito, organizado pelo mesmo ministério e por «Save the children», que poderá ser utilizado por qualquer cidadão que queira assinalar algum abuso, desvio ou pedo-pornografia. Dentre as iniciativas mais recentes, deve ser assinalado o site www.tiseiconnesso.it criado pelo Ministério das Comunicações italiano, sempre em colaboração com «Save the children», onde é colocada à disposição uma série de informações sobre o conteúdo de certos sites, seja para os pais como para as próprias crianças, em conjunto com a campanha televisiva que tem como slogan «A melhor maneira de ajudar o seu filho a não usar incorretamente as novas tecnologias é conhecê-las».
Deve ser salientado também o fato de como a rede se tornou um grande mercado online. Para alguns produtores, o «e-commerce» de brinquedos corresponde já a 4% das vendas, e apenas em 2005 as vendas online corresponderam a 37.600 ações de compra. As razões para investir no processo online são múltiplas: desde a possibilidade de evitar as dificuldades logísticas de distribuição dos produtos, à ampliação de ofertas diferentes de produtos e também a possibilidade de envolvimento do cliente através de campanhas de mala direta e a criação de comunidades virtuais em torno de alguns produtos.

FICHAS:
Pedo-pornografia e internet
Em março de 2006, entraram em vigor as novas medidas diretas de combate e repressão ao fenômeno de exploração sexual dos menores e a pedo-pornografia, estabelecidas pela lei 38/2006 – «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet» foi publicada no Diário oficial em 15 de fevereiro de 2006, nº.38 – com a qual foram substancialmente modificados e integrados os artigos 600bis e seguintes do Código Penal italiano.
A lei confirma os artigos 527, 528, 529 e 725 do Código Penal italiano, que punem os «atos obscenos em local público, publicações, espetáculos obscenos, desenhos ou figuras que ofendem a decência pública».
Porque em muitas publicações, transmissões televisivas e anúncios publicitários, mesmo que não tenham declaradamente um caráter pornográfico, imagens de crianças e adolescentes são apresentadas de maneira explícita ou mais ou menos sutilmente ilusória e de forma falsa, pede-se um novo empenho das instituições competentes para que sejam observadas as normas em vigor e, se preciso for, que façam apelo aos órgãos de Polícia, o Instituto de autodisciplina publicitária, o Ministério das Comunicações, a Polícia postal ou a «Comissão tv e menor».

3) CINEMA

Confirmando as disposições da Constituição italiana, no que se refere ao direito e ao dever das famílias de serem protagonistas na educação de seus filhos, para muitos é chegada à hora de reelaborar a legislação que define o conceito de «censura» (a lei 161/1962 prevê a possibilidade de negar a autorização de abertura às salas de cinema ou de fazer cortes nos filmes, mesmo em função de um público adulto), que hoje está superado. É preciso com urgência estabelecer um critério de tutela dos menores não apenas no que se refere aos filmes que vêem nos circuitos cinematográficos, mas também sucessivamente em casa, muitas vezes em horários acessíveis na programação da televisão.
Uma avaliação correta e preventiva de um filme permite à família ter à sua disposição os instrumentos para escolher se um espetáculo é mais ou menos oportuno, conhecendo a trama, os eventuais conteúdos mais sensíveis, a classificação que a obra recebeu em outros países, etc. Por isso, é justo que a legislação seja revista, uma operação que requer atenção e perspicácia da parte das instituições em um momento de transição da mídia, como este que estamos vivendo, quando esta se tornou realmente um importante componente na educação dos menores.
Não faltam filmes que atraem o público por causa de seu conteúdo de violência, e no entanto entram no circuito cinematográfico sem qualquer restrição de idade. Para um filme que é notícia nos jornais, existem muitos outros com conteúdos duvidosos ou até mesmo perigosos que conseguem passar através do filtro da comissão de revisão cinematográfica, que atualmente funciona junto ao departamento de cinema do Ministério dos Bens Culturais.
Ao mesmo tempo em que existe um projeto de lei do ministro dos Bens culturais, que deve ainda iniciar os trâmites parlamentares, novas situações se apresentam na Itália, com a autocensura de filmes, feita pelos produtores ou distribuidores cinematográficos, com a introdução de novas e mais específicas faixas etárias para as restrições visando os menores a partir dos 10 anos de idade. As restrições serão feitas baseando-se em uma avaliação classificatória dos conteúdos das obras e sucessivamente serão ainda analisadas por uma comissão de psicólogos, educadores e pais.
Este sistema se inspira no modelo americano da Motion Picture Association of America (MPAA), que há 40 anos representa os interesses da indústria do audiovisual americana no mundo. Funcionando a partir de regras bem precisas (estabelecidas ao longo dos anos, também segundo as sentenças dos tribunais federais nos vários Estados americanos e em base aos protestos dos cidadãos), a autocensura americana prevê a existência de uma única comissão competente para determinar as restrições do PG12 ao «restricted» 17 anos. Esta comissão é composta exclusivamente de pais, considerados os primeiros depositários da educação dos filhos, e representam transversalmente a audiência. Importantes sanções econômicas asseguram que o mecanismo de autocertificação corresponda efetivamente aos interesses dos cidadãos. No site da Motion Picture estão disponíveis aos pais os pontos de referência para a avaliação das obras de entretenimento e são publicadas as restrições aplicadas a cada filme que está em exibição nas salas de cinema. Geralmente as avaliações parecem muito mais severas em relação a outros países. Tudo isso, nos vários anos de sua aplicação, deu uma qualificação à indústria americana e seu correto serviço prestado aos ouvintes. Qualquer estrada que se pretenda seguir na Itália, é importante para as famílias que seja estimulado um mercado de produção adequado à infância: é justo que o mecanismo da indústria cinematográfica continue com o seu ritmo de produção, mas não é justo confundir as classificações de acesso ao produto, como qualquer indústria sabe muito bem.
No que se refere às normas européias de classificação dos filmes, e em geral de todo «entertainment» (neologismo anglo-saxão, que, no entanto encontra sua raiz etimológica na relação entre educação e jogo) acessível aos menores, deve ser citado o sistema NICAM, que funciona na Holanda há alguns anos. Fundado em 1999, o NICAM (Nederlands Instituut voor de Classificatie van Audiovisuele Media) se baseia na lei Media Act, onde os programas de grupos que tiveram a autorização para atividades de «broadcasting» não devem incluir obras audiovisuais que prejudiquem o desenvolvimento físico e psicológico de pessoas com menos de 16 anos de idade, seguindo as diretivas da União européia («Televisão sem fronteiras» IV).
O sistema de classificação preventiva funciona também na Grécia, com a lei 1.597, de maio de 1986, que prevê que antes da projeção nas salas de cinema, cada filme seja submetido pelo produtor ou pela sociedade de importação à Comissão para a juventude, que classifica o filme seja como adequado aos menores, ou proibido aos menores de 13 anos, ou de 17 anos ou ainda, nos casos mais graves, severamente inadequado aos menores. Esta comissão é um órgão do Ministério da Cultura e foi concebida procurando-se estabelecer certa proporcionalidade, sendo composta de representantes do Estado (Ministério da Cultura), das categorias ligadas ao cinema, de psicólogos especializados na educação, de sociólogos, dos jovens, dos educadores e dos pais.
Na Áustria, está em vigor um sistema de avaliação complexo, instituído em base a um princípio constitucional federal que confia a tutela dos menores, no que se refere ao cinema e em geral aos meios de comunicação de massa, à competência específica dos Lander. A lei nacional que engloba a regulamentação da mídia é a ORF-ACT, ou seja, a Austrian Broadcasting Corporation nº. 379/1984, que estabelece quais os critérios sobre os quais deve se basear a proteção aplicada a programas e filmes transmitidos na televisão ou através de outros canais mediáticos. No que se refere à exibição dos filmes, a avaliação preventiva das obras cinematográficas, para que sejam decididas as faixas etárias adequadas, é regulamentada pela lei austríaca para a tutela dos menores, a «Jugendschutzgesetz», aplicada através das leis dos Lander federais. Esta lei estabelece nove faixas de restrições de público a partir dos seis anos de idade, com uma sucessiva graduação que prevê restrições para 10, 12, 14 e 16 anos de idade. Para supervisionar o sistema de classificação cinematográfica, existe uma comissão junto ao Ministério da Educação, em Viena, que comunica seu parecer sobre a idoneidade dos filmes às autoridades locais. Geralmente e de maneira individual os Lander adotam as decisões da comissão, e é em âmbito local que se decide de sua aplicação.
Na Espanha, o artigo 20 da Constituição reconhece o direito do cidadão a exprimir e difundir livremente seu pensamento, suas idéias e suas opiniões através de qualquer meio de divulgação. Se por um lado o exercício de tais direitos «não pode ser restrito através de nenhum tipo de censura prévia», o mesmo artigo especifica que «estas liberdades têm o seu limite no respeito dos limites reconhecidos pelas normativas que exprimem este respeito, especialmente no direito à honra, à privacidade, à própria imagem e à proteção da juventude e da infância».
Baseando-se neste princípio, a qualificação dos filmes (Real decreto 81/1997) e das obras audiovisuais é feita antes de sua difusão, através do Instituto de cinematografia e das artes audiovisuais (ICAA), uma entidade autônoma, mas ao mesmo tempo ligada ao Ministério da Educação e Cultura através da secretaria de Estado para a cultura (ver site www.mcu.es).
A subdireção geral de fomento à indústria cinematográfica e do audiovisual, que faz parte do ICAA, se ocupa, dentre outras funções, da classificação em faixas etárias dos filmes e das outras obras audiovisuais em vista de sua exibição pública e para a sua distribuição. A comissão se encarrega de divulgar as informações sobre os filmes e programas audiovisuais, com classificação que vai desde as «salas X» até as restrições para cada faixa etária do público.
Os filmes de caráter pornográfico não podem receber subvenções do Estado e sua projeção nas salas prevê uma taxa suplementar, destinada em parte para estimular um fundo de proteção cinematográfica. A projeção destes filmes pode ser feita somente nas «salas X», onde não podem ser apresentados outros tipos de obras cinematográficas e onde é proibido o ingresso de menores de 18 anos.

CINEMA NA TV

Devido ao alto consumo de programas de televisão por parte dos menores e levando-se em conta as diretivas da União européia, que promovem a auto-regulamentação no âmbito nacional das emissoras de tv e a participação das famílias nesta obra educativa, há alguns anos estão em vigor na França, na Holanda, na Grã-Bretanha, na Grécia e na Itália os códigos de sinais, que servem para identificar tanto os filmes projetados na salas de cinema como aqueles transmitidos na televisão. A tutela dos menores no âmbito da televisão foi também feita adotando-se o chamado sistema «watershed» (separador das águas), que funciona segundo uma seleção de faixas horárias protegidas, algumas aconselhadas à visão dos menores, outras aconselhadas a todos e outras ainda, principalmente na programação noturna, indicadas somente a um público adulto.
A faixa de idade determinada pela classificação preventiva dos filmes tem obviamente uma repercussão na programação das chamadas faixas horárias protegidas ou distintas nas emissoras de televisão pública em todos os países europeus. A definição das linhas de conduta comuns está à base dos acordos de auto-regulamentação e de co-regulamentação dos programas de televisão, estabelecendo-se um código de procedimento comum para as emissoras tanto públicas como privadas. Criou-se assim uma base normativa, que é assumida pela autoridade do Estado e que recebe a confiança dos consumidores das emissoras públicas ou privadas que adotam este sistema de auto-regulamentação.
Para tornar visível aos adultos as classificações dos programas apropriados aos menores, muitas emissoras européias adotaram um sistema de sinais que através de símbolos, números, cores e sinais acústicos advertem ao público a respeito daquilo que está para ser transmitido.
Mas, apenas este sistema, assim como o de filtragem (tipo v-chip), não basta para garantir uma verdadeira tutela dos menores diante de um conjunto de imagens difíceis de serem decodificadas por um jovem. Deve-se pensar às imagens de guerra dos telejornais, dos filmes escabrosos ou às informações sobre os crimes hediondos, que muitas vezes têm como ambiente o próprio núcleo familiar.
É na colaboração entre Estado, produtores de programas audiovisuais e famílias que pode ser fundamentado um autêntico respeito dos menores que encoraje o crescimento positivo da criança em base aos valores fundamentais da pessoa humana.

4) CELULARES COM VÍDEO

Hoje a difusão dos celulares com vídeo chegou à Itália ao índice se 134%, o que significa que muitas pessoas possuem pelo menos dois celulares, inclusive os jovens e as crianças, que recebem este instrumento dos próprios pais. De fato, de duas crianças entre 8 e 13 anos de idade, uma delas tem um celular no bolso. Aquele que poderia ser um instrumento para controlar melhor os deslocamentos e as necessidades dos filhos, se revela no entanto um perigoso meio que pode expor a outro tipo de utilização por parte dos menores, que não se separam nunca do próprio celular, nem mesmo durante as aulas, como lamentam vários professores. Apesar do código de auto-regulamentação assinado pelas principais operadoras (Código de conduta para a oferta de serviços a pagamento em tutela dos menores), na realidade os novos serviços opcionais do celular o tornaram um «personal computer» capaz de permitir novos usos que antes não tinham.
Os desenvolvimentos tecnológicos que estão se verificando no campo da telefonia móvel – particularmente no que se refere à sinergia com a internet e a adoção dos sistemas DVB de vídeos-telefone – contribuem a aumentar a oportunidade de comunicação também para as novas gerações e, ao mesmo tempo, repropõem em novos termos a questão da tutela dos menores. As evoluções já previstas ulteriormente para os próximos anos e o número sempre crescente de pessoas envolvidas, pedem uma grande consciência social e uma constante atenção das pessoas e órgãos encarregados de garantir os direitos dos cidadãos.
Neste contexto devem ser reafirmados os direitos dos menores no campo da comunicação, dentre os quais certamente não está em último lugar aquele que se refere também à segurança diante dos riscos de indução a comportamentos ilícitos ou de acesso a conteúdos nocivos ou indesejados. Também neste campo é essencial o papel dos pais e, em geral, de todos aqueles que são chamados a ter uma função educativa. A maior segurança das crianças e dos jovens quanto ao acesso a conteúdos ilegais é um ponto que deve merecer atenção também através da maior conscientização dos pais e das mães, que devem se capacitar a conhecer e utilizar estes meios.
Para a «alfabetização» dos pais na utilização da mídia devem colaborar também as instituições públicas, promovendo um uso positivo das novas possibilidades tecnológicas. Às empresas cabe a responsabilidade de colocar no mercado um produto que dê garantias no que se refere à sua utilização pelos menores, superando os limites estabelecidos pelo código de auto-regulamentação assinado pelas operadoras de celulares. Devem também oferecer maiores informações aos adultos que assinam um contrato de utilização, como por exemplo a adoção de bloqueios automáticos de acesso a conteúdos nocivos, se o celular passa às mãos de um menor de idade.

5) VIDEOGAMES

Trata-se de uma indústria global, que conquistou os jovens e não apenas eles. Os números relativos à difusão repentina dos videogames indicam que existem 250 mil sites de videogames, cada um deles propõe uma série de títulos, muitos deles recheados de cenas de sexo e de violência. Uma pesquisa recente do Instituto italiano de medicina social (IIMS) coloca em evidência, entre outras coisas, a escassa informação por parte dos adultos a respeito dos videogames utilizados pelos filhos, o predomínio de temas violentas em mais de 30% de títulos não aconselhados aos menores, o predomínio de personagens virtuais normais que podem se tornar especiais, realizando ações extraordinárias.
Mas, o ponto de risco mais elevado se refere aos pequenos jogadores de videogames, crianças entre seis e nove anos de idade que se submetem a entrar tão intensamente no jogo virtual que chegam a formas de dissociação da realidade e solicitam um monitoramento muito atento da parte dos adultos. A mesma pesquisa indica a presença de videogames em 25% das famílias com crianças de três a cinco anos de idade e em 65,2% das famílias com crianças entre seis e 10 anos de idade. O que produz efeitos negativos no âmbito cognitivo das crianças não parece ser especificamente o meio, mas muito mais os elementos que criam a excitação, tais como a velocidade de produção do estímulo e da resposta, a velocidade das imagens, os efeitos especiais, os contrastes, a fragmentação da história, o binômio rumor-ação. O uso prolongado do jogo inibe, segundo alguns psicólogos, a área da capacidade crítica, provocando passividade e ao mesmo tempo agressividade na criança. Mas, não queremos demolir os videogames, porque existem aqueles que são muito adequados aos mais jovens, com valores de informação e de educação, seja também porque o uso deste meio é na realidade um passo na preparação da criança ao sucessivo e mais sofisticado, que é o uso da internet.
De qualquer maneira, os dados relativos à venda destes produtos de entretenimento mostram um crescimento em todos os lugares e a difusão deste meio é acompanhada de uma aceitação social (ou seria uma resignação?) sempre maior.
É urgente ampliar o percurso de conhecimento e das estratégias internacionais, para monitorar um mercado que está cada vez mais vasto. Parece urgente estabelecer modalidades operativas para o controle dos conteúdos e do sistema de sanções, seja para o produtor como para o vendedor dos serviços. O código de auto-regulamentação Pegi (derivado em 2003 do sistema de avaliação e classificação holandês, Nicam, que assinala os conteúdos inadequados aos menores), adotado pelos industriais de «entertainment» que produzem videogames, é a única forma de auto-regulamentação existente atualmente e que prevê sanções (raramente aplicadas, mesmo diante de casos graves evidentes) para os produtores que colocam no comércio os jogos com indicações de faixas etárias apenas aproximativas.
O código Pegi, ao qual a associação européia Isfe adere em 2002, é evidentemente insuficiente na sua função declarada de «fornecer aos consumidores as informações mais oportunas» e expostas no selo de produção. E, como o setor dos videogames tem hoje um volume de negócios que ultrapassa os 740 milhões de euros, envolvendo 24 milhões de jogadores (43% da população a partir dos quatro anos de idade), com uma venda dos produtos classificados para maiores de três anos de idade que chega aos quase 48% dos consumidores. É um dado que define o impacto deste gênero de meio sobre a infância e a adolescência, mostrando toda a sua periculosidade, seja pelo consumo de conteúdos inadequados, seja pelo excessivo número de horas dedicado neste passatempo, muitas vezes solitário e sem a presença de um adulto ao lado. Se for verdade, como sustenta a indústria, que a produção de videogames violentos é apenas uma mínima parte do mercado, é também verdade que esta representa a fatia mais importante do retorno econômico.
O interesse pelos videogames é alimentado pela sinergia com os filmes que inspiram o jogo homônimo e que torna sempre mais atrativo este gênero, principalmente para os adolescentes. Desta maneira é importante também neste campo o estabelecimento de regras precisas em defesa dos consumidores dentre o público jovem, mais exposto aos riscos destas novas formas de entretenimento cada vez mais sofisticadas e envolventes, por causa da combinação entre narrativa e efeitos gráficos.

6) PUBLICIDADE

O problema da tutela dos menores diante da publicidade se apresenta como um corolário, dentro do quadro mais amplo que regulamenta a difícil relação entre a mídia e as crianças. A televisão, e portanto também a publicidade, se constitui em uma fonte de perigo para os menores, isto é, para a maior parte das crianças, principalmente em idade pré-escolar, que devem saber fazer a diferença entre a publicidade e o resto da programação, e entre os programas de ficção e a realidade. Com essas considerações não significa que exista uma acrítica rejeição da publicidade em si mesma – à qual se reconhece, no entanto, onde proceda corretamente, uma função positiva no processo de formação, de crescimento crítico e de socialização do menor –, mas existe a necessidade de prever um sistema de regras destinado a garantir-lhe um uso adequado.
O efeito dos anúncios publicitários é tão grande que em alguns países estão sendo tomadas medidas drásticas a respeito. No Reino Unido, por exemplo, recentemente foram vetados os anúncios publicitários durante os programas destinados às crianças até nove anos de idade, a partir de 1º de janeiro de 2008 a medida se estenderá à programação para os jovens até 15 anos de idade e até o final de 2008 serão vetados em todos os canais dedicados aos menores. Apesar de se reconhecer que a publicidade serve para financiar os programas, aqueles dedicados às crianças terão que recorrer a outras fontes. Também na França começa a se impor uma «linha dura» a esse respeito: visto a alta incidência de publicidade de merendas, de sucos e doces em geral, a partir de agora os anúncios dedicados às crianças deverão ser precedidos de uma espécie de aviso, que orientará para uma alimentação adequada.
Mas, por que as crianças são tão frágeis diante dos apelos da publicidade? Na Itália, explica Paolo Landi, secretário geral da Adisconsum (Associação de defesa dos consumidores e do ambiente»), em um capítulo de seu estudo «Crianças da multimídia»: «Se consideramos que a publicidade não faz outra coisa que veicular um conhecimento imediatamente concretizável em um “ter”, ou em um “ser”, ou em um “fazer”, a criança absorve sem dificuldades os três componentes que são a obsessão dos expertos de marketing, isto é, o componente cognitivo (como fornecer informações indeléveis sobre um produto ou um serviço), o componente afetivo (como fazer o consumidor reagir de maneira emotiva) e o comportamental (como colocar o pequeno consumidor em movimento na direção da aquisição). A partir deste ponto de vista a criança é o público ideal, o consumidor a quem se pode vender qualquer coisa».
Na Itália está em vigor um código de autodisciplina publicitária que surgiu em 1966, em base a um acordo entre os profissionais do setor. Esta primeira forma de tutela, em grande parte com origem comunitária, tem como protagonistas entidades administrativas independentes: a Autoridade de controle da concorrência e do mercado de setor e a Autoridade de garantia para as comunicações e a editoria. Enquanto isso, para a auto-regulamentação, orientada pelas normas que constam do Código de autodisciplina publicitária, e agora também, embora com força jurídica diferente, pelo Código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual se reconhece um poder de decisão e de sanção, emanando uma ordem e intimando seu cumprimento.
Em todos os países onde a televisão serve de veículo às mensagens publicitárias, o mundo empresarial é plenamente consciente do enorme poder de influência que a publicidade tem sobre as crianças.



NORMATIVA INTERNACIONAL

O assunto relativo à tutela dos menores na mídia é um dos mais debatidos, seja no que se refere às normas nacionais, seja no âmbito internacional. Encontra-se diante da situação de precisar acertas as contas com toda a extensão da rede global da internet. O exemplo que, neste momento de transição, coloca mais em evidência a necessidade de estabelecer leis que estejam em condições de controlar o acesso e uso dos conteúdos nocivos para os menores, é exatamente o da internet. Qualquer pessoa no mundo pode abrir um site considerado «arriscado», contendo elementos ilegais e acessíveis a consumidores despreparados, disponibilizados por quem está do outro lado do mundo.
No que se refere aos princípios gerais no âmbito do direito internacional, é preciso recorrer principalmente à convenção da ONU sobre os direitos da criança, com sede em New York, ratificada pelo Parlamento italiano através da lei nº.176/1991. Esta garante à criança uma «consideração proeminente» também a respeito da liberdade, seja no se refere à expressão, seja quando tutela os conteúdos recebidos. Esta mesma convenção, em seu artigo 17, fala da relação entre menor e televisão, desejando «um sistema normativo que tutele o menor-consumidor, mesmo com todas as dificuldades que se apresentam», seja para individuar os fenômenos que devem ser monitorados, seja sobre as normativas possíveis.
No direito da União européia, tal tutela foi recentemente confirmada pela Carta dos direitos fundamentais da União, aprovada em Nice em 2000, cujo artigo 24 salienta que «os Estados membros reconhecem a importância da função exercida pelos meios de comunicação de massa e cuidam para que a criança possa ter acesso às informações e materiais... com a finalidade de promover o seu bem estar social, espiritual e moral, além de sua saúde física e mental». A normativa seguinte, 89/552/CEE, previu algumas restrições, seja no que se refere aos programas como para as mensagens publicitárias destinadas a este público». O artigo 22 desta normativa conduz a impedir a transmissão de programas que contenham cenas pornográficas ou de violência gratuita, ou outros programas inadequados a este público. Não podemos esquecer de mencionar a determinação expressa de «Televisão sem fronteiras», que está hoje em sua quinta versão atualizada, que o tema da tutela dos menores está relacionado com o estatuto geral dos direitos dos menores e corresponde ao disposto nos artigos 50 e 31 da Constituição italiana.
Se for claro que os princípios normativos são todos a favor da tutela dos menores, é também verdadeiro que uma tecnologia em contínua evolução colocou em crise as velhas regras do jogo. Mas também é claro que não se pode mais adiar a necessidade de estabelecer novos parâmetros normativos, para que as crianças possam utilizar os meios de comunicação próprios de seu tempo, com aproveitamento e serenidade também para as famílias.~

EDUCAÇÃO À MÍDIA NO MUNDO: PARA SABER MAIS

A difusão da educação à mídia é uma resposta à necessidade de se informar sobre as novidades no campo dos novos meios de comunicação. Em seguida citamos apenas alguns sites que em vários países oferecem maiores informações sobre como aprender a usar melhor a mídia, enfrentando a problemática da tutela dos menores e da alfabetização às novas tecnologias por parte dos adultos.
«The Media Awareness Nework-Réseau éducation médias» é uma organização canadense sem fins lucrativos, pioneira no desenvolvimento de programas sobre a educação à mídia. Com esta finalidade ela produz programas online em colaboração com organizações internacionais, convicta que, para interpretar as mensagens de informação, de entretenimento e comerciais, os jovens têm necessidade de instrumentos críticos válidos. Por isso é importante formar também os adultos (famílias e professores) sobre como funciona a mídia e como ela determina o estilo de vida.
A organização realiza uma ação contínua de monitoramento em relação à mídia (televisão, cinema, videogames, imprensa, publicidade, etc.), e sua seção dedicada aos pais oferece uma série de elementos para que estes reflitam com os filhos sobre esses meios, além da seção para os educadores, que inclui lições e materiais de apoio. Uma outra seção é dedicada à análise das questões ligadas à mídia, como a difusão de estereótipos, as representações de violência e da diversidade, a privacidade, a publicidade dirigida aos menores. Seu site é em inglês e francês (http://www.media-awareness.ca).
«Quai des images» é o site dedicado ao ensino de cinema e audiovisual organizado pelo Ministério da Educação francês. Ele propõe atividades ligadas à educação à imagem e de análise dos filmes em consonância com os programas escolares, agrupa os textos oficiais a respeito dos meios audiovisuais, oferece uma série de instrumentos de análise e de estudo completos sobre alguns filmes específicos e sobre certos autores em particular, informa sobre conferências, seminários, cursos e festivais sobre o mundo audiovisual e sua utilização em âmbito educativo e didático. Entre outras coisas, reúne também as propostas e as experiências feitas por professores e seus alunos nas escolas secundárias francesas no campo da educação à imagem, além de organizar um fórum de discussões aberto a todos sobre a educação à mídia (http://www.ac-nancy-metz.fr).
Sempre na França, está em funcionamento o blog «Zéro de conduite», organizado pelos professores e destinados a educadores, pais e estudantes. Promove o uso do cinema como instrumento pedagógico, dedicando-se especialmente à atualidade cinematográfica, mas sem esquecer os clássicos e os documentários. Com várias seções e espaços de aprofundamento, se propõe como um local de discussão de temas em um debate aberto (http://cinema-ducation.fluctuat.net).
A Universidade de Massachussetts organizou o Media Education Foundation – MEF, mídia de desafio, que produz e distribui documentários destinados a estimular o pensamento crítico e o debate sobre a relação entre aqueles que detêm o poder sobre a mídia, os conteúdos da mídia comercial, a exigência democrática de um livre fluxo de informações, as diversas representações de idéias e pensamentos e o direito dos cidadãos de informar e serem informados. Alguns destes temas são abordados criticamente, como a identidade do gênero na publicidade, a imagem de sexo nos videoclipes, o papel da mídia na construção da identidade cultural, mídia e saúde, etc. (http://www.mediaed.org/).

(a cura di M. F. D’A.)

 
At 9/17/2007 2:42 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

AS CRIANÇAS E A MÍDIA (II PARTE):
ACEITAR O DESAFIO EDUCATIVO


O tema da 41ª Jornada das Comunicações Sociais, «As crianças e os meios de comunicação: um desafio para a comunicação», nos convida a refletir a respeito de dois aspectos particularmente importantes. O primeiro é a formação das crianças, para que estejam em condições de receber de maneira crítica aquilo que vêem. O segundo é a formação à consciência e ao uso consciente da mídia, que está em contínua transformação tecnológica.
De fato, é o que especifica Bento XVI no início de sua mensagem, de 20 de maio de 2007, para a Jornada: «Os complexos desafios que a educação contemporânea deve enfrentar são muitas vezes ligados à grande influência dos meios de comunicação no nosso mundo. Como aspecto do fenômeno da globalização e estimulados pelo rápido desenvolvimento da tecnologia, os meios de comunicação delineiam fortemente o ambiente cultural (cf. João Paulo II, O rápido desenvolvimento, nº3). Na realidade, há quem afirma que a influência formativa da mídia está em competição com aquela da escola, da Igreja e, quem sabe, até com aquela da própria família».
De fato, como salienta o Pontifício conselho para as Comunicações Sociais, «para muitas pessoas, a realidade corresponde àquilo que os meios de comunicação definem como tal». Episódios recentes, como a utilização do celular na filmagem de violências nas salas de aula, abusos sofridos por pessoas deficientes, fenômenos de trote e de violência generalizada, demonstram como as crianças que crescem passando uma média de quatro horas por dia diante da televisão, sozinhos em casa, absorveram a lógica do «estou no vídeo, logo existo». Os psicólogos, os pedagogos e os estudiosos dos meios de comunicação estudam há tempos sobre as relações entre o consumo televisivo e o comportamento violento dos menores. Uma grande quantidade de pesquisas realizadas em muitos países ocidentais demonstra como esta correlação seja realmente inegável.


NOVAS LINGUAGENS

O fato que muitas crianças vivem completamente inseridas no mundo dos velhos e novos meios de comunicação, que estão cada vez mais frequentemente em correlação entre eles, é confirmado pela popularidade de alguns modelos televisivos, considerados tão efêmeros quanto penosos «momentos de glória», presentes nos programas com os maiores índices de audiência, dos «reality» aos «talk show», sem falar do «trash», que hoje se tornou um gênero de espetáculo.
Dentre as preferências demonstradas pelos adolescentes italianos que assistem televisão mais do que três horas por dia, encontramos, em primeiro lugar, a figura da «veline» (Ndt: misto de corista e coadjuvante na apresentação de programas populares da televisão italiana), enquanto outros da mesma idade se concentram no mais clássico exemplo, o do jogador de futebol. De toda maneira, a coisa mais importante é aparecer, pouco importa por qual motivo, de ser «alguém» ou «alguma coisa» no Olimpo mediático, mesmo que seja apenas por um instante.
Estes são os exemplos mais negativos dos condicionamentos derivados de um excessivo e acrítico uso dos meios de comunicação. Encontramo-nos diante de uma nova geração que cresceu na frente da televisão, capaz de usar as novas tecnologias que os próprios pais, que as adquiriram e as tornaram disponíveis, muitas vezes se encontram despreparados para utilizá-las.
Tanto é verdade que hoje em dia os filmes são vistos diretamente nos celulares e a televisão pode ser assistida na tela do computador. Hoje se telefona através da internet e graças ao download se descarrega os CDs e DVDs mais recentes, se filma e se faz foto com o celular, e assim por diante.
Nas casas, o vocabulário familiar se reduziu ao gênero dos sms e se fala tendo o som da televisão no fundo, se comunica através de e-mail, se faz «visita virtual» via computador, se percorre através de bibliotecas virtuais, tanto que as fichas e arquivos de papel evocam imagens do outro século, completamente em desuso.
A situação dos nossos filhos é diversa daquela da geração precedente, pois eles abriram seus olhos tendo diante de si estes cenários de profunda, contínua e envolvente transformação tecnológica. Eles se constituem aquela que os estudiosos chamam de geração nascida «com seis dedos»: além dos cinco dedos normais da mão, o sexto é o mouse do computador.
Com o aparecimento do mundo «virtual» da internet e dos videogames criou-se uma defasagem em relação à realidade verdadeira e própria. As duas dimensões parecem muitas vezes, e para muitos jovens, como universos paralelos, com conseqüências não indiferentes no plano do processo de amadurecimento. Têm grande sucesso os sites nos quais se prevê uma segunda vida (basta verificar os milhares de registros nos poucos meses de existência do site italiano de «Second Life», que em todo o mundo já tem sete milhões de inscritos), onde a simulação reproduz todas as situações da vida real. Apenas que tudo é falso, a começar da nova identidade, que pode ser escolhida e com ela se inicia a fazer parte deste mundo fora do mundo, onde se pode ser um «qualquer coisa». Isto é, ninguém.
Assim, o grande desafio cultural de hoje é propriamente a redefinição dos limites, que muitas vezes se apresentam demasiadamente instáveis. Isto é, redefinição dos limites entre o real e o virtual, superando a divisão digital que hoje separa as gerações adultas daqueles mais jovens.


OS JOVENS: PROTAGONISTAS OU VÍTIMAS DAS MUDANÇAS?

A linguagem deles é pobre, muitas vezes recheada de termos tirados do dicionário do internauta: clicar, chatar, messagiar, deletar, são alguns dos neologismos que fazem parte de seu vocabulário quotidiano. Falta uma dimensão humana da tecnologia que esteja em condições de traçar o perímetro cultural entre o real e o virtual. Assim a aldeia global difundiu uma quantidade de modelos comportamentais desviados, ou pelo menos discutíveis.
Desta maneira, os jovens que vivem a milhões de quilômetros de distância jogam o mesmo videogame, vêem o mesmo filme, assim como, de maneira transversal, absorvem modelos e comportamentos semelhantes. Muitas vezes os adultos têm menos domínio no uso das novas tecnologias e observam, com uma preocupação resignada diante de suas próprias limitações, as crianças que navegam facilmente na internet.
As raízes das dificuldades neste campo educativo são muito bem explicadas por Marina D’Amato, professora de sociologia da Universidade de Roma, que salienta: «Cada geração tem necessidade de se encontrar também em um mundo fantástico, que serve a interiorizar o paradigma do bom e do belo, do justo e do errado, do oportuno e do útil, também em relação aos exemplos que procedem da narrativa. Hoje nos encontramos em uma condição na qual os avós e os pais contam cada vez menos histórias aos filhos e aos netos, e este papel foi assumido pela televisão. Mas, na realidade, a televisão “exila” e “con-funde”, isto é, funde os modelos morais que são frutos de ânsias e problemas mal resolvidos, muito mais que de certezas. Embora estes se transformem com freqüência, a cada três ou quatro anos, o fato de serem repropostos continuamente faz com que se justaponham uns aos outros» (ver Come mediare i media, de Mario Russo).
Se for verdade que a televisão é o meio mais usado até a adolescência, imediatamente depois surge a grande atração pela internet. Esta passagem nasce de uma sintonia com a linguagem televisiva, que na idade infantil muitas vezes é ouvida durante muitas horas no dia. Esta linguagem se baseia em uma mediação da realidade e desta maneira ela ativa um processo de recepção que é de tipo emotivo.
Neste registro emocional é mais fácil acabar envolvido por situações e figuras capazes de se proporem como modelos identificadores, preservadores de sentido e de comportamentos a serem imitados.
O poder de concentrar uma vontade emulativa em alguns personagens, que correspondem particularmente às necessidades interiores do jovem (necessidades na maioria das vezes induzidas pela publicidade ou por modelos estimuladores), tem uma forte relação com a quantidade de horas que o jovem passa utilizando os novos ou os velhos meios de comunicação.


EDUCAÇÃO NECESSÁRIA

«A formação adequada a um uso correto dos meios de comunicação é essencial para o desenvolvimento cultural, moral e espiritual das crianças… Educar as crianças a serem seletivas no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja, da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos. Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia, com a certeza de que este difícil, embora gratificante, aspecto da condição de pais, é apoiado por toda a comunidade.»
As palavras do discurso de Bento XVI definem com grande clareza o paradigma de uma justa relação entre a mídia e os menores. Uma clareza que devemos agradecer ao magistério da Igreja, no momento em que o mundo da mídia parece ignorar a verdadeira problemática educativa das crianças e as expectativas de qualidade e de segurança exigidas pelas famílias no que se refere ao uso desses meios, seja do cinema aos videogames, da televisão à internet.
Diante da utilização destorcera do meio televisivo, o mais difundido dentre os meios de comunicação, a Igreja se interroga sobre o porquê da televisão não ter um papel educativo e por que os meios de comunicação não podem ser companheiros confiáveis para os jogos na fase de crescimento da criança. O anúncio de uma recente campanha sobre o uso da mídia, promovida pelo Ministério das Comunicações, mostra os vários membros da família que estão vendo a televisão ao lado de uma criança.
Que se trate do avô ou da mãe, a mensagem é a mesma: não deixar uma criança sozinha diante de um meio que, sem o apoio crítico educativo de um adulto, pode transmitir conteúdos inadequados à idade e à maturidade daquele que o vê. Sem esquecer as responsabilidades dos produtores televisivos, empenhados na organização dos programas, o papel da família é realmente insubstituível.
Se realmente o objetivo de quem administra a sociedade de produção televisiva, ou das multinacionais produtoras de videogames ou das operadoras de celulares, é o de promover e vender o produto, o bem estar psicofísico da criança está no centro do interesse dos educadores, sejam eles os professores ou, em primeiro lugar, os pais.
Isto explica bem a mensagem do Papa, que continua a sua análise, salientando que «educar as crianças a serem seletivos no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja e da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos (ver João Paulo II, «Familiaris Consortio», 76). Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia.»


CONTEÚDO DA MÍDIA

No panorama de uma revolução da multimídia, que está modificando transversalmente os hábitos, a mentalidade, os modelos e as linguagens, deve voltar ao centro do debate a tutela daquilo que é melhor para os menores. Sem acusar a «mídia», que enquanto tal não é nem boa nem má, o importante é partir de uma a análise do produto, para assim poder individuar conteúdos que sejam de melhor qualidade para as crianças e os adolescentes. Porque a televisão é um instrumento que abre janelas de conhecimento para o mundo e, se bem utilizada, de «má professora» pode se tornar uma preciosa fonte de estímulo para o crescimento humano e cultural.
A mesma coisa vale, e com mais razão, para a «rede» que engloba e compreende tudo, e para os videogames, onde, ao invés de violência e monstros, poderia se dedicar a produzir (e isso já ocorre em certos casos) histórias instrutivas e de conteúdo interessante.
Bento XVI coloca justamente em evidência as enormes possibilidades para que seja melhorado o conteúdo deste grande campo de produção multimídia: «A educação através da mídia deveria ser positiva. Colocando as crianças diante de um meio estética e moralmente excelente, estas recebem uma ajuda para que desenvolvam a própria opinião, a prudência e a capacidade de discernimento. É importante aqui reconhecer o valor fundamental do exemplo dos pais e as vantagens de introduzir os jovens aos clássicos da literatura infantil (…). A beleza, quase um espelho do divino, inspira e vivifica os corações e as mentes juvenis, enquanto a feiúra e a vulgaridade têm um impacto deprimente sobre os comportamentos». Diante de uma decadência geral do produto televisivo, a questão da qualidade aparece ainda mais forte e vibrante em grande parte de um público formado de famílias, que pede para não ser apenas um exército indistinto de ouvintes silenciosos, mas um público em condições de exprimir suas preferências por conteúdos formativos e informativos de bom nível.
A mensagem de Bento XVI continua, com algumas importantes indicações: «Como a educação em geral, aquela da mídia requer também uma formação ao exercício da liberdade. Trata-se de uma responsabilidade que compromete. Muitas vezes a liberdade é apresentada como uma incansável procura do prazer ou de novas experiências (…). Este desejo, sentido profundamente pelos pais e educadores, que é o de educar as crianças no caminho da beleza, da verdade e da bondade, pode ser apoiado pela indústria da mídia somente na medida em que se promove a dignidade fundamental do ser humano, o verdadeiro valor da vida familiar, as conquistas positivas e as metas da humanidade. A partir disso, a necessidade de que os meios de comunicação estejam empenhados na efetiva formação e no respeito da ética deve ser vista com interesse particular e com urgência não apenas pelos pais, mas também por aqueles que têm responsabilidade cívica».
Na realidade, nos encontramos na situação de ter que reconhecer que na Itália falta uma verdadeira «cultura da criança»: a situação é tão séria que no âmbito institucional procura-se dar uma nova organização geral para verificar e controlar os conteúdos dos setores de entretenimento, como os videogames, que até agora estão submetidos apenas a códigos de auto-regulamentação, feitos e codificados para uso e consumo pelas indústrias produtoras.
Uma vez mais, o primeiro e indispensável apoio à criança só pode vir da família e de uma relação mais estreita com os professores e educadores, exatamente como salienta Bento XVI, lembrando-nos que a preocupação educativa dos pais não deve se tornar uma preocupação genérica, mas uma atenção constante a tudo aquilo que diz respeito aos filhos.

A INDÚSTRIA DA MÍDIA

1) A TELEVISÃO

Se a televisão convencional se apresenta como um ramo de atividade já «maduro», no entanto se apresenta no horizonte a situação da mídia digital (satélite ou a cabo), também como uma plataforma que consente a ligação entre televisão, internet e outro tipo de mídia através do computador. No que se refere à qualidade da programação, apesar dos inúmeros bons propósitos anunciados no âmbito institucional, parece pequena a atenção às exigências dos menores em suas diversas faixas etárias. A programação para os menores, na realidade é confinada em redes e horários particulares, enquanto o resto da programação na faixa horária considerada «para todos» muitas vezes apresenta conteúdos inadequados aos jovens. Mas, quais são as expectativas das gerações de jovens no que se refere à televisão? É realmente verdade que preferem o «trash», os jogos com prêmios absurdos e as «velines»?
A partir de uma pesquisa recente feita pelo instituto Censis sobre «Comunicação, pluralismo social, sociedade aberta» (2005) surge que a relação entre os menores, e em particular dos adolescentes entre os 14 e 18 anos de idade, e a televisão é determinada por elementos de forte contradição e de passividade. Nessa faixa etária, 100% deles vêem televisão praticamente todos os dias, 86% acompanham um pouco de tudo, com uma relevante predileção pelos filmes (72%), por esporte (32%) e pelos «reality shows» (18%).
No entanto, a amostragem entrevistada não está realmente satisfeita com aquilo que vê. De fato, 36% dos adolescentes denunciam a vulgaridade difundida nos programas e 25% criticam a superficialidade. Dentre eles, 46% consideram a televisão como um meio que «invade», ao mesmo tempo em que é interessante notar que 25% consideram que em geral a programação televisiva alimenta nas crianças menores uma visão consumista da vida. Destes dados surge o contraste entre a procura de distração e a reprovação daquilo que lhes é proposto pela programação. Isto significa que o alto índice de procura não é um indicador de satisfação.
Considerando o axioma de que a televisão seja onipresente, fica claro que são os próprios jovens a pedirem uma maior atenção aos conteúdos: menos violência e menos vulgaridade. A exigência de uma regulamentação diversa, diz claramente o relatório do Censis, «não vem somente daqueles, pais e educadores, que estão preocupados pela possível influência negativa sobre os menores, mas se exprime nitidamente também através dos adolescentes, pelo menos de uma parte mais esperta e consciente dentre eles».
Para tutelar melhor os direitos dos menores, desde 2002 foi instituído junto ao Ministério das Comunicações um código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual aderiram os produtores de televisão, seja no âmbito nacional como local. Baseando-se nos princípios sobre a matéria existentes na Constituição italiana e na Convenção dos direitos da criança, estabelecida em 1989 pela ONU, a comissão que controla sua aplicação avaliou em todos estes anos de atividade os milhares de casos em que foram violadas as normas de tutela, que prevêem a transmissão de programas e imagens adequadas a um público de menores de idade durante aquela que é chamada de «faixa protegida» da programação televisiva (das 7h30 às 22h30), intervindo com denúncias e sanções, que nos casos mais graves foram aplicadas pela Autoridade de garantia no setor das comunicações. Para o futuro, esta comissão deverá se transformar em um organismo mais amplo de controle, que se chamará «Mídia e menores», que além da televisão deverá monitorar também os setores dos vídeos-telefone e dos videogames, além da internet, que é o campo de maior risco.

REGRAS DE TUTELA EM OUTROS PAÍSES

É diversa a situação em outros países, como por exemplo na Grã Bretanha, onde o sistema de regulamentação da mídia é estruturado e complexo e foi atualizado nas últimas décadas, com uma particular atenção à tutela dos menores. As inovações tecnológicas neste setor levaram as normativas inglesas a uma série de novas disposições, como por exemplo, a visão em casa de vídeo exclusivamente para adultos, e que fora de casa seriam vetados aos menores, ou o combate à praga mundial dos sites internet para os pedófilos, que contenham material pornográfico ou com conteúdos que possam esconder o aliciamento de menores (ver a Protection Childres Act, de 1978).
A programação televisiva é regulamentada pelo Broadcasting Act (1996), de onde deriva a instituição da Broadcasting Standard Commission (BSC), um órgão independente de controle que estabelece as normas de avaliação e classificação dos programas, também no que se refere aos conteúdos violentos ou que possam ofender a decência pública (site oficial www.bsc.org.uk). Este organismo BSC funciona internamente à estrutura do Broadcasting, supervisionando e regulamentando todas as emissoras de televisão e de rádio, via cabo ou por satélite. Sua tarefa é a de elaborar os códigos de conduta e de aplicação de modelos que respeitem a justiça, além de monitorar os modelos, verificando que respeitem as leis. Com a transmissão de programas com conteúdos considerados inadequados aos menores de várias idades, há alguns anos a televisão inglesa adotou o sistema «watershed», um «separador de águas» entre um horário de programação familiar e outro para os adultos. Todo o sistema televisivo inglês se apóia sobre a responsabilização das famílias, pois sem a colaboração delas qualquer código de modelos para os programas é praticamente inútil.
Na França, está vigorando já há anos um código através de sinais televisivos, que entra em função para assinalar os programas inadequados aos menores. A avaliação do programa televisivo é feita pelo Conseil Supérieur de l’Audiovisuel (CSA), uma autoridade administrativa independente, que controla a difusão dos filmes e outras transmissões em vários canais privados, nacionais, regionais ou locais. A normativa francesa (lei 719/2002) veta a transmissão de programas que possam prejudicar gravemente a integridade física, mental e moral dos menores, porque divulgam conteúdos de pornografia ou de violência gratuita. As transmissões são classificadas por um código de sinais que, em conjunto com um sistema organizado de faixas horárias de programação, garante às famílias mais clareza sobre os programas destinados aos menores.
Na Alemanha, o tema da infância tem particular atenção da legislação, que considera desde o nascimento o início dos direitos fundamentais do cidadão. A tutela é disciplinada no âmbito público pela JSchG (desde o dia 26 de fevereiro de 1985), enquanto a lei GjSM se ocupa do controle sobre a difusão de publicações e conteúdos mediáticos considerados danosos para os menores. A regulamentação no setor televisivo é feita segundo as normas do acordo sobre a radiodifusão dos Lander federais, que as entidades para a mídia nesses Lander adotaram por base para o estabelecimento das diretivas que tutelam o interesse dos menores nas emissoras privadas. Não são admitidas transmissões que incitem o ódio racial, que exaltem a violência ou a guerra, que ofendam a dignidade do homem, que sejam de gênero pornográfico, que mostrem pessoas moribundas ou com sofrimentos que ofendam a dignidade humana. Os responsáveis pela programação, escolhendo os horários das transmissões, devem cuidar para que os menores não vejam programas que podem prejudicar o seu bem estar psíquico, físico ou mental. As transmissões inadequadas às crianças menores podem ser transmitidas somente depois da autorização da entidade competente do Land interessado.
Os responsáveis pela organização dos programas televisivos em âmbito nacional devem nomear encarregados pela tutela dos menores, que atuam no momento da aquisição, da projeção e da realização dos programas. As emissoras privadas fundaram em 1993 uma associação de autocontrole voluntário da televisão («Freiwillige Selbskontrolle Fernsehen», FSF), à qual devem ser apresentados programas particulares, antes da sua transmissão, e suas avaliações consideradas nas decisões das entidades de controle da mídia nos Lander federais. Existe ainda o órgão comum do cidadão para a tutela dos menores, dos programas, da competência mediática e controle da mídia (GSJP), do qual faz parte um integrante da entidade para a mídia nos Lander federais, que dá o seu parecer a respeito de algumas séries, filmes e espetáculos mais ou menos adequados aos menores. Este órgão, o GSJP, decide sobre pedidos de mudança de horários de transmissão de filmes proibidos para menores, controla a forma de novos programas e experimenta novas disposições para a tutela dos menores na televisão digital. A peculiaridade da jurisdição alemã, seja no setor televisivo como no cinematográfico e da mídia em geral, é a minuciosa atenção às exigências com o desenvolvimento do menor e aos riscos que este pode correr com a observância incorreta das leis.
Nos Estados Unidos, é possível consultar via internet um «guia televisivo para os pais» (ver o site www.mpaa.org), que prevê algumas categorias de audiência aplicadas aos programas televisivos transmitidos a todo o público. Este guia organiza várias siglas para identificar a categoria de audiência para cada transmissão: vai-se do TVY (para todas as crianças) ao TVG (para todos), através de várias faixas etárias, que correspondem à passagem da primeira à segunda infância e desta à adolescência. Depois tem o TVPG («parental guidance», visto na presença de um dos pais), o TV14 («parent strongly cautioned», séria advertência aos pais), para os programas que contêm cenas de sexo e de violência. Enfim, há o TVMA, que prevê um «mature audience only», ou seja, destinado a um público de idade superior a 17 anos, última fronteira para os conteúdos considerados «restricted».
Estas avaliações foram elaboradas baseando-se nas opiniões dos próprios pais e são fáceis de serem encontradas e compreendidas. Esta linha de «guia de televisão para os pais» pode ser usada juntamente ao «v-chip», que é um dispositivo de filtro instalado na maior parte dos mais recentes modelos de aparelhos de televisão, para permitir aos pais de bloquear os programas inadequados.

FICHA 1
Brasil: «O que eu penso da tv»
No Brasil, a audiência infantil é muito alta: aproximadamente 30 milhões de crianças vêem televisão pelo menos durante três horas por dia. Explica a profa. Rosália Duarte, do departamento de Ciência da Educação, da PUC do Rio de Janeiro, que «as crianças são muito perspicazes, mas nós podemos e devemos ajudá-las a ampliar o seu quadro de referências, para que possam discutir ainda melhor sobre o conteúdos daquilo que vêem. Para isso temos necessidade, antes de tudo, de ouvir aquilo que elas têm a dizer sobre o assunto e de dialogar com elas. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e muito mais freqüente, a outras atividades culturais». No âmbito de uma pesquisa feita através de um questionário distribuído nas escolas, intitulado «O que eu penso da tv», apareceu que «as crianças querem seriamente ser ouvidas sobre aquilo que pensam da tv, mas sentem que sua opinião é considerada pouco importante e não estão contentes com o excesso de imagens de violência exibidas na televisão, principalmente a violência “real”, definida como aquela transmitida nos telejornais. Eles adoram ver televisão e não importa o que os adultos pensam e dizem a respeito disso. A eles agradam quase todos os tipos de programas transmitidos: novelas, desenhos animados, programas de humor, filmes, seriados, mas isso não faz deles espectadores “idiotas”, pois fazem críticas muito interessantes, pertinentes e bem elaboradas sobre o que consideram feio ou inadequado na televisão. Para a maior parte deles, a televisão se oferece como principal opção de divertimento (em alguns casos, a única), o que significa um dado muito preocupante. Mas, o que chamou mais a nossa atenção é o grau de experiência com o qual essas crianças analisam a televisão: são expertos e demonstram conhecer a televisão também do lado de dentro, inclusive as linguagens que ela utiliza, a sua estrutura de produção, a sua lógica interna e as suas maneiras de intervenção».
As crianças aprendem os valores e os não-valores através da televisão, não resta dúvida, mas demonstram ter senso crítico a respeito deste assunto, quando afirmam nos textos que os programas transmitidos na tv podem lhes ensinar «a serem bons, a ter coragem e a fazer o bem, a cuidar da natureza e de si mesmos, a serem honestos e a lutar por aquilo que desejam», mas também «a serem cruéis e mentirosos, a roubar e matar, a não respeitar os pais e a comprar tudo aquilo que não têm necessidade». Falando sobre a validade do ensino através da mídia, a profa. Duarte salienta a necessidade de «ouvir aquilo que têm a dizer sobre o assunto e a dialogar com eles. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e mais freqüente, a outras atividades culturais».

FICHA 2
Observadores internacionais
Os dados examinados em janeiro de 2006 pelo OssCom, que é um centro de pesquisa da mídia, deixam evidente a tendência a realizar uma forma de co-regulamentação, onde a ação legislativa dos Estados membros se integra com medidas de auto-regulamentação por parte dos produtores, broadcasters e profissionais da comunicação sob o efeito de controles e sanções. São dois os instrumentos mais utilizados no âmbito europeu, observando-se as diretivas previstas no artigo 22 de «Televisão sem fronteiras»: a definição de faixas horárias protegidas (watershed) e os sinais mostrados na tela (determinados por um sistema de «rating»). Apesar disso, aos campos tradicionalmente problemáticos da violência e da pornografia se juntam novos campos de risco para os menores: a vulgaridade, abusos e dependências de substâncias, linguagem e comportamento vulgares, discriminações e abusos, violações e ofensas à dignidade humana. Os critérios de avaliação dos programas se constituem um problema que é partilhado por muitos países da União européia, ao mesmo tempo em que se prepara uma uniformização internacional dos sistemas de classificação (ver mais adiante, Nicam), baseados na visualização de cinco ícones que ilustram simbolicamente qual é a problemática do programa que está sendo analisado e para quais idades ele é desaconselhado.
Deve ser assinalada a atividade online da European Medi@culture. O projeto é promovido pela Comissão Européia, em Bruxelas, no quadro das iniciativas «e-Learning», administrado pelo centro mediático de Baden-Württemberg. O site apresenta informações sobre a educação à mídia na Europa, particularmente na França, Áustria, Finlândia e Alemanha. A seção de projetos de multimídia agrupa os projetos sobre a mídia desenvolvidos por escolas e associações de jovens ao longo do tempo (ver http://www.european-mediaculture.org).

FICHA 3
África do Sul: Encontro mundial sobre a mídia para a infância
Este encontro trienal se realizou no último mês de março em Johannesburg, na África do Sul, com a participação de expertos do setor representando diversos países. Em conjunto se discutiu sobre a necessidade de uma programação adequada às crianças, procurando entender de que modo a violência na mídia pode influir sobre a psíquico dos menores.
Mas, no 5º Encontro mundial sobre a mídia para a infância apresentaram-se também muitas crianças provenientes de todo o mundo e empenhadas em discutir sobre o difícil tema da «Mídia como instrumento de paz e de democracia global». Vieram guiados por grupos de adultos, dentre eles as diversas organizações católicas que há anos trabalham para promover regras para o bem da infância, a serem respeitadas nas transmissões de rádio e televisão através de códigos de regulamentação que devem ser redigidos ou, como em alguns casos, apenas atualizados. Em muitos países do sul do mundo as novas tecnologias de multimídia já estão muito disseminadas e seu uso merece uma atenção particular para tutelar o público mais jovem.
Especialmente na África, explicou o organizador do encontro, Firdoze Bulbulia, começa-se a examinar o projeto de um «Media center» para as crianças, que possa produzir e distribuir transmissões de rádio e de televisão destinadas ao público mais jovem, com o objetivo de realizar um canal televisivo pan-africano dedicado à infância. Os organizadores do encontro estão também trabalhando no projeto de uma aliança africana dos meios de informação e de comunicação, seguindo o modelo daquela já existente na América latina.

2) INTERNET

Na Itália, 47% das famílias italianas têm um computador em casa, um dado relevante mas sempre muito baixo em relação à média dos outros países europeus. O uso da internet por parte dos adolescentes e jovens, e a familiaridade que têm com tudo aquilo que pode ser digitado ou «descarregado» da internet, apresenta não poucos problemas. Pela sua própria natureza de rede de comunicação global, o problema se apresenta em ótica internacional, procurando garantir a tutela dos menores através de precisos acordos com os provedores para um efetivo controle de conteúdo. No campo italiano, até 2006, a tutela dos menores tinha sido deixada nas mãos dos próprios provedores, que em 19 de novembro de 2003 assinaram um acordo de auto-regulamentação: o Codice Internet e Minori. Embora o acordo tenha sido estipulado entre os representantes dos vários provedores diante do Ministério para a Inovação e a Tecnologia, no entanto ele permanece um acordo privado, com lacunas, principalmente no que se refere às sanções que muitas vezes devem ser aplicadas. Em 2006, na seqüência de numerosos casos de violência sobre menores, muitos dos quais realizados através da difusão de material pedo-pornográfico (quando não se tratava de verdadeiro e próprio aliciamento de menores via internet), foi promulgada a lei 38 de 6 de fevereiro de 2006: «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet».
Enfim, como aplicação da lei 38/2006, em fevereiro da 2007 foi publicado um decreto determinando os requisitos técnicos dos instrumentos de filtragem que os provedores da rede internet devem utilizar para impedir o acesso aos sites já assinalados pelo Centro nacional contra a pedo-pornografia. Mas, isso não basta para superar as dificuldades e impedir que os menores possam navegar de maneira arriscada na «rede das redes».
Atualmente foi reativada a comissão anti-pedofilia e desvios de menores através da internet, o «Ciclope», que tinha sido instituída junto ao Ministério para a Eqüidade, do governo italiano, e que ficou inativa por um ano, até a sua reestruturação junto ao Ministério da Família. Está também para entrar em função um site dedicado ao uso da internet, junto ao Ministério das Comunicações, e um número telefônico de emergência gratuito, organizado pelo mesmo ministério e por «Save the children», que poderá ser utilizado por qualquer cidadão que queira assinalar algum abuso, desvio ou pedo-pornografia. Dentre as iniciativas mais recentes, deve ser assinalado o site www.tiseiconnesso.it criado pelo Ministério das Comunicações italiano, sempre em colaboração com «Save the children», onde é colocada à disposição uma série de informações sobre o conteúdo de certos sites, seja para os pais como para as próprias crianças, em conjunto com a campanha televisiva que tem como slogan «A melhor maneira de ajudar o seu filho a não usar incorretamente as novas tecnologias é conhecê-las».
Deve ser salientado também o fato de como a rede se tornou um grande mercado online. Para alguns produtores, o «e-commerce» de brinquedos corresponde já a 4% das vendas, e apenas em 2005 as vendas online corresponderam a 37.600 ações de compra. As razões para investir no processo online são múltiplas: desde a possibilidade de evitar as dificuldades logísticas de distribuição dos produtos, à ampliação de ofertas diferentes de produtos e também a possibilidade de envolvimento do cliente através de campanhas de mala direta e a criação de comunidades virtuais em torno de alguns produtos.

FICHAS:
Pedo-pornografia e internet
Em março de 2006, entraram em vigor as novas medidas diretas de combate e repressão ao fenômeno de exploração sexual dos menores e a pedo-pornografia, estabelecidas pela lei 38/2006 – «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet» foi publicada no Diário oficial em 15 de fevereiro de 2006, nº.38 – com a qual foram substancialmente modificados e integrados os artigos 600bis e seguintes do Código Penal italiano.
A lei confirma os artigos 527, 528, 529 e 725 do Código Penal italiano, que punem os «atos obscenos em local público, publicações, espetáculos obscenos, desenhos ou figuras que ofendem a decência pública».
Porque em muitas publicações, transmissões televisivas e anúncios publicitários, mesmo que não tenham declaradamente um caráter pornográfico, imagens de crianças e adolescentes são apresentadas de maneira explícita ou mais ou menos sutilmente ilusória e de forma falsa, pede-se um novo empenho das instituições competentes para que sejam observadas as normas em vigor e, se preciso for, que façam apelo aos órgãos de Polícia, o Instituto de autodisciplina publicitária, o Ministério das Comunicações, a Polícia postal ou a «Comissão tv e menor».

3) CINEMA

Confirmando as disposições da Constituição italiana, no que se refere ao direito e ao dever das famílias de serem protagonistas na educação de seus filhos, para muitos é chegada à hora de reelaborar a legislação que define o conceito de «censura» (a lei 161/1962 prevê a possibilidade de negar a autorização de abertura às salas de cinema ou de fazer cortes nos filmes, mesmo em função de um público adulto), que hoje está superado. É preciso com urgência estabelecer um critério de tutela dos menores não apenas no que se refere aos filmes que vêem nos circuitos cinematográficos, mas também sucessivamente em casa, muitas vezes em horários acessíveis na programação da televisão.
Uma avaliação correta e preventiva de um filme permite à família ter à sua disposição os instrumentos para escolher se um espetáculo é mais ou menos oportuno, conhecendo a trama, os eventuais conteúdos mais sensíveis, a classificação que a obra recebeu em outros países, etc. Por isso, é justo que a legislação seja revista, uma operação que requer atenção e perspicácia da parte das instituições em um momento de transição da mídia, como este que estamos vivendo, quando esta se tornou realmente um importante componente na educação dos menores.
Não faltam filmes que atraem o público por causa de seu conteúdo de violência, e no entanto entram no circuito cinematográfico sem qualquer restrição de idade. Para um filme que é notícia nos jornais, existem muitos outros com conteúdos duvidosos ou até mesmo perigosos que conseguem passar através do filtro da comissão de revisão cinematográfica, que atualmente funciona junto ao departamento de cinema do Ministério dos Bens Culturais.
Ao mesmo tempo em que existe um projeto de lei do ministro dos Bens culturais, que deve ainda iniciar os trâmites parlamentares, novas situações se apresentam na Itália, com a autocensura de filmes, feita pelos produtores ou distribuidores cinematográficos, com a introdução de novas e mais específicas faixas etárias para as restrições visando os menores a partir dos 10 anos de idade. As restrições serão feitas baseando-se em uma avaliação classificatória dos conteúdos das obras e sucessivamente serão ainda analisadas por uma comissão de psicólogos, educadores e pais.
Este sistema se inspira no modelo americano da Motion Picture Association of America (MPAA), que há 40 anos representa os interesses da indústria do audiovisual americana no mundo. Funcionando a partir de regras bem precisas (estabelecidas ao longo dos anos, também segundo as sentenças dos tribunais federais nos vários Estados americanos e em base aos protestos dos cidadãos), a autocensura americana prevê a existência de uma única comissão competente para determinar as restrições do PG12 ao «restricted» 17 anos. Esta comissão é composta exclusivamente de pais, considerados os primeiros depositários da educação dos filhos, e representam transversalmente a audiência. Importantes sanções econômicas asseguram que o mecanismo de autocertificação corresponda efetivamente aos interesses dos cidadãos. No site da Motion Picture estão disponíveis aos pais os pontos de referência para a avaliação das obras de entretenimento e são publicadas as restrições aplicadas a cada filme que está em exibição nas salas de cinema. Geralmente as avaliações parecem muito mais severas em relação a outros países. Tudo isso, nos vários anos de sua aplicação, deu uma qualificação à indústria americana e seu correto serviço prestado aos ouvintes. Qualquer estrada que se pretenda seguir na Itália, é importante para as famílias que seja estimulado um mercado de produção adequado à infância: é justo que o mecanismo da indústria cinematográfica continue com o seu ritmo de produção, mas não é justo confundir as classificações de acesso ao produto, como qualquer indústria sabe muito bem.
No que se refere às normas européias de classificação dos filmes, e em geral de todo «entertainment» (neologismo anglo-saxão, que, no entanto encontra sua raiz etimológica na relação entre educação e jogo) acessível aos menores, deve ser citado o sistema NICAM, que funciona na Holanda há alguns anos. Fundado em 1999, o NICAM (Nederlands Instituut voor de Classificatie van Audiovisuele Media) se baseia na lei Media Act, onde os programas de grupos que tiveram a autorização para atividades de «broadcasting» não devem incluir obras audiovisuais que prejudiquem o desenvolvimento físico e psicológico de pessoas com menos de 16 anos de idade, seguindo as diretivas da União européia («Televisão sem fronteiras» IV).
O sistema de classificação preventiva funciona também na Grécia, com a lei 1.597, de maio de 1986, que prevê que antes da projeção nas salas de cinema, cada filme seja submetido pelo produtor ou pela sociedade de importação à Comissão para a juventude, que classifica o filme seja como adequado aos menores, ou proibido aos menores de 13 anos, ou de 17 anos ou ainda, nos casos mais graves, severamente inadequado aos menores. Esta comissão é um órgão do Ministério da Cultura e foi concebida procurando-se estabelecer certa proporcionalidade, sendo composta de representantes do Estado (Ministério da Cultura), das categorias ligadas ao cinema, de psicólogos especializados na educação, de sociólogos, dos jovens, dos educadores e dos pais.
Na Áustria, está em vigor um sistema de avaliação complexo, instituído em base a um princípio constitucional federal que confia a tutela dos menores, no que se refere ao cinema e em geral aos meios de comunicação de massa, à competência específica dos Lander. A lei nacional que engloba a regulamentação da mídia é a ORF-ACT, ou seja, a Austrian Broadcasting Corporation nº. 379/1984, que estabelece quais os critérios sobre os quais deve se basear a proteção aplicada a programas e filmes transmitidos na televisão ou através de outros canais mediáticos. No que se refere à exibição dos filmes, a avaliação preventiva das obras cinematográficas, para que sejam decididas as faixas etárias adequadas, é regulamentada pela lei austríaca para a tutela dos menores, a «Jugendschutzgesetz», aplicada através das leis dos Lander federais. Esta lei estabelece nove faixas de restrições de público a partir dos seis anos de idade, com uma sucessiva graduação que prevê restrições para 10, 12, 14 e 16 anos de idade. Para supervisionar o sistema de classificação cinematográfica, existe uma comissão junto ao Ministério da Educação, em Viena, que comunica seu parecer sobre a idoneidade dos filmes às autoridades locais. Geralmente e de maneira individual os Lander adotam as decisões da comissão, e é em âmbito local que se decide de sua aplicação.
Na Espanha, o artigo 20 da Constituição reconhece o direito do cidadão a exprimir e difundir livremente seu pensamento, suas idéias e suas opiniões através de qualquer meio de divulgação. Se por um lado o exercício de tais direitos «não pode ser restrito através de nenhum tipo de censura prévia», o mesmo artigo especifica que «estas liberdades têm o seu limite no respeito dos limites reconhecidos pelas normativas que exprimem este respeito, especialmente no direito à honra, à privacidade, à própria imagem e à proteção da juventude e da infância».
Baseando-se neste princípio, a qualificação dos filmes (Real decreto 81/1997) e das obras audiovisuais é feita antes de sua difusão, através do Instituto de cinematografia e das artes audiovisuais (ICAA), uma entidade autônoma, mas ao mesmo tempo ligada ao Ministério da Educação e Cultura através da secretaria de Estado para a cultura (ver site www.mcu.es).
A subdireção geral de fomento à indústria cinematográfica e do audiovisual, que faz parte do ICAA, se ocupa, dentre outras funções, da classificação em faixas etárias dos filmes e das outras obras audiovisuais em vista de sua exibição pública e para a sua distribuição. A comissão se encarrega de divulgar as informações sobre os filmes e programas audiovisuais, com classificação que vai desde as «salas X» até as restrições para cada faixa etária do público.
Os filmes de caráter pornográfico não podem receber subvenções do Estado e sua projeção nas salas prevê uma taxa suplementar, destinada em parte para estimular um fundo de proteção cinematográfica. A projeção destes filmes pode ser feita somente nas «salas X», onde não podem ser apresentados outros tipos de obras cinematográficas e onde é proibido o ingresso de menores de 18 anos.

CINEMA NA TV

Devido ao alto consumo de programas de televisão por parte dos menores e levando-se em conta as diretivas da União européia, que promovem a auto-regulamentação no âmbito nacional das emissoras de tv e a participação das famílias nesta obra educativa, há alguns anos estão em vigor na França, na Holanda, na Grã-Bretanha, na Grécia e na Itália os códigos de sinais, que servem para identificar tanto os filmes projetados na salas de cinema como aqueles transmitidos na televisão. A tutela dos menores no âmbito da televisão foi também feita adotando-se o chamado sistema «watershed» (separador das águas), que funciona segundo uma seleção de faixas horárias protegidas, algumas aconselhadas à visão dos menores, outras aconselhadas a todos e outras ainda, principalmente na programação noturna, indicadas somente a um público adulto.
A faixa de idade determinada pela classificação preventiva dos filmes tem obviamente uma repercussão na programação das chamadas faixas horárias protegidas ou distintas nas emissoras de televisão pública em todos os países europeus. A definição das linhas de conduta comuns está à base dos acordos de auto-regulamentação e de co-regulamentação dos programas de televisão, estabelecendo-se um código de procedimento comum para as emissoras tanto públicas como privadas. Criou-se assim uma base normativa, que é assumida pela autoridade do Estado e que recebe a confiança dos consumidores das emissoras públicas ou privadas que adotam este sistema de auto-regulamentação.
Para tornar visível aos adultos as classificações dos programas apropriados aos menores, muitas emissoras européias adotaram um sistema de sinais que através de símbolos, números, cores e sinais acústicos advertem ao público a respeito daquilo que está para ser transmitido.
Mas, apenas este sistema, assim como o de filtragem (tipo v-chip), não basta para garantir uma verdadeira tutela dos menores diante de um conjunto de imagens difíceis de serem decodificadas por um jovem. Deve-se pensar às imagens de guerra dos telejornais, dos filmes escabrosos ou às informações sobre os crimes hediondos, que muitas vezes têm como ambiente o próprio núcleo familiar.
É na colaboração entre Estado, produtores de programas audiovisuais e famílias que pode ser fundamentado um autêntico respeito dos menores que encoraje o crescimento positivo da criança em base aos valores fundamentais da pessoa humana.

4) CELULARES COM VÍDEO

Hoje a difusão dos celulares com vídeo chegou à Itália ao índice se 134%, o que significa que muitas pessoas possuem pelo menos dois celulares, inclusive os jovens e as crianças, que recebem este instrumento dos próprios pais. De fato, de duas crianças entre 8 e 13 anos de idade, uma delas tem um celular no bolso. Aquele que poderia ser um instrumento para controlar melhor os deslocamentos e as necessidades dos filhos, se revela no entanto um perigoso meio que pode expor a outro tipo de utilização por parte dos menores, que não se separam nunca do próprio celular, nem mesmo durante as aulas, como lamentam vários professores. Apesar do código de auto-regulamentação assinado pelas principais operadoras (Código de conduta para a oferta de serviços a pagamento em tutela dos menores), na realidade os novos serviços opcionais do celular o tornaram um «personal computer» capaz de permitir novos usos que antes não tinham.
Os desenvolvimentos tecnológicos que estão se verificando no campo da telefonia móvel – particularmente no que se refere à sinergia com a internet e a adoção dos sistemas DVB de vídeos-telefone – contribuem a aumentar a oportunidade de comunicação também para as novas gerações e, ao mesmo tempo, repropõem em novos termos a questão da tutela dos menores. As evoluções já previstas ulteriormente para os próximos anos e o número sempre crescente de pessoas envolvidas, pedem uma grande consciência social e uma constante atenção das pessoas e órgãos encarregados de garantir os direitos dos cidadãos.
Neste contexto devem ser reafirmados os direitos dos menores no campo da comunicação, dentre os quais certamente não está em último lugar aquele que se refere também à segurança diante dos riscos de indução a comportamentos ilícitos ou de acesso a conteúdos nocivos ou indesejados. Também neste campo é essencial o papel dos pais e, em geral, de todos aqueles que são chamados a ter uma função educativa. A maior segurança das crianças e dos jovens quanto ao acesso a conteúdos ilegais é um ponto que deve merecer atenção também através da maior conscientização dos pais e das mães, que devem se capacitar a conhecer e utilizar estes meios.
Para a «alfabetização» dos pais na utilização da mídia devem colaborar também as instituições públicas, promovendo um uso positivo das novas possibilidades tecnológicas. Às empresas cabe a responsabilidade de colocar no mercado um produto que dê garantias no que se refere à sua utilização pelos menores, superando os limites estabelecidos pelo código de auto-regulamentação assinado pelas operadoras de celulares. Devem também oferecer maiores informações aos adultos que assinam um contrato de utilização, como por exemplo a adoção de bloqueios automáticos de acesso a conteúdos nocivos, se o celular passa às mãos de um menor de idade.

5) VIDEOGAMES

Trata-se de uma indústria global, que conquistou os jovens e não apenas eles. Os números relativos à difusão repentina dos videogames indicam que existem 250 mil sites de videogames, cada um deles propõe uma série de títulos, muitos deles recheados de cenas de sexo e de violência. Uma pesquisa recente do Instituto italiano de medicina social (IIMS) coloca em evidência, entre outras coisas, a escassa informação por parte dos adultos a respeito dos videogames utilizados pelos filhos, o predomínio de temas violentas em mais de 30% de títulos não aconselhados aos menores, o predomínio de personagens virtuais normais que podem se tornar especiais, realizando ações extraordinárias.
Mas, o ponto de risco mais elevado se refere aos pequenos jogadores de videogames, crianças entre seis e nove anos de idade que se submetem a entrar tão intensamente no jogo virtual que chegam a formas de dissociação da realidade e solicitam um monitoramento muito atento da parte dos adultos. A mesma pesquisa indica a presença de videogames em 25% das famílias com crianças de três a cinco anos de idade e em 65,2% das famílias com crianças entre seis e 10 anos de idade. O que produz efeitos negativos no âmbito cognitivo das crianças não parece ser especificamente o meio, mas muito mais os elementos que criam a excitação, tais como a velocidade de produção do estímulo e da resposta, a velocidade das imagens, os efeitos especiais, os contrastes, a fragmentação da história, o binômio rumor-ação. O uso prolongado do jogo inibe, segundo alguns psicólogos, a área da capacidade crítica, provocando passividade e ao mesmo tempo agressividade na criança. Mas, não queremos demolir os videogames, porque existem aqueles que são muito adequados aos mais jovens, com valores de informação e de educação, seja também porque o uso deste meio é na realidade um passo na preparação da criança ao sucessivo e mais sofisticado, que é o uso da internet.
De qualquer maneira, os dados relativos à venda destes produtos de entretenimento mostram um crescimento em todos os lugares e a difusão deste meio é acompanhada de uma aceitação social (ou seria uma resignação?) sempre maior.
É urgente ampliar o percurso de conhecimento e das estratégias internacionais, para monitorar um mercado que está cada vez mais vasto. Parece urgente estabelecer modalidades operativas para o controle dos conteúdos e do sistema de sanções, seja para o produtor como para o vendedor dos serviços. O código de auto-regulamentação Pegi (derivado em 2003 do sistema de avaliação e classificação holandês, Nicam, que assinala os conteúdos inadequados aos menores), adotado pelos industriais de «entertainment» que produzem videogames, é a única forma de auto-regulamentação existente atualmente e que prevê sanções (raramente aplicadas, mesmo diante de casos graves evidentes) para os produtores que colocam no comércio os jogos com indicações de faixas etárias apenas aproximativas.
O código Pegi, ao qual a associação européia Isfe adere em 2002, é evidentemente insuficiente na sua função declarada de «fornecer aos consumidores as informações mais oportunas» e expostas no selo de produção. E, como o setor dos videogames tem hoje um volume de negócios que ultrapassa os 740 milhões de euros, envolvendo 24 milhões de jogadores (43% da população a partir dos quatro anos de idade), com uma venda dos produtos classificados para maiores de três anos de idade que chega aos quase 48% dos consumidores. É um dado que define o impacto deste gênero de meio sobre a infância e a adolescência, mostrando toda a sua periculosidade, seja pelo consumo de conteúdos inadequados, seja pelo excessivo número de horas dedicado neste passatempo, muitas vezes solitário e sem a presença de um adulto ao lado. Se for verdade, como sustenta a indústria, que a produção de videogames violentos é apenas uma mínima parte do mercado, é também verdade que esta representa a fatia mais importante do retorno econômico.
O interesse pelos videogames é alimentado pela sinergia com os filmes que inspiram o jogo homônimo e que torna sempre mais atrativo este gênero, principalmente para os adolescentes. Desta maneira é importante também neste campo o estabelecimento de regras precisas em defesa dos consumidores dentre o público jovem, mais exposto aos riscos destas novas formas de entretenimento cada vez mais sofisticadas e envolventes, por causa da combinação entre narrativa e efeitos gráficos.

6) PUBLICIDADE

O problema da tutela dos menores diante da publicidade se apresenta como um corolário, dentro do quadro mais amplo que regulamenta a difícil relação entre a mídia e as crianças. A televisão, e portanto também a publicidade, se constitui em uma fonte de perigo para os menores, isto é, para a maior parte das crianças, principalmente em idade pré-escolar, que devem saber fazer a diferença entre a publicidade e o resto da programação, e entre os programas de ficção e a realidade. Com essas considerações não significa que exista uma acrítica rejeição da publicidade em si mesma – à qual se reconhece, no entanto, onde proceda corretamente, uma função positiva no processo de formação, de crescimento crítico e de socialização do menor –, mas existe a necessidade de prever um sistema de regras destinado a garantir-lhe um uso adequado.
O efeito dos anúncios publicitários é tão grande que em alguns países estão sendo tomadas medidas drásticas a respeito. No Reino Unido, por exemplo, recentemente foram vetados os anúncios publicitários durante os programas destinados às crianças até nove anos de idade, a partir de 1º de janeiro de 2008 a medida se estenderá à programação para os jovens até 15 anos de idade e até o final de 2008 serão vetados em todos os canais dedicados aos menores. Apesar de se reconhecer que a publicidade serve para financiar os programas, aqueles dedicados às crianças terão que recorrer a outras fontes. Também na França começa a se impor uma «linha dura» a esse respeito: visto a alta incidência de publicidade de merendas, de sucos e doces em geral, a partir de agora os anúncios dedicados às crianças deverão ser precedidos de uma espécie de aviso, que orientará para uma alimentação adequada.
Mas, por que as crianças são tão frágeis diante dos apelos da publicidade? Na Itália, explica Paolo Landi, secretário geral da Adisconsum (Associação de defesa dos consumidores e do ambiente»), em um capítulo de seu estudo «Crianças da multimídia»: «Se consideramos que a publicidade não faz outra coisa que veicular um conhecimento imediatamente concretizável em um “ter”, ou em um “ser”, ou em um “fazer”, a criança absorve sem dificuldades os três componentes que são a obsessão dos expertos de marketing, isto é, o componente cognitivo (como fornecer informações indeléveis sobre um produto ou um serviço), o componente afetivo (como fazer o consumidor reagir de maneira emotiva) e o comportamental (como colocar o pequeno consumidor em movimento na direção da aquisição). A partir deste ponto de vista a criança é o público ideal, o consumidor a quem se pode vender qualquer coisa».
Na Itália está em vigor um código de autodisciplina publicitária que surgiu em 1966, em base a um acordo entre os profissionais do setor. Esta primeira forma de tutela, em grande parte com origem comunitária, tem como protagonistas entidades administrativas independentes: a Autoridade de controle da concorrência e do mercado de setor e a Autoridade de garantia para as comunicações e a editoria. Enquanto isso, para a auto-regulamentação, orientada pelas normas que constam do Código de autodisciplina publicitária, e agora também, embora com força jurídica diferente, pelo Código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual se reconhece um poder de decisão e de sanção, emanando uma ordem e intimando seu cumprimento.
Em todos os países onde a televisão serve de veículo às mensagens publicitárias, o mundo empresarial é plenamente consciente do enorme poder de influência que a publicidade tem sobre as crianças.



NORMATIVA INTERNACIONAL

O assunto relativo à tutela dos menores na mídia é um dos mais debatidos, seja no que se refere às normas nacionais, seja no âmbito internacional. Encontra-se diante da situação de precisar acertas as contas com toda a extensão da rede global da internet. O exemplo que, neste momento de transição, coloca mais em evidência a necessidade de estabelecer leis que estejam em condições de controlar o acesso e uso dos conteúdos nocivos para os menores, é exatamente o da internet. Qualquer pessoa no mundo pode abrir um site considerado «arriscado», contendo elementos ilegais e acessíveis a consumidores despreparados, disponibilizados por quem está do outro lado do mundo.
No que se refere aos princípios gerais no âmbito do direito internacional, é preciso recorrer principalmente à convenção da ONU sobre os direitos da criança, com sede em New York, ratificada pelo Parlamento italiano através da lei nº.176/1991. Esta garante à criança uma «consideração proeminente» também a respeito da liberdade, seja no se refere à expressão, seja quando tutela os conteúdos recebidos. Esta mesma convenção, em seu artigo 17, fala da relação entre menor e televisão, desejando «um sistema normativo que tutele o menor-consumidor, mesmo com todas as dificuldades que se apresentam», seja para individuar os fenômenos que devem ser monitorados, seja sobre as normativas possíveis.
No direito da União européia, tal tutela foi recentemente confirmada pela Carta dos direitos fundamentais da União, aprovada em Nice em 2000, cujo artigo 24 salienta que «os Estados membros reconhecem a importância da função exercida pelos meios de comunicação de massa e cuidam para que a criança possa ter acesso às informações e materiais... com a finalidade de promover o seu bem estar social, espiritual e moral, além de sua saúde física e mental». A normativa seguinte, 89/552/CEE, previu algumas restrições, seja no que se refere aos programas como para as mensagens publicitárias destinadas a este público». O artigo 22 desta normativa conduz a impedir a transmissão de programas que contenham cenas pornográficas ou de violência gratuita, ou outros programas inadequados a este público. Não podemos esquecer de mencionar a determinação expressa de «Televisão sem fronteiras», que está hoje em sua quinta versão atualizada, que o tema da tutela dos menores está relacionado com o estatuto geral dos direitos dos menores e corresponde ao disposto nos artigos 50 e 31 da Constituição italiana.
Se for claro que os princípios normativos são todos a favor da tutela dos menores, é também verdadeiro que uma tecnologia em contínua evolução colocou em crise as velhas regras do jogo. Mas também é claro que não se pode mais adiar a necessidade de estabelecer novos parâmetros normativos, para que as crianças possam utilizar os meios de comunicação próprios de seu tempo, com aproveitamento e serenidade também para as famílias.~

EDUCAÇÃO À MÍDIA NO MUNDO: PARA SABER MAIS

A difusão da educação à mídia é uma resposta à necessidade de se informar sobre as novidades no campo dos novos meios de comunicação. Em seguida citamos apenas alguns sites que em vários países oferecem maiores informações sobre como aprender a usar melhor a mídia, enfrentando a problemática da tutela dos menores e da alfabetização às novas tecnologias por parte dos adultos.
«The Media Awareness Nework-Réseau éducation médias» é uma organização canadense sem fins lucrativos, pioneira no desenvolvimento de programas sobre a educação à mídia. Com esta finalidade ela produz programas online em colaboração com organizações internacionais, convicta que, para interpretar as mensagens de informação, de entretenimento e comerciais, os jovens têm necessidade de instrumentos críticos válidos. Por isso é importante formar também os adultos (famílias e professores) sobre como funciona a mídia e como ela determina o estilo de vida.
A organização realiza uma ação contínua de monitoramento em relação à mídia (televisão, cinema, videogames, imprensa, publicidade, etc.), e sua seção dedicada aos pais oferece uma série de elementos para que estes reflitam com os filhos sobre esses meios, além da seção para os educadores, que inclui lições e materiais de apoio. Uma outra seção é dedicada à análise das questões ligadas à mídia, como a difusão de estereótipos, as representações de violência e da diversidade, a privacidade, a publicidade dirigida aos menores. Seu site é em inglês e francês (http://www.media-awareness.ca).
«Quai des images» é o site dedicado ao ensino de cinema e audiovisual organizado pelo Ministério da Educação francês. Ele propõe atividades ligadas à educação à imagem e de análise dos filmes em consonância com os programas escolares, agrupa os textos oficiais a respeito dos meios audiovisuais, oferece uma série de instrumentos de análise e de estudo completos sobre alguns filmes específicos e sobre certos autores em particular, informa sobre conferências, seminários, cursos e festivais sobre o mundo audiovisual e sua utilização em âmbito educativo e didático. Entre outras coisas, reúne também as propostas e as experiências feitas por professores e seus alunos nas escolas secundárias francesas no campo da educação à imagem, além de organizar um fórum de discussões aberto a todos sobre a educação à mídia (http://www.ac-nancy-metz.fr).
Sempre na França, está em funcionamento o blog «Zéro de conduite», organizado pelos professores e destinados a educadores, pais e estudantes. Promove o uso do cinema como instrumento pedagógico, dedicando-se especialmente à atualidade cinematográfica, mas sem esquecer os clássicos e os documentários. Com várias seções e espaços de aprofundamento, se propõe como um local de discussão de temas em um debate aberto (http://cinema-ducation.fluctuat.net).
A Universidade de Massachussetts organizou o Media Education Foundation – MEF, mídia de desafio, que produz e distribui documentários destinados a estimular o pensamento crítico e o debate sobre a relação entre aqueles que detêm o poder sobre a mídia, os conteúdos da mídia comercial, a exigência democrática de um livre fluxo de informações, as diversas representações de idéias e pensamentos e o direito dos cidadãos de informar e serem informados. Alguns destes temas são abordados criticamente, como a identidade do gênero na publicidade, a imagem de sexo nos videoclipes, o papel da mídia na construção da identidade cultural, mídia e saúde, etc. (http://www.mediaed.org/).

(a cura di M. F. D’A.)

 
At 9/17/2007 2:42 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

AS CRIANÇAS E A MÍDIA (II PARTE):
ACEITAR O DESAFIO EDUCATIVO


O tema da 41ª Jornada das Comunicações Sociais, «As crianças e os meios de comunicação: um desafio para a comunicação», nos convida a refletir a respeito de dois aspectos particularmente importantes. O primeiro é a formação das crianças, para que estejam em condições de receber de maneira crítica aquilo que vêem. O segundo é a formação à consciência e ao uso consciente da mídia, que está em contínua transformação tecnológica.
De fato, é o que especifica Bento XVI no início de sua mensagem, de 20 de maio de 2007, para a Jornada: «Os complexos desafios que a educação contemporânea deve enfrentar são muitas vezes ligados à grande influência dos meios de comunicação no nosso mundo. Como aspecto do fenômeno da globalização e estimulados pelo rápido desenvolvimento da tecnologia, os meios de comunicação delineiam fortemente o ambiente cultural (cf. João Paulo II, O rápido desenvolvimento, nº3). Na realidade, há quem afirma que a influência formativa da mídia está em competição com aquela da escola, da Igreja e, quem sabe, até com aquela da própria família».
De fato, como salienta o Pontifício conselho para as Comunicações Sociais, «para muitas pessoas, a realidade corresponde àquilo que os meios de comunicação definem como tal». Episódios recentes, como a utilização do celular na filmagem de violências nas salas de aula, abusos sofridos por pessoas deficientes, fenômenos de trote e de violência generalizada, demonstram como as crianças que crescem passando uma média de quatro horas por dia diante da televisão, sozinhos em casa, absorveram a lógica do «estou no vídeo, logo existo». Os psicólogos, os pedagogos e os estudiosos dos meios de comunicação estudam há tempos sobre as relações entre o consumo televisivo e o comportamento violento dos menores. Uma grande quantidade de pesquisas realizadas em muitos países ocidentais demonstra como esta correlação seja realmente inegável.


NOVAS LINGUAGENS

O fato que muitas crianças vivem completamente inseridas no mundo dos velhos e novos meios de comunicação, que estão cada vez mais frequentemente em correlação entre eles, é confirmado pela popularidade de alguns modelos televisivos, considerados tão efêmeros quanto penosos «momentos de glória», presentes nos programas com os maiores índices de audiência, dos «reality» aos «talk show», sem falar do «trash», que hoje se tornou um gênero de espetáculo.
Dentre as preferências demonstradas pelos adolescentes italianos que assistem televisão mais do que três horas por dia, encontramos, em primeiro lugar, a figura da «veline» (Ndt: misto de corista e coadjuvante na apresentação de programas populares da televisão italiana), enquanto outros da mesma idade se concentram no mais clássico exemplo, o do jogador de futebol. De toda maneira, a coisa mais importante é aparecer, pouco importa por qual motivo, de ser «alguém» ou «alguma coisa» no Olimpo mediático, mesmo que seja apenas por um instante.
Estes são os exemplos mais negativos dos condicionamentos derivados de um excessivo e acrítico uso dos meios de comunicação. Encontramo-nos diante de uma nova geração que cresceu na frente da televisão, capaz de usar as novas tecnologias que os próprios pais, que as adquiriram e as tornaram disponíveis, muitas vezes se encontram despreparados para utilizá-las.
Tanto é verdade que hoje em dia os filmes são vistos diretamente nos celulares e a televisão pode ser assistida na tela do computador. Hoje se telefona através da internet e graças ao download se descarrega os CDs e DVDs mais recentes, se filma e se faz foto com o celular, e assim por diante.
Nas casas, o vocabulário familiar se reduziu ao gênero dos sms e se fala tendo o som da televisão no fundo, se comunica através de e-mail, se faz «visita virtual» via computador, se percorre através de bibliotecas virtuais, tanto que as fichas e arquivos de papel evocam imagens do outro século, completamente em desuso.
A situação dos nossos filhos é diversa daquela da geração precedente, pois eles abriram seus olhos tendo diante de si estes cenários de profunda, contínua e envolvente transformação tecnológica. Eles se constituem aquela que os estudiosos chamam de geração nascida «com seis dedos»: além dos cinco dedos normais da mão, o sexto é o mouse do computador.
Com o aparecimento do mundo «virtual» da internet e dos videogames criou-se uma defasagem em relação à realidade verdadeira e própria. As duas dimensões parecem muitas vezes, e para muitos jovens, como universos paralelos, com conseqüências não indiferentes no plano do processo de amadurecimento. Têm grande sucesso os sites nos quais se prevê uma segunda vida (basta verificar os milhares de registros nos poucos meses de existência do site italiano de «Second Life», que em todo o mundo já tem sete milhões de inscritos), onde a simulação reproduz todas as situações da vida real. Apenas que tudo é falso, a começar da nova identidade, que pode ser escolhida e com ela se inicia a fazer parte deste mundo fora do mundo, onde se pode ser um «qualquer coisa». Isto é, ninguém.
Assim, o grande desafio cultural de hoje é propriamente a redefinição dos limites, que muitas vezes se apresentam demasiadamente instáveis. Isto é, redefinição dos limites entre o real e o virtual, superando a divisão digital que hoje separa as gerações adultas daqueles mais jovens.


OS JOVENS: PROTAGONISTAS OU VÍTIMAS DAS MUDANÇAS?

A linguagem deles é pobre, muitas vezes recheada de termos tirados do dicionário do internauta: clicar, chatar, messagiar, deletar, são alguns dos neologismos que fazem parte de seu vocabulário quotidiano. Falta uma dimensão humana da tecnologia que esteja em condições de traçar o perímetro cultural entre o real e o virtual. Assim a aldeia global difundiu uma quantidade de modelos comportamentais desviados, ou pelo menos discutíveis.
Desta maneira, os jovens que vivem a milhões de quilômetros de distância jogam o mesmo videogame, vêem o mesmo filme, assim como, de maneira transversal, absorvem modelos e comportamentos semelhantes. Muitas vezes os adultos têm menos domínio no uso das novas tecnologias e observam, com uma preocupação resignada diante de suas próprias limitações, as crianças que navegam facilmente na internet.
As raízes das dificuldades neste campo educativo são muito bem explicadas por Marina D’Amato, professora de sociologia da Universidade de Roma, que salienta: «Cada geração tem necessidade de se encontrar também em um mundo fantástico, que serve a interiorizar o paradigma do bom e do belo, do justo e do errado, do oportuno e do útil, também em relação aos exemplos que procedem da narrativa. Hoje nos encontramos em uma condição na qual os avós e os pais contam cada vez menos histórias aos filhos e aos netos, e este papel foi assumido pela televisão. Mas, na realidade, a televisão “exila” e “con-funde”, isto é, funde os modelos morais que são frutos de ânsias e problemas mal resolvidos, muito mais que de certezas. Embora estes se transformem com freqüência, a cada três ou quatro anos, o fato de serem repropostos continuamente faz com que se justaponham uns aos outros» (ver Come mediare i media, de Mario Russo).
Se for verdade que a televisão é o meio mais usado até a adolescência, imediatamente depois surge a grande atração pela internet. Esta passagem nasce de uma sintonia com a linguagem televisiva, que na idade infantil muitas vezes é ouvida durante muitas horas no dia. Esta linguagem se baseia em uma mediação da realidade e desta maneira ela ativa um processo de recepção que é de tipo emotivo.
Neste registro emocional é mais fácil acabar envolvido por situações e figuras capazes de se proporem como modelos identificadores, preservadores de sentido e de comportamentos a serem imitados.
O poder de concentrar uma vontade emulativa em alguns personagens, que correspondem particularmente às necessidades interiores do jovem (necessidades na maioria das vezes induzidas pela publicidade ou por modelos estimuladores), tem uma forte relação com a quantidade de horas que o jovem passa utilizando os novos ou os velhos meios de comunicação.


EDUCAÇÃO NECESSÁRIA

«A formação adequada a um uso correto dos meios de comunicação é essencial para o desenvolvimento cultural, moral e espiritual das crianças… Educar as crianças a serem seletivas no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja, da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos. Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia, com a certeza de que este difícil, embora gratificante, aspecto da condição de pais, é apoiado por toda a comunidade.»
As palavras do discurso de Bento XVI definem com grande clareza o paradigma de uma justa relação entre a mídia e os menores. Uma clareza que devemos agradecer ao magistério da Igreja, no momento em que o mundo da mídia parece ignorar a verdadeira problemática educativa das crianças e as expectativas de qualidade e de segurança exigidas pelas famílias no que se refere ao uso desses meios, seja do cinema aos videogames, da televisão à internet.
Diante da utilização destorcera do meio televisivo, o mais difundido dentre os meios de comunicação, a Igreja se interroga sobre o porquê da televisão não ter um papel educativo e por que os meios de comunicação não podem ser companheiros confiáveis para os jogos na fase de crescimento da criança. O anúncio de uma recente campanha sobre o uso da mídia, promovida pelo Ministério das Comunicações, mostra os vários membros da família que estão vendo a televisão ao lado de uma criança.
Que se trate do avô ou da mãe, a mensagem é a mesma: não deixar uma criança sozinha diante de um meio que, sem o apoio crítico educativo de um adulto, pode transmitir conteúdos inadequados à idade e à maturidade daquele que o vê. Sem esquecer as responsabilidades dos produtores televisivos, empenhados na organização dos programas, o papel da família é realmente insubstituível.
Se realmente o objetivo de quem administra a sociedade de produção televisiva, ou das multinacionais produtoras de videogames ou das operadoras de celulares, é o de promover e vender o produto, o bem estar psicofísico da criança está no centro do interesse dos educadores, sejam eles os professores ou, em primeiro lugar, os pais.
Isto explica bem a mensagem do Papa, que continua a sua análise, salientando que «educar as crianças a serem seletivos no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja e da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos (ver João Paulo II, «Familiaris Consortio», 76). Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia.»


CONTEÚDO DA MÍDIA

No panorama de uma revolução da multimídia, que está modificando transversalmente os hábitos, a mentalidade, os modelos e as linguagens, deve voltar ao centro do debate a tutela daquilo que é melhor para os menores. Sem acusar a «mídia», que enquanto tal não é nem boa nem má, o importante é partir de uma a análise do produto, para assim poder individuar conteúdos que sejam de melhor qualidade para as crianças e os adolescentes. Porque a televisão é um instrumento que abre janelas de conhecimento para o mundo e, se bem utilizada, de «má professora» pode se tornar uma preciosa fonte de estímulo para o crescimento humano e cultural.
A mesma coisa vale, e com mais razão, para a «rede» que engloba e compreende tudo, e para os videogames, onde, ao invés de violência e monstros, poderia se dedicar a produzir (e isso já ocorre em certos casos) histórias instrutivas e de conteúdo interessante.
Bento XVI coloca justamente em evidência as enormes possibilidades para que seja melhorado o conteúdo deste grande campo de produção multimídia: «A educação através da mídia deveria ser positiva. Colocando as crianças diante de um meio estética e moralmente excelente, estas recebem uma ajuda para que desenvolvam a própria opinião, a prudência e a capacidade de discernimento. É importante aqui reconhecer o valor fundamental do exemplo dos pais e as vantagens de introduzir os jovens aos clássicos da literatura infantil (…). A beleza, quase um espelho do divino, inspira e vivifica os corações e as mentes juvenis, enquanto a feiúra e a vulgaridade têm um impacto deprimente sobre os comportamentos». Diante de uma decadência geral do produto televisivo, a questão da qualidade aparece ainda mais forte e vibrante em grande parte de um público formado de famílias, que pede para não ser apenas um exército indistinto de ouvintes silenciosos, mas um público em condições de exprimir suas preferências por conteúdos formativos e informativos de bom nível.
A mensagem de Bento XVI continua, com algumas importantes indicações: «Como a educação em geral, aquela da mídia requer também uma formação ao exercício da liberdade. Trata-se de uma responsabilidade que compromete. Muitas vezes a liberdade é apresentada como uma incansável procura do prazer ou de novas experiências (…). Este desejo, sentido profundamente pelos pais e educadores, que é o de educar as crianças no caminho da beleza, da verdade e da bondade, pode ser apoiado pela indústria da mídia somente na medida em que se promove a dignidade fundamental do ser humano, o verdadeiro valor da vida familiar, as conquistas positivas e as metas da humanidade. A partir disso, a necessidade de que os meios de comunicação estejam empenhados na efetiva formação e no respeito da ética deve ser vista com interesse particular e com urgência não apenas pelos pais, mas também por aqueles que têm responsabilidade cívica».
Na realidade, nos encontramos na situação de ter que reconhecer que na Itália falta uma verdadeira «cultura da criança»: a situação é tão séria que no âmbito institucional procura-se dar uma nova organização geral para verificar e controlar os conteúdos dos setores de entretenimento, como os videogames, que até agora estão submetidos apenas a códigos de auto-regulamentação, feitos e codificados para uso e consumo pelas indústrias produtoras.
Uma vez mais, o primeiro e indispensável apoio à criança só pode vir da família e de uma relação mais estreita com os professores e educadores, exatamente como salienta Bento XVI, lembrando-nos que a preocupação educativa dos pais não deve se tornar uma preocupação genérica, mas uma atenção constante a tudo aquilo que diz respeito aos filhos.

A INDÚSTRIA DA MÍDIA

1) A TELEVISÃO

Se a televisão convencional se apresenta como um ramo de atividade já «maduro», no entanto se apresenta no horizonte a situação da mídia digital (satélite ou a cabo), também como uma plataforma que consente a ligação entre televisão, internet e outro tipo de mídia através do computador. No que se refere à qualidade da programação, apesar dos inúmeros bons propósitos anunciados no âmbito institucional, parece pequena a atenção às exigências dos menores em suas diversas faixas etárias. A programação para os menores, na realidade é confinada em redes e horários particulares, enquanto o resto da programação na faixa horária considerada «para todos» muitas vezes apresenta conteúdos inadequados aos jovens. Mas, quais são as expectativas das gerações de jovens no que se refere à televisão? É realmente verdade que preferem o «trash», os jogos com prêmios absurdos e as «velines»?
A partir de uma pesquisa recente feita pelo instituto Censis sobre «Comunicação, pluralismo social, sociedade aberta» (2005) surge que a relação entre os menores, e em particular dos adolescentes entre os 14 e 18 anos de idade, e a televisão é determinada por elementos de forte contradição e de passividade. Nessa faixa etária, 100% deles vêem televisão praticamente todos os dias, 86% acompanham um pouco de tudo, com uma relevante predileção pelos filmes (72%), por esporte (32%) e pelos «reality shows» (18%).
No entanto, a amostragem entrevistada não está realmente satisfeita com aquilo que vê. De fato, 36% dos adolescentes denunciam a vulgaridade difundida nos programas e 25% criticam a superficialidade. Dentre eles, 46% consideram a televisão como um meio que «invade», ao mesmo tempo em que é interessante notar que 25% consideram que em geral a programação televisiva alimenta nas crianças menores uma visão consumista da vida. Destes dados surge o contraste entre a procura de distração e a reprovação daquilo que lhes é proposto pela programação. Isto significa que o alto índice de procura não é um indicador de satisfação.
Considerando o axioma de que a televisão seja onipresente, fica claro que são os próprios jovens a pedirem uma maior atenção aos conteúdos: menos violência e menos vulgaridade. A exigência de uma regulamentação diversa, diz claramente o relatório do Censis, «não vem somente daqueles, pais e educadores, que estão preocupados pela possível influência negativa sobre os menores, mas se exprime nitidamente também através dos adolescentes, pelo menos de uma parte mais esperta e consciente dentre eles».
Para tutelar melhor os direitos dos menores, desde 2002 foi instituído junto ao Ministério das Comunicações um código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual aderiram os produtores de televisão, seja no âmbito nacional como local. Baseando-se nos princípios sobre a matéria existentes na Constituição italiana e na Convenção dos direitos da criança, estabelecida em 1989 pela ONU, a comissão que controla sua aplicação avaliou em todos estes anos de atividade os milhares de casos em que foram violadas as normas de tutela, que prevêem a transmissão de programas e imagens adequadas a um público de menores de idade durante aquela que é chamada de «faixa protegida» da programação televisiva (das 7h30 às 22h30), intervindo com denúncias e sanções, que nos casos mais graves foram aplicadas pela Autoridade de garantia no setor das comunicações. Para o futuro, esta comissão deverá se transformar em um organismo mais amplo de controle, que se chamará «Mídia e menores», que além da televisão deverá monitorar também os setores dos vídeos-telefone e dos videogames, além da internet, que é o campo de maior risco.

REGRAS DE TUTELA EM OUTROS PAÍSES

É diversa a situação em outros países, como por exemplo na Grã Bretanha, onde o sistema de regulamentação da mídia é estruturado e complexo e foi atualizado nas últimas décadas, com uma particular atenção à tutela dos menores. As inovações tecnológicas neste setor levaram as normativas inglesas a uma série de novas disposições, como por exemplo, a visão em casa de vídeo exclusivamente para adultos, e que fora de casa seriam vetados aos menores, ou o combate à praga mundial dos sites internet para os pedófilos, que contenham material pornográfico ou com conteúdos que possam esconder o aliciamento de menores (ver a Protection Childres Act, de 1978).
A programação televisiva é regulamentada pelo Broadcasting Act (1996), de onde deriva a instituição da Broadcasting Standard Commission (BSC), um órgão independente de controle que estabelece as normas de avaliação e classificação dos programas, também no que se refere aos conteúdos violentos ou que possam ofender a decência pública (site oficial www.bsc.org.uk). Este organismo BSC funciona internamente à estrutura do Broadcasting, supervisionando e regulamentando todas as emissoras de televisão e de rádio, via cabo ou por satélite. Sua tarefa é a de elaborar os códigos de conduta e de aplicação de modelos que respeitem a justiça, além de monitorar os modelos, verificando que respeitem as leis. Com a transmissão de programas com conteúdos considerados inadequados aos menores de várias idades, há alguns anos a televisão inglesa adotou o sistema «watershed», um «separador de águas» entre um horário de programação familiar e outro para os adultos. Todo o sistema televisivo inglês se apóia sobre a responsabilização das famílias, pois sem a colaboração delas qualquer código de modelos para os programas é praticamente inútil.
Na França, está vigorando já há anos um código através de sinais televisivos, que entra em função para assinalar os programas inadequados aos menores. A avaliação do programa televisivo é feita pelo Conseil Supérieur de l’Audiovisuel (CSA), uma autoridade administrativa independente, que controla a difusão dos filmes e outras transmissões em vários canais privados, nacionais, regionais ou locais. A normativa francesa (lei 719/2002) veta a transmissão de programas que possam prejudicar gravemente a integridade física, mental e moral dos menores, porque divulgam conteúdos de pornografia ou de violência gratuita. As transmissões são classificadas por um código de sinais que, em conjunto com um sistema organizado de faixas horárias de programação, garante às famílias mais clareza sobre os programas destinados aos menores.
Na Alemanha, o tema da infância tem particular atenção da legislação, que considera desde o nascimento o início dos direitos fundamentais do cidadão. A tutela é disciplinada no âmbito público pela JSchG (desde o dia 26 de fevereiro de 1985), enquanto a lei GjSM se ocupa do controle sobre a difusão de publicações e conteúdos mediáticos considerados danosos para os menores. A regulamentação no setor televisivo é feita segundo as normas do acordo sobre a radiodifusão dos Lander federais, que as entidades para a mídia nesses Lander adotaram por base para o estabelecimento das diretivas que tutelam o interesse dos menores nas emissoras privadas. Não são admitidas transmissões que incitem o ódio racial, que exaltem a violência ou a guerra, que ofendam a dignidade do homem, que sejam de gênero pornográfico, que mostrem pessoas moribundas ou com sofrimentos que ofendam a dignidade humana. Os responsáveis pela programação, escolhendo os horários das transmissões, devem cuidar para que os menores não vejam programas que podem prejudicar o seu bem estar psíquico, físico ou mental. As transmissões inadequadas às crianças menores podem ser transmitidas somente depois da autorização da entidade competente do Land interessado.
Os responsáveis pela organização dos programas televisivos em âmbito nacional devem nomear encarregados pela tutela dos menores, que atuam no momento da aquisição, da projeção e da realização dos programas. As emissoras privadas fundaram em 1993 uma associação de autocontrole voluntário da televisão («Freiwillige Selbskontrolle Fernsehen», FSF), à qual devem ser apresentados programas particulares, antes da sua transmissão, e suas avaliações consideradas nas decisões das entidades de controle da mídia nos Lander federais. Existe ainda o órgão comum do cidadão para a tutela dos menores, dos programas, da competência mediática e controle da mídia (GSJP), do qual faz parte um integrante da entidade para a mídia nos Lander federais, que dá o seu parecer a respeito de algumas séries, filmes e espetáculos mais ou menos adequados aos menores. Este órgão, o GSJP, decide sobre pedidos de mudança de horários de transmissão de filmes proibidos para menores, controla a forma de novos programas e experimenta novas disposições para a tutela dos menores na televisão digital. A peculiaridade da jurisdição alemã, seja no setor televisivo como no cinematográfico e da mídia em geral, é a minuciosa atenção às exigências com o desenvolvimento do menor e aos riscos que este pode correr com a observância incorreta das leis.
Nos Estados Unidos, é possível consultar via internet um «guia televisivo para os pais» (ver o site www.mpaa.org), que prevê algumas categorias de audiência aplicadas aos programas televisivos transmitidos a todo o público. Este guia organiza várias siglas para identificar a categoria de audiência para cada transmissão: vai-se do TVY (para todas as crianças) ao TVG (para todos), através de várias faixas etárias, que correspondem à passagem da primeira à segunda infância e desta à adolescência. Depois tem o TVPG («parental guidance», visto na presença de um dos pais), o TV14 («parent strongly cautioned», séria advertência aos pais), para os programas que contêm cenas de sexo e de violência. Enfim, há o TVMA, que prevê um «mature audience only», ou seja, destinado a um público de idade superior a 17 anos, última fronteira para os conteúdos considerados «restricted».
Estas avaliações foram elaboradas baseando-se nas opiniões dos próprios pais e são fáceis de serem encontradas e compreendidas. Esta linha de «guia de televisão para os pais» pode ser usada juntamente ao «v-chip», que é um dispositivo de filtro instalado na maior parte dos mais recentes modelos de aparelhos de televisão, para permitir aos pais de bloquear os programas inadequados.

FICHA 1
Brasil: «O que eu penso da tv»
No Brasil, a audiência infantil é muito alta: aproximadamente 30 milhões de crianças vêem televisão pelo menos durante três horas por dia. Explica a profa. Rosália Duarte, do departamento de Ciência da Educação, da PUC do Rio de Janeiro, que «as crianças são muito perspicazes, mas nós podemos e devemos ajudá-las a ampliar o seu quadro de referências, para que possam discutir ainda melhor sobre o conteúdos daquilo que vêem. Para isso temos necessidade, antes de tudo, de ouvir aquilo que elas têm a dizer sobre o assunto e de dialogar com elas. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e muito mais freqüente, a outras atividades culturais». No âmbito de uma pesquisa feita através de um questionário distribuído nas escolas, intitulado «O que eu penso da tv», apareceu que «as crianças querem seriamente ser ouvidas sobre aquilo que pensam da tv, mas sentem que sua opinião é considerada pouco importante e não estão contentes com o excesso de imagens de violência exibidas na televisão, principalmente a violência “real”, definida como aquela transmitida nos telejornais. Eles adoram ver televisão e não importa o que os adultos pensam e dizem a respeito disso. A eles agradam quase todos os tipos de programas transmitidos: novelas, desenhos animados, programas de humor, filmes, seriados, mas isso não faz deles espectadores “idiotas”, pois fazem críticas muito interessantes, pertinentes e bem elaboradas sobre o que consideram feio ou inadequado na televisão. Para a maior parte deles, a televisão se oferece como principal opção de divertimento (em alguns casos, a única), o que significa um dado muito preocupante. Mas, o que chamou mais a nossa atenção é o grau de experiência com o qual essas crianças analisam a televisão: são expertos e demonstram conhecer a televisão também do lado de dentro, inclusive as linguagens que ela utiliza, a sua estrutura de produção, a sua lógica interna e as suas maneiras de intervenção».
As crianças aprendem os valores e os não-valores através da televisão, não resta dúvida, mas demonstram ter senso crítico a respeito deste assunto, quando afirmam nos textos que os programas transmitidos na tv podem lhes ensinar «a serem bons, a ter coragem e a fazer o bem, a cuidar da natureza e de si mesmos, a serem honestos e a lutar por aquilo que desejam», mas também «a serem cruéis e mentirosos, a roubar e matar, a não respeitar os pais e a comprar tudo aquilo que não têm necessidade». Falando sobre a validade do ensino através da mídia, a profa. Duarte salienta a necessidade de «ouvir aquilo que têm a dizer sobre o assunto e a dialogar com eles. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e mais freqüente, a outras atividades culturais».

FICHA 2
Observadores internacionais
Os dados examinados em janeiro de 2006 pelo OssCom, que é um centro de pesquisa da mídia, deixam evidente a tendência a realizar uma forma de co-regulamentação, onde a ação legislativa dos Estados membros se integra com medidas de auto-regulamentação por parte dos produtores, broadcasters e profissionais da comunicação sob o efeito de controles e sanções. São dois os instrumentos mais utilizados no âmbito europeu, observando-se as diretivas previstas no artigo 22 de «Televisão sem fronteiras»: a definição de faixas horárias protegidas (watershed) e os sinais mostrados na tela (determinados por um sistema de «rating»). Apesar disso, aos campos tradicionalmente problemáticos da violência e da pornografia se juntam novos campos de risco para os menores: a vulgaridade, abusos e dependências de substâncias, linguagem e comportamento vulgares, discriminações e abusos, violações e ofensas à dignidade humana. Os critérios de avaliação dos programas se constituem um problema que é partilhado por muitos países da União européia, ao mesmo tempo em que se prepara uma uniformização internacional dos sistemas de classificação (ver mais adiante, Nicam), baseados na visualização de cinco ícones que ilustram simbolicamente qual é a problemática do programa que está sendo analisado e para quais idades ele é desaconselhado.
Deve ser assinalada a atividade online da European Medi@culture. O projeto é promovido pela Comissão Européia, em Bruxelas, no quadro das iniciativas «e-Learning», administrado pelo centro mediático de Baden-Württemberg. O site apresenta informações sobre a educação à mídia na Europa, particularmente na França, Áustria, Finlândia e Alemanha. A seção de projetos de multimídia agrupa os projetos sobre a mídia desenvolvidos por escolas e associações de jovens ao longo do tempo (ver http://www.european-mediaculture.org).

FICHA 3
África do Sul: Encontro mundial sobre a mídia para a infância
Este encontro trienal se realizou no último mês de março em Johannesburg, na África do Sul, com a participação de expertos do setor representando diversos países. Em conjunto se discutiu sobre a necessidade de uma programação adequada às crianças, procurando entender de que modo a violência na mídia pode influir sobre a psíquico dos menores.
Mas, no 5º Encontro mundial sobre a mídia para a infância apresentaram-se também muitas crianças provenientes de todo o mundo e empenhadas em discutir sobre o difícil tema da «Mídia como instrumento de paz e de democracia global». Vieram guiados por grupos de adultos, dentre eles as diversas organizações católicas que há anos trabalham para promover regras para o bem da infância, a serem respeitadas nas transmissões de rádio e televisão através de códigos de regulamentação que devem ser redigidos ou, como em alguns casos, apenas atualizados. Em muitos países do sul do mundo as novas tecnologias de multimídia já estão muito disseminadas e seu uso merece uma atenção particular para tutelar o público mais jovem.
Especialmente na África, explicou o organizador do encontro, Firdoze Bulbulia, começa-se a examinar o projeto de um «Media center» para as crianças, que possa produzir e distribuir transmissões de rádio e de televisão destinadas ao público mais jovem, com o objetivo de realizar um canal televisivo pan-africano dedicado à infância. Os organizadores do encontro estão também trabalhando no projeto de uma aliança africana dos meios de informação e de comunicação, seguindo o modelo daquela já existente na América latina.

2) INTERNET

Na Itália, 47% das famílias italianas têm um computador em casa, um dado relevante mas sempre muito baixo em relação à média dos outros países europeus. O uso da internet por parte dos adolescentes e jovens, e a familiaridade que têm com tudo aquilo que pode ser digitado ou «descarregado» da internet, apresenta não poucos problemas. Pela sua própria natureza de rede de comunicação global, o problema se apresenta em ótica internacional, procurando garantir a tutela dos menores através de precisos acordos com os provedores para um efetivo controle de conteúdo. No campo italiano, até 2006, a tutela dos menores tinha sido deixada nas mãos dos próprios provedores, que em 19 de novembro de 2003 assinaram um acordo de auto-regulamentação: o Codice Internet e Minori. Embora o acordo tenha sido estipulado entre os representantes dos vários provedores diante do Ministério para a Inovação e a Tecnologia, no entanto ele permanece um acordo privado, com lacunas, principalmente no que se refere às sanções que muitas vezes devem ser aplicadas. Em 2006, na seqüência de numerosos casos de violência sobre menores, muitos dos quais realizados através da difusão de material pedo-pornográfico (quando não se tratava de verdadeiro e próprio aliciamento de menores via internet), foi promulgada a lei 38 de 6 de fevereiro de 2006: «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet».
Enfim, como aplicação da lei 38/2006, em fevereiro da 2007 foi publicado um decreto determinando os requisitos técnicos dos instrumentos de filtragem que os provedores da rede internet devem utilizar para impedir o acesso aos sites já assinalados pelo Centro nacional contra a pedo-pornografia. Mas, isso não basta para superar as dificuldades e impedir que os menores possam navegar de maneira arriscada na «rede das redes».
Atualmente foi reativada a comissão anti-pedofilia e desvios de menores através da internet, o «Ciclope», que tinha sido instituída junto ao Ministério para a Eqüidade, do governo italiano, e que ficou inativa por um ano, até a sua reestruturação junto ao Ministério da Família. Está também para entrar em função um site dedicado ao uso da internet, junto ao Ministério das Comunicações, e um número telefônico de emergência gratuito, organizado pelo mesmo ministério e por «Save the children», que poderá ser utilizado por qualquer cidadão que queira assinalar algum abuso, desvio ou pedo-pornografia. Dentre as iniciativas mais recentes, deve ser assinalado o site www.tiseiconnesso.it criado pelo Ministério das Comunicações italiano, sempre em colaboração com «Save the children», onde é colocada à disposição uma série de informações sobre o conteúdo de certos sites, seja para os pais como para as próprias crianças, em conjunto com a campanha televisiva que tem como slogan «A melhor maneira de ajudar o seu filho a não usar incorretamente as novas tecnologias é conhecê-las».
Deve ser salientado também o fato de como a rede se tornou um grande mercado online. Para alguns produtores, o «e-commerce» de brinquedos corresponde já a 4% das vendas, e apenas em 2005 as vendas online corresponderam a 37.600 ações de compra. As razões para investir no processo online são múltiplas: desde a possibilidade de evitar as dificuldades logísticas de distribuição dos produtos, à ampliação de ofertas diferentes de produtos e também a possibilidade de envolvimento do cliente através de campanhas de mala direta e a criação de comunidades virtuais em torno de alguns produtos.

FICHAS:
Pedo-pornografia e internet
Em março de 2006, entraram em vigor as novas medidas diretas de combate e repressão ao fenômeno de exploração sexual dos menores e a pedo-pornografia, estabelecidas pela lei 38/2006 – «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet» foi publicada no Diário oficial em 15 de fevereiro de 2006, nº.38 – com a qual foram substancialmente modificados e integrados os artigos 600bis e seguintes do Código Penal italiano.
A lei confirma os artigos 527, 528, 529 e 725 do Código Penal italiano, que punem os «atos obscenos em local público, publicações, espetáculos obscenos, desenhos ou figuras que ofendem a decência pública».
Porque em muitas publicações, transmissões televisivas e anúncios publicitários, mesmo que não tenham declaradamente um caráter pornográfico, imagens de crianças e adolescentes são apresentadas de maneira explícita ou mais ou menos sutilmente ilusória e de forma falsa, pede-se um novo empenho das instituições competentes para que sejam observadas as normas em vigor e, se preciso for, que façam apelo aos órgãos de Polícia, o Instituto de autodisciplina publicitária, o Ministério das Comunicações, a Polícia postal ou a «Comissão tv e menor».

3) CINEMA

Confirmando as disposições da Constituição italiana, no que se refere ao direito e ao dever das famílias de serem protagonistas na educação de seus filhos, para muitos é chegada à hora de reelaborar a legislação que define o conceito de «censura» (a lei 161/1962 prevê a possibilidade de negar a autorização de abertura às salas de cinema ou de fazer cortes nos filmes, mesmo em função de um público adulto), que hoje está superado. É preciso com urgência estabelecer um critério de tutela dos menores não apenas no que se refere aos filmes que vêem nos circuitos cinematográficos, mas também sucessivamente em casa, muitas vezes em horários acessíveis na programação da televisão.
Uma avaliação correta e preventiva de um filme permite à família ter à sua disposição os instrumentos para escolher se um espetáculo é mais ou menos oportuno, conhecendo a trama, os eventuais conteúdos mais sensíveis, a classificação que a obra recebeu em outros países, etc. Por isso, é justo que a legislação seja revista, uma operação que requer atenção e perspicácia da parte das instituições em um momento de transição da mídia, como este que estamos vivendo, quando esta se tornou realmente um importante componente na educação dos menores.
Não faltam filmes que atraem o público por causa de seu conteúdo de violência, e no entanto entram no circuito cinematográfico sem qualquer restrição de idade. Para um filme que é notícia nos jornais, existem muitos outros com conteúdos duvidosos ou até mesmo perigosos que conseguem passar através do filtro da comissão de revisão cinematográfica, que atualmente funciona junto ao departamento de cinema do Ministério dos Bens Culturais.
Ao mesmo tempo em que existe um projeto de lei do ministro dos Bens culturais, que deve ainda iniciar os trâmites parlamentares, novas situações se apresentam na Itália, com a autocensura de filmes, feita pelos produtores ou distribuidores cinematográficos, com a introdução de novas e mais específicas faixas etárias para as restrições visando os menores a partir dos 10 anos de idade. As restrições serão feitas baseando-se em uma avaliação classificatória dos conteúdos das obras e sucessivamente serão ainda analisadas por uma comissão de psicólogos, educadores e pais.
Este sistema se inspira no modelo americano da Motion Picture Association of America (MPAA), que há 40 anos representa os interesses da indústria do audiovisual americana no mundo. Funcionando a partir de regras bem precisas (estabelecidas ao longo dos anos, também segundo as sentenças dos tribunais federais nos vários Estados americanos e em base aos protestos dos cidadãos), a autocensura americana prevê a existência de uma única comissão competente para determinar as restrições do PG12 ao «restricted» 17 anos. Esta comissão é composta exclusivamente de pais, considerados os primeiros depositários da educação dos filhos, e representam transversalmente a audiência. Importantes sanções econômicas asseguram que o mecanismo de autocertificação corresponda efetivamente aos interesses dos cidadãos. No site da Motion Picture estão disponíveis aos pais os pontos de referência para a avaliação das obras de entretenimento e são publicadas as restrições aplicadas a cada filme que está em exibição nas salas de cinema. Geralmente as avaliações parecem muito mais severas em relação a outros países. Tudo isso, nos vários anos de sua aplicação, deu uma qualificação à indústria americana e seu correto serviço prestado aos ouvintes. Qualquer estrada que se pretenda seguir na Itália, é importante para as famílias que seja estimulado um mercado de produção adequado à infância: é justo que o mecanismo da indústria cinematográfica continue com o seu ritmo de produção, mas não é justo confundir as classificações de acesso ao produto, como qualquer indústria sabe muito bem.
No que se refere às normas européias de classificação dos filmes, e em geral de todo «entertainment» (neologismo anglo-saxão, que, no entanto encontra sua raiz etimológica na relação entre educação e jogo) acessível aos menores, deve ser citado o sistema NICAM, que funciona na Holanda há alguns anos. Fundado em 1999, o NICAM (Nederlands Instituut voor de Classificatie van Audiovisuele Media) se baseia na lei Media Act, onde os programas de grupos que tiveram a autorização para atividades de «broadcasting» não devem incluir obras audiovisuais que prejudiquem o desenvolvimento físico e psicológico de pessoas com menos de 16 anos de idade, seguindo as diretivas da União européia («Televisão sem fronteiras» IV).
O sistema de classificação preventiva funciona também na Grécia, com a lei 1.597, de maio de 1986, que prevê que antes da projeção nas salas de cinema, cada filme seja submetido pelo produtor ou pela sociedade de importação à Comissão para a juventude, que classifica o filme seja como adequado aos menores, ou proibido aos menores de 13 anos, ou de 17 anos ou ainda, nos casos mais graves, severamente inadequado aos menores. Esta comissão é um órgão do Ministério da Cultura e foi concebida procurando-se estabelecer certa proporcionalidade, sendo composta de representantes do Estado (Ministério da Cultura), das categorias ligadas ao cinema, de psicólogos especializados na educação, de sociólogos, dos jovens, dos educadores e dos pais.
Na Áustria, está em vigor um sistema de avaliação complexo, instituído em base a um princípio constitucional federal que confia a tutela dos menores, no que se refere ao cinema e em geral aos meios de comunicação de massa, à competência específica dos Lander. A lei nacional que engloba a regulamentação da mídia é a ORF-ACT, ou seja, a Austrian Broadcasting Corporation nº. 379/1984, que estabelece quais os critérios sobre os quais deve se basear a proteção aplicada a programas e filmes transmitidos na televisão ou através de outros canais mediáticos. No que se refere à exibição dos filmes, a avaliação preventiva das obras cinematográficas, para que sejam decididas as faixas etárias adequadas, é regulamentada pela lei austríaca para a tutela dos menores, a «Jugendschutzgesetz», aplicada através das leis dos Lander federais. Esta lei estabelece nove faixas de restrições de público a partir dos seis anos de idade, com uma sucessiva graduação que prevê restrições para 10, 12, 14 e 16 anos de idade. Para supervisionar o sistema de classificação cinematográfica, existe uma comissão junto ao Ministério da Educação, em Viena, que comunica seu parecer sobre a idoneidade dos filmes às autoridades locais. Geralmente e de maneira individual os Lander adotam as decisões da comissão, e é em âmbito local que se decide de sua aplicação.
Na Espanha, o artigo 20 da Constituição reconhece o direito do cidadão a exprimir e difundir livremente seu pensamento, suas idéias e suas opiniões através de qualquer meio de divulgação. Se por um lado o exercício de tais direitos «não pode ser restrito através de nenhum tipo de censura prévia», o mesmo artigo especifica que «estas liberdades têm o seu limite no respeito dos limites reconhecidos pelas normativas que exprimem este respeito, especialmente no direito à honra, à privacidade, à própria imagem e à proteção da juventude e da infância».
Baseando-se neste princípio, a qualificação dos filmes (Real decreto 81/1997) e das obras audiovisuais é feita antes de sua difusão, através do Instituto de cinematografia e das artes audiovisuais (ICAA), uma entidade autônoma, mas ao mesmo tempo ligada ao Ministério da Educação e Cultura através da secretaria de Estado para a cultura (ver site www.mcu.es).
A subdireção geral de fomento à indústria cinematográfica e do audiovisual, que faz parte do ICAA, se ocupa, dentre outras funções, da classificação em faixas etárias dos filmes e das outras obras audiovisuais em vista de sua exibição pública e para a sua distribuição. A comissão se encarrega de divulgar as informações sobre os filmes e programas audiovisuais, com classificação que vai desde as «salas X» até as restrições para cada faixa etária do público.
Os filmes de caráter pornográfico não podem receber subvenções do Estado e sua projeção nas salas prevê uma taxa suplementar, destinada em parte para estimular um fundo de proteção cinematográfica. A projeção destes filmes pode ser feita somente nas «salas X», onde não podem ser apresentados outros tipos de obras cinematográficas e onde é proibido o ingresso de menores de 18 anos.

CINEMA NA TV

Devido ao alto consumo de programas de televisão por parte dos menores e levando-se em conta as diretivas da União européia, que promovem a auto-regulamentação no âmbito nacional das emissoras de tv e a participação das famílias nesta obra educativa, há alguns anos estão em vigor na França, na Holanda, na Grã-Bretanha, na Grécia e na Itália os códigos de sinais, que servem para identificar tanto os filmes projetados na salas de cinema como aqueles transmitidos na televisão. A tutela dos menores no âmbito da televisão foi também feita adotando-se o chamado sistema «watershed» (separador das águas), que funciona segundo uma seleção de faixas horárias protegidas, algumas aconselhadas à visão dos menores, outras aconselhadas a todos e outras ainda, principalmente na programação noturna, indicadas somente a um público adulto.
A faixa de idade determinada pela classificação preventiva dos filmes tem obviamente uma repercussão na programação das chamadas faixas horárias protegidas ou distintas nas emissoras de televisão pública em todos os países europeus. A definição das linhas de conduta comuns está à base dos acordos de auto-regulamentação e de co-regulamentação dos programas de televisão, estabelecendo-se um código de procedimento comum para as emissoras tanto públicas como privadas. Criou-se assim uma base normativa, que é assumida pela autoridade do Estado e que recebe a confiança dos consumidores das emissoras públicas ou privadas que adotam este sistema de auto-regulamentação.
Para tornar visível aos adultos as classificações dos programas apropriados aos menores, muitas emissoras européias adotaram um sistema de sinais que através de símbolos, números, cores e sinais acústicos advertem ao público a respeito daquilo que está para ser transmitido.
Mas, apenas este sistema, assim como o de filtragem (tipo v-chip), não basta para garantir uma verdadeira tutela dos menores diante de um conjunto de imagens difíceis de serem decodificadas por um jovem. Deve-se pensar às imagens de guerra dos telejornais, dos filmes escabrosos ou às informações sobre os crimes hediondos, que muitas vezes têm como ambiente o próprio núcleo familiar.
É na colaboração entre Estado, produtores de programas audiovisuais e famílias que pode ser fundamentado um autêntico respeito dos menores que encoraje o crescimento positivo da criança em base aos valores fundamentais da pessoa humana.

4) CELULARES COM VÍDEO

Hoje a difusão dos celulares com vídeo chegou à Itália ao índice se 134%, o que significa que muitas pessoas possuem pelo menos dois celulares, inclusive os jovens e as crianças, que recebem este instrumento dos próprios pais. De fato, de duas crianças entre 8 e 13 anos de idade, uma delas tem um celular no bolso. Aquele que poderia ser um instrumento para controlar melhor os deslocamentos e as necessidades dos filhos, se revela no entanto um perigoso meio que pode expor a outro tipo de utilização por parte dos menores, que não se separam nunca do próprio celular, nem mesmo durante as aulas, como lamentam vários professores. Apesar do código de auto-regulamentação assinado pelas principais operadoras (Código de conduta para a oferta de serviços a pagamento em tutela dos menores), na realidade os novos serviços opcionais do celular o tornaram um «personal computer» capaz de permitir novos usos que antes não tinham.
Os desenvolvimentos tecnológicos que estão se verificando no campo da telefonia móvel – particularmente no que se refere à sinergia com a internet e a adoção dos sistemas DVB de vídeos-telefone – contribuem a aumentar a oportunidade de comunicação também para as novas gerações e, ao mesmo tempo, repropõem em novos termos a questão da tutela dos menores. As evoluções já previstas ulteriormente para os próximos anos e o número sempre crescente de pessoas envolvidas, pedem uma grande consciência social e uma constante atenção das pessoas e órgãos encarregados de garantir os direitos dos cidadãos.
Neste contexto devem ser reafirmados os direitos dos menores no campo da comunicação, dentre os quais certamente não está em último lugar aquele que se refere também à segurança diante dos riscos de indução a comportamentos ilícitos ou de acesso a conteúdos nocivos ou indesejados. Também neste campo é essencial o papel dos pais e, em geral, de todos aqueles que são chamados a ter uma função educativa. A maior segurança das crianças e dos jovens quanto ao acesso a conteúdos ilegais é um ponto que deve merecer atenção também através da maior conscientização dos pais e das mães, que devem se capacitar a conhecer e utilizar estes meios.
Para a «alfabetização» dos pais na utilização da mídia devem colaborar também as instituições públicas, promovendo um uso positivo das novas possibilidades tecnológicas. Às empresas cabe a responsabilidade de colocar no mercado um produto que dê garantias no que se refere à sua utilização pelos menores, superando os limites estabelecidos pelo código de auto-regulamentação assinado pelas operadoras de celulares. Devem também oferecer maiores informações aos adultos que assinam um contrato de utilização, como por exemplo a adoção de bloqueios automáticos de acesso a conteúdos nocivos, se o celular passa às mãos de um menor de idade.

5) VIDEOGAMES

Trata-se de uma indústria global, que conquistou os jovens e não apenas eles. Os números relativos à difusão repentina dos videogames indicam que existem 250 mil sites de videogames, cada um deles propõe uma série de títulos, muitos deles recheados de cenas de sexo e de violência. Uma pesquisa recente do Instituto italiano de medicina social (IIMS) coloca em evidência, entre outras coisas, a escassa informação por parte dos adultos a respeito dos videogames utilizados pelos filhos, o predomínio de temas violentas em mais de 30% de títulos não aconselhados aos menores, o predomínio de personagens virtuais normais que podem se tornar especiais, realizando ações extraordinárias.
Mas, o ponto de risco mais elevado se refere aos pequenos jogadores de videogames, crianças entre seis e nove anos de idade que se submetem a entrar tão intensamente no jogo virtual que chegam a formas de dissociação da realidade e solicitam um monitoramento muito atento da parte dos adultos. A mesma pesquisa indica a presença de videogames em 25% das famílias com crianças de três a cinco anos de idade e em 65,2% das famílias com crianças entre seis e 10 anos de idade. O que produz efeitos negativos no âmbito cognitivo das crianças não parece ser especificamente o meio, mas muito mais os elementos que criam a excitação, tais como a velocidade de produção do estímulo e da resposta, a velocidade das imagens, os efeitos especiais, os contrastes, a fragmentação da história, o binômio rumor-ação. O uso prolongado do jogo inibe, segundo alguns psicólogos, a área da capacidade crítica, provocando passividade e ao mesmo tempo agressividade na criança. Mas, não queremos demolir os videogames, porque existem aqueles que são muito adequados aos mais jovens, com valores de informação e de educação, seja também porque o uso deste meio é na realidade um passo na preparação da criança ao sucessivo e mais sofisticado, que é o uso da internet.
De qualquer maneira, os dados relativos à venda destes produtos de entretenimento mostram um crescimento em todos os lugares e a difusão deste meio é acompanhada de uma aceitação social (ou seria uma resignação?) sempre maior.
É urgente ampliar o percurso de conhecimento e das estratégias internacionais, para monitorar um mercado que está cada vez mais vasto. Parece urgente estabelecer modalidades operativas para o controle dos conteúdos e do sistema de sanções, seja para o produtor como para o vendedor dos serviços. O código de auto-regulamentação Pegi (derivado em 2003 do sistema de avaliação e classificação holandês, Nicam, que assinala os conteúdos inadequados aos menores), adotado pelos industriais de «entertainment» que produzem videogames, é a única forma de auto-regulamentação existente atualmente e que prevê sanções (raramente aplicadas, mesmo diante de casos graves evidentes) para os produtores que colocam no comércio os jogos com indicações de faixas etárias apenas aproximativas.
O código Pegi, ao qual a associação européia Isfe adere em 2002, é evidentemente insuficiente na sua função declarada de «fornecer aos consumidores as informações mais oportunas» e expostas no selo de produção. E, como o setor dos videogames tem hoje um volume de negócios que ultrapassa os 740 milhões de euros, envolvendo 24 milhões de jogadores (43% da população a partir dos quatro anos de idade), com uma venda dos produtos classificados para maiores de três anos de idade que chega aos quase 48% dos consumidores. É um dado que define o impacto deste gênero de meio sobre a infância e a adolescência, mostrando toda a sua periculosidade, seja pelo consumo de conteúdos inadequados, seja pelo excessivo número de horas dedicado neste passatempo, muitas vezes solitário e sem a presença de um adulto ao lado. Se for verdade, como sustenta a indústria, que a produção de videogames violentos é apenas uma mínima parte do mercado, é também verdade que esta representa a fatia mais importante do retorno econômico.
O interesse pelos videogames é alimentado pela sinergia com os filmes que inspiram o jogo homônimo e que torna sempre mais atrativo este gênero, principalmente para os adolescentes. Desta maneira é importante também neste campo o estabelecimento de regras precisas em defesa dos consumidores dentre o público jovem, mais exposto aos riscos destas novas formas de entretenimento cada vez mais sofisticadas e envolventes, por causa da combinação entre narrativa e efeitos gráficos.

6) PUBLICIDADE

O problema da tutela dos menores diante da publicidade se apresenta como um corolário, dentro do quadro mais amplo que regulamenta a difícil relação entre a mídia e as crianças. A televisão, e portanto também a publicidade, se constitui em uma fonte de perigo para os menores, isto é, para a maior parte das crianças, principalmente em idade pré-escolar, que devem saber fazer a diferença entre a publicidade e o resto da programação, e entre os programas de ficção e a realidade. Com essas considerações não significa que exista uma acrítica rejeição da publicidade em si mesma – à qual se reconhece, no entanto, onde proceda corretamente, uma função positiva no processo de formação, de crescimento crítico e de socialização do menor –, mas existe a necessidade de prever um sistema de regras destinado a garantir-lhe um uso adequado.
O efeito dos anúncios publicitários é tão grande que em alguns países estão sendo tomadas medidas drásticas a respeito. No Reino Unido, por exemplo, recentemente foram vetados os anúncios publicitários durante os programas destinados às crianças até nove anos de idade, a partir de 1º de janeiro de 2008 a medida se estenderá à programação para os jovens até 15 anos de idade e até o final de 2008 serão vetados em todos os canais dedicados aos menores. Apesar de se reconhecer que a publicidade serve para financiar os programas, aqueles dedicados às crianças terão que recorrer a outras fontes. Também na França começa a se impor uma «linha dura» a esse respeito: visto a alta incidência de publicidade de merendas, de sucos e doces em geral, a partir de agora os anúncios dedicados às crianças deverão ser precedidos de uma espécie de aviso, que orientará para uma alimentação adequada.
Mas, por que as crianças são tão frágeis diante dos apelos da publicidade? Na Itália, explica Paolo Landi, secretário geral da Adisconsum (Associação de defesa dos consumidores e do ambiente»), em um capítulo de seu estudo «Crianças da multimídia»: «Se consideramos que a publicidade não faz outra coisa que veicular um conhecimento imediatamente concretizável em um “ter”, ou em um “ser”, ou em um “fazer”, a criança absorve sem dificuldades os três componentes que são a obsessão dos expertos de marketing, isto é, o componente cognitivo (como fornecer informações indeléveis sobre um produto ou um serviço), o componente afetivo (como fazer o consumidor reagir de maneira emotiva) e o comportamental (como colocar o pequeno consumidor em movimento na direção da aquisição). A partir deste ponto de vista a criança é o público ideal, o consumidor a quem se pode vender qualquer coisa».
Na Itália está em vigor um código de autodisciplina publicitária que surgiu em 1966, em base a um acordo entre os profissionais do setor. Esta primeira forma de tutela, em grande parte com origem comunitária, tem como protagonistas entidades administrativas independentes: a Autoridade de controle da concorrência e do mercado de setor e a Autoridade de garantia para as comunicações e a editoria. Enquanto isso, para a auto-regulamentação, orientada pelas normas que constam do Código de autodisciplina publicitária, e agora também, embora com força jurídica diferente, pelo Código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual se reconhece um poder de decisão e de sanção, emanando uma ordem e intimando seu cumprimento.
Em todos os países onde a televisão serve de veículo às mensagens publicitárias, o mundo empresarial é plenamente consciente do enorme poder de influência que a publicidade tem sobre as crianças.



NORMATIVA INTERNACIONAL

O assunto relativo à tutela dos menores na mídia é um dos mais debatidos, seja no que se refere às normas nacionais, seja no âmbito internacional. Encontra-se diante da situação de precisar acertas as contas com toda a extensão da rede global da internet. O exemplo que, neste momento de transição, coloca mais em evidência a necessidade de estabelecer leis que estejam em condições de controlar o acesso e uso dos conteúdos nocivos para os menores, é exatamente o da internet. Qualquer pessoa no mundo pode abrir um site considerado «arriscado», contendo elementos ilegais e acessíveis a consumidores despreparados, disponibilizados por quem está do outro lado do mundo.
No que se refere aos princípios gerais no âmbito do direito internacional, é preciso recorrer principalmente à convenção da ONU sobre os direitos da criança, com sede em New York, ratificada pelo Parlamento italiano através da lei nº.176/1991. Esta garante à criança uma «consideração proeminente» também a respeito da liberdade, seja no se refere à expressão, seja quando tutela os conteúdos recebidos. Esta mesma convenção, em seu artigo 17, fala da relação entre menor e televisão, desejando «um sistema normativo que tutele o menor-consumidor, mesmo com todas as dificuldades que se apresentam», seja para individuar os fenômenos que devem ser monitorados, seja sobre as normativas possíveis.
No direito da União européia, tal tutela foi recentemente confirmada pela Carta dos direitos fundamentais da União, aprovada em Nice em 2000, cujo artigo 24 salienta que «os Estados membros reconhecem a importância da função exercida pelos meios de comunicação de massa e cuidam para que a criança possa ter acesso às informações e materiais... com a finalidade de promover o seu bem estar social, espiritual e moral, além de sua saúde física e mental». A normativa seguinte, 89/552/CEE, previu algumas restrições, seja no que se refere aos programas como para as mensagens publicitárias destinadas a este público». O artigo 22 desta normativa conduz a impedir a transmissão de programas que contenham cenas pornográficas ou de violência gratuita, ou outros programas inadequados a este público. Não podemos esquecer de mencionar a determinação expressa de «Televisão sem fronteiras», que está hoje em sua quinta versão atualizada, que o tema da tutela dos menores está relacionado com o estatuto geral dos direitos dos menores e corresponde ao disposto nos artigos 50 e 31 da Constituição italiana.
Se for claro que os princípios normativos são todos a favor da tutela dos menores, é também verdadeiro que uma tecnologia em contínua evolução colocou em crise as velhas regras do jogo. Mas também é claro que não se pode mais adiar a necessidade de estabelecer novos parâmetros normativos, para que as crianças possam utilizar os meios de comunicação próprios de seu tempo, com aproveitamento e serenidade também para as famílias.~

EDUCAÇÃO À MÍDIA NO MUNDO: PARA SABER MAIS

A difusão da educação à mídia é uma resposta à necessidade de se informar sobre as novidades no campo dos novos meios de comunicação. Em seguida citamos apenas alguns sites que em vários países oferecem maiores informações sobre como aprender a usar melhor a mídia, enfrentando a problemática da tutela dos menores e da alfabetização às novas tecnologias por parte dos adultos.
«The Media Awareness Nework-Réseau éducation médias» é uma organização canadense sem fins lucrativos, pioneira no desenvolvimento de programas sobre a educação à mídia. Com esta finalidade ela produz programas online em colaboração com organizações internacionais, convicta que, para interpretar as mensagens de informação, de entretenimento e comerciais, os jovens têm necessidade de instrumentos críticos válidos. Por isso é importante formar também os adultos (famílias e professores) sobre como funciona a mídia e como ela determina o estilo de vida.
A organização realiza uma ação contínua de monitoramento em relação à mídia (televisão, cinema, videogames, imprensa, publicidade, etc.), e sua seção dedicada aos pais oferece uma série de elementos para que estes reflitam com os filhos sobre esses meios, além da seção para os educadores, que inclui lições e materiais de apoio. Uma outra seção é dedicada à análise das questões ligadas à mídia, como a difusão de estereótipos, as representações de violência e da diversidade, a privacidade, a publicidade dirigida aos menores. Seu site é em inglês e francês (http://www.media-awareness.ca).
«Quai des images» é o site dedicado ao ensino de cinema e audiovisual organizado pelo Ministério da Educação francês. Ele propõe atividades ligadas à educação à imagem e de análise dos filmes em consonância com os programas escolares, agrupa os textos oficiais a respeito dos meios audiovisuais, oferece uma série de instrumentos de análise e de estudo completos sobre alguns filmes específicos e sobre certos autores em particular, informa sobre conferências, seminários, cursos e festivais sobre o mundo audiovisual e sua utilização em âmbito educativo e didático. Entre outras coisas, reúne também as propostas e as experiências feitas por professores e seus alunos nas escolas secundárias francesas no campo da educação à imagem, além de organizar um fórum de discussões aberto a todos sobre a educação à mídia (http://www.ac-nancy-metz.fr).
Sempre na França, está em funcionamento o blog «Zéro de conduite», organizado pelos professores e destinados a educadores, pais e estudantes. Promove o uso do cinema como instrumento pedagógico, dedicando-se especialmente à atualidade cinematográfica, mas sem esquecer os clássicos e os documentários. Com várias seções e espaços de aprofundamento, se propõe como um local de discussão de temas em um debate aberto (http://cinema-ducation.fluctuat.net).
A Universidade de Massachussetts organizou o Media Education Foundation – MEF, mídia de desafio, que produz e distribui documentários destinados a estimular o pensamento crítico e o debate sobre a relação entre aqueles que detêm o poder sobre a mídia, os conteúdos da mídia comercial, a exigência democrática de um livre fluxo de informações, as diversas representações de idéias e pensamentos e o direito dos cidadãos de informar e serem informados. Alguns destes temas são abordados criticamente, como a identidade do gênero na publicidade, a imagem de sexo nos videoclipes, o papel da mídia na construção da identidade cultural, mídia e saúde, etc. (http://www.mediaed.org/).

(a cura di M. F. D’A.)

 
At 9/17/2007 2:42 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

AS CRIANÇAS E A MÍDIA (II PARTE):
ACEITAR O DESAFIO EDUCATIVO


O tema da 41ª Jornada das Comunicações Sociais, «As crianças e os meios de comunicação: um desafio para a comunicação», nos convida a refletir a respeito de dois aspectos particularmente importantes. O primeiro é a formação das crianças, para que estejam em condições de receber de maneira crítica aquilo que vêem. O segundo é a formação à consciência e ao uso consciente da mídia, que está em contínua transformação tecnológica.
De fato, é o que especifica Bento XVI no início de sua mensagem, de 20 de maio de 2007, para a Jornada: «Os complexos desafios que a educação contemporânea deve enfrentar são muitas vezes ligados à grande influência dos meios de comunicação no nosso mundo. Como aspecto do fenômeno da globalização e estimulados pelo rápido desenvolvimento da tecnologia, os meios de comunicação delineiam fortemente o ambiente cultural (cf. João Paulo II, O rápido desenvolvimento, nº3). Na realidade, há quem afirma que a influência formativa da mídia está em competição com aquela da escola, da Igreja e, quem sabe, até com aquela da própria família».
De fato, como salienta o Pontifício conselho para as Comunicações Sociais, «para muitas pessoas, a realidade corresponde àquilo que os meios de comunicação definem como tal». Episódios recentes, como a utilização do celular na filmagem de violências nas salas de aula, abusos sofridos por pessoas deficientes, fenômenos de trote e de violência generalizada, demonstram como as crianças que crescem passando uma média de quatro horas por dia diante da televisão, sozinhos em casa, absorveram a lógica do «estou no vídeo, logo existo». Os psicólogos, os pedagogos e os estudiosos dos meios de comunicação estudam há tempos sobre as relações entre o consumo televisivo e o comportamento violento dos menores. Uma grande quantidade de pesquisas realizadas em muitos países ocidentais demonstra como esta correlação seja realmente inegável.


NOVAS LINGUAGENS

O fato que muitas crianças vivem completamente inseridas no mundo dos velhos e novos meios de comunicação, que estão cada vez mais frequentemente em correlação entre eles, é confirmado pela popularidade de alguns modelos televisivos, considerados tão efêmeros quanto penosos «momentos de glória», presentes nos programas com os maiores índices de audiência, dos «reality» aos «talk show», sem falar do «trash», que hoje se tornou um gênero de espetáculo.
Dentre as preferências demonstradas pelos adolescentes italianos que assistem televisão mais do que três horas por dia, encontramos, em primeiro lugar, a figura da «veline» (Ndt: misto de corista e coadjuvante na apresentação de programas populares da televisão italiana), enquanto outros da mesma idade se concentram no mais clássico exemplo, o do jogador de futebol. De toda maneira, a coisa mais importante é aparecer, pouco importa por qual motivo, de ser «alguém» ou «alguma coisa» no Olimpo mediático, mesmo que seja apenas por um instante.
Estes são os exemplos mais negativos dos condicionamentos derivados de um excessivo e acrítico uso dos meios de comunicação. Encontramo-nos diante de uma nova geração que cresceu na frente da televisão, capaz de usar as novas tecnologias que os próprios pais, que as adquiriram e as tornaram disponíveis, muitas vezes se encontram despreparados para utilizá-las.
Tanto é verdade que hoje em dia os filmes são vistos diretamente nos celulares e a televisão pode ser assistida na tela do computador. Hoje se telefona através da internet e graças ao download se descarrega os CDs e DVDs mais recentes, se filma e se faz foto com o celular, e assim por diante.
Nas casas, o vocabulário familiar se reduziu ao gênero dos sms e se fala tendo o som da televisão no fundo, se comunica através de e-mail, se faz «visita virtual» via computador, se percorre através de bibliotecas virtuais, tanto que as fichas e arquivos de papel evocam imagens do outro século, completamente em desuso.
A situação dos nossos filhos é diversa daquela da geração precedente, pois eles abriram seus olhos tendo diante de si estes cenários de profunda, contínua e envolvente transformação tecnológica. Eles se constituem aquela que os estudiosos chamam de geração nascida «com seis dedos»: além dos cinco dedos normais da mão, o sexto é o mouse do computador.
Com o aparecimento do mundo «virtual» da internet e dos videogames criou-se uma defasagem em relação à realidade verdadeira e própria. As duas dimensões parecem muitas vezes, e para muitos jovens, como universos paralelos, com conseqüências não indiferentes no plano do processo de amadurecimento. Têm grande sucesso os sites nos quais se prevê uma segunda vida (basta verificar os milhares de registros nos poucos meses de existência do site italiano de «Second Life», que em todo o mundo já tem sete milhões de inscritos), onde a simulação reproduz todas as situações da vida real. Apenas que tudo é falso, a começar da nova identidade, que pode ser escolhida e com ela se inicia a fazer parte deste mundo fora do mundo, onde se pode ser um «qualquer coisa». Isto é, ninguém.
Assim, o grande desafio cultural de hoje é propriamente a redefinição dos limites, que muitas vezes se apresentam demasiadamente instáveis. Isto é, redefinição dos limites entre o real e o virtual, superando a divisão digital que hoje separa as gerações adultas daqueles mais jovens.


OS JOVENS: PROTAGONISTAS OU VÍTIMAS DAS MUDANÇAS?

A linguagem deles é pobre, muitas vezes recheada de termos tirados do dicionário do internauta: clicar, chatar, messagiar, deletar, são alguns dos neologismos que fazem parte de seu vocabulário quotidiano. Falta uma dimensão humana da tecnologia que esteja em condições de traçar o perímetro cultural entre o real e o virtual. Assim a aldeia global difundiu uma quantidade de modelos comportamentais desviados, ou pelo menos discutíveis.
Desta maneira, os jovens que vivem a milhões de quilômetros de distância jogam o mesmo videogame, vêem o mesmo filme, assim como, de maneira transversal, absorvem modelos e comportamentos semelhantes. Muitas vezes os adultos têm menos domínio no uso das novas tecnologias e observam, com uma preocupação resignada diante de suas próprias limitações, as crianças que navegam facilmente na internet.
As raízes das dificuldades neste campo educativo são muito bem explicadas por Marina D’Amato, professora de sociologia da Universidade de Roma, que salienta: «Cada geração tem necessidade de se encontrar também em um mundo fantástico, que serve a interiorizar o paradigma do bom e do belo, do justo e do errado, do oportuno e do útil, também em relação aos exemplos que procedem da narrativa. Hoje nos encontramos em uma condição na qual os avós e os pais contam cada vez menos histórias aos filhos e aos netos, e este papel foi assumido pela televisão. Mas, na realidade, a televisão “exila” e “con-funde”, isto é, funde os modelos morais que são frutos de ânsias e problemas mal resolvidos, muito mais que de certezas. Embora estes se transformem com freqüência, a cada três ou quatro anos, o fato de serem repropostos continuamente faz com que se justaponham uns aos outros» (ver Come mediare i media, de Mario Russo).
Se for verdade que a televisão é o meio mais usado até a adolescência, imediatamente depois surge a grande atração pela internet. Esta passagem nasce de uma sintonia com a linguagem televisiva, que na idade infantil muitas vezes é ouvida durante muitas horas no dia. Esta linguagem se baseia em uma mediação da realidade e desta maneira ela ativa um processo de recepção que é de tipo emotivo.
Neste registro emocional é mais fácil acabar envolvido por situações e figuras capazes de se proporem como modelos identificadores, preservadores de sentido e de comportamentos a serem imitados.
O poder de concentrar uma vontade emulativa em alguns personagens, que correspondem particularmente às necessidades interiores do jovem (necessidades na maioria das vezes induzidas pela publicidade ou por modelos estimuladores), tem uma forte relação com a quantidade de horas que o jovem passa utilizando os novos ou os velhos meios de comunicação.


EDUCAÇÃO NECESSÁRIA

«A formação adequada a um uso correto dos meios de comunicação é essencial para o desenvolvimento cultural, moral e espiritual das crianças… Educar as crianças a serem seletivas no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja, da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos. Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia, com a certeza de que este difícil, embora gratificante, aspecto da condição de pais, é apoiado por toda a comunidade.»
As palavras do discurso de Bento XVI definem com grande clareza o paradigma de uma justa relação entre a mídia e os menores. Uma clareza que devemos agradecer ao magistério da Igreja, no momento em que o mundo da mídia parece ignorar a verdadeira problemática educativa das crianças e as expectativas de qualidade e de segurança exigidas pelas famílias no que se refere ao uso desses meios, seja do cinema aos videogames, da televisão à internet.
Diante da utilização destorcera do meio televisivo, o mais difundido dentre os meios de comunicação, a Igreja se interroga sobre o porquê da televisão não ter um papel educativo e por que os meios de comunicação não podem ser companheiros confiáveis para os jogos na fase de crescimento da criança. O anúncio de uma recente campanha sobre o uso da mídia, promovida pelo Ministério das Comunicações, mostra os vários membros da família que estão vendo a televisão ao lado de uma criança.
Que se trate do avô ou da mãe, a mensagem é a mesma: não deixar uma criança sozinha diante de um meio que, sem o apoio crítico educativo de um adulto, pode transmitir conteúdos inadequados à idade e à maturidade daquele que o vê. Sem esquecer as responsabilidades dos produtores televisivos, empenhados na organização dos programas, o papel da família é realmente insubstituível.
Se realmente o objetivo de quem administra a sociedade de produção televisiva, ou das multinacionais produtoras de videogames ou das operadoras de celulares, é o de promover e vender o produto, o bem estar psicofísico da criança está no centro do interesse dos educadores, sejam eles os professores ou, em primeiro lugar, os pais.
Isto explica bem a mensagem do Papa, que continua a sua análise, salientando que «educar as crianças a serem seletivos no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja e da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos (ver João Paulo II, «Familiaris Consortio», 76). Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia.»


CONTEÚDO DA MÍDIA

No panorama de uma revolução da multimídia, que está modificando transversalmente os hábitos, a mentalidade, os modelos e as linguagens, deve voltar ao centro do debate a tutela daquilo que é melhor para os menores. Sem acusar a «mídia», que enquanto tal não é nem boa nem má, o importante é partir de uma a análise do produto, para assim poder individuar conteúdos que sejam de melhor qualidade para as crianças e os adolescentes. Porque a televisão é um instrumento que abre janelas de conhecimento para o mundo e, se bem utilizada, de «má professora» pode se tornar uma preciosa fonte de estímulo para o crescimento humano e cultural.
A mesma coisa vale, e com mais razão, para a «rede» que engloba e compreende tudo, e para os videogames, onde, ao invés de violência e monstros, poderia se dedicar a produzir (e isso já ocorre em certos casos) histórias instrutivas e de conteúdo interessante.
Bento XVI coloca justamente em evidência as enormes possibilidades para que seja melhorado o conteúdo deste grande campo de produção multimídia: «A educação através da mídia deveria ser positiva. Colocando as crianças diante de um meio estética e moralmente excelente, estas recebem uma ajuda para que desenvolvam a própria opinião, a prudência e a capacidade de discernimento. É importante aqui reconhecer o valor fundamental do exemplo dos pais e as vantagens de introduzir os jovens aos clássicos da literatura infantil (…). A beleza, quase um espelho do divino, inspira e vivifica os corações e as mentes juvenis, enquanto a feiúra e a vulgaridade têm um impacto deprimente sobre os comportamentos». Diante de uma decadência geral do produto televisivo, a questão da qualidade aparece ainda mais forte e vibrante em grande parte de um público formado de famílias, que pede para não ser apenas um exército indistinto de ouvintes silenciosos, mas um público em condições de exprimir suas preferências por conteúdos formativos e informativos de bom nível.
A mensagem de Bento XVI continua, com algumas importantes indicações: «Como a educação em geral, aquela da mídia requer também uma formação ao exercício da liberdade. Trata-se de uma responsabilidade que compromete. Muitas vezes a liberdade é apresentada como uma incansável procura do prazer ou de novas experiências (…). Este desejo, sentido profundamente pelos pais e educadores, que é o de educar as crianças no caminho da beleza, da verdade e da bondade, pode ser apoiado pela indústria da mídia somente na medida em que se promove a dignidade fundamental do ser humano, o verdadeiro valor da vida familiar, as conquistas positivas e as metas da humanidade. A partir disso, a necessidade de que os meios de comunicação estejam empenhados na efetiva formação e no respeito da ética deve ser vista com interesse particular e com urgência não apenas pelos pais, mas também por aqueles que têm responsabilidade cívica».
Na realidade, nos encontramos na situação de ter que reconhecer que na Itália falta uma verdadeira «cultura da criança»: a situação é tão séria que no âmbito institucional procura-se dar uma nova organização geral para verificar e controlar os conteúdos dos setores de entretenimento, como os videogames, que até agora estão submetidos apenas a códigos de auto-regulamentação, feitos e codificados para uso e consumo pelas indústrias produtoras.
Uma vez mais, o primeiro e indispensável apoio à criança só pode vir da família e de uma relação mais estreita com os professores e educadores, exatamente como salienta Bento XVI, lembrando-nos que a preocupação educativa dos pais não deve se tornar uma preocupação genérica, mas uma atenção constante a tudo aquilo que diz respeito aos filhos.

A INDÚSTRIA DA MÍDIA

1) A TELEVISÃO

Se a televisão convencional se apresenta como um ramo de atividade já «maduro», no entanto se apresenta no horizonte a situação da mídia digital (satélite ou a cabo), também como uma plataforma que consente a ligação entre televisão, internet e outro tipo de mídia através do computador. No que se refere à qualidade da programação, apesar dos inúmeros bons propósitos anunciados no âmbito institucional, parece pequena a atenção às exigências dos menores em suas diversas faixas etárias. A programação para os menores, na realidade é confinada em redes e horários particulares, enquanto o resto da programação na faixa horária considerada «para todos» muitas vezes apresenta conteúdos inadequados aos jovens. Mas, quais são as expectativas das gerações de jovens no que se refere à televisão? É realmente verdade que preferem o «trash», os jogos com prêmios absurdos e as «velines»?
A partir de uma pesquisa recente feita pelo instituto Censis sobre «Comunicação, pluralismo social, sociedade aberta» (2005) surge que a relação entre os menores, e em particular dos adolescentes entre os 14 e 18 anos de idade, e a televisão é determinada por elementos de forte contradição e de passividade. Nessa faixa etária, 100% deles vêem televisão praticamente todos os dias, 86% acompanham um pouco de tudo, com uma relevante predileção pelos filmes (72%), por esporte (32%) e pelos «reality shows» (18%).
No entanto, a amostragem entrevistada não está realmente satisfeita com aquilo que vê. De fato, 36% dos adolescentes denunciam a vulgaridade difundida nos programas e 25% criticam a superficialidade. Dentre eles, 46% consideram a televisão como um meio que «invade», ao mesmo tempo em que é interessante notar que 25% consideram que em geral a programação televisiva alimenta nas crianças menores uma visão consumista da vida. Destes dados surge o contraste entre a procura de distração e a reprovação daquilo que lhes é proposto pela programação. Isto significa que o alto índice de procura não é um indicador de satisfação.
Considerando o axioma de que a televisão seja onipresente, fica claro que são os próprios jovens a pedirem uma maior atenção aos conteúdos: menos violência e menos vulgaridade. A exigência de uma regulamentação diversa, diz claramente o relatório do Censis, «não vem somente daqueles, pais e educadores, que estão preocupados pela possível influência negativa sobre os menores, mas se exprime nitidamente também através dos adolescentes, pelo menos de uma parte mais esperta e consciente dentre eles».
Para tutelar melhor os direitos dos menores, desde 2002 foi instituído junto ao Ministério das Comunicações um código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual aderiram os produtores de televisão, seja no âmbito nacional como local. Baseando-se nos princípios sobre a matéria existentes na Constituição italiana e na Convenção dos direitos da criança, estabelecida em 1989 pela ONU, a comissão que controla sua aplicação avaliou em todos estes anos de atividade os milhares de casos em que foram violadas as normas de tutela, que prevêem a transmissão de programas e imagens adequadas a um público de menores de idade durante aquela que é chamada de «faixa protegida» da programação televisiva (das 7h30 às 22h30), intervindo com denúncias e sanções, que nos casos mais graves foram aplicadas pela Autoridade de garantia no setor das comunicações. Para o futuro, esta comissão deverá se transformar em um organismo mais amplo de controle, que se chamará «Mídia e menores», que além da televisão deverá monitorar também os setores dos vídeos-telefone e dos videogames, além da internet, que é o campo de maior risco.

REGRAS DE TUTELA EM OUTROS PAÍSES

É diversa a situação em outros países, como por exemplo na Grã Bretanha, onde o sistema de regulamentação da mídia é estruturado e complexo e foi atualizado nas últimas décadas, com uma particular atenção à tutela dos menores. As inovações tecnológicas neste setor levaram as normativas inglesas a uma série de novas disposições, como por exemplo, a visão em casa de vídeo exclusivamente para adultos, e que fora de casa seriam vetados aos menores, ou o combate à praga mundial dos sites internet para os pedófilos, que contenham material pornográfico ou com conteúdos que possam esconder o aliciamento de menores (ver a Protection Childres Act, de 1978).
A programação televisiva é regulamentada pelo Broadcasting Act (1996), de onde deriva a instituição da Broadcasting Standard Commission (BSC), um órgão independente de controle que estabelece as normas de avaliação e classificação dos programas, também no que se refere aos conteúdos violentos ou que possam ofender a decência pública (site oficial www.bsc.org.uk). Este organismo BSC funciona internamente à estrutura do Broadcasting, supervisionando e regulamentando todas as emissoras de televisão e de rádio, via cabo ou por satélite. Sua tarefa é a de elaborar os códigos de conduta e de aplicação de modelos que respeitem a justiça, além de monitorar os modelos, verificando que respeitem as leis. Com a transmissão de programas com conteúdos considerados inadequados aos menores de várias idades, há alguns anos a televisão inglesa adotou o sistema «watershed», um «separador de águas» entre um horário de programação familiar e outro para os adultos. Todo o sistema televisivo inglês se apóia sobre a responsabilização das famílias, pois sem a colaboração delas qualquer código de modelos para os programas é praticamente inútil.
Na França, está vigorando já há anos um código através de sinais televisivos, que entra em função para assinalar os programas inadequados aos menores. A avaliação do programa televisivo é feita pelo Conseil Supérieur de l’Audiovisuel (CSA), uma autoridade administrativa independente, que controla a difusão dos filmes e outras transmissões em vários canais privados, nacionais, regionais ou locais. A normativa francesa (lei 719/2002) veta a transmissão de programas que possam prejudicar gravemente a integridade física, mental e moral dos menores, porque divulgam conteúdos de pornografia ou de violência gratuita. As transmissões são classificadas por um código de sinais que, em conjunto com um sistema organizado de faixas horárias de programação, garante às famílias mais clareza sobre os programas destinados aos menores.
Na Alemanha, o tema da infância tem particular atenção da legislação, que considera desde o nascimento o início dos direitos fundamentais do cidadão. A tutela é disciplinada no âmbito público pela JSchG (desde o dia 26 de fevereiro de 1985), enquanto a lei GjSM se ocupa do controle sobre a difusão de publicações e conteúdos mediáticos considerados danosos para os menores. A regulamentação no setor televisivo é feita segundo as normas do acordo sobre a radiodifusão dos Lander federais, que as entidades para a mídia nesses Lander adotaram por base para o estabelecimento das diretivas que tutelam o interesse dos menores nas emissoras privadas. Não são admitidas transmissões que incitem o ódio racial, que exaltem a violência ou a guerra, que ofendam a dignidade do homem, que sejam de gênero pornográfico, que mostrem pessoas moribundas ou com sofrimentos que ofendam a dignidade humana. Os responsáveis pela programação, escolhendo os horários das transmissões, devem cuidar para que os menores não vejam programas que podem prejudicar o seu bem estar psíquico, físico ou mental. As transmissões inadequadas às crianças menores podem ser transmitidas somente depois da autorização da entidade competente do Land interessado.
Os responsáveis pela organização dos programas televisivos em âmbito nacional devem nomear encarregados pela tutela dos menores, que atuam no momento da aquisição, da projeção e da realização dos programas. As emissoras privadas fundaram em 1993 uma associação de autocontrole voluntário da televisão («Freiwillige Selbskontrolle Fernsehen», FSF), à qual devem ser apresentados programas particulares, antes da sua transmissão, e suas avaliações consideradas nas decisões das entidades de controle da mídia nos Lander federais. Existe ainda o órgão comum do cidadão para a tutela dos menores, dos programas, da competência mediática e controle da mídia (GSJP), do qual faz parte um integrante da entidade para a mídia nos Lander federais, que dá o seu parecer a respeito de algumas séries, filmes e espetáculos mais ou menos adequados aos menores. Este órgão, o GSJP, decide sobre pedidos de mudança de horários de transmissão de filmes proibidos para menores, controla a forma de novos programas e experimenta novas disposições para a tutela dos menores na televisão digital. A peculiaridade da jurisdição alemã, seja no setor televisivo como no cinematográfico e da mídia em geral, é a minuciosa atenção às exigências com o desenvolvimento do menor e aos riscos que este pode correr com a observância incorreta das leis.
Nos Estados Unidos, é possível consultar via internet um «guia televisivo para os pais» (ver o site www.mpaa.org), que prevê algumas categorias de audiência aplicadas aos programas televisivos transmitidos a todo o público. Este guia organiza várias siglas para identificar a categoria de audiência para cada transmissão: vai-se do TVY (para todas as crianças) ao TVG (para todos), através de várias faixas etárias, que correspondem à passagem da primeira à segunda infância e desta à adolescência. Depois tem o TVPG («parental guidance», visto na presença de um dos pais), o TV14 («parent strongly cautioned», séria advertência aos pais), para os programas que contêm cenas de sexo e de violência. Enfim, há o TVMA, que prevê um «mature audience only», ou seja, destinado a um público de idade superior a 17 anos, última fronteira para os conteúdos considerados «restricted».
Estas avaliações foram elaboradas baseando-se nas opiniões dos próprios pais e são fáceis de serem encontradas e compreendidas. Esta linha de «guia de televisão para os pais» pode ser usada juntamente ao «v-chip», que é um dispositivo de filtro instalado na maior parte dos mais recentes modelos de aparelhos de televisão, para permitir aos pais de bloquear os programas inadequados.

FICHA 1
Brasil: «O que eu penso da tv»
No Brasil, a audiência infantil é muito alta: aproximadamente 30 milhões de crianças vêem televisão pelo menos durante três horas por dia. Explica a profa. Rosália Duarte, do departamento de Ciência da Educação, da PUC do Rio de Janeiro, que «as crianças são muito perspicazes, mas nós podemos e devemos ajudá-las a ampliar o seu quadro de referências, para que possam discutir ainda melhor sobre o conteúdos daquilo que vêem. Para isso temos necessidade, antes de tudo, de ouvir aquilo que elas têm a dizer sobre o assunto e de dialogar com elas. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e muito mais freqüente, a outras atividades culturais». No âmbito de uma pesquisa feita através de um questionário distribuído nas escolas, intitulado «O que eu penso da tv», apareceu que «as crianças querem seriamente ser ouvidas sobre aquilo que pensam da tv, mas sentem que sua opinião é considerada pouco importante e não estão contentes com o excesso de imagens de violência exibidas na televisão, principalmente a violência “real”, definida como aquela transmitida nos telejornais. Eles adoram ver televisão e não importa o que os adultos pensam e dizem a respeito disso. A eles agradam quase todos os tipos de programas transmitidos: novelas, desenhos animados, programas de humor, filmes, seriados, mas isso não faz deles espectadores “idiotas”, pois fazem críticas muito interessantes, pertinentes e bem elaboradas sobre o que consideram feio ou inadequado na televisão. Para a maior parte deles, a televisão se oferece como principal opção de divertimento (em alguns casos, a única), o que significa um dado muito preocupante. Mas, o que chamou mais a nossa atenção é o grau de experiência com o qual essas crianças analisam a televisão: são expertos e demonstram conhecer a televisão também do lado de dentro, inclusive as linguagens que ela utiliza, a sua estrutura de produção, a sua lógica interna e as suas maneiras de intervenção».
As crianças aprendem os valores e os não-valores através da televisão, não resta dúvida, mas demonstram ter senso crítico a respeito deste assunto, quando afirmam nos textos que os programas transmitidos na tv podem lhes ensinar «a serem bons, a ter coragem e a fazer o bem, a cuidar da natureza e de si mesmos, a serem honestos e a lutar por aquilo que desejam», mas também «a serem cruéis e mentirosos, a roubar e matar, a não respeitar os pais e a comprar tudo aquilo que não têm necessidade». Falando sobre a validade do ensino através da mídia, a profa. Duarte salienta a necessidade de «ouvir aquilo que têm a dizer sobre o assunto e a dialogar com eles. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e mais freqüente, a outras atividades culturais».

FICHA 2
Observadores internacionais
Os dados examinados em janeiro de 2006 pelo OssCom, que é um centro de pesquisa da mídia, deixam evidente a tendência a realizar uma forma de co-regulamentação, onde a ação legislativa dos Estados membros se integra com medidas de auto-regulamentação por parte dos produtores, broadcasters e profissionais da comunicação sob o efeito de controles e sanções. São dois os instrumentos mais utilizados no âmbito europeu, observando-se as diretivas previstas no artigo 22 de «Televisão sem fronteiras»: a definição de faixas horárias protegidas (watershed) e os sinais mostrados na tela (determinados por um sistema de «rating»). Apesar disso, aos campos tradicionalmente problemáticos da violência e da pornografia se juntam novos campos de risco para os menores: a vulgaridade, abusos e dependências de substâncias, linguagem e comportamento vulgares, discriminações e abusos, violações e ofensas à dignidade humana. Os critérios de avaliação dos programas se constituem um problema que é partilhado por muitos países da União européia, ao mesmo tempo em que se prepara uma uniformização internacional dos sistemas de classificação (ver mais adiante, Nicam), baseados na visualização de cinco ícones que ilustram simbolicamente qual é a problemática do programa que está sendo analisado e para quais idades ele é desaconselhado.
Deve ser assinalada a atividade online da European Medi@culture. O projeto é promovido pela Comissão Européia, em Bruxelas, no quadro das iniciativas «e-Learning», administrado pelo centro mediático de Baden-Württemberg. O site apresenta informações sobre a educação à mídia na Europa, particularmente na França, Áustria, Finlândia e Alemanha. A seção de projetos de multimídia agrupa os projetos sobre a mídia desenvolvidos por escolas e associações de jovens ao longo do tempo (ver http://www.european-mediaculture.org).

FICHA 3
África do Sul: Encontro mundial sobre a mídia para a infância
Este encontro trienal se realizou no último mês de março em Johannesburg, na África do Sul, com a participação de expertos do setor representando diversos países. Em conjunto se discutiu sobre a necessidade de uma programação adequada às crianças, procurando entender de que modo a violência na mídia pode influir sobre a psíquico dos menores.
Mas, no 5º Encontro mundial sobre a mídia para a infância apresentaram-se também muitas crianças provenientes de todo o mundo e empenhadas em discutir sobre o difícil tema da «Mídia como instrumento de paz e de democracia global». Vieram guiados por grupos de adultos, dentre eles as diversas organizações católicas que há anos trabalham para promover regras para o bem da infância, a serem respeitadas nas transmissões de rádio e televisão através de códigos de regulamentação que devem ser redigidos ou, como em alguns casos, apenas atualizados. Em muitos países do sul do mundo as novas tecnologias de multimídia já estão muito disseminadas e seu uso merece uma atenção particular para tutelar o público mais jovem.
Especialmente na África, explicou o organizador do encontro, Firdoze Bulbulia, começa-se a examinar o projeto de um «Media center» para as crianças, que possa produzir e distribuir transmissões de rádio e de televisão destinadas ao público mais jovem, com o objetivo de realizar um canal televisivo pan-africano dedicado à infância. Os organizadores do encontro estão também trabalhando no projeto de uma aliança africana dos meios de informação e de comunicação, seguindo o modelo daquela já existente na América latina.

2) INTERNET

Na Itália, 47% das famílias italianas têm um computador em casa, um dado relevante mas sempre muito baixo em relação à média dos outros países europeus. O uso da internet por parte dos adolescentes e jovens, e a familiaridade que têm com tudo aquilo que pode ser digitado ou «descarregado» da internet, apresenta não poucos problemas. Pela sua própria natureza de rede de comunicação global, o problema se apresenta em ótica internacional, procurando garantir a tutela dos menores através de precisos acordos com os provedores para um efetivo controle de conteúdo. No campo italiano, até 2006, a tutela dos menores tinha sido deixada nas mãos dos próprios provedores, que em 19 de novembro de 2003 assinaram um acordo de auto-regulamentação: o Codice Internet e Minori. Embora o acordo tenha sido estipulado entre os representantes dos vários provedores diante do Ministério para a Inovação e a Tecnologia, no entanto ele permanece um acordo privado, com lacunas, principalmente no que se refere às sanções que muitas vezes devem ser aplicadas. Em 2006, na seqüência de numerosos casos de violência sobre menores, muitos dos quais realizados através da difusão de material pedo-pornográfico (quando não se tratava de verdadeiro e próprio aliciamento de menores via internet), foi promulgada a lei 38 de 6 de fevereiro de 2006: «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet».
Enfim, como aplicação da lei 38/2006, em fevereiro da 2007 foi publicado um decreto determinando os requisitos técnicos dos instrumentos de filtragem que os provedores da rede internet devem utilizar para impedir o acesso aos sites já assinalados pelo Centro nacional contra a pedo-pornografia. Mas, isso não basta para superar as dificuldades e impedir que os menores possam navegar de maneira arriscada na «rede das redes».
Atualmente foi reativada a comissão anti-pedofilia e desvios de menores através da internet, o «Ciclope», que tinha sido instituída junto ao Ministério para a Eqüidade, do governo italiano, e que ficou inativa por um ano, até a sua reestruturação junto ao Ministério da Família. Está também para entrar em função um site dedicado ao uso da internet, junto ao Ministério das Comunicações, e um número telefônico de emergência gratuito, organizado pelo mesmo ministério e por «Save the children», que poderá ser utilizado por qualquer cidadão que queira assinalar algum abuso, desvio ou pedo-pornografia. Dentre as iniciativas mais recentes, deve ser assinalado o site www.tiseiconnesso.it criado pelo Ministério das Comunicações italiano, sempre em colaboração com «Save the children», onde é colocada à disposição uma série de informações sobre o conteúdo de certos sites, seja para os pais como para as próprias crianças, em conjunto com a campanha televisiva que tem como slogan «A melhor maneira de ajudar o seu filho a não usar incorretamente as novas tecnologias é conhecê-las».
Deve ser salientado também o fato de como a rede se tornou um grande mercado online. Para alguns produtores, o «e-commerce» de brinquedos corresponde já a 4% das vendas, e apenas em 2005 as vendas online corresponderam a 37.600 ações de compra. As razões para investir no processo online são múltiplas: desde a possibilidade de evitar as dificuldades logísticas de distribuição dos produtos, à ampliação de ofertas diferentes de produtos e também a possibilidade de envolvimento do cliente através de campanhas de mala direta e a criação de comunidades virtuais em torno de alguns produtos.

FICHAS:
Pedo-pornografia e internet
Em março de 2006, entraram em vigor as novas medidas diretas de combate e repressão ao fenômeno de exploração sexual dos menores e a pedo-pornografia, estabelecidas pela lei 38/2006 – «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet» foi publicada no Diário oficial em 15 de fevereiro de 2006, nº.38 – com a qual foram substancialmente modificados e integrados os artigos 600bis e seguintes do Código Penal italiano.
A lei confirma os artigos 527, 528, 529 e 725 do Código Penal italiano, que punem os «atos obscenos em local público, publicações, espetáculos obscenos, desenhos ou figuras que ofendem a decência pública».
Porque em muitas publicações, transmissões televisivas e anúncios publicitários, mesmo que não tenham declaradamente um caráter pornográfico, imagens de crianças e adolescentes são apresentadas de maneira explícita ou mais ou menos sutilmente ilusória e de forma falsa, pede-se um novo empenho das instituições competentes para que sejam observadas as normas em vigor e, se preciso for, que façam apelo aos órgãos de Polícia, o Instituto de autodisciplina publicitária, o Ministério das Comunicações, a Polícia postal ou a «Comissão tv e menor».

3) CINEMA

Confirmando as disposições da Constituição italiana, no que se refere ao direito e ao dever das famílias de serem protagonistas na educação de seus filhos, para muitos é chegada à hora de reelaborar a legislação que define o conceito de «censura» (a lei 161/1962 prevê a possibilidade de negar a autorização de abertura às salas de cinema ou de fazer cortes nos filmes, mesmo em função de um público adulto), que hoje está superado. É preciso com urgência estabelecer um critério de tutela dos menores não apenas no que se refere aos filmes que vêem nos circuitos cinematográficos, mas também sucessivamente em casa, muitas vezes em horários acessíveis na programação da televisão.
Uma avaliação correta e preventiva de um filme permite à família ter à sua disposição os instrumentos para escolher se um espetáculo é mais ou menos oportuno, conhecendo a trama, os eventuais conteúdos mais sensíveis, a classificação que a obra recebeu em outros países, etc. Por isso, é justo que a legislação seja revista, uma operação que requer atenção e perspicácia da parte das instituições em um momento de transição da mídia, como este que estamos vivendo, quando esta se tornou realmente um importante componente na educação dos menores.
Não faltam filmes que atraem o público por causa de seu conteúdo de violência, e no entanto entram no circuito cinematográfico sem qualquer restrição de idade. Para um filme que é notícia nos jornais, existem muitos outros com conteúdos duvidosos ou até mesmo perigosos que conseguem passar através do filtro da comissão de revisão cinematográfica, que atualmente funciona junto ao departamento de cinema do Ministério dos Bens Culturais.
Ao mesmo tempo em que existe um projeto de lei do ministro dos Bens culturais, que deve ainda iniciar os trâmites parlamentares, novas situações se apresentam na Itália, com a autocensura de filmes, feita pelos produtores ou distribuidores cinematográficos, com a introdução de novas e mais específicas faixas etárias para as restrições visando os menores a partir dos 10 anos de idade. As restrições serão feitas baseando-se em uma avaliação classificatória dos conteúdos das obras e sucessivamente serão ainda analisadas por uma comissão de psicólogos, educadores e pais.
Este sistema se inspira no modelo americano da Motion Picture Association of America (MPAA), que há 40 anos representa os interesses da indústria do audiovisual americana no mundo. Funcionando a partir de regras bem precisas (estabelecidas ao longo dos anos, também segundo as sentenças dos tribunais federais nos vários Estados americanos e em base aos protestos dos cidadãos), a autocensura americana prevê a existência de uma única comissão competente para determinar as restrições do PG12 ao «restricted» 17 anos. Esta comissão é composta exclusivamente de pais, considerados os primeiros depositários da educação dos filhos, e representam transversalmente a audiência. Importantes sanções econômicas asseguram que o mecanismo de autocertificação corresponda efetivamente aos interesses dos cidadãos. No site da Motion Picture estão disponíveis aos pais os pontos de referência para a avaliação das obras de entretenimento e são publicadas as restrições aplicadas a cada filme que está em exibição nas salas de cinema. Geralmente as avaliações parecem muito mais severas em relação a outros países. Tudo isso, nos vários anos de sua aplicação, deu uma qualificação à indústria americana e seu correto serviço prestado aos ouvintes. Qualquer estrada que se pretenda seguir na Itália, é importante para as famílias que seja estimulado um mercado de produção adequado à infância: é justo que o mecanismo da indústria cinematográfica continue com o seu ritmo de produção, mas não é justo confundir as classificações de acesso ao produto, como qualquer indústria sabe muito bem.
No que se refere às normas européias de classificação dos filmes, e em geral de todo «entertainment» (neologismo anglo-saxão, que, no entanto encontra sua raiz etimológica na relação entre educação e jogo) acessível aos menores, deve ser citado o sistema NICAM, que funciona na Holanda há alguns anos. Fundado em 1999, o NICAM (Nederlands Instituut voor de Classificatie van Audiovisuele Media) se baseia na lei Media Act, onde os programas de grupos que tiveram a autorização para atividades de «broadcasting» não devem incluir obras audiovisuais que prejudiquem o desenvolvimento físico e psicológico de pessoas com menos de 16 anos de idade, seguindo as diretivas da União européia («Televisão sem fronteiras» IV).
O sistema de classificação preventiva funciona também na Grécia, com a lei 1.597, de maio de 1986, que prevê que antes da projeção nas salas de cinema, cada filme seja submetido pelo produtor ou pela sociedade de importação à Comissão para a juventude, que classifica o filme seja como adequado aos menores, ou proibido aos menores de 13 anos, ou de 17 anos ou ainda, nos casos mais graves, severamente inadequado aos menores. Esta comissão é um órgão do Ministério da Cultura e foi concebida procurando-se estabelecer certa proporcionalidade, sendo composta de representantes do Estado (Ministério da Cultura), das categorias ligadas ao cinema, de psicólogos especializados na educação, de sociólogos, dos jovens, dos educadores e dos pais.
Na Áustria, está em vigor um sistema de avaliação complexo, instituído em base a um princípio constitucional federal que confia a tutela dos menores, no que se refere ao cinema e em geral aos meios de comunicação de massa, à competência específica dos Lander. A lei nacional que engloba a regulamentação da mídia é a ORF-ACT, ou seja, a Austrian Broadcasting Corporation nº. 379/1984, que estabelece quais os critérios sobre os quais deve se basear a proteção aplicada a programas e filmes transmitidos na televisão ou através de outros canais mediáticos. No que se refere à exibição dos filmes, a avaliação preventiva das obras cinematográficas, para que sejam decididas as faixas etárias adequadas, é regulamentada pela lei austríaca para a tutela dos menores, a «Jugendschutzgesetz», aplicada através das leis dos Lander federais. Esta lei estabelece nove faixas de restrições de público a partir dos seis anos de idade, com uma sucessiva graduação que prevê restrições para 10, 12, 14 e 16 anos de idade. Para supervisionar o sistema de classificação cinematográfica, existe uma comissão junto ao Ministério da Educação, em Viena, que comunica seu parecer sobre a idoneidade dos filmes às autoridades locais. Geralmente e de maneira individual os Lander adotam as decisões da comissão, e é em âmbito local que se decide de sua aplicação.
Na Espanha, o artigo 20 da Constituição reconhece o direito do cidadão a exprimir e difundir livremente seu pensamento, suas idéias e suas opiniões através de qualquer meio de divulgação. Se por um lado o exercício de tais direitos «não pode ser restrito através de nenhum tipo de censura prévia», o mesmo artigo especifica que «estas liberdades têm o seu limite no respeito dos limites reconhecidos pelas normativas que exprimem este respeito, especialmente no direito à honra, à privacidade, à própria imagem e à proteção da juventude e da infância».
Baseando-se neste princípio, a qualificação dos filmes (Real decreto 81/1997) e das obras audiovisuais é feita antes de sua difusão, através do Instituto de cinematografia e das artes audiovisuais (ICAA), uma entidade autônoma, mas ao mesmo tempo ligada ao Ministério da Educação e Cultura através da secretaria de Estado para a cultura (ver site www.mcu.es).
A subdireção geral de fomento à indústria cinematográfica e do audiovisual, que faz parte do ICAA, se ocupa, dentre outras funções, da classificação em faixas etárias dos filmes e das outras obras audiovisuais em vista de sua exibição pública e para a sua distribuição. A comissão se encarrega de divulgar as informações sobre os filmes e programas audiovisuais, com classificação que vai desde as «salas X» até as restrições para cada faixa etária do público.
Os filmes de caráter pornográfico não podem receber subvenções do Estado e sua projeção nas salas prevê uma taxa suplementar, destinada em parte para estimular um fundo de proteção cinematográfica. A projeção destes filmes pode ser feita somente nas «salas X», onde não podem ser apresentados outros tipos de obras cinematográficas e onde é proibido o ingresso de menores de 18 anos.

CINEMA NA TV

Devido ao alto consumo de programas de televisão por parte dos menores e levando-se em conta as diretivas da União européia, que promovem a auto-regulamentação no âmbito nacional das emissoras de tv e a participação das famílias nesta obra educativa, há alguns anos estão em vigor na França, na Holanda, na Grã-Bretanha, na Grécia e na Itália os códigos de sinais, que servem para identificar tanto os filmes projetados na salas de cinema como aqueles transmitidos na televisão. A tutela dos menores no âmbito da televisão foi também feita adotando-se o chamado sistema «watershed» (separador das águas), que funciona segundo uma seleção de faixas horárias protegidas, algumas aconselhadas à visão dos menores, outras aconselhadas a todos e outras ainda, principalmente na programação noturna, indicadas somente a um público adulto.
A faixa de idade determinada pela classificação preventiva dos filmes tem obviamente uma repercussão na programação das chamadas faixas horárias protegidas ou distintas nas emissoras de televisão pública em todos os países europeus. A definição das linhas de conduta comuns está à base dos acordos de auto-regulamentação e de co-regulamentação dos programas de televisão, estabelecendo-se um código de procedimento comum para as emissoras tanto públicas como privadas. Criou-se assim uma base normativa, que é assumida pela autoridade do Estado e que recebe a confiança dos consumidores das emissoras públicas ou privadas que adotam este sistema de auto-regulamentação.
Para tornar visível aos adultos as classificações dos programas apropriados aos menores, muitas emissoras européias adotaram um sistema de sinais que através de símbolos, números, cores e sinais acústicos advertem ao público a respeito daquilo que está para ser transmitido.
Mas, apenas este sistema, assim como o de filtragem (tipo v-chip), não basta para garantir uma verdadeira tutela dos menores diante de um conjunto de imagens difíceis de serem decodificadas por um jovem. Deve-se pensar às imagens de guerra dos telejornais, dos filmes escabrosos ou às informações sobre os crimes hediondos, que muitas vezes têm como ambiente o próprio núcleo familiar.
É na colaboração entre Estado, produtores de programas audiovisuais e famílias que pode ser fundamentado um autêntico respeito dos menores que encoraje o crescimento positivo da criança em base aos valores fundamentais da pessoa humana.

4) CELULARES COM VÍDEO

Hoje a difusão dos celulares com vídeo chegou à Itália ao índice se 134%, o que significa que muitas pessoas possuem pelo menos dois celulares, inclusive os jovens e as crianças, que recebem este instrumento dos próprios pais. De fato, de duas crianças entre 8 e 13 anos de idade, uma delas tem um celular no bolso. Aquele que poderia ser um instrumento para controlar melhor os deslocamentos e as necessidades dos filhos, se revela no entanto um perigoso meio que pode expor a outro tipo de utilização por parte dos menores, que não se separam nunca do próprio celular, nem mesmo durante as aulas, como lamentam vários professores. Apesar do código de auto-regulamentação assinado pelas principais operadoras (Código de conduta para a oferta de serviços a pagamento em tutela dos menores), na realidade os novos serviços opcionais do celular o tornaram um «personal computer» capaz de permitir novos usos que antes não tinham.
Os desenvolvimentos tecnológicos que estão se verificando no campo da telefonia móvel – particularmente no que se refere à sinergia com a internet e a adoção dos sistemas DVB de vídeos-telefone – contribuem a aumentar a oportunidade de comunicação também para as novas gerações e, ao mesmo tempo, repropõem em novos termos a questão da tutela dos menores. As evoluções já previstas ulteriormente para os próximos anos e o número sempre crescente de pessoas envolvidas, pedem uma grande consciência social e uma constante atenção das pessoas e órgãos encarregados de garantir os direitos dos cidadãos.
Neste contexto devem ser reafirmados os direitos dos menores no campo da comunicação, dentre os quais certamente não está em último lugar aquele que se refere também à segurança diante dos riscos de indução a comportamentos ilícitos ou de acesso a conteúdos nocivos ou indesejados. Também neste campo é essencial o papel dos pais e, em geral, de todos aqueles que são chamados a ter uma função educativa. A maior segurança das crianças e dos jovens quanto ao acesso a conteúdos ilegais é um ponto que deve merecer atenção também através da maior conscientização dos pais e das mães, que devem se capacitar a conhecer e utilizar estes meios.
Para a «alfabetização» dos pais na utilização da mídia devem colaborar também as instituições públicas, promovendo um uso positivo das novas possibilidades tecnológicas. Às empresas cabe a responsabilidade de colocar no mercado um produto que dê garantias no que se refere à sua utilização pelos menores, superando os limites estabelecidos pelo código de auto-regulamentação assinado pelas operadoras de celulares. Devem também oferecer maiores informações aos adultos que assinam um contrato de utilização, como por exemplo a adoção de bloqueios automáticos de acesso a conteúdos nocivos, se o celular passa às mãos de um menor de idade.

5) VIDEOGAMES

Trata-se de uma indústria global, que conquistou os jovens e não apenas eles. Os números relativos à difusão repentina dos videogames indicam que existem 250 mil sites de videogames, cada um deles propõe uma série de títulos, muitos deles recheados de cenas de sexo e de violência. Uma pesquisa recente do Instituto italiano de medicina social (IIMS) coloca em evidência, entre outras coisas, a escassa informação por parte dos adultos a respeito dos videogames utilizados pelos filhos, o predomínio de temas violentas em mais de 30% de títulos não aconselhados aos menores, o predomínio de personagens virtuais normais que podem se tornar especiais, realizando ações extraordinárias.
Mas, o ponto de risco mais elevado se refere aos pequenos jogadores de videogames, crianças entre seis e nove anos de idade que se submetem a entrar tão intensamente no jogo virtual que chegam a formas de dissociação da realidade e solicitam um monitoramento muito atento da parte dos adultos. A mesma pesquisa indica a presença de videogames em 25% das famílias com crianças de três a cinco anos de idade e em 65,2% das famílias com crianças entre seis e 10 anos de idade. O que produz efeitos negativos no âmbito cognitivo das crianças não parece ser especificamente o meio, mas muito mais os elementos que criam a excitação, tais como a velocidade de produção do estímulo e da resposta, a velocidade das imagens, os efeitos especiais, os contrastes, a fragmentação da história, o binômio rumor-ação. O uso prolongado do jogo inibe, segundo alguns psicólogos, a área da capacidade crítica, provocando passividade e ao mesmo tempo agressividade na criança. Mas, não queremos demolir os videogames, porque existem aqueles que são muito adequados aos mais jovens, com valores de informação e de educação, seja também porque o uso deste meio é na realidade um passo na preparação da criança ao sucessivo e mais sofisticado, que é o uso da internet.
De qualquer maneira, os dados relativos à venda destes produtos de entretenimento mostram um crescimento em todos os lugares e a difusão deste meio é acompanhada de uma aceitação social (ou seria uma resignação?) sempre maior.
É urgente ampliar o percurso de conhecimento e das estratégias internacionais, para monitorar um mercado que está cada vez mais vasto. Parece urgente estabelecer modalidades operativas para o controle dos conteúdos e do sistema de sanções, seja para o produtor como para o vendedor dos serviços. O código de auto-regulamentação Pegi (derivado em 2003 do sistema de avaliação e classificação holandês, Nicam, que assinala os conteúdos inadequados aos menores), adotado pelos industriais de «entertainment» que produzem videogames, é a única forma de auto-regulamentação existente atualmente e que prevê sanções (raramente aplicadas, mesmo diante de casos graves evidentes) para os produtores que colocam no comércio os jogos com indicações de faixas etárias apenas aproximativas.
O código Pegi, ao qual a associação européia Isfe adere em 2002, é evidentemente insuficiente na sua função declarada de «fornecer aos consumidores as informações mais oportunas» e expostas no selo de produção. E, como o setor dos videogames tem hoje um volume de negócios que ultrapassa os 740 milhões de euros, envolvendo 24 milhões de jogadores (43% da população a partir dos quatro anos de idade), com uma venda dos produtos classificados para maiores de três anos de idade que chega aos quase 48% dos consumidores. É um dado que define o impacto deste gênero de meio sobre a infância e a adolescência, mostrando toda a sua periculosidade, seja pelo consumo de conteúdos inadequados, seja pelo excessivo número de horas dedicado neste passatempo, muitas vezes solitário e sem a presença de um adulto ao lado. Se for verdade, como sustenta a indústria, que a produção de videogames violentos é apenas uma mínima parte do mercado, é também verdade que esta representa a fatia mais importante do retorno econômico.
O interesse pelos videogames é alimentado pela sinergia com os filmes que inspiram o jogo homônimo e que torna sempre mais atrativo este gênero, principalmente para os adolescentes. Desta maneira é importante também neste campo o estabelecimento de regras precisas em defesa dos consumidores dentre o público jovem, mais exposto aos riscos destas novas formas de entretenimento cada vez mais sofisticadas e envolventes, por causa da combinação entre narrativa e efeitos gráficos.

6) PUBLICIDADE

O problema da tutela dos menores diante da publicidade se apresenta como um corolário, dentro do quadro mais amplo que regulamenta a difícil relação entre a mídia e as crianças. A televisão, e portanto também a publicidade, se constitui em uma fonte de perigo para os menores, isto é, para a maior parte das crianças, principalmente em idade pré-escolar, que devem saber fazer a diferença entre a publicidade e o resto da programação, e entre os programas de ficção e a realidade. Com essas considerações não significa que exista uma acrítica rejeição da publicidade em si mesma – à qual se reconhece, no entanto, onde proceda corretamente, uma função positiva no processo de formação, de crescimento crítico e de socialização do menor –, mas existe a necessidade de prever um sistema de regras destinado a garantir-lhe um uso adequado.
O efeito dos anúncios publicitários é tão grande que em alguns países estão sendo tomadas medidas drásticas a respeito. No Reino Unido, por exemplo, recentemente foram vetados os anúncios publicitários durante os programas destinados às crianças até nove anos de idade, a partir de 1º de janeiro de 2008 a medida se estenderá à programação para os jovens até 15 anos de idade e até o final de 2008 serão vetados em todos os canais dedicados aos menores. Apesar de se reconhecer que a publicidade serve para financiar os programas, aqueles dedicados às crianças terão que recorrer a outras fontes. Também na França começa a se impor uma «linha dura» a esse respeito: visto a alta incidência de publicidade de merendas, de sucos e doces em geral, a partir de agora os anúncios dedicados às crianças deverão ser precedidos de uma espécie de aviso, que orientará para uma alimentação adequada.
Mas, por que as crianças são tão frágeis diante dos apelos da publicidade? Na Itália, explica Paolo Landi, secretário geral da Adisconsum (Associação de defesa dos consumidores e do ambiente»), em um capítulo de seu estudo «Crianças da multimídia»: «Se consideramos que a publicidade não faz outra coisa que veicular um conhecimento imediatamente concretizável em um “ter”, ou em um “ser”, ou em um “fazer”, a criança absorve sem dificuldades os três componentes que são a obsessão dos expertos de marketing, isto é, o componente cognitivo (como fornecer informações indeléveis sobre um produto ou um serviço), o componente afetivo (como fazer o consumidor reagir de maneira emotiva) e o comportamental (como colocar o pequeno consumidor em movimento na direção da aquisição). A partir deste ponto de vista a criança é o público ideal, o consumidor a quem se pode vender qualquer coisa».
Na Itália está em vigor um código de autodisciplina publicitária que surgiu em 1966, em base a um acordo entre os profissionais do setor. Esta primeira forma de tutela, em grande parte com origem comunitária, tem como protagonistas entidades administrativas independentes: a Autoridade de controle da concorrência e do mercado de setor e a Autoridade de garantia para as comunicações e a editoria. Enquanto isso, para a auto-regulamentação, orientada pelas normas que constam do Código de autodisciplina publicitária, e agora também, embora com força jurídica diferente, pelo Código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual se reconhece um poder de decisão e de sanção, emanando uma ordem e intimando seu cumprimento.
Em todos os países onde a televisão serve de veículo às mensagens publicitárias, o mundo empresarial é plenamente consciente do enorme poder de influência que a publicidade tem sobre as crianças.



NORMATIVA INTERNACIONAL

O assunto relativo à tutela dos menores na mídia é um dos mais debatidos, seja no que se refere às normas nacionais, seja no âmbito internacional. Encontra-se diante da situação de precisar acertas as contas com toda a extensão da rede global da internet. O exemplo que, neste momento de transição, coloca mais em evidência a necessidade de estabelecer leis que estejam em condições de controlar o acesso e uso dos conteúdos nocivos para os menores, é exatamente o da internet. Qualquer pessoa no mundo pode abrir um site considerado «arriscado», contendo elementos ilegais e acessíveis a consumidores despreparados, disponibilizados por quem está do outro lado do mundo.
No que se refere aos princípios gerais no âmbito do direito internacional, é preciso recorrer principalmente à convenção da ONU sobre os direitos da criança, com sede em New York, ratificada pelo Parlamento italiano através da lei nº.176/1991. Esta garante à criança uma «consideração proeminente» também a respeito da liberdade, seja no se refere à expressão, seja quando tutela os conteúdos recebidos. Esta mesma convenção, em seu artigo 17, fala da relação entre menor e televisão, desejando «um sistema normativo que tutele o menor-consumidor, mesmo com todas as dificuldades que se apresentam», seja para individuar os fenômenos que devem ser monitorados, seja sobre as normativas possíveis.
No direito da União européia, tal tutela foi recentemente confirmada pela Carta dos direitos fundamentais da União, aprovada em Nice em 2000, cujo artigo 24 salienta que «os Estados membros reconhecem a importância da função exercida pelos meios de comunicação de massa e cuidam para que a criança possa ter acesso às informações e materiais... com a finalidade de promover o seu bem estar social, espiritual e moral, além de sua saúde física e mental». A normativa seguinte, 89/552/CEE, previu algumas restrições, seja no que se refere aos programas como para as mensagens publicitárias destinadas a este público». O artigo 22 desta normativa conduz a impedir a transmissão de programas que contenham cenas pornográficas ou de violência gratuita, ou outros programas inadequados a este público. Não podemos esquecer de mencionar a determinação expressa de «Televisão sem fronteiras», que está hoje em sua quinta versão atualizada, que o tema da tutela dos menores está relacionado com o estatuto geral dos direitos dos menores e corresponde ao disposto nos artigos 50 e 31 da Constituição italiana.
Se for claro que os princípios normativos são todos a favor da tutela dos menores, é também verdadeiro que uma tecnologia em contínua evolução colocou em crise as velhas regras do jogo. Mas também é claro que não se pode mais adiar a necessidade de estabelecer novos parâmetros normativos, para que as crianças possam utilizar os meios de comunicação próprios de seu tempo, com aproveitamento e serenidade também para as famílias.~

EDUCAÇÃO À MÍDIA NO MUNDO: PARA SABER MAIS

A difusão da educação à mídia é uma resposta à necessidade de se informar sobre as novidades no campo dos novos meios de comunicação. Em seguida citamos apenas alguns sites que em vários países oferecem maiores informações sobre como aprender a usar melhor a mídia, enfrentando a problemática da tutela dos menores e da alfabetização às novas tecnologias por parte dos adultos.
«The Media Awareness Nework-Réseau éducation médias» é uma organização canadense sem fins lucrativos, pioneira no desenvolvimento de programas sobre a educação à mídia. Com esta finalidade ela produz programas online em colaboração com organizações internacionais, convicta que, para interpretar as mensagens de informação, de entretenimento e comerciais, os jovens têm necessidade de instrumentos críticos válidos. Por isso é importante formar também os adultos (famílias e professores) sobre como funciona a mídia e como ela determina o estilo de vida.
A organização realiza uma ação contínua de monitoramento em relação à mídia (televisão, cinema, videogames, imprensa, publicidade, etc.), e sua seção dedicada aos pais oferece uma série de elementos para que estes reflitam com os filhos sobre esses meios, além da seção para os educadores, que inclui lições e materiais de apoio. Uma outra seção é dedicada à análise das questões ligadas à mídia, como a difusão de estereótipos, as representações de violência e da diversidade, a privacidade, a publicidade dirigida aos menores. Seu site é em inglês e francês (http://www.media-awareness.ca).
«Quai des images» é o site dedicado ao ensino de cinema e audiovisual organizado pelo Ministério da Educação francês. Ele propõe atividades ligadas à educação à imagem e de análise dos filmes em consonância com os programas escolares, agrupa os textos oficiais a respeito dos meios audiovisuais, oferece uma série de instrumentos de análise e de estudo completos sobre alguns filmes específicos e sobre certos autores em particular, informa sobre conferências, seminários, cursos e festivais sobre o mundo audiovisual e sua utilização em âmbito educativo e didático. Entre outras coisas, reúne também as propostas e as experiências feitas por professores e seus alunos nas escolas secundárias francesas no campo da educação à imagem, além de organizar um fórum de discussões aberto a todos sobre a educação à mídia (http://www.ac-nancy-metz.fr).
Sempre na França, está em funcionamento o blog «Zéro de conduite», organizado pelos professores e destinados a educadores, pais e estudantes. Promove o uso do cinema como instrumento pedagógico, dedicando-se especialmente à atualidade cinematográfica, mas sem esquecer os clássicos e os documentários. Com várias seções e espaços de aprofundamento, se propõe como um local de discussão de temas em um debate aberto (http://cinema-ducation.fluctuat.net).
A Universidade de Massachussetts organizou o Media Education Foundation – MEF, mídia de desafio, que produz e distribui documentários destinados a estimular o pensamento crítico e o debate sobre a relação entre aqueles que detêm o poder sobre a mídia, os conteúdos da mídia comercial, a exigência democrática de um livre fluxo de informações, as diversas representações de idéias e pensamentos e o direito dos cidadãos de informar e serem informados. Alguns destes temas são abordados criticamente, como a identidade do gênero na publicidade, a imagem de sexo nos videoclipes, o papel da mídia na construção da identidade cultural, mídia e saúde, etc. (http://www.mediaed.org/).

(a cura di M. F. D’A.)

 
At 9/17/2007 2:42 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

AS CRIANÇAS E A MÍDIA (II PARTE):
ACEITAR O DESAFIO EDUCATIVO


O tema da 41ª Jornada das Comunicações Sociais, «As crianças e os meios de comunicação: um desafio para a comunicação», nos convida a refletir a respeito de dois aspectos particularmente importantes. O primeiro é a formação das crianças, para que estejam em condições de receber de maneira crítica aquilo que vêem. O segundo é a formação à consciência e ao uso consciente da mídia, que está em contínua transformação tecnológica.
De fato, é o que especifica Bento XVI no início de sua mensagem, de 20 de maio de 2007, para a Jornada: «Os complexos desafios que a educação contemporânea deve enfrentar são muitas vezes ligados à grande influência dos meios de comunicação no nosso mundo. Como aspecto do fenômeno da globalização e estimulados pelo rápido desenvolvimento da tecnologia, os meios de comunicação delineiam fortemente o ambiente cultural (cf. João Paulo II, O rápido desenvolvimento, nº3). Na realidade, há quem afirma que a influência formativa da mídia está em competição com aquela da escola, da Igreja e, quem sabe, até com aquela da própria família».
De fato, como salienta o Pontifício conselho para as Comunicações Sociais, «para muitas pessoas, a realidade corresponde àquilo que os meios de comunicação definem como tal». Episódios recentes, como a utilização do celular na filmagem de violências nas salas de aula, abusos sofridos por pessoas deficientes, fenômenos de trote e de violência generalizada, demonstram como as crianças que crescem passando uma média de quatro horas por dia diante da televisão, sozinhos em casa, absorveram a lógica do «estou no vídeo, logo existo». Os psicólogos, os pedagogos e os estudiosos dos meios de comunicação estudam há tempos sobre as relações entre o consumo televisivo e o comportamento violento dos menores. Uma grande quantidade de pesquisas realizadas em muitos países ocidentais demonstra como esta correlação seja realmente inegável.


NOVAS LINGUAGENS

O fato que muitas crianças vivem completamente inseridas no mundo dos velhos e novos meios de comunicação, que estão cada vez mais frequentemente em correlação entre eles, é confirmado pela popularidade de alguns modelos televisivos, considerados tão efêmeros quanto penosos «momentos de glória», presentes nos programas com os maiores índices de audiência, dos «reality» aos «talk show», sem falar do «trash», que hoje se tornou um gênero de espetáculo.
Dentre as preferências demonstradas pelos adolescentes italianos que assistem televisão mais do que três horas por dia, encontramos, em primeiro lugar, a figura da «veline» (Ndt: misto de corista e coadjuvante na apresentação de programas populares da televisão italiana), enquanto outros da mesma idade se concentram no mais clássico exemplo, o do jogador de futebol. De toda maneira, a coisa mais importante é aparecer, pouco importa por qual motivo, de ser «alguém» ou «alguma coisa» no Olimpo mediático, mesmo que seja apenas por um instante.
Estes são os exemplos mais negativos dos condicionamentos derivados de um excessivo e acrítico uso dos meios de comunicação. Encontramo-nos diante de uma nova geração que cresceu na frente da televisão, capaz de usar as novas tecnologias que os próprios pais, que as adquiriram e as tornaram disponíveis, muitas vezes se encontram despreparados para utilizá-las.
Tanto é verdade que hoje em dia os filmes são vistos diretamente nos celulares e a televisão pode ser assistida na tela do computador. Hoje se telefona através da internet e graças ao download se descarrega os CDs e DVDs mais recentes, se filma e se faz foto com o celular, e assim por diante.
Nas casas, o vocabulário familiar se reduziu ao gênero dos sms e se fala tendo o som da televisão no fundo, se comunica através de e-mail, se faz «visita virtual» via computador, se percorre através de bibliotecas virtuais, tanto que as fichas e arquivos de papel evocam imagens do outro século, completamente em desuso.
A situação dos nossos filhos é diversa daquela da geração precedente, pois eles abriram seus olhos tendo diante de si estes cenários de profunda, contínua e envolvente transformação tecnológica. Eles se constituem aquela que os estudiosos chamam de geração nascida «com seis dedos»: além dos cinco dedos normais da mão, o sexto é o mouse do computador.
Com o aparecimento do mundo «virtual» da internet e dos videogames criou-se uma defasagem em relação à realidade verdadeira e própria. As duas dimensões parecem muitas vezes, e para muitos jovens, como universos paralelos, com conseqüências não indiferentes no plano do processo de amadurecimento. Têm grande sucesso os sites nos quais se prevê uma segunda vida (basta verificar os milhares de registros nos poucos meses de existência do site italiano de «Second Life», que em todo o mundo já tem sete milhões de inscritos), onde a simulação reproduz todas as situações da vida real. Apenas que tudo é falso, a começar da nova identidade, que pode ser escolhida e com ela se inicia a fazer parte deste mundo fora do mundo, onde se pode ser um «qualquer coisa». Isto é, ninguém.
Assim, o grande desafio cultural de hoje é propriamente a redefinição dos limites, que muitas vezes se apresentam demasiadamente instáveis. Isto é, redefinição dos limites entre o real e o virtual, superando a divisão digital que hoje separa as gerações adultas daqueles mais jovens.


OS JOVENS: PROTAGONISTAS OU VÍTIMAS DAS MUDANÇAS?

A linguagem deles é pobre, muitas vezes recheada de termos tirados do dicionário do internauta: clicar, chatar, messagiar, deletar, são alguns dos neologismos que fazem parte de seu vocabulário quotidiano. Falta uma dimensão humana da tecnologia que esteja em condições de traçar o perímetro cultural entre o real e o virtual. Assim a aldeia global difundiu uma quantidade de modelos comportamentais desviados, ou pelo menos discutíveis.
Desta maneira, os jovens que vivem a milhões de quilômetros de distância jogam o mesmo videogame, vêem o mesmo filme, assim como, de maneira transversal, absorvem modelos e comportamentos semelhantes. Muitas vezes os adultos têm menos domínio no uso das novas tecnologias e observam, com uma preocupação resignada diante de suas próprias limitações, as crianças que navegam facilmente na internet.
As raízes das dificuldades neste campo educativo são muito bem explicadas por Marina D’Amato, professora de sociologia da Universidade de Roma, que salienta: «Cada geração tem necessidade de se encontrar também em um mundo fantástico, que serve a interiorizar o paradigma do bom e do belo, do justo e do errado, do oportuno e do útil, também em relação aos exemplos que procedem da narrativa. Hoje nos encontramos em uma condição na qual os avós e os pais contam cada vez menos histórias aos filhos e aos netos, e este papel foi assumido pela televisão. Mas, na realidade, a televisão “exila” e “con-funde”, isto é, funde os modelos morais que são frutos de ânsias e problemas mal resolvidos, muito mais que de certezas. Embora estes se transformem com freqüência, a cada três ou quatro anos, o fato de serem repropostos continuamente faz com que se justaponham uns aos outros» (ver Come mediare i media, de Mario Russo).
Se for verdade que a televisão é o meio mais usado até a adolescência, imediatamente depois surge a grande atração pela internet. Esta passagem nasce de uma sintonia com a linguagem televisiva, que na idade infantil muitas vezes é ouvida durante muitas horas no dia. Esta linguagem se baseia em uma mediação da realidade e desta maneira ela ativa um processo de recepção que é de tipo emotivo.
Neste registro emocional é mais fácil acabar envolvido por situações e figuras capazes de se proporem como modelos identificadores, preservadores de sentido e de comportamentos a serem imitados.
O poder de concentrar uma vontade emulativa em alguns personagens, que correspondem particularmente às necessidades interiores do jovem (necessidades na maioria das vezes induzidas pela publicidade ou por modelos estimuladores), tem uma forte relação com a quantidade de horas que o jovem passa utilizando os novos ou os velhos meios de comunicação.


EDUCAÇÃO NECESSÁRIA

«A formação adequada a um uso correto dos meios de comunicação é essencial para o desenvolvimento cultural, moral e espiritual das crianças… Educar as crianças a serem seletivas no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja, da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos. Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia, com a certeza de que este difícil, embora gratificante, aspecto da condição de pais, é apoiado por toda a comunidade.»
As palavras do discurso de Bento XVI definem com grande clareza o paradigma de uma justa relação entre a mídia e os menores. Uma clareza que devemos agradecer ao magistério da Igreja, no momento em que o mundo da mídia parece ignorar a verdadeira problemática educativa das crianças e as expectativas de qualidade e de segurança exigidas pelas famílias no que se refere ao uso desses meios, seja do cinema aos videogames, da televisão à internet.
Diante da utilização destorcera do meio televisivo, o mais difundido dentre os meios de comunicação, a Igreja se interroga sobre o porquê da televisão não ter um papel educativo e por que os meios de comunicação não podem ser companheiros confiáveis para os jogos na fase de crescimento da criança. O anúncio de uma recente campanha sobre o uso da mídia, promovida pelo Ministério das Comunicações, mostra os vários membros da família que estão vendo a televisão ao lado de uma criança.
Que se trate do avô ou da mãe, a mensagem é a mesma: não deixar uma criança sozinha diante de um meio que, sem o apoio crítico educativo de um adulto, pode transmitir conteúdos inadequados à idade e à maturidade daquele que o vê. Sem esquecer as responsabilidades dos produtores televisivos, empenhados na organização dos programas, o papel da família é realmente insubstituível.
Se realmente o objetivo de quem administra a sociedade de produção televisiva, ou das multinacionais produtoras de videogames ou das operadoras de celulares, é o de promover e vender o produto, o bem estar psicofísico da criança está no centro do interesse dos educadores, sejam eles os professores ou, em primeiro lugar, os pais.
Isto explica bem a mensagem do Papa, que continua a sua análise, salientando que «educar as crianças a serem seletivos no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja e da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos (ver João Paulo II, «Familiaris Consortio», 76). Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia.»


CONTEÚDO DA MÍDIA

No panorama de uma revolução da multimídia, que está modificando transversalmente os hábitos, a mentalidade, os modelos e as linguagens, deve voltar ao centro do debate a tutela daquilo que é melhor para os menores. Sem acusar a «mídia», que enquanto tal não é nem boa nem má, o importante é partir de uma a análise do produto, para assim poder individuar conteúdos que sejam de melhor qualidade para as crianças e os adolescentes. Porque a televisão é um instrumento que abre janelas de conhecimento para o mundo e, se bem utilizada, de «má professora» pode se tornar uma preciosa fonte de estímulo para o crescimento humano e cultural.
A mesma coisa vale, e com mais razão, para a «rede» que engloba e compreende tudo, e para os videogames, onde, ao invés de violência e monstros, poderia se dedicar a produzir (e isso já ocorre em certos casos) histórias instrutivas e de conteúdo interessante.
Bento XVI coloca justamente em evidência as enormes possibilidades para que seja melhorado o conteúdo deste grande campo de produção multimídia: «A educação através da mídia deveria ser positiva. Colocando as crianças diante de um meio estética e moralmente excelente, estas recebem uma ajuda para que desenvolvam a própria opinião, a prudência e a capacidade de discernimento. É importante aqui reconhecer o valor fundamental do exemplo dos pais e as vantagens de introduzir os jovens aos clássicos da literatura infantil (…). A beleza, quase um espelho do divino, inspira e vivifica os corações e as mentes juvenis, enquanto a feiúra e a vulgaridade têm um impacto deprimente sobre os comportamentos». Diante de uma decadência geral do produto televisivo, a questão da qualidade aparece ainda mais forte e vibrante em grande parte de um público formado de famílias, que pede para não ser apenas um exército indistinto de ouvintes silenciosos, mas um público em condições de exprimir suas preferências por conteúdos formativos e informativos de bom nível.
A mensagem de Bento XVI continua, com algumas importantes indicações: «Como a educação em geral, aquela da mídia requer também uma formação ao exercício da liberdade. Trata-se de uma responsabilidade que compromete. Muitas vezes a liberdade é apresentada como uma incansável procura do prazer ou de novas experiências (…). Este desejo, sentido profundamente pelos pais e educadores, que é o de educar as crianças no caminho da beleza, da verdade e da bondade, pode ser apoiado pela indústria da mídia somente na medida em que se promove a dignidade fundamental do ser humano, o verdadeiro valor da vida familiar, as conquistas positivas e as metas da humanidade. A partir disso, a necessidade de que os meios de comunicação estejam empenhados na efetiva formação e no respeito da ética deve ser vista com interesse particular e com urgência não apenas pelos pais, mas também por aqueles que têm responsabilidade cívica».
Na realidade, nos encontramos na situação de ter que reconhecer que na Itália falta uma verdadeira «cultura da criança»: a situação é tão séria que no âmbito institucional procura-se dar uma nova organização geral para verificar e controlar os conteúdos dos setores de entretenimento, como os videogames, que até agora estão submetidos apenas a códigos de auto-regulamentação, feitos e codificados para uso e consumo pelas indústrias produtoras.
Uma vez mais, o primeiro e indispensável apoio à criança só pode vir da família e de uma relação mais estreita com os professores e educadores, exatamente como salienta Bento XVI, lembrando-nos que a preocupação educativa dos pais não deve se tornar uma preocupação genérica, mas uma atenção constante a tudo aquilo que diz respeito aos filhos.

A INDÚSTRIA DA MÍDIA

1) A TELEVISÃO

Se a televisão convencional se apresenta como um ramo de atividade já «maduro», no entanto se apresenta no horizonte a situação da mídia digital (satélite ou a cabo), também como uma plataforma que consente a ligação entre televisão, internet e outro tipo de mídia através do computador. No que se refere à qualidade da programação, apesar dos inúmeros bons propósitos anunciados no âmbito institucional, parece pequena a atenção às exigências dos menores em suas diversas faixas etárias. A programação para os menores, na realidade é confinada em redes e horários particulares, enquanto o resto da programação na faixa horária considerada «para todos» muitas vezes apresenta conteúdos inadequados aos jovens. Mas, quais são as expectativas das gerações de jovens no que se refere à televisão? É realmente verdade que preferem o «trash», os jogos com prêmios absurdos e as «velines»?
A partir de uma pesquisa recente feita pelo instituto Censis sobre «Comunicação, pluralismo social, sociedade aberta» (2005) surge que a relação entre os menores, e em particular dos adolescentes entre os 14 e 18 anos de idade, e a televisão é determinada por elementos de forte contradição e de passividade. Nessa faixa etária, 100% deles vêem televisão praticamente todos os dias, 86% acompanham um pouco de tudo, com uma relevante predileção pelos filmes (72%), por esporte (32%) e pelos «reality shows» (18%).
No entanto, a amostragem entrevistada não está realmente satisfeita com aquilo que vê. De fato, 36% dos adolescentes denunciam a vulgaridade difundida nos programas e 25% criticam a superficialidade. Dentre eles, 46% consideram a televisão como um meio que «invade», ao mesmo tempo em que é interessante notar que 25% consideram que em geral a programação televisiva alimenta nas crianças menores uma visão consumista da vida. Destes dados surge o contraste entre a procura de distração e a reprovação daquilo que lhes é proposto pela programação. Isto significa que o alto índice de procura não é um indicador de satisfação.
Considerando o axioma de que a televisão seja onipresente, fica claro que são os próprios jovens a pedirem uma maior atenção aos conteúdos: menos violência e menos vulgaridade. A exigência de uma regulamentação diversa, diz claramente o relatório do Censis, «não vem somente daqueles, pais e educadores, que estão preocupados pela possível influência negativa sobre os menores, mas se exprime nitidamente também através dos adolescentes, pelo menos de uma parte mais esperta e consciente dentre eles».
Para tutelar melhor os direitos dos menores, desde 2002 foi instituído junto ao Ministério das Comunicações um código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual aderiram os produtores de televisão, seja no âmbito nacional como local. Baseando-se nos princípios sobre a matéria existentes na Constituição italiana e na Convenção dos direitos da criança, estabelecida em 1989 pela ONU, a comissão que controla sua aplicação avaliou em todos estes anos de atividade os milhares de casos em que foram violadas as normas de tutela, que prevêem a transmissão de programas e imagens adequadas a um público de menores de idade durante aquela que é chamada de «faixa protegida» da programação televisiva (das 7h30 às 22h30), intervindo com denúncias e sanções, que nos casos mais graves foram aplicadas pela Autoridade de garantia no setor das comunicações. Para o futuro, esta comissão deverá se transformar em um organismo mais amplo de controle, que se chamará «Mídia e menores», que além da televisão deverá monitorar também os setores dos vídeos-telefone e dos videogames, além da internet, que é o campo de maior risco.

REGRAS DE TUTELA EM OUTROS PAÍSES

É diversa a situação em outros países, como por exemplo na Grã Bretanha, onde o sistema de regulamentação da mídia é estruturado e complexo e foi atualizado nas últimas décadas, com uma particular atenção à tutela dos menores. As inovações tecnológicas neste setor levaram as normativas inglesas a uma série de novas disposições, como por exemplo, a visão em casa de vídeo exclusivamente para adultos, e que fora de casa seriam vetados aos menores, ou o combate à praga mundial dos sites internet para os pedófilos, que contenham material pornográfico ou com conteúdos que possam esconder o aliciamento de menores (ver a Protection Childres Act, de 1978).
A programação televisiva é regulamentada pelo Broadcasting Act (1996), de onde deriva a instituição da Broadcasting Standard Commission (BSC), um órgão independente de controle que estabelece as normas de avaliação e classificação dos programas, também no que se refere aos conteúdos violentos ou que possam ofender a decência pública (site oficial www.bsc.org.uk). Este organismo BSC funciona internamente à estrutura do Broadcasting, supervisionando e regulamentando todas as emissoras de televisão e de rádio, via cabo ou por satélite. Sua tarefa é a de elaborar os códigos de conduta e de aplicação de modelos que respeitem a justiça, além de monitorar os modelos, verificando que respeitem as leis. Com a transmissão de programas com conteúdos considerados inadequados aos menores de várias idades, há alguns anos a televisão inglesa adotou o sistema «watershed», um «separador de águas» entre um horário de programação familiar e outro para os adultos. Todo o sistema televisivo inglês se apóia sobre a responsabilização das famílias, pois sem a colaboração delas qualquer código de modelos para os programas é praticamente inútil.
Na França, está vigorando já há anos um código através de sinais televisivos, que entra em função para assinalar os programas inadequados aos menores. A avaliação do programa televisivo é feita pelo Conseil Supérieur de l’Audiovisuel (CSA), uma autoridade administrativa independente, que controla a difusão dos filmes e outras transmissões em vários canais privados, nacionais, regionais ou locais. A normativa francesa (lei 719/2002) veta a transmissão de programas que possam prejudicar gravemente a integridade física, mental e moral dos menores, porque divulgam conteúdos de pornografia ou de violência gratuita. As transmissões são classificadas por um código de sinais que, em conjunto com um sistema organizado de faixas horárias de programação, garante às famílias mais clareza sobre os programas destinados aos menores.
Na Alemanha, o tema da infância tem particular atenção da legislação, que considera desde o nascimento o início dos direitos fundamentais do cidadão. A tutela é disciplinada no âmbito público pela JSchG (desde o dia 26 de fevereiro de 1985), enquanto a lei GjSM se ocupa do controle sobre a difusão de publicações e conteúdos mediáticos considerados danosos para os menores. A regulamentação no setor televisivo é feita segundo as normas do acordo sobre a radiodifusão dos Lander federais, que as entidades para a mídia nesses Lander adotaram por base para o estabelecimento das diretivas que tutelam o interesse dos menores nas emissoras privadas. Não são admitidas transmissões que incitem o ódio racial, que exaltem a violência ou a guerra, que ofendam a dignidade do homem, que sejam de gênero pornográfico, que mostrem pessoas moribundas ou com sofrimentos que ofendam a dignidade humana. Os responsáveis pela programação, escolhendo os horários das transmissões, devem cuidar para que os menores não vejam programas que podem prejudicar o seu bem estar psíquico, físico ou mental. As transmissões inadequadas às crianças menores podem ser transmitidas somente depois da autorização da entidade competente do Land interessado.
Os responsáveis pela organização dos programas televisivos em âmbito nacional devem nomear encarregados pela tutela dos menores, que atuam no momento da aquisição, da projeção e da realização dos programas. As emissoras privadas fundaram em 1993 uma associação de autocontrole voluntário da televisão («Freiwillige Selbskontrolle Fernsehen», FSF), à qual devem ser apresentados programas particulares, antes da sua transmissão, e suas avaliações consideradas nas decisões das entidades de controle da mídia nos Lander federais. Existe ainda o órgão comum do cidadão para a tutela dos menores, dos programas, da competência mediática e controle da mídia (GSJP), do qual faz parte um integrante da entidade para a mídia nos Lander federais, que dá o seu parecer a respeito de algumas séries, filmes e espetáculos mais ou menos adequados aos menores. Este órgão, o GSJP, decide sobre pedidos de mudança de horários de transmissão de filmes proibidos para menores, controla a forma de novos programas e experimenta novas disposições para a tutela dos menores na televisão digital. A peculiaridade da jurisdição alemã, seja no setor televisivo como no cinematográfico e da mídia em geral, é a minuciosa atenção às exigências com o desenvolvimento do menor e aos riscos que este pode correr com a observância incorreta das leis.
Nos Estados Unidos, é possível consultar via internet um «guia televisivo para os pais» (ver o site www.mpaa.org), que prevê algumas categorias de audiência aplicadas aos programas televisivos transmitidos a todo o público. Este guia organiza várias siglas para identificar a categoria de audiência para cada transmissão: vai-se do TVY (para todas as crianças) ao TVG (para todos), através de várias faixas etárias, que correspondem à passagem da primeira à segunda infância e desta à adolescência. Depois tem o TVPG («parental guidance», visto na presença de um dos pais), o TV14 («parent strongly cautioned», séria advertência aos pais), para os programas que contêm cenas de sexo e de violência. Enfim, há o TVMA, que prevê um «mature audience only», ou seja, destinado a um público de idade superior a 17 anos, última fronteira para os conteúdos considerados «restricted».
Estas avaliações foram elaboradas baseando-se nas opiniões dos próprios pais e são fáceis de serem encontradas e compreendidas. Esta linha de «guia de televisão para os pais» pode ser usada juntamente ao «v-chip», que é um dispositivo de filtro instalado na maior parte dos mais recentes modelos de aparelhos de televisão, para permitir aos pais de bloquear os programas inadequados.

FICHA 1
Brasil: «O que eu penso da tv»
No Brasil, a audiência infantil é muito alta: aproximadamente 30 milhões de crianças vêem televisão pelo menos durante três horas por dia. Explica a profa. Rosália Duarte, do departamento de Ciência da Educação, da PUC do Rio de Janeiro, que «as crianças são muito perspicazes, mas nós podemos e devemos ajudá-las a ampliar o seu quadro de referências, para que possam discutir ainda melhor sobre o conteúdos daquilo que vêem. Para isso temos necessidade, antes de tudo, de ouvir aquilo que elas têm a dizer sobre o assunto e de dialogar com elas. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e muito mais freqüente, a outras atividades culturais». No âmbito de uma pesquisa feita através de um questionário distribuído nas escolas, intitulado «O que eu penso da tv», apareceu que «as crianças querem seriamente ser ouvidas sobre aquilo que pensam da tv, mas sentem que sua opinião é considerada pouco importante e não estão contentes com o excesso de imagens de violência exibidas na televisão, principalmente a violência “real”, definida como aquela transmitida nos telejornais. Eles adoram ver televisão e não importa o que os adultos pensam e dizem a respeito disso. A eles agradam quase todos os tipos de programas transmitidos: novelas, desenhos animados, programas de humor, filmes, seriados, mas isso não faz deles espectadores “idiotas”, pois fazem críticas muito interessantes, pertinentes e bem elaboradas sobre o que consideram feio ou inadequado na televisão. Para a maior parte deles, a televisão se oferece como principal opção de divertimento (em alguns casos, a única), o que significa um dado muito preocupante. Mas, o que chamou mais a nossa atenção é o grau de experiência com o qual essas crianças analisam a televisão: são expertos e demonstram conhecer a televisão também do lado de dentro, inclusive as linguagens que ela utiliza, a sua estrutura de produção, a sua lógica interna e as suas maneiras de intervenção».
As crianças aprendem os valores e os não-valores através da televisão, não resta dúvida, mas demonstram ter senso crítico a respeito deste assunto, quando afirmam nos textos que os programas transmitidos na tv podem lhes ensinar «a serem bons, a ter coragem e a fazer o bem, a cuidar da natureza e de si mesmos, a serem honestos e a lutar por aquilo que desejam», mas também «a serem cruéis e mentirosos, a roubar e matar, a não respeitar os pais e a comprar tudo aquilo que não têm necessidade». Falando sobre a validade do ensino através da mídia, a profa. Duarte salienta a necessidade de «ouvir aquilo que têm a dizer sobre o assunto e a dialogar com eles. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e mais freqüente, a outras atividades culturais».

FICHA 2
Observadores internacionais
Os dados examinados em janeiro de 2006 pelo OssCom, que é um centro de pesquisa da mídia, deixam evidente a tendência a realizar uma forma de co-regulamentação, onde a ação legislativa dos Estados membros se integra com medidas de auto-regulamentação por parte dos produtores, broadcasters e profissionais da comunicação sob o efeito de controles e sanções. São dois os instrumentos mais utilizados no âmbito europeu, observando-se as diretivas previstas no artigo 22 de «Televisão sem fronteiras»: a definição de faixas horárias protegidas (watershed) e os sinais mostrados na tela (determinados por um sistema de «rating»). Apesar disso, aos campos tradicionalmente problemáticos da violência e da pornografia se juntam novos campos de risco para os menores: a vulgaridade, abusos e dependências de substâncias, linguagem e comportamento vulgares, discriminações e abusos, violações e ofensas à dignidade humana. Os critérios de avaliação dos programas se constituem um problema que é partilhado por muitos países da União européia, ao mesmo tempo em que se prepara uma uniformização internacional dos sistemas de classificação (ver mais adiante, Nicam), baseados na visualização de cinco ícones que ilustram simbolicamente qual é a problemática do programa que está sendo analisado e para quais idades ele é desaconselhado.
Deve ser assinalada a atividade online da European Medi@culture. O projeto é promovido pela Comissão Européia, em Bruxelas, no quadro das iniciativas «e-Learning», administrado pelo centro mediático de Baden-Württemberg. O site apresenta informações sobre a educação à mídia na Europa, particularmente na França, Áustria, Finlândia e Alemanha. A seção de projetos de multimídia agrupa os projetos sobre a mídia desenvolvidos por escolas e associações de jovens ao longo do tempo (ver http://www.european-mediaculture.org).

FICHA 3
África do Sul: Encontro mundial sobre a mídia para a infância
Este encontro trienal se realizou no último mês de março em Johannesburg, na África do Sul, com a participação de expertos do setor representando diversos países. Em conjunto se discutiu sobre a necessidade de uma programação adequada às crianças, procurando entender de que modo a violência na mídia pode influir sobre a psíquico dos menores.
Mas, no 5º Encontro mundial sobre a mídia para a infância apresentaram-se também muitas crianças provenientes de todo o mundo e empenhadas em discutir sobre o difícil tema da «Mídia como instrumento de paz e de democracia global». Vieram guiados por grupos de adultos, dentre eles as diversas organizações católicas que há anos trabalham para promover regras para o bem da infância, a serem respeitadas nas transmissões de rádio e televisão através de códigos de regulamentação que devem ser redigidos ou, como em alguns casos, apenas atualizados. Em muitos países do sul do mundo as novas tecnologias de multimídia já estão muito disseminadas e seu uso merece uma atenção particular para tutelar o público mais jovem.
Especialmente na África, explicou o organizador do encontro, Firdoze Bulbulia, começa-se a examinar o projeto de um «Media center» para as crianças, que possa produzir e distribuir transmissões de rádio e de televisão destinadas ao público mais jovem, com o objetivo de realizar um canal televisivo pan-africano dedicado à infância. Os organizadores do encontro estão também trabalhando no projeto de uma aliança africana dos meios de informação e de comunicação, seguindo o modelo daquela já existente na América latina.

2) INTERNET

Na Itália, 47% das famílias italianas têm um computador em casa, um dado relevante mas sempre muito baixo em relação à média dos outros países europeus. O uso da internet por parte dos adolescentes e jovens, e a familiaridade que têm com tudo aquilo que pode ser digitado ou «descarregado» da internet, apresenta não poucos problemas. Pela sua própria natureza de rede de comunicação global, o problema se apresenta em ótica internacional, procurando garantir a tutela dos menores através de precisos acordos com os provedores para um efetivo controle de conteúdo. No campo italiano, até 2006, a tutela dos menores tinha sido deixada nas mãos dos próprios provedores, que em 19 de novembro de 2003 assinaram um acordo de auto-regulamentação: o Codice Internet e Minori. Embora o acordo tenha sido estipulado entre os representantes dos vários provedores diante do Ministério para a Inovação e a Tecnologia, no entanto ele permanece um acordo privado, com lacunas, principalmente no que se refere às sanções que muitas vezes devem ser aplicadas. Em 2006, na seqüência de numerosos casos de violência sobre menores, muitos dos quais realizados através da difusão de material pedo-pornográfico (quando não se tratava de verdadeiro e próprio aliciamento de menores via internet), foi promulgada a lei 38 de 6 de fevereiro de 2006: «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet».
Enfim, como aplicação da lei 38/2006, em fevereiro da 2007 foi publicado um decreto determinando os requisitos técnicos dos instrumentos de filtragem que os provedores da rede internet devem utilizar para impedir o acesso aos sites já assinalados pelo Centro nacional contra a pedo-pornografia. Mas, isso não basta para superar as dificuldades e impedir que os menores possam navegar de maneira arriscada na «rede das redes».
Atualmente foi reativada a comissão anti-pedofilia e desvios de menores através da internet, o «Ciclope», que tinha sido instituída junto ao Ministério para a Eqüidade, do governo italiano, e que ficou inativa por um ano, até a sua reestruturação junto ao Ministério da Família. Está também para entrar em função um site dedicado ao uso da internet, junto ao Ministério das Comunicações, e um número telefônico de emergência gratuito, organizado pelo mesmo ministério e por «Save the children», que poderá ser utilizado por qualquer cidadão que queira assinalar algum abuso, desvio ou pedo-pornografia. Dentre as iniciativas mais recentes, deve ser assinalado o site www.tiseiconnesso.it criado pelo Ministério das Comunicações italiano, sempre em colaboração com «Save the children», onde é colocada à disposição uma série de informações sobre o conteúdo de certos sites, seja para os pais como para as próprias crianças, em conjunto com a campanha televisiva que tem como slogan «A melhor maneira de ajudar o seu filho a não usar incorretamente as novas tecnologias é conhecê-las».
Deve ser salientado também o fato de como a rede se tornou um grande mercado online. Para alguns produtores, o «e-commerce» de brinquedos corresponde já a 4% das vendas, e apenas em 2005 as vendas online corresponderam a 37.600 ações de compra. As razões para investir no processo online são múltiplas: desde a possibilidade de evitar as dificuldades logísticas de distribuição dos produtos, à ampliação de ofertas diferentes de produtos e também a possibilidade de envolvimento do cliente através de campanhas de mala direta e a criação de comunidades virtuais em torno de alguns produtos.

FICHAS:
Pedo-pornografia e internet
Em março de 2006, entraram em vigor as novas medidas diretas de combate e repressão ao fenômeno de exploração sexual dos menores e a pedo-pornografia, estabelecidas pela lei 38/2006 – «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet» foi publicada no Diário oficial em 15 de fevereiro de 2006, nº.38 – com a qual foram substancialmente modificados e integrados os artigos 600bis e seguintes do Código Penal italiano.
A lei confirma os artigos 527, 528, 529 e 725 do Código Penal italiano, que punem os «atos obscenos em local público, publicações, espetáculos obscenos, desenhos ou figuras que ofendem a decência pública».
Porque em muitas publicações, transmissões televisivas e anúncios publicitários, mesmo que não tenham declaradamente um caráter pornográfico, imagens de crianças e adolescentes são apresentadas de maneira explícita ou mais ou menos sutilmente ilusória e de forma falsa, pede-se um novo empenho das instituições competentes para que sejam observadas as normas em vigor e, se preciso for, que façam apelo aos órgãos de Polícia, o Instituto de autodisciplina publicitária, o Ministério das Comunicações, a Polícia postal ou a «Comissão tv e menor».

3) CINEMA

Confirmando as disposições da Constituição italiana, no que se refere ao direito e ao dever das famílias de serem protagonistas na educação de seus filhos, para muitos é chegada à hora de reelaborar a legislação que define o conceito de «censura» (a lei 161/1962 prevê a possibilidade de negar a autorização de abertura às salas de cinema ou de fazer cortes nos filmes, mesmo em função de um público adulto), que hoje está superado. É preciso com urgência estabelecer um critério de tutela dos menores não apenas no que se refere aos filmes que vêem nos circuitos cinematográficos, mas também sucessivamente em casa, muitas vezes em horários acessíveis na programação da televisão.
Uma avaliação correta e preventiva de um filme permite à família ter à sua disposição os instrumentos para escolher se um espetáculo é mais ou menos oportuno, conhecendo a trama, os eventuais conteúdos mais sensíveis, a classificação que a obra recebeu em outros países, etc. Por isso, é justo que a legislação seja revista, uma operação que requer atenção e perspicácia da parte das instituições em um momento de transição da mídia, como este que estamos vivendo, quando esta se tornou realmente um importante componente na educação dos menores.
Não faltam filmes que atraem o público por causa de seu conteúdo de violência, e no entanto entram no circuito cinematográfico sem qualquer restrição de idade. Para um filme que é notícia nos jornais, existem muitos outros com conteúdos duvidosos ou até mesmo perigosos que conseguem passar através do filtro da comissão de revisão cinematográfica, que atualmente funciona junto ao departamento de cinema do Ministério dos Bens Culturais.
Ao mesmo tempo em que existe um projeto de lei do ministro dos Bens culturais, que deve ainda iniciar os trâmites parlamentares, novas situações se apresentam na Itália, com a autocensura de filmes, feita pelos produtores ou distribuidores cinematográficos, com a introdução de novas e mais específicas faixas etárias para as restrições visando os menores a partir dos 10 anos de idade. As restrições serão feitas baseando-se em uma avaliação classificatória dos conteúdos das obras e sucessivamente serão ainda analisadas por uma comissão de psicólogos, educadores e pais.
Este sistema se inspira no modelo americano da Motion Picture Association of America (MPAA), que há 40 anos representa os interesses da indústria do audiovisual americana no mundo. Funcionando a partir de regras bem precisas (estabelecidas ao longo dos anos, também segundo as sentenças dos tribunais federais nos vários Estados americanos e em base aos protestos dos cidadãos), a autocensura americana prevê a existência de uma única comissão competente para determinar as restrições do PG12 ao «restricted» 17 anos. Esta comissão é composta exclusivamente de pais, considerados os primeiros depositários da educação dos filhos, e representam transversalmente a audiência. Importantes sanções econômicas asseguram que o mecanismo de autocertificação corresponda efetivamente aos interesses dos cidadãos. No site da Motion Picture estão disponíveis aos pais os pontos de referência para a avaliação das obras de entretenimento e são publicadas as restrições aplicadas a cada filme que está em exibição nas salas de cinema. Geralmente as avaliações parecem muito mais severas em relação a outros países. Tudo isso, nos vários anos de sua aplicação, deu uma qualificação à indústria americana e seu correto serviço prestado aos ouvintes. Qualquer estrada que se pretenda seguir na Itália, é importante para as famílias que seja estimulado um mercado de produção adequado à infância: é justo que o mecanismo da indústria cinematográfica continue com o seu ritmo de produção, mas não é justo confundir as classificações de acesso ao produto, como qualquer indústria sabe muito bem.
No que se refere às normas européias de classificação dos filmes, e em geral de todo «entertainment» (neologismo anglo-saxão, que, no entanto encontra sua raiz etimológica na relação entre educação e jogo) acessível aos menores, deve ser citado o sistema NICAM, que funciona na Holanda há alguns anos. Fundado em 1999, o NICAM (Nederlands Instituut voor de Classificatie van Audiovisuele Media) se baseia na lei Media Act, onde os programas de grupos que tiveram a autorização para atividades de «broadcasting» não devem incluir obras audiovisuais que prejudiquem o desenvolvimento físico e psicológico de pessoas com menos de 16 anos de idade, seguindo as diretivas da União européia («Televisão sem fronteiras» IV).
O sistema de classificação preventiva funciona também na Grécia, com a lei 1.597, de maio de 1986, que prevê que antes da projeção nas salas de cinema, cada filme seja submetido pelo produtor ou pela sociedade de importação à Comissão para a juventude, que classifica o filme seja como adequado aos menores, ou proibido aos menores de 13 anos, ou de 17 anos ou ainda, nos casos mais graves, severamente inadequado aos menores. Esta comissão é um órgão do Ministério da Cultura e foi concebida procurando-se estabelecer certa proporcionalidade, sendo composta de representantes do Estado (Ministério da Cultura), das categorias ligadas ao cinema, de psicólogos especializados na educação, de sociólogos, dos jovens, dos educadores e dos pais.
Na Áustria, está em vigor um sistema de avaliação complexo, instituído em base a um princípio constitucional federal que confia a tutela dos menores, no que se refere ao cinema e em geral aos meios de comunicação de massa, à competência específica dos Lander. A lei nacional que engloba a regulamentação da mídia é a ORF-ACT, ou seja, a Austrian Broadcasting Corporation nº. 379/1984, que estabelece quais os critérios sobre os quais deve se basear a proteção aplicada a programas e filmes transmitidos na televisão ou através de outros canais mediáticos. No que se refere à exibição dos filmes, a avaliação preventiva das obras cinematográficas, para que sejam decididas as faixas etárias adequadas, é regulamentada pela lei austríaca para a tutela dos menores, a «Jugendschutzgesetz», aplicada através das leis dos Lander federais. Esta lei estabelece nove faixas de restrições de público a partir dos seis anos de idade, com uma sucessiva graduação que prevê restrições para 10, 12, 14 e 16 anos de idade. Para supervisionar o sistema de classificação cinematográfica, existe uma comissão junto ao Ministério da Educação, em Viena, que comunica seu parecer sobre a idoneidade dos filmes às autoridades locais. Geralmente e de maneira individual os Lander adotam as decisões da comissão, e é em âmbito local que se decide de sua aplicação.
Na Espanha, o artigo 20 da Constituição reconhece o direito do cidadão a exprimir e difundir livremente seu pensamento, suas idéias e suas opiniões através de qualquer meio de divulgação. Se por um lado o exercício de tais direitos «não pode ser restrito através de nenhum tipo de censura prévia», o mesmo artigo especifica que «estas liberdades têm o seu limite no respeito dos limites reconhecidos pelas normativas que exprimem este respeito, especialmente no direito à honra, à privacidade, à própria imagem e à proteção da juventude e da infância».
Baseando-se neste princípio, a qualificação dos filmes (Real decreto 81/1997) e das obras audiovisuais é feita antes de sua difusão, através do Instituto de cinematografia e das artes audiovisuais (ICAA), uma entidade autônoma, mas ao mesmo tempo ligada ao Ministério da Educação e Cultura através da secretaria de Estado para a cultura (ver site www.mcu.es).
A subdireção geral de fomento à indústria cinematográfica e do audiovisual, que faz parte do ICAA, se ocupa, dentre outras funções, da classificação em faixas etárias dos filmes e das outras obras audiovisuais em vista de sua exibição pública e para a sua distribuição. A comissão se encarrega de divulgar as informações sobre os filmes e programas audiovisuais, com classificação que vai desde as «salas X» até as restrições para cada faixa etária do público.
Os filmes de caráter pornográfico não podem receber subvenções do Estado e sua projeção nas salas prevê uma taxa suplementar, destinada em parte para estimular um fundo de proteção cinematográfica. A projeção destes filmes pode ser feita somente nas «salas X», onde não podem ser apresentados outros tipos de obras cinematográficas e onde é proibido o ingresso de menores de 18 anos.

CINEMA NA TV

Devido ao alto consumo de programas de televisão por parte dos menores e levando-se em conta as diretivas da União européia, que promovem a auto-regulamentação no âmbito nacional das emissoras de tv e a participação das famílias nesta obra educativa, há alguns anos estão em vigor na França, na Holanda, na Grã-Bretanha, na Grécia e na Itália os códigos de sinais, que servem para identificar tanto os filmes projetados na salas de cinema como aqueles transmitidos na televisão. A tutela dos menores no âmbito da televisão foi também feita adotando-se o chamado sistema «watershed» (separador das águas), que funciona segundo uma seleção de faixas horárias protegidas, algumas aconselhadas à visão dos menores, outras aconselhadas a todos e outras ainda, principalmente na programação noturna, indicadas somente a um público adulto.
A faixa de idade determinada pela classificação preventiva dos filmes tem obviamente uma repercussão na programação das chamadas faixas horárias protegidas ou distintas nas emissoras de televisão pública em todos os países europeus. A definição das linhas de conduta comuns está à base dos acordos de auto-regulamentação e de co-regulamentação dos programas de televisão, estabelecendo-se um código de procedimento comum para as emissoras tanto públicas como privadas. Criou-se assim uma base normativa, que é assumida pela autoridade do Estado e que recebe a confiança dos consumidores das emissoras públicas ou privadas que adotam este sistema de auto-regulamentação.
Para tornar visível aos adultos as classificações dos programas apropriados aos menores, muitas emissoras européias adotaram um sistema de sinais que através de símbolos, números, cores e sinais acústicos advertem ao público a respeito daquilo que está para ser transmitido.
Mas, apenas este sistema, assim como o de filtragem (tipo v-chip), não basta para garantir uma verdadeira tutela dos menores diante de um conjunto de imagens difíceis de serem decodificadas por um jovem. Deve-se pensar às imagens de guerra dos telejornais, dos filmes escabrosos ou às informações sobre os crimes hediondos, que muitas vezes têm como ambiente o próprio núcleo familiar.
É na colaboração entre Estado, produtores de programas audiovisuais e famílias que pode ser fundamentado um autêntico respeito dos menores que encoraje o crescimento positivo da criança em base aos valores fundamentais da pessoa humana.

4) CELULARES COM VÍDEO

Hoje a difusão dos celulares com vídeo chegou à Itália ao índice se 134%, o que significa que muitas pessoas possuem pelo menos dois celulares, inclusive os jovens e as crianças, que recebem este instrumento dos próprios pais. De fato, de duas crianças entre 8 e 13 anos de idade, uma delas tem um celular no bolso. Aquele que poderia ser um instrumento para controlar melhor os deslocamentos e as necessidades dos filhos, se revela no entanto um perigoso meio que pode expor a outro tipo de utilização por parte dos menores, que não se separam nunca do próprio celular, nem mesmo durante as aulas, como lamentam vários professores. Apesar do código de auto-regulamentação assinado pelas principais operadoras (Código de conduta para a oferta de serviços a pagamento em tutela dos menores), na realidade os novos serviços opcionais do celular o tornaram um «personal computer» capaz de permitir novos usos que antes não tinham.
Os desenvolvimentos tecnológicos que estão se verificando no campo da telefonia móvel – particularmente no que se refere à sinergia com a internet e a adoção dos sistemas DVB de vídeos-telefone – contribuem a aumentar a oportunidade de comunicação também para as novas gerações e, ao mesmo tempo, repropõem em novos termos a questão da tutela dos menores. As evoluções já previstas ulteriormente para os próximos anos e o número sempre crescente de pessoas envolvidas, pedem uma grande consciência social e uma constante atenção das pessoas e órgãos encarregados de garantir os direitos dos cidadãos.
Neste contexto devem ser reafirmados os direitos dos menores no campo da comunicação, dentre os quais certamente não está em último lugar aquele que se refere também à segurança diante dos riscos de indução a comportamentos ilícitos ou de acesso a conteúdos nocivos ou indesejados. Também neste campo é essencial o papel dos pais e, em geral, de todos aqueles que são chamados a ter uma função educativa. A maior segurança das crianças e dos jovens quanto ao acesso a conteúdos ilegais é um ponto que deve merecer atenção também através da maior conscientização dos pais e das mães, que devem se capacitar a conhecer e utilizar estes meios.
Para a «alfabetização» dos pais na utilização da mídia devem colaborar também as instituições públicas, promovendo um uso positivo das novas possibilidades tecnológicas. Às empresas cabe a responsabilidade de colocar no mercado um produto que dê garantias no que se refere à sua utilização pelos menores, superando os limites estabelecidos pelo código de auto-regulamentação assinado pelas operadoras de celulares. Devem também oferecer maiores informações aos adultos que assinam um contrato de utilização, como por exemplo a adoção de bloqueios automáticos de acesso a conteúdos nocivos, se o celular passa às mãos de um menor de idade.

5) VIDEOGAMES

Trata-se de uma indústria global, que conquistou os jovens e não apenas eles. Os números relativos à difusão repentina dos videogames indicam que existem 250 mil sites de videogames, cada um deles propõe uma série de títulos, muitos deles recheados de cenas de sexo e de violência. Uma pesquisa recente do Instituto italiano de medicina social (IIMS) coloca em evidência, entre outras coisas, a escassa informação por parte dos adultos a respeito dos videogames utilizados pelos filhos, o predomínio de temas violentas em mais de 30% de títulos não aconselhados aos menores, o predomínio de personagens virtuais normais que podem se tornar especiais, realizando ações extraordinárias.
Mas, o ponto de risco mais elevado se refere aos pequenos jogadores de videogames, crianças entre seis e nove anos de idade que se submetem a entrar tão intensamente no jogo virtual que chegam a formas de dissociação da realidade e solicitam um monitoramento muito atento da parte dos adultos. A mesma pesquisa indica a presença de videogames em 25% das famílias com crianças de três a cinco anos de idade e em 65,2% das famílias com crianças entre seis e 10 anos de idade. O que produz efeitos negativos no âmbito cognitivo das crianças não parece ser especificamente o meio, mas muito mais os elementos que criam a excitação, tais como a velocidade de produção do estímulo e da resposta, a velocidade das imagens, os efeitos especiais, os contrastes, a fragmentação da história, o binômio rumor-ação. O uso prolongado do jogo inibe, segundo alguns psicólogos, a área da capacidade crítica, provocando passividade e ao mesmo tempo agressividade na criança. Mas, não queremos demolir os videogames, porque existem aqueles que são muito adequados aos mais jovens, com valores de informação e de educação, seja também porque o uso deste meio é na realidade um passo na preparação da criança ao sucessivo e mais sofisticado, que é o uso da internet.
De qualquer maneira, os dados relativos à venda destes produtos de entretenimento mostram um crescimento em todos os lugares e a difusão deste meio é acompanhada de uma aceitação social (ou seria uma resignação?) sempre maior.
É urgente ampliar o percurso de conhecimento e das estratégias internacionais, para monitorar um mercado que está cada vez mais vasto. Parece urgente estabelecer modalidades operativas para o controle dos conteúdos e do sistema de sanções, seja para o produtor como para o vendedor dos serviços. O código de auto-regulamentação Pegi (derivado em 2003 do sistema de avaliação e classificação holandês, Nicam, que assinala os conteúdos inadequados aos menores), adotado pelos industriais de «entertainment» que produzem videogames, é a única forma de auto-regulamentação existente atualmente e que prevê sanções (raramente aplicadas, mesmo diante de casos graves evidentes) para os produtores que colocam no comércio os jogos com indicações de faixas etárias apenas aproximativas.
O código Pegi, ao qual a associação européia Isfe adere em 2002, é evidentemente insuficiente na sua função declarada de «fornecer aos consumidores as informações mais oportunas» e expostas no selo de produção. E, como o setor dos videogames tem hoje um volume de negócios que ultrapassa os 740 milhões de euros, envolvendo 24 milhões de jogadores (43% da população a partir dos quatro anos de idade), com uma venda dos produtos classificados para maiores de três anos de idade que chega aos quase 48% dos consumidores. É um dado que define o impacto deste gênero de meio sobre a infância e a adolescência, mostrando toda a sua periculosidade, seja pelo consumo de conteúdos inadequados, seja pelo excessivo número de horas dedicado neste passatempo, muitas vezes solitário e sem a presença de um adulto ao lado. Se for verdade, como sustenta a indústria, que a produção de videogames violentos é apenas uma mínima parte do mercado, é também verdade que esta representa a fatia mais importante do retorno econômico.
O interesse pelos videogames é alimentado pela sinergia com os filmes que inspiram o jogo homônimo e que torna sempre mais atrativo este gênero, principalmente para os adolescentes. Desta maneira é importante também neste campo o estabelecimento de regras precisas em defesa dos consumidores dentre o público jovem, mais exposto aos riscos destas novas formas de entretenimento cada vez mais sofisticadas e envolventes, por causa da combinação entre narrativa e efeitos gráficos.

6) PUBLICIDADE

O problema da tutela dos menores diante da publicidade se apresenta como um corolário, dentro do quadro mais amplo que regulamenta a difícil relação entre a mídia e as crianças. A televisão, e portanto também a publicidade, se constitui em uma fonte de perigo para os menores, isto é, para a maior parte das crianças, principalmente em idade pré-escolar, que devem saber fazer a diferença entre a publicidade e o resto da programação, e entre os programas de ficção e a realidade. Com essas considerações não significa que exista uma acrítica rejeição da publicidade em si mesma – à qual se reconhece, no entanto, onde proceda corretamente, uma função positiva no processo de formação, de crescimento crítico e de socialização do menor –, mas existe a necessidade de prever um sistema de regras destinado a garantir-lhe um uso adequado.
O efeito dos anúncios publicitários é tão grande que em alguns países estão sendo tomadas medidas drásticas a respeito. No Reino Unido, por exemplo, recentemente foram vetados os anúncios publicitários durante os programas destinados às crianças até nove anos de idade, a partir de 1º de janeiro de 2008 a medida se estenderá à programação para os jovens até 15 anos de idade e até o final de 2008 serão vetados em todos os canais dedicados aos menores. Apesar de se reconhecer que a publicidade serve para financiar os programas, aqueles dedicados às crianças terão que recorrer a outras fontes. Também na França começa a se impor uma «linha dura» a esse respeito: visto a alta incidência de publicidade de merendas, de sucos e doces em geral, a partir de agora os anúncios dedicados às crianças deverão ser precedidos de uma espécie de aviso, que orientará para uma alimentação adequada.
Mas, por que as crianças são tão frágeis diante dos apelos da publicidade? Na Itália, explica Paolo Landi, secretário geral da Adisconsum (Associação de defesa dos consumidores e do ambiente»), em um capítulo de seu estudo «Crianças da multimídia»: «Se consideramos que a publicidade não faz outra coisa que veicular um conhecimento imediatamente concretizável em um “ter”, ou em um “ser”, ou em um “fazer”, a criança absorve sem dificuldades os três componentes que são a obsessão dos expertos de marketing, isto é, o componente cognitivo (como fornecer informações indeléveis sobre um produto ou um serviço), o componente afetivo (como fazer o consumidor reagir de maneira emotiva) e o comportamental (como colocar o pequeno consumidor em movimento na direção da aquisição). A partir deste ponto de vista a criança é o público ideal, o consumidor a quem se pode vender qualquer coisa».
Na Itália está em vigor um código de autodisciplina publicitária que surgiu em 1966, em base a um acordo entre os profissionais do setor. Esta primeira forma de tutela, em grande parte com origem comunitária, tem como protagonistas entidades administrativas independentes: a Autoridade de controle da concorrência e do mercado de setor e a Autoridade de garantia para as comunicações e a editoria. Enquanto isso, para a auto-regulamentação, orientada pelas normas que constam do Código de autodisciplina publicitária, e agora também, embora com força jurídica diferente, pelo Código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual se reconhece um poder de decisão e de sanção, emanando uma ordem e intimando seu cumprimento.
Em todos os países onde a televisão serve de veículo às mensagens publicitárias, o mundo empresarial é plenamente consciente do enorme poder de influência que a publicidade tem sobre as crianças.



NORMATIVA INTERNACIONAL

O assunto relativo à tutela dos menores na mídia é um dos mais debatidos, seja no que se refere às normas nacionais, seja no âmbito internacional. Encontra-se diante da situação de precisar acertas as contas com toda a extensão da rede global da internet. O exemplo que, neste momento de transição, coloca mais em evidência a necessidade de estabelecer leis que estejam em condições de controlar o acesso e uso dos conteúdos nocivos para os menores, é exatamente o da internet. Qualquer pessoa no mundo pode abrir um site considerado «arriscado», contendo elementos ilegais e acessíveis a consumidores despreparados, disponibilizados por quem está do outro lado do mundo.
No que se refere aos princípios gerais no âmbito do direito internacional, é preciso recorrer principalmente à convenção da ONU sobre os direitos da criança, com sede em New York, ratificada pelo Parlamento italiano através da lei nº.176/1991. Esta garante à criança uma «consideração proeminente» também a respeito da liberdade, seja no se refere à expressão, seja quando tutela os conteúdos recebidos. Esta mesma convenção, em seu artigo 17, fala da relação entre menor e televisão, desejando «um sistema normativo que tutele o menor-consumidor, mesmo com todas as dificuldades que se apresentam», seja para individuar os fenômenos que devem ser monitorados, seja sobre as normativas possíveis.
No direito da União européia, tal tutela foi recentemente confirmada pela Carta dos direitos fundamentais da União, aprovada em Nice em 2000, cujo artigo 24 salienta que «os Estados membros reconhecem a importância da função exercida pelos meios de comunicação de massa e cuidam para que a criança possa ter acesso às informações e materiais... com a finalidade de promover o seu bem estar social, espiritual e moral, além de sua saúde física e mental». A normativa seguinte, 89/552/CEE, previu algumas restrições, seja no que se refere aos programas como para as mensagens publicitárias destinadas a este público». O artigo 22 desta normativa conduz a impedir a transmissão de programas que contenham cenas pornográficas ou de violência gratuita, ou outros programas inadequados a este público. Não podemos esquecer de mencionar a determinação expressa de «Televisão sem fronteiras», que está hoje em sua quinta versão atualizada, que o tema da tutela dos menores está relacionado com o estatuto geral dos direitos dos menores e corresponde ao disposto nos artigos 50 e 31 da Constituição italiana.
Se for claro que os princípios normativos são todos a favor da tutela dos menores, é também verdadeiro que uma tecnologia em contínua evolução colocou em crise as velhas regras do jogo. Mas também é claro que não se pode mais adiar a necessidade de estabelecer novos parâmetros normativos, para que as crianças possam utilizar os meios de comunicação próprios de seu tempo, com aproveitamento e serenidade também para as famílias.~

EDUCAÇÃO À MÍDIA NO MUNDO: PARA SABER MAIS

A difusão da educação à mídia é uma resposta à necessidade de se informar sobre as novidades no campo dos novos meios de comunicação. Em seguida citamos apenas alguns sites que em vários países oferecem maiores informações sobre como aprender a usar melhor a mídia, enfrentando a problemática da tutela dos menores e da alfabetização às novas tecnologias por parte dos adultos.
«The Media Awareness Nework-Réseau éducation médias» é uma organização canadense sem fins lucrativos, pioneira no desenvolvimento de programas sobre a educação à mídia. Com esta finalidade ela produz programas online em colaboração com organizações internacionais, convicta que, para interpretar as mensagens de informação, de entretenimento e comerciais, os jovens têm necessidade de instrumentos críticos válidos. Por isso é importante formar também os adultos (famílias e professores) sobre como funciona a mídia e como ela determina o estilo de vida.
A organização realiza uma ação contínua de monitoramento em relação à mídia (televisão, cinema, videogames, imprensa, publicidade, etc.), e sua seção dedicada aos pais oferece uma série de elementos para que estes reflitam com os filhos sobre esses meios, além da seção para os educadores, que inclui lições e materiais de apoio. Uma outra seção é dedicada à análise das questões ligadas à mídia, como a difusão de estereótipos, as representações de violência e da diversidade, a privacidade, a publicidade dirigida aos menores. Seu site é em inglês e francês (http://www.media-awareness.ca).
«Quai des images» é o site dedicado ao ensino de cinema e audiovisual organizado pelo Ministério da Educação francês. Ele propõe atividades ligadas à educação à imagem e de análise dos filmes em consonância com os programas escolares, agrupa os textos oficiais a respeito dos meios audiovisuais, oferece uma série de instrumentos de análise e de estudo completos sobre alguns filmes específicos e sobre certos autores em particular, informa sobre conferências, seminários, cursos e festivais sobre o mundo audiovisual e sua utilização em âmbito educativo e didático. Entre outras coisas, reúne também as propostas e as experiências feitas por professores e seus alunos nas escolas secundárias francesas no campo da educação à imagem, além de organizar um fórum de discussões aberto a todos sobre a educação à mídia (http://www.ac-nancy-metz.fr).
Sempre na França, está em funcionamento o blog «Zéro de conduite», organizado pelos professores e destinados a educadores, pais e estudantes. Promove o uso do cinema como instrumento pedagógico, dedicando-se especialmente à atualidade cinematográfica, mas sem esquecer os clássicos e os documentários. Com várias seções e espaços de aprofundamento, se propõe como um local de discussão de temas em um debate aberto (http://cinema-ducation.fluctuat.net).
A Universidade de Massachussetts organizou o Media Education Foundation – MEF, mídia de desafio, que produz e distribui documentários destinados a estimular o pensamento crítico e o debate sobre a relação entre aqueles que detêm o poder sobre a mídia, os conteúdos da mídia comercial, a exigência democrática de um livre fluxo de informações, as diversas representações de idéias e pensamentos e o direito dos cidadãos de informar e serem informados. Alguns destes temas são abordados criticamente, como a identidade do gênero na publicidade, a imagem de sexo nos videoclipes, o papel da mídia na construção da identidade cultural, mídia e saúde, etc. (http://www.mediaed.org/).

(a cura di M. F. D’A.)

 
At 9/17/2007 2:42 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

AS CRIANÇAS E A MÍDIA (II PARTE):
ACEITAR O DESAFIO EDUCATIVO


O tema da 41ª Jornada das Comunicações Sociais, «As crianças e os meios de comunicação: um desafio para a comunicação», nos convida a refletir a respeito de dois aspectos particularmente importantes. O primeiro é a formação das crianças, para que estejam em condições de receber de maneira crítica aquilo que vêem. O segundo é a formação à consciência e ao uso consciente da mídia, que está em contínua transformação tecnológica.
De fato, é o que especifica Bento XVI no início de sua mensagem, de 20 de maio de 2007, para a Jornada: «Os complexos desafios que a educação contemporânea deve enfrentar são muitas vezes ligados à grande influência dos meios de comunicação no nosso mundo. Como aspecto do fenômeno da globalização e estimulados pelo rápido desenvolvimento da tecnologia, os meios de comunicação delineiam fortemente o ambiente cultural (cf. João Paulo II, O rápido desenvolvimento, nº3). Na realidade, há quem afirma que a influência formativa da mídia está em competição com aquela da escola, da Igreja e, quem sabe, até com aquela da própria família».
De fato, como salienta o Pontifício conselho para as Comunicações Sociais, «para muitas pessoas, a realidade corresponde àquilo que os meios de comunicação definem como tal». Episódios recentes, como a utilização do celular na filmagem de violências nas salas de aula, abusos sofridos por pessoas deficientes, fenômenos de trote e de violência generalizada, demonstram como as crianças que crescem passando uma média de quatro horas por dia diante da televisão, sozinhos em casa, absorveram a lógica do «estou no vídeo, logo existo». Os psicólogos, os pedagogos e os estudiosos dos meios de comunicação estudam há tempos sobre as relações entre o consumo televisivo e o comportamento violento dos menores. Uma grande quantidade de pesquisas realizadas em muitos países ocidentais demonstra como esta correlação seja realmente inegável.


NOVAS LINGUAGENS

O fato que muitas crianças vivem completamente inseridas no mundo dos velhos e novos meios de comunicação, que estão cada vez mais frequentemente em correlação entre eles, é confirmado pela popularidade de alguns modelos televisivos, considerados tão efêmeros quanto penosos «momentos de glória», presentes nos programas com os maiores índices de audiência, dos «reality» aos «talk show», sem falar do «trash», que hoje se tornou um gênero de espetáculo.
Dentre as preferências demonstradas pelos adolescentes italianos que assistem televisão mais do que três horas por dia, encontramos, em primeiro lugar, a figura da «veline» (Ndt: misto de corista e coadjuvante na apresentação de programas populares da televisão italiana), enquanto outros da mesma idade se concentram no mais clássico exemplo, o do jogador de futebol. De toda maneira, a coisa mais importante é aparecer, pouco importa por qual motivo, de ser «alguém» ou «alguma coisa» no Olimpo mediático, mesmo que seja apenas por um instante.
Estes são os exemplos mais negativos dos condicionamentos derivados de um excessivo e acrítico uso dos meios de comunicação. Encontramo-nos diante de uma nova geração que cresceu na frente da televisão, capaz de usar as novas tecnologias que os próprios pais, que as adquiriram e as tornaram disponíveis, muitas vezes se encontram despreparados para utilizá-las.
Tanto é verdade que hoje em dia os filmes são vistos diretamente nos celulares e a televisão pode ser assistida na tela do computador. Hoje se telefona através da internet e graças ao download se descarrega os CDs e DVDs mais recentes, se filma e se faz foto com o celular, e assim por diante.
Nas casas, o vocabulário familiar se reduziu ao gênero dos sms e se fala tendo o som da televisão no fundo, se comunica através de e-mail, se faz «visita virtual» via computador, se percorre através de bibliotecas virtuais, tanto que as fichas e arquivos de papel evocam imagens do outro século, completamente em desuso.
A situação dos nossos filhos é diversa daquela da geração precedente, pois eles abriram seus olhos tendo diante de si estes cenários de profunda, contínua e envolvente transformação tecnológica. Eles se constituem aquela que os estudiosos chamam de geração nascida «com seis dedos»: além dos cinco dedos normais da mão, o sexto é o mouse do computador.
Com o aparecimento do mundo «virtual» da internet e dos videogames criou-se uma defasagem em relação à realidade verdadeira e própria. As duas dimensões parecem muitas vezes, e para muitos jovens, como universos paralelos, com conseqüências não indiferentes no plano do processo de amadurecimento. Têm grande sucesso os sites nos quais se prevê uma segunda vida (basta verificar os milhares de registros nos poucos meses de existência do site italiano de «Second Life», que em todo o mundo já tem sete milhões de inscritos), onde a simulação reproduz todas as situações da vida real. Apenas que tudo é falso, a começar da nova identidade, que pode ser escolhida e com ela se inicia a fazer parte deste mundo fora do mundo, onde se pode ser um «qualquer coisa». Isto é, ninguém.
Assim, o grande desafio cultural de hoje é propriamente a redefinição dos limites, que muitas vezes se apresentam demasiadamente instáveis. Isto é, redefinição dos limites entre o real e o virtual, superando a divisão digital que hoje separa as gerações adultas daqueles mais jovens.


OS JOVENS: PROTAGONISTAS OU VÍTIMAS DAS MUDANÇAS?

A linguagem deles é pobre, muitas vezes recheada de termos tirados do dicionário do internauta: clicar, chatar, messagiar, deletar, são alguns dos neologismos que fazem parte de seu vocabulário quotidiano. Falta uma dimensão humana da tecnologia que esteja em condições de traçar o perímetro cultural entre o real e o virtual. Assim a aldeia global difundiu uma quantidade de modelos comportamentais desviados, ou pelo menos discutíveis.
Desta maneira, os jovens que vivem a milhões de quilômetros de distância jogam o mesmo videogame, vêem o mesmo filme, assim como, de maneira transversal, absorvem modelos e comportamentos semelhantes. Muitas vezes os adultos têm menos domínio no uso das novas tecnologias e observam, com uma preocupação resignada diante de suas próprias limitações, as crianças que navegam facilmente na internet.
As raízes das dificuldades neste campo educativo são muito bem explicadas por Marina D’Amato, professora de sociologia da Universidade de Roma, que salienta: «Cada geração tem necessidade de se encontrar também em um mundo fantástico, que serve a interiorizar o paradigma do bom e do belo, do justo e do errado, do oportuno e do útil, também em relação aos exemplos que procedem da narrativa. Hoje nos encontramos em uma condição na qual os avós e os pais contam cada vez menos histórias aos filhos e aos netos, e este papel foi assumido pela televisão. Mas, na realidade, a televisão “exila” e “con-funde”, isto é, funde os modelos morais que são frutos de ânsias e problemas mal resolvidos, muito mais que de certezas. Embora estes se transformem com freqüência, a cada três ou quatro anos, o fato de serem repropostos continuamente faz com que se justaponham uns aos outros» (ver Come mediare i media, de Mario Russo).
Se for verdade que a televisão é o meio mais usado até a adolescência, imediatamente depois surge a grande atração pela internet. Esta passagem nasce de uma sintonia com a linguagem televisiva, que na idade infantil muitas vezes é ouvida durante muitas horas no dia. Esta linguagem se baseia em uma mediação da realidade e desta maneira ela ativa um processo de recepção que é de tipo emotivo.
Neste registro emocional é mais fácil acabar envolvido por situações e figuras capazes de se proporem como modelos identificadores, preservadores de sentido e de comportamentos a serem imitados.
O poder de concentrar uma vontade emulativa em alguns personagens, que correspondem particularmente às necessidades interiores do jovem (necessidades na maioria das vezes induzidas pela publicidade ou por modelos estimuladores), tem uma forte relação com a quantidade de horas que o jovem passa utilizando os novos ou os velhos meios de comunicação.


EDUCAÇÃO NECESSÁRIA

«A formação adequada a um uso correto dos meios de comunicação é essencial para o desenvolvimento cultural, moral e espiritual das crianças… Educar as crianças a serem seletivas no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja, da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos. Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia, com a certeza de que este difícil, embora gratificante, aspecto da condição de pais, é apoiado por toda a comunidade.»
As palavras do discurso de Bento XVI definem com grande clareza o paradigma de uma justa relação entre a mídia e os menores. Uma clareza que devemos agradecer ao magistério da Igreja, no momento em que o mundo da mídia parece ignorar a verdadeira problemática educativa das crianças e as expectativas de qualidade e de segurança exigidas pelas famílias no que se refere ao uso desses meios, seja do cinema aos videogames, da televisão à internet.
Diante da utilização destorcera do meio televisivo, o mais difundido dentre os meios de comunicação, a Igreja se interroga sobre o porquê da televisão não ter um papel educativo e por que os meios de comunicação não podem ser companheiros confiáveis para os jogos na fase de crescimento da criança. O anúncio de uma recente campanha sobre o uso da mídia, promovida pelo Ministério das Comunicações, mostra os vários membros da família que estão vendo a televisão ao lado de uma criança.
Que se trate do avô ou da mãe, a mensagem é a mesma: não deixar uma criança sozinha diante de um meio que, sem o apoio crítico educativo de um adulto, pode transmitir conteúdos inadequados à idade e à maturidade daquele que o vê. Sem esquecer as responsabilidades dos produtores televisivos, empenhados na organização dos programas, o papel da família é realmente insubstituível.
Se realmente o objetivo de quem administra a sociedade de produção televisiva, ou das multinacionais produtoras de videogames ou das operadoras de celulares, é o de promover e vender o produto, o bem estar psicofísico da criança está no centro do interesse dos educadores, sejam eles os professores ou, em primeiro lugar, os pais.
Isto explica bem a mensagem do Papa, que continua a sua análise, salientando que «educar as crianças a serem seletivos no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja e da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos (ver João Paulo II, «Familiaris Consortio», 76). Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia.»


CONTEÚDO DA MÍDIA

No panorama de uma revolução da multimídia, que está modificando transversalmente os hábitos, a mentalidade, os modelos e as linguagens, deve voltar ao centro do debate a tutela daquilo que é melhor para os menores. Sem acusar a «mídia», que enquanto tal não é nem boa nem má, o importante é partir de uma a análise do produto, para assim poder individuar conteúdos que sejam de melhor qualidade para as crianças e os adolescentes. Porque a televisão é um instrumento que abre janelas de conhecimento para o mundo e, se bem utilizada, de «má professora» pode se tornar uma preciosa fonte de estímulo para o crescimento humano e cultural.
A mesma coisa vale, e com mais razão, para a «rede» que engloba e compreende tudo, e para os videogames, onde, ao invés de violência e monstros, poderia se dedicar a produzir (e isso já ocorre em certos casos) histórias instrutivas e de conteúdo interessante.
Bento XVI coloca justamente em evidência as enormes possibilidades para que seja melhorado o conteúdo deste grande campo de produção multimídia: «A educação através da mídia deveria ser positiva. Colocando as crianças diante de um meio estética e moralmente excelente, estas recebem uma ajuda para que desenvolvam a própria opinião, a prudência e a capacidade de discernimento. É importante aqui reconhecer o valor fundamental do exemplo dos pais e as vantagens de introduzir os jovens aos clássicos da literatura infantil (…). A beleza, quase um espelho do divino, inspira e vivifica os corações e as mentes juvenis, enquanto a feiúra e a vulgaridade têm um impacto deprimente sobre os comportamentos». Diante de uma decadência geral do produto televisivo, a questão da qualidade aparece ainda mais forte e vibrante em grande parte de um público formado de famílias, que pede para não ser apenas um exército indistinto de ouvintes silenciosos, mas um público em condições de exprimir suas preferências por conteúdos formativos e informativos de bom nível.
A mensagem de Bento XVI continua, com algumas importantes indicações: «Como a educação em geral, aquela da mídia requer também uma formação ao exercício da liberdade. Trata-se de uma responsabilidade que compromete. Muitas vezes a liberdade é apresentada como uma incansável procura do prazer ou de novas experiências (…). Este desejo, sentido profundamente pelos pais e educadores, que é o de educar as crianças no caminho da beleza, da verdade e da bondade, pode ser apoiado pela indústria da mídia somente na medida em que se promove a dignidade fundamental do ser humano, o verdadeiro valor da vida familiar, as conquistas positivas e as metas da humanidade. A partir disso, a necessidade de que os meios de comunicação estejam empenhados na efetiva formação e no respeito da ética deve ser vista com interesse particular e com urgência não apenas pelos pais, mas também por aqueles que têm responsabilidade cívica».
Na realidade, nos encontramos na situação de ter que reconhecer que na Itália falta uma verdadeira «cultura da criança»: a situação é tão séria que no âmbito institucional procura-se dar uma nova organização geral para verificar e controlar os conteúdos dos setores de entretenimento, como os videogames, que até agora estão submetidos apenas a códigos de auto-regulamentação, feitos e codificados para uso e consumo pelas indústrias produtoras.
Uma vez mais, o primeiro e indispensável apoio à criança só pode vir da família e de uma relação mais estreita com os professores e educadores, exatamente como salienta Bento XVI, lembrando-nos que a preocupação educativa dos pais não deve se tornar uma preocupação genérica, mas uma atenção constante a tudo aquilo que diz respeito aos filhos.

A INDÚSTRIA DA MÍDIA

1) A TELEVISÃO

Se a televisão convencional se apresenta como um ramo de atividade já «maduro», no entanto se apresenta no horizonte a situação da mídia digital (satélite ou a cabo), também como uma plataforma que consente a ligação entre televisão, internet e outro tipo de mídia através do computador. No que se refere à qualidade da programação, apesar dos inúmeros bons propósitos anunciados no âmbito institucional, parece pequena a atenção às exigências dos menores em suas diversas faixas etárias. A programação para os menores, na realidade é confinada em redes e horários particulares, enquanto o resto da programação na faixa horária considerada «para todos» muitas vezes apresenta conteúdos inadequados aos jovens. Mas, quais são as expectativas das gerações de jovens no que se refere à televisão? É realmente verdade que preferem o «trash», os jogos com prêmios absurdos e as «velines»?
A partir de uma pesquisa recente feita pelo instituto Censis sobre «Comunicação, pluralismo social, sociedade aberta» (2005) surge que a relação entre os menores, e em particular dos adolescentes entre os 14 e 18 anos de idade, e a televisão é determinada por elementos de forte contradição e de passividade. Nessa faixa etária, 100% deles vêem televisão praticamente todos os dias, 86% acompanham um pouco de tudo, com uma relevante predileção pelos filmes (72%), por esporte (32%) e pelos «reality shows» (18%).
No entanto, a amostragem entrevistada não está realmente satisfeita com aquilo que vê. De fato, 36% dos adolescentes denunciam a vulgaridade difundida nos programas e 25% criticam a superficialidade. Dentre eles, 46% consideram a televisão como um meio que «invade», ao mesmo tempo em que é interessante notar que 25% consideram que em geral a programação televisiva alimenta nas crianças menores uma visão consumista da vida. Destes dados surge o contraste entre a procura de distração e a reprovação daquilo que lhes é proposto pela programação. Isto significa que o alto índice de procura não é um indicador de satisfação.
Considerando o axioma de que a televisão seja onipresente, fica claro que são os próprios jovens a pedirem uma maior atenção aos conteúdos: menos violência e menos vulgaridade. A exigência de uma regulamentação diversa, diz claramente o relatório do Censis, «não vem somente daqueles, pais e educadores, que estão preocupados pela possível influência negativa sobre os menores, mas se exprime nitidamente também através dos adolescentes, pelo menos de uma parte mais esperta e consciente dentre eles».
Para tutelar melhor os direitos dos menores, desde 2002 foi instituído junto ao Ministério das Comunicações um código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual aderiram os produtores de televisão, seja no âmbito nacional como local. Baseando-se nos princípios sobre a matéria existentes na Constituição italiana e na Convenção dos direitos da criança, estabelecida em 1989 pela ONU, a comissão que controla sua aplicação avaliou em todos estes anos de atividade os milhares de casos em que foram violadas as normas de tutela, que prevêem a transmissão de programas e imagens adequadas a um público de menores de idade durante aquela que é chamada de «faixa protegida» da programação televisiva (das 7h30 às 22h30), intervindo com denúncias e sanções, que nos casos mais graves foram aplicadas pela Autoridade de garantia no setor das comunicações. Para o futuro, esta comissão deverá se transformar em um organismo mais amplo de controle, que se chamará «Mídia e menores», que além da televisão deverá monitorar também os setores dos vídeos-telefone e dos videogames, além da internet, que é o campo de maior risco.

REGRAS DE TUTELA EM OUTROS PAÍSES

É diversa a situação em outros países, como por exemplo na Grã Bretanha, onde o sistema de regulamentação da mídia é estruturado e complexo e foi atualizado nas últimas décadas, com uma particular atenção à tutela dos menores. As inovações tecnológicas neste setor levaram as normativas inglesas a uma série de novas disposições, como por exemplo, a visão em casa de vídeo exclusivamente para adultos, e que fora de casa seriam vetados aos menores, ou o combate à praga mundial dos sites internet para os pedófilos, que contenham material pornográfico ou com conteúdos que possam esconder o aliciamento de menores (ver a Protection Childres Act, de 1978).
A programação televisiva é regulamentada pelo Broadcasting Act (1996), de onde deriva a instituição da Broadcasting Standard Commission (BSC), um órgão independente de controle que estabelece as normas de avaliação e classificação dos programas, também no que se refere aos conteúdos violentos ou que possam ofender a decência pública (site oficial www.bsc.org.uk). Este organismo BSC funciona internamente à estrutura do Broadcasting, supervisionando e regulamentando todas as emissoras de televisão e de rádio, via cabo ou por satélite. Sua tarefa é a de elaborar os códigos de conduta e de aplicação de modelos que respeitem a justiça, além de monitorar os modelos, verificando que respeitem as leis. Com a transmissão de programas com conteúdos considerados inadequados aos menores de várias idades, há alguns anos a televisão inglesa adotou o sistema «watershed», um «separador de águas» entre um horário de programação familiar e outro para os adultos. Todo o sistema televisivo inglês se apóia sobre a responsabilização das famílias, pois sem a colaboração delas qualquer código de modelos para os programas é praticamente inútil.
Na França, está vigorando já há anos um código através de sinais televisivos, que entra em função para assinalar os programas inadequados aos menores. A avaliação do programa televisivo é feita pelo Conseil Supérieur de l’Audiovisuel (CSA), uma autoridade administrativa independente, que controla a difusão dos filmes e outras transmissões em vários canais privados, nacionais, regionais ou locais. A normativa francesa (lei 719/2002) veta a transmissão de programas que possam prejudicar gravemente a integridade física, mental e moral dos menores, porque divulgam conteúdos de pornografia ou de violência gratuita. As transmissões são classificadas por um código de sinais que, em conjunto com um sistema organizado de faixas horárias de programação, garante às famílias mais clareza sobre os programas destinados aos menores.
Na Alemanha, o tema da infância tem particular atenção da legislação, que considera desde o nascimento o início dos direitos fundamentais do cidadão. A tutela é disciplinada no âmbito público pela JSchG (desde o dia 26 de fevereiro de 1985), enquanto a lei GjSM se ocupa do controle sobre a difusão de publicações e conteúdos mediáticos considerados danosos para os menores. A regulamentação no setor televisivo é feita segundo as normas do acordo sobre a radiodifusão dos Lander federais, que as entidades para a mídia nesses Lander adotaram por base para o estabelecimento das diretivas que tutelam o interesse dos menores nas emissoras privadas. Não são admitidas transmissões que incitem o ódio racial, que exaltem a violência ou a guerra, que ofendam a dignidade do homem, que sejam de gênero pornográfico, que mostrem pessoas moribundas ou com sofrimentos que ofendam a dignidade humana. Os responsáveis pela programação, escolhendo os horários das transmissões, devem cuidar para que os menores não vejam programas que podem prejudicar o seu bem estar psíquico, físico ou mental. As transmissões inadequadas às crianças menores podem ser transmitidas somente depois da autorização da entidade competente do Land interessado.
Os responsáveis pela organização dos programas televisivos em âmbito nacional devem nomear encarregados pela tutela dos menores, que atuam no momento da aquisição, da projeção e da realização dos programas. As emissoras privadas fundaram em 1993 uma associação de autocontrole voluntário da televisão («Freiwillige Selbskontrolle Fernsehen», FSF), à qual devem ser apresentados programas particulares, antes da sua transmissão, e suas avaliações consideradas nas decisões das entidades de controle da mídia nos Lander federais. Existe ainda o órgão comum do cidadão para a tutela dos menores, dos programas, da competência mediática e controle da mídia (GSJP), do qual faz parte um integrante da entidade para a mídia nos Lander federais, que dá o seu parecer a respeito de algumas séries, filmes e espetáculos mais ou menos adequados aos menores. Este órgão, o GSJP, decide sobre pedidos de mudança de horários de transmissão de filmes proibidos para menores, controla a forma de novos programas e experimenta novas disposições para a tutela dos menores na televisão digital. A peculiaridade da jurisdição alemã, seja no setor televisivo como no cinematográfico e da mídia em geral, é a minuciosa atenção às exigências com o desenvolvimento do menor e aos riscos que este pode correr com a observância incorreta das leis.
Nos Estados Unidos, é possível consultar via internet um «guia televisivo para os pais» (ver o site www.mpaa.org), que prevê algumas categorias de audiência aplicadas aos programas televisivos transmitidos a todo o público. Este guia organiza várias siglas para identificar a categoria de audiência para cada transmissão: vai-se do TVY (para todas as crianças) ao TVG (para todos), através de várias faixas etárias, que correspondem à passagem da primeira à segunda infância e desta à adolescência. Depois tem o TVPG («parental guidance», visto na presença de um dos pais), o TV14 («parent strongly cautioned», séria advertência aos pais), para os programas que contêm cenas de sexo e de violência. Enfim, há o TVMA, que prevê um «mature audience only», ou seja, destinado a um público de idade superior a 17 anos, última fronteira para os conteúdos considerados «restricted».
Estas avaliações foram elaboradas baseando-se nas opiniões dos próprios pais e são fáceis de serem encontradas e compreendidas. Esta linha de «guia de televisão para os pais» pode ser usada juntamente ao «v-chip», que é um dispositivo de filtro instalado na maior parte dos mais recentes modelos de aparelhos de televisão, para permitir aos pais de bloquear os programas inadequados.

FICHA 1
Brasil: «O que eu penso da tv»
No Brasil, a audiência infantil é muito alta: aproximadamente 30 milhões de crianças vêem televisão pelo menos durante três horas por dia. Explica a profa. Rosália Duarte, do departamento de Ciência da Educação, da PUC do Rio de Janeiro, que «as crianças são muito perspicazes, mas nós podemos e devemos ajudá-las a ampliar o seu quadro de referências, para que possam discutir ainda melhor sobre o conteúdos daquilo que vêem. Para isso temos necessidade, antes de tudo, de ouvir aquilo que elas têm a dizer sobre o assunto e de dialogar com elas. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e muito mais freqüente, a outras atividades culturais». No âmbito de uma pesquisa feita através de um questionário distribuído nas escolas, intitulado «O que eu penso da tv», apareceu que «as crianças querem seriamente ser ouvidas sobre aquilo que pensam da tv, mas sentem que sua opinião é considerada pouco importante e não estão contentes com o excesso de imagens de violência exibidas na televisão, principalmente a violência “real”, definida como aquela transmitida nos telejornais. Eles adoram ver televisão e não importa o que os adultos pensam e dizem a respeito disso. A eles agradam quase todos os tipos de programas transmitidos: novelas, desenhos animados, programas de humor, filmes, seriados, mas isso não faz deles espectadores “idiotas”, pois fazem críticas muito interessantes, pertinentes e bem elaboradas sobre o que consideram feio ou inadequado na televisão. Para a maior parte deles, a televisão se oferece como principal opção de divertimento (em alguns casos, a única), o que significa um dado muito preocupante. Mas, o que chamou mais a nossa atenção é o grau de experiência com o qual essas crianças analisam a televisão: são expertos e demonstram conhecer a televisão também do lado de dentro, inclusive as linguagens que ela utiliza, a sua estrutura de produção, a sua lógica interna e as suas maneiras de intervenção».
As crianças aprendem os valores e os não-valores através da televisão, não resta dúvida, mas demonstram ter senso crítico a respeito deste assunto, quando afirmam nos textos que os programas transmitidos na tv podem lhes ensinar «a serem bons, a ter coragem e a fazer o bem, a cuidar da natureza e de si mesmos, a serem honestos e a lutar por aquilo que desejam», mas também «a serem cruéis e mentirosos, a roubar e matar, a não respeitar os pais e a comprar tudo aquilo que não têm necessidade». Falando sobre a validade do ensino através da mídia, a profa. Duarte salienta a necessidade de «ouvir aquilo que têm a dizer sobre o assunto e a dialogar com eles. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e mais freqüente, a outras atividades culturais».

FICHA 2
Observadores internacionais
Os dados examinados em janeiro de 2006 pelo OssCom, que é um centro de pesquisa da mídia, deixam evidente a tendência a realizar uma forma de co-regulamentação, onde a ação legislativa dos Estados membros se integra com medidas de auto-regulamentação por parte dos produtores, broadcasters e profissionais da comunicação sob o efeito de controles e sanções. São dois os instrumentos mais utilizados no âmbito europeu, observando-se as diretivas previstas no artigo 22 de «Televisão sem fronteiras»: a definição de faixas horárias protegidas (watershed) e os sinais mostrados na tela (determinados por um sistema de «rating»). Apesar disso, aos campos tradicionalmente problemáticos da violência e da pornografia se juntam novos campos de risco para os menores: a vulgaridade, abusos e dependências de substâncias, linguagem e comportamento vulgares, discriminações e abusos, violações e ofensas à dignidade humana. Os critérios de avaliação dos programas se constituem um problema que é partilhado por muitos países da União européia, ao mesmo tempo em que se prepara uma uniformização internacional dos sistemas de classificação (ver mais adiante, Nicam), baseados na visualização de cinco ícones que ilustram simbolicamente qual é a problemática do programa que está sendo analisado e para quais idades ele é desaconselhado.
Deve ser assinalada a atividade online da European Medi@culture. O projeto é promovido pela Comissão Européia, em Bruxelas, no quadro das iniciativas «e-Learning», administrado pelo centro mediático de Baden-Württemberg. O site apresenta informações sobre a educação à mídia na Europa, particularmente na França, Áustria, Finlândia e Alemanha. A seção de projetos de multimídia agrupa os projetos sobre a mídia desenvolvidos por escolas e associações de jovens ao longo do tempo (ver http://www.european-mediaculture.org).

FICHA 3
África do Sul: Encontro mundial sobre a mídia para a infância
Este encontro trienal se realizou no último mês de março em Johannesburg, na África do Sul, com a participação de expertos do setor representando diversos países. Em conjunto se discutiu sobre a necessidade de uma programação adequada às crianças, procurando entender de que modo a violência na mídia pode influir sobre a psíquico dos menores.
Mas, no 5º Encontro mundial sobre a mídia para a infância apresentaram-se também muitas crianças provenientes de todo o mundo e empenhadas em discutir sobre o difícil tema da «Mídia como instrumento de paz e de democracia global». Vieram guiados por grupos de adultos, dentre eles as diversas organizações católicas que há anos trabalham para promover regras para o bem da infância, a serem respeitadas nas transmissões de rádio e televisão através de códigos de regulamentação que devem ser redigidos ou, como em alguns casos, apenas atualizados. Em muitos países do sul do mundo as novas tecnologias de multimídia já estão muito disseminadas e seu uso merece uma atenção particular para tutelar o público mais jovem.
Especialmente na África, explicou o organizador do encontro, Firdoze Bulbulia, começa-se a examinar o projeto de um «Media center» para as crianças, que possa produzir e distribuir transmissões de rádio e de televisão destinadas ao público mais jovem, com o objetivo de realizar um canal televisivo pan-africano dedicado à infância. Os organizadores do encontro estão também trabalhando no projeto de uma aliança africana dos meios de informação e de comunicação, seguindo o modelo daquela já existente na América latina.

2) INTERNET

Na Itália, 47% das famílias italianas têm um computador em casa, um dado relevante mas sempre muito baixo em relação à média dos outros países europeus. O uso da internet por parte dos adolescentes e jovens, e a familiaridade que têm com tudo aquilo que pode ser digitado ou «descarregado» da internet, apresenta não poucos problemas. Pela sua própria natureza de rede de comunicação global, o problema se apresenta em ótica internacional, procurando garantir a tutela dos menores através de precisos acordos com os provedores para um efetivo controle de conteúdo. No campo italiano, até 2006, a tutela dos menores tinha sido deixada nas mãos dos próprios provedores, que em 19 de novembro de 2003 assinaram um acordo de auto-regulamentação: o Codice Internet e Minori. Embora o acordo tenha sido estipulado entre os representantes dos vários provedores diante do Ministério para a Inovação e a Tecnologia, no entanto ele permanece um acordo privado, com lacunas, principalmente no que se refere às sanções que muitas vezes devem ser aplicadas. Em 2006, na seqüência de numerosos casos de violência sobre menores, muitos dos quais realizados através da difusão de material pedo-pornográfico (quando não se tratava de verdadeiro e próprio aliciamento de menores via internet), foi promulgada a lei 38 de 6 de fevereiro de 2006: «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet».
Enfim, como aplicação da lei 38/2006, em fevereiro da 2007 foi publicado um decreto determinando os requisitos técnicos dos instrumentos de filtragem que os provedores da rede internet devem utilizar para impedir o acesso aos sites já assinalados pelo Centro nacional contra a pedo-pornografia. Mas, isso não basta para superar as dificuldades e impedir que os menores possam navegar de maneira arriscada na «rede das redes».
Atualmente foi reativada a comissão anti-pedofilia e desvios de menores através da internet, o «Ciclope», que tinha sido instituída junto ao Ministério para a Eqüidade, do governo italiano, e que ficou inativa por um ano, até a sua reestruturação junto ao Ministério da Família. Está também para entrar em função um site dedicado ao uso da internet, junto ao Ministério das Comunicações, e um número telefônico de emergência gratuito, organizado pelo mesmo ministério e por «Save the children», que poderá ser utilizado por qualquer cidadão que queira assinalar algum abuso, desvio ou pedo-pornografia. Dentre as iniciativas mais recentes, deve ser assinalado o site www.tiseiconnesso.it criado pelo Ministério das Comunicações italiano, sempre em colaboração com «Save the children», onde é colocada à disposição uma série de informações sobre o conteúdo de certos sites, seja para os pais como para as próprias crianças, em conjunto com a campanha televisiva que tem como slogan «A melhor maneira de ajudar o seu filho a não usar incorretamente as novas tecnologias é conhecê-las».
Deve ser salientado também o fato de como a rede se tornou um grande mercado online. Para alguns produtores, o «e-commerce» de brinquedos corresponde já a 4% das vendas, e apenas em 2005 as vendas online corresponderam a 37.600 ações de compra. As razões para investir no processo online são múltiplas: desde a possibilidade de evitar as dificuldades logísticas de distribuição dos produtos, à ampliação de ofertas diferentes de produtos e também a possibilidade de envolvimento do cliente através de campanhas de mala direta e a criação de comunidades virtuais em torno de alguns produtos.

FICHAS:
Pedo-pornografia e internet
Em março de 2006, entraram em vigor as novas medidas diretas de combate e repressão ao fenômeno de exploração sexual dos menores e a pedo-pornografia, estabelecidas pela lei 38/2006 – «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet» foi publicada no Diário oficial em 15 de fevereiro de 2006, nº.38 – com a qual foram substancialmente modificados e integrados os artigos 600bis e seguintes do Código Penal italiano.
A lei confirma os artigos 527, 528, 529 e 725 do Código Penal italiano, que punem os «atos obscenos em local público, publicações, espetáculos obscenos, desenhos ou figuras que ofendem a decência pública».
Porque em muitas publicações, transmissões televisivas e anúncios publicitários, mesmo que não tenham declaradamente um caráter pornográfico, imagens de crianças e adolescentes são apresentadas de maneira explícita ou mais ou menos sutilmente ilusória e de forma falsa, pede-se um novo empenho das instituições competentes para que sejam observadas as normas em vigor e, se preciso for, que façam apelo aos órgãos de Polícia, o Instituto de autodisciplina publicitária, o Ministério das Comunicações, a Polícia postal ou a «Comissão tv e menor».

3) CINEMA

Confirmando as disposições da Constituição italiana, no que se refere ao direito e ao dever das famílias de serem protagonistas na educação de seus filhos, para muitos é chegada à hora de reelaborar a legislação que define o conceito de «censura» (a lei 161/1962 prevê a possibilidade de negar a autorização de abertura às salas de cinema ou de fazer cortes nos filmes, mesmo em função de um público adulto), que hoje está superado. É preciso com urgência estabelecer um critério de tutela dos menores não apenas no que se refere aos filmes que vêem nos circuitos cinematográficos, mas também sucessivamente em casa, muitas vezes em horários acessíveis na programação da televisão.
Uma avaliação correta e preventiva de um filme permite à família ter à sua disposição os instrumentos para escolher se um espetáculo é mais ou menos oportuno, conhecendo a trama, os eventuais conteúdos mais sensíveis, a classificação que a obra recebeu em outros países, etc. Por isso, é justo que a legislação seja revista, uma operação que requer atenção e perspicácia da parte das instituições em um momento de transição da mídia, como este que estamos vivendo, quando esta se tornou realmente um importante componente na educação dos menores.
Não faltam filmes que atraem o público por causa de seu conteúdo de violência, e no entanto entram no circuito cinematográfico sem qualquer restrição de idade. Para um filme que é notícia nos jornais, existem muitos outros com conteúdos duvidosos ou até mesmo perigosos que conseguem passar através do filtro da comissão de revisão cinematográfica, que atualmente funciona junto ao departamento de cinema do Ministério dos Bens Culturais.
Ao mesmo tempo em que existe um projeto de lei do ministro dos Bens culturais, que deve ainda iniciar os trâmites parlamentares, novas situações se apresentam na Itália, com a autocensura de filmes, feita pelos produtores ou distribuidores cinematográficos, com a introdução de novas e mais específicas faixas etárias para as restrições visando os menores a partir dos 10 anos de idade. As restrições serão feitas baseando-se em uma avaliação classificatória dos conteúdos das obras e sucessivamente serão ainda analisadas por uma comissão de psicólogos, educadores e pais.
Este sistema se inspira no modelo americano da Motion Picture Association of America (MPAA), que há 40 anos representa os interesses da indústria do audiovisual americana no mundo. Funcionando a partir de regras bem precisas (estabelecidas ao longo dos anos, também segundo as sentenças dos tribunais federais nos vários Estados americanos e em base aos protestos dos cidadãos), a autocensura americana prevê a existência de uma única comissão competente para determinar as restrições do PG12 ao «restricted» 17 anos. Esta comissão é composta exclusivamente de pais, considerados os primeiros depositários da educação dos filhos, e representam transversalmente a audiência. Importantes sanções econômicas asseguram que o mecanismo de autocertificação corresponda efetivamente aos interesses dos cidadãos. No site da Motion Picture estão disponíveis aos pais os pontos de referência para a avaliação das obras de entretenimento e são publicadas as restrições aplicadas a cada filme que está em exibição nas salas de cinema. Geralmente as avaliações parecem muito mais severas em relação a outros países. Tudo isso, nos vários anos de sua aplicação, deu uma qualificação à indústria americana e seu correto serviço prestado aos ouvintes. Qualquer estrada que se pretenda seguir na Itália, é importante para as famílias que seja estimulado um mercado de produção adequado à infância: é justo que o mecanismo da indústria cinematográfica continue com o seu ritmo de produção, mas não é justo confundir as classificações de acesso ao produto, como qualquer indústria sabe muito bem.
No que se refere às normas européias de classificação dos filmes, e em geral de todo «entertainment» (neologismo anglo-saxão, que, no entanto encontra sua raiz etimológica na relação entre educação e jogo) acessível aos menores, deve ser citado o sistema NICAM, que funciona na Holanda há alguns anos. Fundado em 1999, o NICAM (Nederlands Instituut voor de Classificatie van Audiovisuele Media) se baseia na lei Media Act, onde os programas de grupos que tiveram a autorização para atividades de «broadcasting» não devem incluir obras audiovisuais que prejudiquem o desenvolvimento físico e psicológico de pessoas com menos de 16 anos de idade, seguindo as diretivas da União européia («Televisão sem fronteiras» IV).
O sistema de classificação preventiva funciona também na Grécia, com a lei 1.597, de maio de 1986, que prevê que antes da projeção nas salas de cinema, cada filme seja submetido pelo produtor ou pela sociedade de importação à Comissão para a juventude, que classifica o filme seja como adequado aos menores, ou proibido aos menores de 13 anos, ou de 17 anos ou ainda, nos casos mais graves, severamente inadequado aos menores. Esta comissão é um órgão do Ministério da Cultura e foi concebida procurando-se estabelecer certa proporcionalidade, sendo composta de representantes do Estado (Ministério da Cultura), das categorias ligadas ao cinema, de psicólogos especializados na educação, de sociólogos, dos jovens, dos educadores e dos pais.
Na Áustria, está em vigor um sistema de avaliação complexo, instituído em base a um princípio constitucional federal que confia a tutela dos menores, no que se refere ao cinema e em geral aos meios de comunicação de massa, à competência específica dos Lander. A lei nacional que engloba a regulamentação da mídia é a ORF-ACT, ou seja, a Austrian Broadcasting Corporation nº. 379/1984, que estabelece quais os critérios sobre os quais deve se basear a proteção aplicada a programas e filmes transmitidos na televisão ou através de outros canais mediáticos. No que se refere à exibição dos filmes, a avaliação preventiva das obras cinematográficas, para que sejam decididas as faixas etárias adequadas, é regulamentada pela lei austríaca para a tutela dos menores, a «Jugendschutzgesetz», aplicada através das leis dos Lander federais. Esta lei estabelece nove faixas de restrições de público a partir dos seis anos de idade, com uma sucessiva graduação que prevê restrições para 10, 12, 14 e 16 anos de idade. Para supervisionar o sistema de classificação cinematográfica, existe uma comissão junto ao Ministério da Educação, em Viena, que comunica seu parecer sobre a idoneidade dos filmes às autoridades locais. Geralmente e de maneira individual os Lander adotam as decisões da comissão, e é em âmbito local que se decide de sua aplicação.
Na Espanha, o artigo 20 da Constituição reconhece o direito do cidadão a exprimir e difundir livremente seu pensamento, suas idéias e suas opiniões através de qualquer meio de divulgação. Se por um lado o exercício de tais direitos «não pode ser restrito através de nenhum tipo de censura prévia», o mesmo artigo especifica que «estas liberdades têm o seu limite no respeito dos limites reconhecidos pelas normativas que exprimem este respeito, especialmente no direito à honra, à privacidade, à própria imagem e à proteção da juventude e da infância».
Baseando-se neste princípio, a qualificação dos filmes (Real decreto 81/1997) e das obras audiovisuais é feita antes de sua difusão, através do Instituto de cinematografia e das artes audiovisuais (ICAA), uma entidade autônoma, mas ao mesmo tempo ligada ao Ministério da Educação e Cultura através da secretaria de Estado para a cultura (ver site www.mcu.es).
A subdireção geral de fomento à indústria cinematográfica e do audiovisual, que faz parte do ICAA, se ocupa, dentre outras funções, da classificação em faixas etárias dos filmes e das outras obras audiovisuais em vista de sua exibição pública e para a sua distribuição. A comissão se encarrega de divulgar as informações sobre os filmes e programas audiovisuais, com classificação que vai desde as «salas X» até as restrições para cada faixa etária do público.
Os filmes de caráter pornográfico não podem receber subvenções do Estado e sua projeção nas salas prevê uma taxa suplementar, destinada em parte para estimular um fundo de proteção cinematográfica. A projeção destes filmes pode ser feita somente nas «salas X», onde não podem ser apresentados outros tipos de obras cinematográficas e onde é proibido o ingresso de menores de 18 anos.

CINEMA NA TV

Devido ao alto consumo de programas de televisão por parte dos menores e levando-se em conta as diretivas da União européia, que promovem a auto-regulamentação no âmbito nacional das emissoras de tv e a participação das famílias nesta obra educativa, há alguns anos estão em vigor na França, na Holanda, na Grã-Bretanha, na Grécia e na Itália os códigos de sinais, que servem para identificar tanto os filmes projetados na salas de cinema como aqueles transmitidos na televisão. A tutela dos menores no âmbito da televisão foi também feita adotando-se o chamado sistema «watershed» (separador das águas), que funciona segundo uma seleção de faixas horárias protegidas, algumas aconselhadas à visão dos menores, outras aconselhadas a todos e outras ainda, principalmente na programação noturna, indicadas somente a um público adulto.
A faixa de idade determinada pela classificação preventiva dos filmes tem obviamente uma repercussão na programação das chamadas faixas horárias protegidas ou distintas nas emissoras de televisão pública em todos os países europeus. A definição das linhas de conduta comuns está à base dos acordos de auto-regulamentação e de co-regulamentação dos programas de televisão, estabelecendo-se um código de procedimento comum para as emissoras tanto públicas como privadas. Criou-se assim uma base normativa, que é assumida pela autoridade do Estado e que recebe a confiança dos consumidores das emissoras públicas ou privadas que adotam este sistema de auto-regulamentação.
Para tornar visível aos adultos as classificações dos programas apropriados aos menores, muitas emissoras européias adotaram um sistema de sinais que através de símbolos, números, cores e sinais acústicos advertem ao público a respeito daquilo que está para ser transmitido.
Mas, apenas este sistema, assim como o de filtragem (tipo v-chip), não basta para garantir uma verdadeira tutela dos menores diante de um conjunto de imagens difíceis de serem decodificadas por um jovem. Deve-se pensar às imagens de guerra dos telejornais, dos filmes escabrosos ou às informações sobre os crimes hediondos, que muitas vezes têm como ambiente o próprio núcleo familiar.
É na colaboração entre Estado, produtores de programas audiovisuais e famílias que pode ser fundamentado um autêntico respeito dos menores que encoraje o crescimento positivo da criança em base aos valores fundamentais da pessoa humana.

4) CELULARES COM VÍDEO

Hoje a difusão dos celulares com vídeo chegou à Itália ao índice se 134%, o que significa que muitas pessoas possuem pelo menos dois celulares, inclusive os jovens e as crianças, que recebem este instrumento dos próprios pais. De fato, de duas crianças entre 8 e 13 anos de idade, uma delas tem um celular no bolso. Aquele que poderia ser um instrumento para controlar melhor os deslocamentos e as necessidades dos filhos, se revela no entanto um perigoso meio que pode expor a outro tipo de utilização por parte dos menores, que não se separam nunca do próprio celular, nem mesmo durante as aulas, como lamentam vários professores. Apesar do código de auto-regulamentação assinado pelas principais operadoras (Código de conduta para a oferta de serviços a pagamento em tutela dos menores), na realidade os novos serviços opcionais do celular o tornaram um «personal computer» capaz de permitir novos usos que antes não tinham.
Os desenvolvimentos tecnológicos que estão se verificando no campo da telefonia móvel – particularmente no que se refere à sinergia com a internet e a adoção dos sistemas DVB de vídeos-telefone – contribuem a aumentar a oportunidade de comunicação também para as novas gerações e, ao mesmo tempo, repropõem em novos termos a questão da tutela dos menores. As evoluções já previstas ulteriormente para os próximos anos e o número sempre crescente de pessoas envolvidas, pedem uma grande consciência social e uma constante atenção das pessoas e órgãos encarregados de garantir os direitos dos cidadãos.
Neste contexto devem ser reafirmados os direitos dos menores no campo da comunicação, dentre os quais certamente não está em último lugar aquele que se refere também à segurança diante dos riscos de indução a comportamentos ilícitos ou de acesso a conteúdos nocivos ou indesejados. Também neste campo é essencial o papel dos pais e, em geral, de todos aqueles que são chamados a ter uma função educativa. A maior segurança das crianças e dos jovens quanto ao acesso a conteúdos ilegais é um ponto que deve merecer atenção também através da maior conscientização dos pais e das mães, que devem se capacitar a conhecer e utilizar estes meios.
Para a «alfabetização» dos pais na utilização da mídia devem colaborar também as instituições públicas, promovendo um uso positivo das novas possibilidades tecnológicas. Às empresas cabe a responsabilidade de colocar no mercado um produto que dê garantias no que se refere à sua utilização pelos menores, superando os limites estabelecidos pelo código de auto-regulamentação assinado pelas operadoras de celulares. Devem também oferecer maiores informações aos adultos que assinam um contrato de utilização, como por exemplo a adoção de bloqueios automáticos de acesso a conteúdos nocivos, se o celular passa às mãos de um menor de idade.

5) VIDEOGAMES

Trata-se de uma indústria global, que conquistou os jovens e não apenas eles. Os números relativos à difusão repentina dos videogames indicam que existem 250 mil sites de videogames, cada um deles propõe uma série de títulos, muitos deles recheados de cenas de sexo e de violência. Uma pesquisa recente do Instituto italiano de medicina social (IIMS) coloca em evidência, entre outras coisas, a escassa informação por parte dos adultos a respeito dos videogames utilizados pelos filhos, o predomínio de temas violentas em mais de 30% de títulos não aconselhados aos menores, o predomínio de personagens virtuais normais que podem se tornar especiais, realizando ações extraordinárias.
Mas, o ponto de risco mais elevado se refere aos pequenos jogadores de videogames, crianças entre seis e nove anos de idade que se submetem a entrar tão intensamente no jogo virtual que chegam a formas de dissociação da realidade e solicitam um monitoramento muito atento da parte dos adultos. A mesma pesquisa indica a presença de videogames em 25% das famílias com crianças de três a cinco anos de idade e em 65,2% das famílias com crianças entre seis e 10 anos de idade. O que produz efeitos negativos no âmbito cognitivo das crianças não parece ser especificamente o meio, mas muito mais os elementos que criam a excitação, tais como a velocidade de produção do estímulo e da resposta, a velocidade das imagens, os efeitos especiais, os contrastes, a fragmentação da história, o binômio rumor-ação. O uso prolongado do jogo inibe, segundo alguns psicólogos, a área da capacidade crítica, provocando passividade e ao mesmo tempo agressividade na criança. Mas, não queremos demolir os videogames, porque existem aqueles que são muito adequados aos mais jovens, com valores de informação e de educação, seja também porque o uso deste meio é na realidade um passo na preparação da criança ao sucessivo e mais sofisticado, que é o uso da internet.
De qualquer maneira, os dados relativos à venda destes produtos de entretenimento mostram um crescimento em todos os lugares e a difusão deste meio é acompanhada de uma aceitação social (ou seria uma resignação?) sempre maior.
É urgente ampliar o percurso de conhecimento e das estratégias internacionais, para monitorar um mercado que está cada vez mais vasto. Parece urgente estabelecer modalidades operativas para o controle dos conteúdos e do sistema de sanções, seja para o produtor como para o vendedor dos serviços. O código de auto-regulamentação Pegi (derivado em 2003 do sistema de avaliação e classificação holandês, Nicam, que assinala os conteúdos inadequados aos menores), adotado pelos industriais de «entertainment» que produzem videogames, é a única forma de auto-regulamentação existente atualmente e que prevê sanções (raramente aplicadas, mesmo diante de casos graves evidentes) para os produtores que colocam no comércio os jogos com indicações de faixas etárias apenas aproximativas.
O código Pegi, ao qual a associação européia Isfe adere em 2002, é evidentemente insuficiente na sua função declarada de «fornecer aos consumidores as informações mais oportunas» e expostas no selo de produção. E, como o setor dos videogames tem hoje um volume de negócios que ultrapassa os 740 milhões de euros, envolvendo 24 milhões de jogadores (43% da população a partir dos quatro anos de idade), com uma venda dos produtos classificados para maiores de três anos de idade que chega aos quase 48% dos consumidores. É um dado que define o impacto deste gênero de meio sobre a infância e a adolescência, mostrando toda a sua periculosidade, seja pelo consumo de conteúdos inadequados, seja pelo excessivo número de horas dedicado neste passatempo, muitas vezes solitário e sem a presença de um adulto ao lado. Se for verdade, como sustenta a indústria, que a produção de videogames violentos é apenas uma mínima parte do mercado, é também verdade que esta representa a fatia mais importante do retorno econômico.
O interesse pelos videogames é alimentado pela sinergia com os filmes que inspiram o jogo homônimo e que torna sempre mais atrativo este gênero, principalmente para os adolescentes. Desta maneira é importante também neste campo o estabelecimento de regras precisas em defesa dos consumidores dentre o público jovem, mais exposto aos riscos destas novas formas de entretenimento cada vez mais sofisticadas e envolventes, por causa da combinação entre narrativa e efeitos gráficos.

6) PUBLICIDADE

O problema da tutela dos menores diante da publicidade se apresenta como um corolário, dentro do quadro mais amplo que regulamenta a difícil relação entre a mídia e as crianças. A televisão, e portanto também a publicidade, se constitui em uma fonte de perigo para os menores, isto é, para a maior parte das crianças, principalmente em idade pré-escolar, que devem saber fazer a diferença entre a publicidade e o resto da programação, e entre os programas de ficção e a realidade. Com essas considerações não significa que exista uma acrítica rejeição da publicidade em si mesma – à qual se reconhece, no entanto, onde proceda corretamente, uma função positiva no processo de formação, de crescimento crítico e de socialização do menor –, mas existe a necessidade de prever um sistema de regras destinado a garantir-lhe um uso adequado.
O efeito dos anúncios publicitários é tão grande que em alguns países estão sendo tomadas medidas drásticas a respeito. No Reino Unido, por exemplo, recentemente foram vetados os anúncios publicitários durante os programas destinados às crianças até nove anos de idade, a partir de 1º de janeiro de 2008 a medida se estenderá à programação para os jovens até 15 anos de idade e até o final de 2008 serão vetados em todos os canais dedicados aos menores. Apesar de se reconhecer que a publicidade serve para financiar os programas, aqueles dedicados às crianças terão que recorrer a outras fontes. Também na França começa a se impor uma «linha dura» a esse respeito: visto a alta incidência de publicidade de merendas, de sucos e doces em geral, a partir de agora os anúncios dedicados às crianças deverão ser precedidos de uma espécie de aviso, que orientará para uma alimentação adequada.
Mas, por que as crianças são tão frágeis diante dos apelos da publicidade? Na Itália, explica Paolo Landi, secretário geral da Adisconsum (Associação de defesa dos consumidores e do ambiente»), em um capítulo de seu estudo «Crianças da multimídia»: «Se consideramos que a publicidade não faz outra coisa que veicular um conhecimento imediatamente concretizável em um “ter”, ou em um “ser”, ou em um “fazer”, a criança absorve sem dificuldades os três componentes que são a obsessão dos expertos de marketing, isto é, o componente cognitivo (como fornecer informações indeléveis sobre um produto ou um serviço), o componente afetivo (como fazer o consumidor reagir de maneira emotiva) e o comportamental (como colocar o pequeno consumidor em movimento na direção da aquisição). A partir deste ponto de vista a criança é o público ideal, o consumidor a quem se pode vender qualquer coisa».
Na Itália está em vigor um código de autodisciplina publicitária que surgiu em 1966, em base a um acordo entre os profissionais do setor. Esta primeira forma de tutela, em grande parte com origem comunitária, tem como protagonistas entidades administrativas independentes: a Autoridade de controle da concorrência e do mercado de setor e a Autoridade de garantia para as comunicações e a editoria. Enquanto isso, para a auto-regulamentação, orientada pelas normas que constam do Código de autodisciplina publicitária, e agora também, embora com força jurídica diferente, pelo Código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual se reconhece um poder de decisão e de sanção, emanando uma ordem e intimando seu cumprimento.
Em todos os países onde a televisão serve de veículo às mensagens publicitárias, o mundo empresarial é plenamente consciente do enorme poder de influência que a publicidade tem sobre as crianças.



NORMATIVA INTERNACIONAL

O assunto relativo à tutela dos menores na mídia é um dos mais debatidos, seja no que se refere às normas nacionais, seja no âmbito internacional. Encontra-se diante da situação de precisar acertas as contas com toda a extensão da rede global da internet. O exemplo que, neste momento de transição, coloca mais em evidência a necessidade de estabelecer leis que estejam em condições de controlar o acesso e uso dos conteúdos nocivos para os menores, é exatamente o da internet. Qualquer pessoa no mundo pode abrir um site considerado «arriscado», contendo elementos ilegais e acessíveis a consumidores despreparados, disponibilizados por quem está do outro lado do mundo.
No que se refere aos princípios gerais no âmbito do direito internacional, é preciso recorrer principalmente à convenção da ONU sobre os direitos da criança, com sede em New York, ratificada pelo Parlamento italiano através da lei nº.176/1991. Esta garante à criança uma «consideração proeminente» também a respeito da liberdade, seja no se refere à expressão, seja quando tutela os conteúdos recebidos. Esta mesma convenção, em seu artigo 17, fala da relação entre menor e televisão, desejando «um sistema normativo que tutele o menor-consumidor, mesmo com todas as dificuldades que se apresentam», seja para individuar os fenômenos que devem ser monitorados, seja sobre as normativas possíveis.
No direito da União européia, tal tutela foi recentemente confirmada pela Carta dos direitos fundamentais da União, aprovada em Nice em 2000, cujo artigo 24 salienta que «os Estados membros reconhecem a importância da função exercida pelos meios de comunicação de massa e cuidam para que a criança possa ter acesso às informações e materiais... com a finalidade de promover o seu bem estar social, espiritual e moral, além de sua saúde física e mental». A normativa seguinte, 89/552/CEE, previu algumas restrições, seja no que se refere aos programas como para as mensagens publicitárias destinadas a este público». O artigo 22 desta normativa conduz a impedir a transmissão de programas que contenham cenas pornográficas ou de violência gratuita, ou outros programas inadequados a este público. Não podemos esquecer de mencionar a determinação expressa de «Televisão sem fronteiras», que está hoje em sua quinta versão atualizada, que o tema da tutela dos menores está relacionado com o estatuto geral dos direitos dos menores e corresponde ao disposto nos artigos 50 e 31 da Constituição italiana.
Se for claro que os princípios normativos são todos a favor da tutela dos menores, é também verdadeiro que uma tecnologia em contínua evolução colocou em crise as velhas regras do jogo. Mas também é claro que não se pode mais adiar a necessidade de estabelecer novos parâmetros normativos, para que as crianças possam utilizar os meios de comunicação próprios de seu tempo, com aproveitamento e serenidade também para as famílias.~

EDUCAÇÃO À MÍDIA NO MUNDO: PARA SABER MAIS

A difusão da educação à mídia é uma resposta à necessidade de se informar sobre as novidades no campo dos novos meios de comunicação. Em seguida citamos apenas alguns sites que em vários países oferecem maiores informações sobre como aprender a usar melhor a mídia, enfrentando a problemática da tutela dos menores e da alfabetização às novas tecnologias por parte dos adultos.
«The Media Awareness Nework-Réseau éducation médias» é uma organização canadense sem fins lucrativos, pioneira no desenvolvimento de programas sobre a educação à mídia. Com esta finalidade ela produz programas online em colaboração com organizações internacionais, convicta que, para interpretar as mensagens de informação, de entretenimento e comerciais, os jovens têm necessidade de instrumentos críticos válidos. Por isso é importante formar também os adultos (famílias e professores) sobre como funciona a mídia e como ela determina o estilo de vida.
A organização realiza uma ação contínua de monitoramento em relação à mídia (televisão, cinema, videogames, imprensa, publicidade, etc.), e sua seção dedicada aos pais oferece uma série de elementos para que estes reflitam com os filhos sobre esses meios, além da seção para os educadores, que inclui lições e materiais de apoio. Uma outra seção é dedicada à análise das questões ligadas à mídia, como a difusão de estereótipos, as representações de violência e da diversidade, a privacidade, a publicidade dirigida aos menores. Seu site é em inglês e francês (http://www.media-awareness.ca).
«Quai des images» é o site dedicado ao ensino de cinema e audiovisual organizado pelo Ministério da Educação francês. Ele propõe atividades ligadas à educação à imagem e de análise dos filmes em consonância com os programas escolares, agrupa os textos oficiais a respeito dos meios audiovisuais, oferece uma série de instrumentos de análise e de estudo completos sobre alguns filmes específicos e sobre certos autores em particular, informa sobre conferências, seminários, cursos e festivais sobre o mundo audiovisual e sua utilização em âmbito educativo e didático. Entre outras coisas, reúne também as propostas e as experiências feitas por professores e seus alunos nas escolas secundárias francesas no campo da educação à imagem, além de organizar um fórum de discussões aberto a todos sobre a educação à mídia (http://www.ac-nancy-metz.fr).
Sempre na França, está em funcionamento o blog «Zéro de conduite», organizado pelos professores e destinados a educadores, pais e estudantes. Promove o uso do cinema como instrumento pedagógico, dedicando-se especialmente à atualidade cinematográfica, mas sem esquecer os clássicos e os documentários. Com várias seções e espaços de aprofundamento, se propõe como um local de discussão de temas em um debate aberto (http://cinema-ducation.fluctuat.net).
A Universidade de Massachussetts organizou o Media Education Foundation – MEF, mídia de desafio, que produz e distribui documentários destinados a estimular o pensamento crítico e o debate sobre a relação entre aqueles que detêm o poder sobre a mídia, os conteúdos da mídia comercial, a exigência democrática de um livre fluxo de informações, as diversas representações de idéias e pensamentos e o direito dos cidadãos de informar e serem informados. Alguns destes temas são abordados criticamente, como a identidade do gênero na publicidade, a imagem de sexo nos videoclipes, o papel da mídia na construção da identidade cultural, mídia e saúde, etc. (http://www.mediaed.org/).

(a cura di M. F. D’A.)

 
At 9/17/2007 2:42 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

AS CRIANÇAS E A MÍDIA (II PARTE):
ACEITAR O DESAFIO EDUCATIVO


O tema da 41ª Jornada das Comunicações Sociais, «As crianças e os meios de comunicação: um desafio para a comunicação», nos convida a refletir a respeito de dois aspectos particularmente importantes. O primeiro é a formação das crianças, para que estejam em condições de receber de maneira crítica aquilo que vêem. O segundo é a formação à consciência e ao uso consciente da mídia, que está em contínua transformação tecnológica.
De fato, é o que especifica Bento XVI no início de sua mensagem, de 20 de maio de 2007, para a Jornada: «Os complexos desafios que a educação contemporânea deve enfrentar são muitas vezes ligados à grande influência dos meios de comunicação no nosso mundo. Como aspecto do fenômeno da globalização e estimulados pelo rápido desenvolvimento da tecnologia, os meios de comunicação delineiam fortemente o ambiente cultural (cf. João Paulo II, O rápido desenvolvimento, nº3). Na realidade, há quem afirma que a influência formativa da mídia está em competição com aquela da escola, da Igreja e, quem sabe, até com aquela da própria família».
De fato, como salienta o Pontifício conselho para as Comunicações Sociais, «para muitas pessoas, a realidade corresponde àquilo que os meios de comunicação definem como tal». Episódios recentes, como a utilização do celular na filmagem de violências nas salas de aula, abusos sofridos por pessoas deficientes, fenômenos de trote e de violência generalizada, demonstram como as crianças que crescem passando uma média de quatro horas por dia diante da televisão, sozinhos em casa, absorveram a lógica do «estou no vídeo, logo existo». Os psicólogos, os pedagogos e os estudiosos dos meios de comunicação estudam há tempos sobre as relações entre o consumo televisivo e o comportamento violento dos menores. Uma grande quantidade de pesquisas realizadas em muitos países ocidentais demonstra como esta correlação seja realmente inegável.


NOVAS LINGUAGENS

O fato que muitas crianças vivem completamente inseridas no mundo dos velhos e novos meios de comunicação, que estão cada vez mais frequentemente em correlação entre eles, é confirmado pela popularidade de alguns modelos televisivos, considerados tão efêmeros quanto penosos «momentos de glória», presentes nos programas com os maiores índices de audiência, dos «reality» aos «talk show», sem falar do «trash», que hoje se tornou um gênero de espetáculo.
Dentre as preferências demonstradas pelos adolescentes italianos que assistem televisão mais do que três horas por dia, encontramos, em primeiro lugar, a figura da «veline» (Ndt: misto de corista e coadjuvante na apresentação de programas populares da televisão italiana), enquanto outros da mesma idade se concentram no mais clássico exemplo, o do jogador de futebol. De toda maneira, a coisa mais importante é aparecer, pouco importa por qual motivo, de ser «alguém» ou «alguma coisa» no Olimpo mediático, mesmo que seja apenas por um instante.
Estes são os exemplos mais negativos dos condicionamentos derivados de um excessivo e acrítico uso dos meios de comunicação. Encontramo-nos diante de uma nova geração que cresceu na frente da televisão, capaz de usar as novas tecnologias que os próprios pais, que as adquiriram e as tornaram disponíveis, muitas vezes se encontram despreparados para utilizá-las.
Tanto é verdade que hoje em dia os filmes são vistos diretamente nos celulares e a televisão pode ser assistida na tela do computador. Hoje se telefona através da internet e graças ao download se descarrega os CDs e DVDs mais recentes, se filma e se faz foto com o celular, e assim por diante.
Nas casas, o vocabulário familiar se reduziu ao gênero dos sms e se fala tendo o som da televisão no fundo, se comunica através de e-mail, se faz «visita virtual» via computador, se percorre através de bibliotecas virtuais, tanto que as fichas e arquivos de papel evocam imagens do outro século, completamente em desuso.
A situação dos nossos filhos é diversa daquela da geração precedente, pois eles abriram seus olhos tendo diante de si estes cenários de profunda, contínua e envolvente transformação tecnológica. Eles se constituem aquela que os estudiosos chamam de geração nascida «com seis dedos»: além dos cinco dedos normais da mão, o sexto é o mouse do computador.
Com o aparecimento do mundo «virtual» da internet e dos videogames criou-se uma defasagem em relação à realidade verdadeira e própria. As duas dimensões parecem muitas vezes, e para muitos jovens, como universos paralelos, com conseqüências não indiferentes no plano do processo de amadurecimento. Têm grande sucesso os sites nos quais se prevê uma segunda vida (basta verificar os milhares de registros nos poucos meses de existência do site italiano de «Second Life», que em todo o mundo já tem sete milhões de inscritos), onde a simulação reproduz todas as situações da vida real. Apenas que tudo é falso, a começar da nova identidade, que pode ser escolhida e com ela se inicia a fazer parte deste mundo fora do mundo, onde se pode ser um «qualquer coisa». Isto é, ninguém.
Assim, o grande desafio cultural de hoje é propriamente a redefinição dos limites, que muitas vezes se apresentam demasiadamente instáveis. Isto é, redefinição dos limites entre o real e o virtual, superando a divisão digital que hoje separa as gerações adultas daqueles mais jovens.


OS JOVENS: PROTAGONISTAS OU VÍTIMAS DAS MUDANÇAS?

A linguagem deles é pobre, muitas vezes recheada de termos tirados do dicionário do internauta: clicar, chatar, messagiar, deletar, são alguns dos neologismos que fazem parte de seu vocabulário quotidiano. Falta uma dimensão humana da tecnologia que esteja em condições de traçar o perímetro cultural entre o real e o virtual. Assim a aldeia global difundiu uma quantidade de modelos comportamentais desviados, ou pelo menos discutíveis.
Desta maneira, os jovens que vivem a milhões de quilômetros de distância jogam o mesmo videogame, vêem o mesmo filme, assim como, de maneira transversal, absorvem modelos e comportamentos semelhantes. Muitas vezes os adultos têm menos domínio no uso das novas tecnologias e observam, com uma preocupação resignada diante de suas próprias limitações, as crianças que navegam facilmente na internet.
As raízes das dificuldades neste campo educativo são muito bem explicadas por Marina D’Amato, professora de sociologia da Universidade de Roma, que salienta: «Cada geração tem necessidade de se encontrar também em um mundo fantástico, que serve a interiorizar o paradigma do bom e do belo, do justo e do errado, do oportuno e do útil, também em relação aos exemplos que procedem da narrativa. Hoje nos encontramos em uma condição na qual os avós e os pais contam cada vez menos histórias aos filhos e aos netos, e este papel foi assumido pela televisão. Mas, na realidade, a televisão “exila” e “con-funde”, isto é, funde os modelos morais que são frutos de ânsias e problemas mal resolvidos, muito mais que de certezas. Embora estes se transformem com freqüência, a cada três ou quatro anos, o fato de serem repropostos continuamente faz com que se justaponham uns aos outros» (ver Come mediare i media, de Mario Russo).
Se for verdade que a televisão é o meio mais usado até a adolescência, imediatamente depois surge a grande atração pela internet. Esta passagem nasce de uma sintonia com a linguagem televisiva, que na idade infantil muitas vezes é ouvida durante muitas horas no dia. Esta linguagem se baseia em uma mediação da realidade e desta maneira ela ativa um processo de recepção que é de tipo emotivo.
Neste registro emocional é mais fácil acabar envolvido por situações e figuras capazes de se proporem como modelos identificadores, preservadores de sentido e de comportamentos a serem imitados.
O poder de concentrar uma vontade emulativa em alguns personagens, que correspondem particularmente às necessidades interiores do jovem (necessidades na maioria das vezes induzidas pela publicidade ou por modelos estimuladores), tem uma forte relação com a quantidade de horas que o jovem passa utilizando os novos ou os velhos meios de comunicação.


EDUCAÇÃO NECESSÁRIA

«A formação adequada a um uso correto dos meios de comunicação é essencial para o desenvolvimento cultural, moral e espiritual das crianças… Educar as crianças a serem seletivas no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja, da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos. Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia, com a certeza de que este difícil, embora gratificante, aspecto da condição de pais, é apoiado por toda a comunidade.»
As palavras do discurso de Bento XVI definem com grande clareza o paradigma de uma justa relação entre a mídia e os menores. Uma clareza que devemos agradecer ao magistério da Igreja, no momento em que o mundo da mídia parece ignorar a verdadeira problemática educativa das crianças e as expectativas de qualidade e de segurança exigidas pelas famílias no que se refere ao uso desses meios, seja do cinema aos videogames, da televisão à internet.
Diante da utilização destorcera do meio televisivo, o mais difundido dentre os meios de comunicação, a Igreja se interroga sobre o porquê da televisão não ter um papel educativo e por que os meios de comunicação não podem ser companheiros confiáveis para os jogos na fase de crescimento da criança. O anúncio de uma recente campanha sobre o uso da mídia, promovida pelo Ministério das Comunicações, mostra os vários membros da família que estão vendo a televisão ao lado de uma criança.
Que se trate do avô ou da mãe, a mensagem é a mesma: não deixar uma criança sozinha diante de um meio que, sem o apoio crítico educativo de um adulto, pode transmitir conteúdos inadequados à idade e à maturidade daquele que o vê. Sem esquecer as responsabilidades dos produtores televisivos, empenhados na organização dos programas, o papel da família é realmente insubstituível.
Se realmente o objetivo de quem administra a sociedade de produção televisiva, ou das multinacionais produtoras de videogames ou das operadoras de celulares, é o de promover e vender o produto, o bem estar psicofísico da criança está no centro do interesse dos educadores, sejam eles os professores ou, em primeiro lugar, os pais.
Isto explica bem a mensagem do Papa, que continua a sua análise, salientando que «educar as crianças a serem seletivos no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja e da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos (ver João Paulo II, «Familiaris Consortio», 76). Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia.»


CONTEÚDO DA MÍDIA

No panorama de uma revolução da multimídia, que está modificando transversalmente os hábitos, a mentalidade, os modelos e as linguagens, deve voltar ao centro do debate a tutela daquilo que é melhor para os menores. Sem acusar a «mídia», que enquanto tal não é nem boa nem má, o importante é partir de uma a análise do produto, para assim poder individuar conteúdos que sejam de melhor qualidade para as crianças e os adolescentes. Porque a televisão é um instrumento que abre janelas de conhecimento para o mundo e, se bem utilizada, de «má professora» pode se tornar uma preciosa fonte de estímulo para o crescimento humano e cultural.
A mesma coisa vale, e com mais razão, para a «rede» que engloba e compreende tudo, e para os videogames, onde, ao invés de violência e monstros, poderia se dedicar a produzir (e isso já ocorre em certos casos) histórias instrutivas e de conteúdo interessante.
Bento XVI coloca justamente em evidência as enormes possibilidades para que seja melhorado o conteúdo deste grande campo de produção multimídia: «A educação através da mídia deveria ser positiva. Colocando as crianças diante de um meio estética e moralmente excelente, estas recebem uma ajuda para que desenvolvam a própria opinião, a prudência e a capacidade de discernimento. É importante aqui reconhecer o valor fundamental do exemplo dos pais e as vantagens de introduzir os jovens aos clássicos da literatura infantil (…). A beleza, quase um espelho do divino, inspira e vivifica os corações e as mentes juvenis, enquanto a feiúra e a vulgaridade têm um impacto deprimente sobre os comportamentos». Diante de uma decadência geral do produto televisivo, a questão da qualidade aparece ainda mais forte e vibrante em grande parte de um público formado de famílias, que pede para não ser apenas um exército indistinto de ouvintes silenciosos, mas um público em condições de exprimir suas preferências por conteúdos formativos e informativos de bom nível.
A mensagem de Bento XVI continua, com algumas importantes indicações: «Como a educação em geral, aquela da mídia requer também uma formação ao exercício da liberdade. Trata-se de uma responsabilidade que compromete. Muitas vezes a liberdade é apresentada como uma incansável procura do prazer ou de novas experiências (…). Este desejo, sentido profundamente pelos pais e educadores, que é o de educar as crianças no caminho da beleza, da verdade e da bondade, pode ser apoiado pela indústria da mídia somente na medida em que se promove a dignidade fundamental do ser humano, o verdadeiro valor da vida familiar, as conquistas positivas e as metas da humanidade. A partir disso, a necessidade de que os meios de comunicação estejam empenhados na efetiva formação e no respeito da ética deve ser vista com interesse particular e com urgência não apenas pelos pais, mas também por aqueles que têm responsabilidade cívica».
Na realidade, nos encontramos na situação de ter que reconhecer que na Itália falta uma verdadeira «cultura da criança»: a situação é tão séria que no âmbito institucional procura-se dar uma nova organização geral para verificar e controlar os conteúdos dos setores de entretenimento, como os videogames, que até agora estão submetidos apenas a códigos de auto-regulamentação, feitos e codificados para uso e consumo pelas indústrias produtoras.
Uma vez mais, o primeiro e indispensável apoio à criança só pode vir da família e de uma relação mais estreita com os professores e educadores, exatamente como salienta Bento XVI, lembrando-nos que a preocupação educativa dos pais não deve se tornar uma preocupação genérica, mas uma atenção constante a tudo aquilo que diz respeito aos filhos.

A INDÚSTRIA DA MÍDIA

1) A TELEVISÃO

Se a televisão convencional se apresenta como um ramo de atividade já «maduro», no entanto se apresenta no horizonte a situação da mídia digital (satélite ou a cabo), também como uma plataforma que consente a ligação entre televisão, internet e outro tipo de mídia através do computador. No que se refere à qualidade da programação, apesar dos inúmeros bons propósitos anunciados no âmbito institucional, parece pequena a atenção às exigências dos menores em suas diversas faixas etárias. A programação para os menores, na realidade é confinada em redes e horários particulares, enquanto o resto da programação na faixa horária considerada «para todos» muitas vezes apresenta conteúdos inadequados aos jovens. Mas, quais são as expectativas das gerações de jovens no que se refere à televisão? É realmente verdade que preferem o «trash», os jogos com prêmios absurdos e as «velines»?
A partir de uma pesquisa recente feita pelo instituto Censis sobre «Comunicação, pluralismo social, sociedade aberta» (2005) surge que a relação entre os menores, e em particular dos adolescentes entre os 14 e 18 anos de idade, e a televisão é determinada por elementos de forte contradição e de passividade. Nessa faixa etária, 100% deles vêem televisão praticamente todos os dias, 86% acompanham um pouco de tudo, com uma relevante predileção pelos filmes (72%), por esporte (32%) e pelos «reality shows» (18%).
No entanto, a amostragem entrevistada não está realmente satisfeita com aquilo que vê. De fato, 36% dos adolescentes denunciam a vulgaridade difundida nos programas e 25% criticam a superficialidade. Dentre eles, 46% consideram a televisão como um meio que «invade», ao mesmo tempo em que é interessante notar que 25% consideram que em geral a programação televisiva alimenta nas crianças menores uma visão consumista da vida. Destes dados surge o contraste entre a procura de distração e a reprovação daquilo que lhes é proposto pela programação. Isto significa que o alto índice de procura não é um indicador de satisfação.
Considerando o axioma de que a televisão seja onipresente, fica claro que são os próprios jovens a pedirem uma maior atenção aos conteúdos: menos violência e menos vulgaridade. A exigência de uma regulamentação diversa, diz claramente o relatório do Censis, «não vem somente daqueles, pais e educadores, que estão preocupados pela possível influência negativa sobre os menores, mas se exprime nitidamente também através dos adolescentes, pelo menos de uma parte mais esperta e consciente dentre eles».
Para tutelar melhor os direitos dos menores, desde 2002 foi instituído junto ao Ministério das Comunicações um código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual aderiram os produtores de televisão, seja no âmbito nacional como local. Baseando-se nos princípios sobre a matéria existentes na Constituição italiana e na Convenção dos direitos da criança, estabelecida em 1989 pela ONU, a comissão que controla sua aplicação avaliou em todos estes anos de atividade os milhares de casos em que foram violadas as normas de tutela, que prevêem a transmissão de programas e imagens adequadas a um público de menores de idade durante aquela que é chamada de «faixa protegida» da programação televisiva (das 7h30 às 22h30), intervindo com denúncias e sanções, que nos casos mais graves foram aplicadas pela Autoridade de garantia no setor das comunicações. Para o futuro, esta comissão deverá se transformar em um organismo mais amplo de controle, que se chamará «Mídia e menores», que além da televisão deverá monitorar também os setores dos vídeos-telefone e dos videogames, além da internet, que é o campo de maior risco.

REGRAS DE TUTELA EM OUTROS PAÍSES

É diversa a situação em outros países, como por exemplo na Grã Bretanha, onde o sistema de regulamentação da mídia é estruturado e complexo e foi atualizado nas últimas décadas, com uma particular atenção à tutela dos menores. As inovações tecnológicas neste setor levaram as normativas inglesas a uma série de novas disposições, como por exemplo, a visão em casa de vídeo exclusivamente para adultos, e que fora de casa seriam vetados aos menores, ou o combate à praga mundial dos sites internet para os pedófilos, que contenham material pornográfico ou com conteúdos que possam esconder o aliciamento de menores (ver a Protection Childres Act, de 1978).
A programação televisiva é regulamentada pelo Broadcasting Act (1996), de onde deriva a instituição da Broadcasting Standard Commission (BSC), um órgão independente de controle que estabelece as normas de avaliação e classificação dos programas, também no que se refere aos conteúdos violentos ou que possam ofender a decência pública (site oficial www.bsc.org.uk). Este organismo BSC funciona internamente à estrutura do Broadcasting, supervisionando e regulamentando todas as emissoras de televisão e de rádio, via cabo ou por satélite. Sua tarefa é a de elaborar os códigos de conduta e de aplicação de modelos que respeitem a justiça, além de monitorar os modelos, verificando que respeitem as leis. Com a transmissão de programas com conteúdos considerados inadequados aos menores de várias idades, há alguns anos a televisão inglesa adotou o sistema «watershed», um «separador de águas» entre um horário de programação familiar e outro para os adultos. Todo o sistema televisivo inglês se apóia sobre a responsabilização das famílias, pois sem a colaboração delas qualquer código de modelos para os programas é praticamente inútil.
Na França, está vigorando já há anos um código através de sinais televisivos, que entra em função para assinalar os programas inadequados aos menores. A avaliação do programa televisivo é feita pelo Conseil Supérieur de l’Audiovisuel (CSA), uma autoridade administrativa independente, que controla a difusão dos filmes e outras transmissões em vários canais privados, nacionais, regionais ou locais. A normativa francesa (lei 719/2002) veta a transmissão de programas que possam prejudicar gravemente a integridade física, mental e moral dos menores, porque divulgam conteúdos de pornografia ou de violência gratuita. As transmissões são classificadas por um código de sinais que, em conjunto com um sistema organizado de faixas horárias de programação, garante às famílias mais clareza sobre os programas destinados aos menores.
Na Alemanha, o tema da infância tem particular atenção da legislação, que considera desde o nascimento o início dos direitos fundamentais do cidadão. A tutela é disciplinada no âmbito público pela JSchG (desde o dia 26 de fevereiro de 1985), enquanto a lei GjSM se ocupa do controle sobre a difusão de publicações e conteúdos mediáticos considerados danosos para os menores. A regulamentação no setor televisivo é feita segundo as normas do acordo sobre a radiodifusão dos Lander federais, que as entidades para a mídia nesses Lander adotaram por base para o estabelecimento das diretivas que tutelam o interesse dos menores nas emissoras privadas. Não são admitidas transmissões que incitem o ódio racial, que exaltem a violência ou a guerra, que ofendam a dignidade do homem, que sejam de gênero pornográfico, que mostrem pessoas moribundas ou com sofrimentos que ofendam a dignidade humana. Os responsáveis pela programação, escolhendo os horários das transmissões, devem cuidar para que os menores não vejam programas que podem prejudicar o seu bem estar psíquico, físico ou mental. As transmissões inadequadas às crianças menores podem ser transmitidas somente depois da autorização da entidade competente do Land interessado.
Os responsáveis pela organização dos programas televisivos em âmbito nacional devem nomear encarregados pela tutela dos menores, que atuam no momento da aquisição, da projeção e da realização dos programas. As emissoras privadas fundaram em 1993 uma associação de autocontrole voluntário da televisão («Freiwillige Selbskontrolle Fernsehen», FSF), à qual devem ser apresentados programas particulares, antes da sua transmissão, e suas avaliações consideradas nas decisões das entidades de controle da mídia nos Lander federais. Existe ainda o órgão comum do cidadão para a tutela dos menores, dos programas, da competência mediática e controle da mídia (GSJP), do qual faz parte um integrante da entidade para a mídia nos Lander federais, que dá o seu parecer a respeito de algumas séries, filmes e espetáculos mais ou menos adequados aos menores. Este órgão, o GSJP, decide sobre pedidos de mudança de horários de transmissão de filmes proibidos para menores, controla a forma de novos programas e experimenta novas disposições para a tutela dos menores na televisão digital. A peculiaridade da jurisdição alemã, seja no setor televisivo como no cinematográfico e da mídia em geral, é a minuciosa atenção às exigências com o desenvolvimento do menor e aos riscos que este pode correr com a observância incorreta das leis.
Nos Estados Unidos, é possível consultar via internet um «guia televisivo para os pais» (ver o site www.mpaa.org), que prevê algumas categorias de audiência aplicadas aos programas televisivos transmitidos a todo o público. Este guia organiza várias siglas para identificar a categoria de audiência para cada transmissão: vai-se do TVY (para todas as crianças) ao TVG (para todos), através de várias faixas etárias, que correspondem à passagem da primeira à segunda infância e desta à adolescência. Depois tem o TVPG («parental guidance», visto na presença de um dos pais), o TV14 («parent strongly cautioned», séria advertência aos pais), para os programas que contêm cenas de sexo e de violência. Enfim, há o TVMA, que prevê um «mature audience only», ou seja, destinado a um público de idade superior a 17 anos, última fronteira para os conteúdos considerados «restricted».
Estas avaliações foram elaboradas baseando-se nas opiniões dos próprios pais e são fáceis de serem encontradas e compreendidas. Esta linha de «guia de televisão para os pais» pode ser usada juntamente ao «v-chip», que é um dispositivo de filtro instalado na maior parte dos mais recentes modelos de aparelhos de televisão, para permitir aos pais de bloquear os programas inadequados.

FICHA 1
Brasil: «O que eu penso da tv»
No Brasil, a audiência infantil é muito alta: aproximadamente 30 milhões de crianças vêem televisão pelo menos durante três horas por dia. Explica a profa. Rosália Duarte, do departamento de Ciência da Educação, da PUC do Rio de Janeiro, que «as crianças são muito perspicazes, mas nós podemos e devemos ajudá-las a ampliar o seu quadro de referências, para que possam discutir ainda melhor sobre o conteúdos daquilo que vêem. Para isso temos necessidade, antes de tudo, de ouvir aquilo que elas têm a dizer sobre o assunto e de dialogar com elas. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e muito mais freqüente, a outras atividades culturais». No âmbito de uma pesquisa feita através de um questionário distribuído nas escolas, intitulado «O que eu penso da tv», apareceu que «as crianças querem seriamente ser ouvidas sobre aquilo que pensam da tv, mas sentem que sua opinião é considerada pouco importante e não estão contentes com o excesso de imagens de violência exibidas na televisão, principalmente a violência “real”, definida como aquela transmitida nos telejornais. Eles adoram ver televisão e não importa o que os adultos pensam e dizem a respeito disso. A eles agradam quase todos os tipos de programas transmitidos: novelas, desenhos animados, programas de humor, filmes, seriados, mas isso não faz deles espectadores “idiotas”, pois fazem críticas muito interessantes, pertinentes e bem elaboradas sobre o que consideram feio ou inadequado na televisão. Para a maior parte deles, a televisão se oferece como principal opção de divertimento (em alguns casos, a única), o que significa um dado muito preocupante. Mas, o que chamou mais a nossa atenção é o grau de experiência com o qual essas crianças analisam a televisão: são expertos e demonstram conhecer a televisão também do lado de dentro, inclusive as linguagens que ela utiliza, a sua estrutura de produção, a sua lógica interna e as suas maneiras de intervenção».
As crianças aprendem os valores e os não-valores através da televisão, não resta dúvida, mas demonstram ter senso crítico a respeito deste assunto, quando afirmam nos textos que os programas transmitidos na tv podem lhes ensinar «a serem bons, a ter coragem e a fazer o bem, a cuidar da natureza e de si mesmos, a serem honestos e a lutar por aquilo que desejam», mas também «a serem cruéis e mentirosos, a roubar e matar, a não respeitar os pais e a comprar tudo aquilo que não têm necessidade». Falando sobre a validade do ensino através da mídia, a profa. Duarte salienta a necessidade de «ouvir aquilo que têm a dizer sobre o assunto e a dialogar com eles. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e mais freqüente, a outras atividades culturais».

FICHA 2
Observadores internacionais
Os dados examinados em janeiro de 2006 pelo OssCom, que é um centro de pesquisa da mídia, deixam evidente a tendência a realizar uma forma de co-regulamentação, onde a ação legislativa dos Estados membros se integra com medidas de auto-regulamentação por parte dos produtores, broadcasters e profissionais da comunicação sob o efeito de controles e sanções. São dois os instrumentos mais utilizados no âmbito europeu, observando-se as diretivas previstas no artigo 22 de «Televisão sem fronteiras»: a definição de faixas horárias protegidas (watershed) e os sinais mostrados na tela (determinados por um sistema de «rating»). Apesar disso, aos campos tradicionalmente problemáticos da violência e da pornografia se juntam novos campos de risco para os menores: a vulgaridade, abusos e dependências de substâncias, linguagem e comportamento vulgares, discriminações e abusos, violações e ofensas à dignidade humana. Os critérios de avaliação dos programas se constituem um problema que é partilhado por muitos países da União européia, ao mesmo tempo em que se prepara uma uniformização internacional dos sistemas de classificação (ver mais adiante, Nicam), baseados na visualização de cinco ícones que ilustram simbolicamente qual é a problemática do programa que está sendo analisado e para quais idades ele é desaconselhado.
Deve ser assinalada a atividade online da European Medi@culture. O projeto é promovido pela Comissão Européia, em Bruxelas, no quadro das iniciativas «e-Learning», administrado pelo centro mediático de Baden-Württemberg. O site apresenta informações sobre a educação à mídia na Europa, particularmente na França, Áustria, Finlândia e Alemanha. A seção de projetos de multimídia agrupa os projetos sobre a mídia desenvolvidos por escolas e associações de jovens ao longo do tempo (ver http://www.european-mediaculture.org).

FICHA 3
África do Sul: Encontro mundial sobre a mídia para a infância
Este encontro trienal se realizou no último mês de março em Johannesburg, na África do Sul, com a participação de expertos do setor representando diversos países. Em conjunto se discutiu sobre a necessidade de uma programação adequada às crianças, procurando entender de que modo a violência na mídia pode influir sobre a psíquico dos menores.
Mas, no 5º Encontro mundial sobre a mídia para a infância apresentaram-se também muitas crianças provenientes de todo o mundo e empenhadas em discutir sobre o difícil tema da «Mídia como instrumento de paz e de democracia global». Vieram guiados por grupos de adultos, dentre eles as diversas organizações católicas que há anos trabalham para promover regras para o bem da infância, a serem respeitadas nas transmissões de rádio e televisão através de códigos de regulamentação que devem ser redigidos ou, como em alguns casos, apenas atualizados. Em muitos países do sul do mundo as novas tecnologias de multimídia já estão muito disseminadas e seu uso merece uma atenção particular para tutelar o público mais jovem.
Especialmente na África, explicou o organizador do encontro, Firdoze Bulbulia, começa-se a examinar o projeto de um «Media center» para as crianças, que possa produzir e distribuir transmissões de rádio e de televisão destinadas ao público mais jovem, com o objetivo de realizar um canal televisivo pan-africano dedicado à infância. Os organizadores do encontro estão também trabalhando no projeto de uma aliança africana dos meios de informação e de comunicação, seguindo o modelo daquela já existente na América latina.

2) INTERNET

Na Itália, 47% das famílias italianas têm um computador em casa, um dado relevante mas sempre muito baixo em relação à média dos outros países europeus. O uso da internet por parte dos adolescentes e jovens, e a familiaridade que têm com tudo aquilo que pode ser digitado ou «descarregado» da internet, apresenta não poucos problemas. Pela sua própria natureza de rede de comunicação global, o problema se apresenta em ótica internacional, procurando garantir a tutela dos menores através de precisos acordos com os provedores para um efetivo controle de conteúdo. No campo italiano, até 2006, a tutela dos menores tinha sido deixada nas mãos dos próprios provedores, que em 19 de novembro de 2003 assinaram um acordo de auto-regulamentação: o Codice Internet e Minori. Embora o acordo tenha sido estipulado entre os representantes dos vários provedores diante do Ministério para a Inovação e a Tecnologia, no entanto ele permanece um acordo privado, com lacunas, principalmente no que se refere às sanções que muitas vezes devem ser aplicadas. Em 2006, na seqüência de numerosos casos de violência sobre menores, muitos dos quais realizados através da difusão de material pedo-pornográfico (quando não se tratava de verdadeiro e próprio aliciamento de menores via internet), foi promulgada a lei 38 de 6 de fevereiro de 2006: «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet».
Enfim, como aplicação da lei 38/2006, em fevereiro da 2007 foi publicado um decreto determinando os requisitos técnicos dos instrumentos de filtragem que os provedores da rede internet devem utilizar para impedir o acesso aos sites já assinalados pelo Centro nacional contra a pedo-pornografia. Mas, isso não basta para superar as dificuldades e impedir que os menores possam navegar de maneira arriscada na «rede das redes».
Atualmente foi reativada a comissão anti-pedofilia e desvios de menores através da internet, o «Ciclope», que tinha sido instituída junto ao Ministério para a Eqüidade, do governo italiano, e que ficou inativa por um ano, até a sua reestruturação junto ao Ministério da Família. Está também para entrar em função um site dedicado ao uso da internet, junto ao Ministério das Comunicações, e um número telefônico de emergência gratuito, organizado pelo mesmo ministério e por «Save the children», que poderá ser utilizado por qualquer cidadão que queira assinalar algum abuso, desvio ou pedo-pornografia. Dentre as iniciativas mais recentes, deve ser assinalado o site www.tiseiconnesso.it criado pelo Ministério das Comunicações italiano, sempre em colaboração com «Save the children», onde é colocada à disposição uma série de informações sobre o conteúdo de certos sites, seja para os pais como para as próprias crianças, em conjunto com a campanha televisiva que tem como slogan «A melhor maneira de ajudar o seu filho a não usar incorretamente as novas tecnologias é conhecê-las».
Deve ser salientado também o fato de como a rede se tornou um grande mercado online. Para alguns produtores, o «e-commerce» de brinquedos corresponde já a 4% das vendas, e apenas em 2005 as vendas online corresponderam a 37.600 ações de compra. As razões para investir no processo online são múltiplas: desde a possibilidade de evitar as dificuldades logísticas de distribuição dos produtos, à ampliação de ofertas diferentes de produtos e também a possibilidade de envolvimento do cliente através de campanhas de mala direta e a criação de comunidades virtuais em torno de alguns produtos.

FICHAS:
Pedo-pornografia e internet
Em março de 2006, entraram em vigor as novas medidas diretas de combate e repressão ao fenômeno de exploração sexual dos menores e a pedo-pornografia, estabelecidas pela lei 38/2006 – «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet» foi publicada no Diário oficial em 15 de fevereiro de 2006, nº.38 – com a qual foram substancialmente modificados e integrados os artigos 600bis e seguintes do Código Penal italiano.
A lei confirma os artigos 527, 528, 529 e 725 do Código Penal italiano, que punem os «atos obscenos em local público, publicações, espetáculos obscenos, desenhos ou figuras que ofendem a decência pública».
Porque em muitas publicações, transmissões televisivas e anúncios publicitários, mesmo que não tenham declaradamente um caráter pornográfico, imagens de crianças e adolescentes são apresentadas de maneira explícita ou mais ou menos sutilmente ilusória e de forma falsa, pede-se um novo empenho das instituições competentes para que sejam observadas as normas em vigor e, se preciso for, que façam apelo aos órgãos de Polícia, o Instituto de autodisciplina publicitária, o Ministério das Comunicações, a Polícia postal ou a «Comissão tv e menor».

3) CINEMA

Confirmando as disposições da Constituição italiana, no que se refere ao direito e ao dever das famílias de serem protagonistas na educação de seus filhos, para muitos é chegada à hora de reelaborar a legislação que define o conceito de «censura» (a lei 161/1962 prevê a possibilidade de negar a autorização de abertura às salas de cinema ou de fazer cortes nos filmes, mesmo em função de um público adulto), que hoje está superado. É preciso com urgência estabelecer um critério de tutela dos menores não apenas no que se refere aos filmes que vêem nos circuitos cinematográficos, mas também sucessivamente em casa, muitas vezes em horários acessíveis na programação da televisão.
Uma avaliação correta e preventiva de um filme permite à família ter à sua disposição os instrumentos para escolher se um espetáculo é mais ou menos oportuno, conhecendo a trama, os eventuais conteúdos mais sensíveis, a classificação que a obra recebeu em outros países, etc. Por isso, é justo que a legislação seja revista, uma operação que requer atenção e perspicácia da parte das instituições em um momento de transição da mídia, como este que estamos vivendo, quando esta se tornou realmente um importante componente na educação dos menores.
Não faltam filmes que atraem o público por causa de seu conteúdo de violência, e no entanto entram no circuito cinematográfico sem qualquer restrição de idade. Para um filme que é notícia nos jornais, existem muitos outros com conteúdos duvidosos ou até mesmo perigosos que conseguem passar através do filtro da comissão de revisão cinematográfica, que atualmente funciona junto ao departamento de cinema do Ministério dos Bens Culturais.
Ao mesmo tempo em que existe um projeto de lei do ministro dos Bens culturais, que deve ainda iniciar os trâmites parlamentares, novas situações se apresentam na Itália, com a autocensura de filmes, feita pelos produtores ou distribuidores cinematográficos, com a introdução de novas e mais específicas faixas etárias para as restrições visando os menores a partir dos 10 anos de idade. As restrições serão feitas baseando-se em uma avaliação classificatória dos conteúdos das obras e sucessivamente serão ainda analisadas por uma comissão de psicólogos, educadores e pais.
Este sistema se inspira no modelo americano da Motion Picture Association of America (MPAA), que há 40 anos representa os interesses da indústria do audiovisual americana no mundo. Funcionando a partir de regras bem precisas (estabelecidas ao longo dos anos, também segundo as sentenças dos tribunais federais nos vários Estados americanos e em base aos protestos dos cidadãos), a autocensura americana prevê a existência de uma única comissão competente para determinar as restrições do PG12 ao «restricted» 17 anos. Esta comissão é composta exclusivamente de pais, considerados os primeiros depositários da educação dos filhos, e representam transversalmente a audiência. Importantes sanções econômicas asseguram que o mecanismo de autocertificação corresponda efetivamente aos interesses dos cidadãos. No site da Motion Picture estão disponíveis aos pais os pontos de referência para a avaliação das obras de entretenimento e são publicadas as restrições aplicadas a cada filme que está em exibição nas salas de cinema. Geralmente as avaliações parecem muito mais severas em relação a outros países. Tudo isso, nos vários anos de sua aplicação, deu uma qualificação à indústria americana e seu correto serviço prestado aos ouvintes. Qualquer estrada que se pretenda seguir na Itália, é importante para as famílias que seja estimulado um mercado de produção adequado à infância: é justo que o mecanismo da indústria cinematográfica continue com o seu ritmo de produção, mas não é justo confundir as classificações de acesso ao produto, como qualquer indústria sabe muito bem.
No que se refere às normas européias de classificação dos filmes, e em geral de todo «entertainment» (neologismo anglo-saxão, que, no entanto encontra sua raiz etimológica na relação entre educação e jogo) acessível aos menores, deve ser citado o sistema NICAM, que funciona na Holanda há alguns anos. Fundado em 1999, o NICAM (Nederlands Instituut voor de Classificatie van Audiovisuele Media) se baseia na lei Media Act, onde os programas de grupos que tiveram a autorização para atividades de «broadcasting» não devem incluir obras audiovisuais que prejudiquem o desenvolvimento físico e psicológico de pessoas com menos de 16 anos de idade, seguindo as diretivas da União européia («Televisão sem fronteiras» IV).
O sistema de classificação preventiva funciona também na Grécia, com a lei 1.597, de maio de 1986, que prevê que antes da projeção nas salas de cinema, cada filme seja submetido pelo produtor ou pela sociedade de importação à Comissão para a juventude, que classifica o filme seja como adequado aos menores, ou proibido aos menores de 13 anos, ou de 17 anos ou ainda, nos casos mais graves, severamente inadequado aos menores. Esta comissão é um órgão do Ministério da Cultura e foi concebida procurando-se estabelecer certa proporcionalidade, sendo composta de representantes do Estado (Ministério da Cultura), das categorias ligadas ao cinema, de psicólogos especializados na educação, de sociólogos, dos jovens, dos educadores e dos pais.
Na Áustria, está em vigor um sistema de avaliação complexo, instituído em base a um princípio constitucional federal que confia a tutela dos menores, no que se refere ao cinema e em geral aos meios de comunicação de massa, à competência específica dos Lander. A lei nacional que engloba a regulamentação da mídia é a ORF-ACT, ou seja, a Austrian Broadcasting Corporation nº. 379/1984, que estabelece quais os critérios sobre os quais deve se basear a proteção aplicada a programas e filmes transmitidos na televisão ou através de outros canais mediáticos. No que se refere à exibição dos filmes, a avaliação preventiva das obras cinematográficas, para que sejam decididas as faixas etárias adequadas, é regulamentada pela lei austríaca para a tutela dos menores, a «Jugendschutzgesetz», aplicada através das leis dos Lander federais. Esta lei estabelece nove faixas de restrições de público a partir dos seis anos de idade, com uma sucessiva graduação que prevê restrições para 10, 12, 14 e 16 anos de idade. Para supervisionar o sistema de classificação cinematográfica, existe uma comissão junto ao Ministério da Educação, em Viena, que comunica seu parecer sobre a idoneidade dos filmes às autoridades locais. Geralmente e de maneira individual os Lander adotam as decisões da comissão, e é em âmbito local que se decide de sua aplicação.
Na Espanha, o artigo 20 da Constituição reconhece o direito do cidadão a exprimir e difundir livremente seu pensamento, suas idéias e suas opiniões através de qualquer meio de divulgação. Se por um lado o exercício de tais direitos «não pode ser restrito através de nenhum tipo de censura prévia», o mesmo artigo especifica que «estas liberdades têm o seu limite no respeito dos limites reconhecidos pelas normativas que exprimem este respeito, especialmente no direito à honra, à privacidade, à própria imagem e à proteção da juventude e da infância».
Baseando-se neste princípio, a qualificação dos filmes (Real decreto 81/1997) e das obras audiovisuais é feita antes de sua difusão, através do Instituto de cinematografia e das artes audiovisuais (ICAA), uma entidade autônoma, mas ao mesmo tempo ligada ao Ministério da Educação e Cultura através da secretaria de Estado para a cultura (ver site www.mcu.es).
A subdireção geral de fomento à indústria cinematográfica e do audiovisual, que faz parte do ICAA, se ocupa, dentre outras funções, da classificação em faixas etárias dos filmes e das outras obras audiovisuais em vista de sua exibição pública e para a sua distribuição. A comissão se encarrega de divulgar as informações sobre os filmes e programas audiovisuais, com classificação que vai desde as «salas X» até as restrições para cada faixa etária do público.
Os filmes de caráter pornográfico não podem receber subvenções do Estado e sua projeção nas salas prevê uma taxa suplementar, destinada em parte para estimular um fundo de proteção cinematográfica. A projeção destes filmes pode ser feita somente nas «salas X», onde não podem ser apresentados outros tipos de obras cinematográficas e onde é proibido o ingresso de menores de 18 anos.

CINEMA NA TV

Devido ao alto consumo de programas de televisão por parte dos menores e levando-se em conta as diretivas da União européia, que promovem a auto-regulamentação no âmbito nacional das emissoras de tv e a participação das famílias nesta obra educativa, há alguns anos estão em vigor na França, na Holanda, na Grã-Bretanha, na Grécia e na Itália os códigos de sinais, que servem para identificar tanto os filmes projetados na salas de cinema como aqueles transmitidos na televisão. A tutela dos menores no âmbito da televisão foi também feita adotando-se o chamado sistema «watershed» (separador das águas), que funciona segundo uma seleção de faixas horárias protegidas, algumas aconselhadas à visão dos menores, outras aconselhadas a todos e outras ainda, principalmente na programação noturna, indicadas somente a um público adulto.
A faixa de idade determinada pela classificação preventiva dos filmes tem obviamente uma repercussão na programação das chamadas faixas horárias protegidas ou distintas nas emissoras de televisão pública em todos os países europeus. A definição das linhas de conduta comuns está à base dos acordos de auto-regulamentação e de co-regulamentação dos programas de televisão, estabelecendo-se um código de procedimento comum para as emissoras tanto públicas como privadas. Criou-se assim uma base normativa, que é assumida pela autoridade do Estado e que recebe a confiança dos consumidores das emissoras públicas ou privadas que adotam este sistema de auto-regulamentação.
Para tornar visível aos adultos as classificações dos programas apropriados aos menores, muitas emissoras européias adotaram um sistema de sinais que através de símbolos, números, cores e sinais acústicos advertem ao público a respeito daquilo que está para ser transmitido.
Mas, apenas este sistema, assim como o de filtragem (tipo v-chip), não basta para garantir uma verdadeira tutela dos menores diante de um conjunto de imagens difíceis de serem decodificadas por um jovem. Deve-se pensar às imagens de guerra dos telejornais, dos filmes escabrosos ou às informações sobre os crimes hediondos, que muitas vezes têm como ambiente o próprio núcleo familiar.
É na colaboração entre Estado, produtores de programas audiovisuais e famílias que pode ser fundamentado um autêntico respeito dos menores que encoraje o crescimento positivo da criança em base aos valores fundamentais da pessoa humana.

4) CELULARES COM VÍDEO

Hoje a difusão dos celulares com vídeo chegou à Itália ao índice se 134%, o que significa que muitas pessoas possuem pelo menos dois celulares, inclusive os jovens e as crianças, que recebem este instrumento dos próprios pais. De fato, de duas crianças entre 8 e 13 anos de idade, uma delas tem um celular no bolso. Aquele que poderia ser um instrumento para controlar melhor os deslocamentos e as necessidades dos filhos, se revela no entanto um perigoso meio que pode expor a outro tipo de utilização por parte dos menores, que não se separam nunca do próprio celular, nem mesmo durante as aulas, como lamentam vários professores. Apesar do código de auto-regulamentação assinado pelas principais operadoras (Código de conduta para a oferta de serviços a pagamento em tutela dos menores), na realidade os novos serviços opcionais do celular o tornaram um «personal computer» capaz de permitir novos usos que antes não tinham.
Os desenvolvimentos tecnológicos que estão se verificando no campo da telefonia móvel – particularmente no que se refere à sinergia com a internet e a adoção dos sistemas DVB de vídeos-telefone – contribuem a aumentar a oportunidade de comunicação também para as novas gerações e, ao mesmo tempo, repropõem em novos termos a questão da tutela dos menores. As evoluções já previstas ulteriormente para os próximos anos e o número sempre crescente de pessoas envolvidas, pedem uma grande consciência social e uma constante atenção das pessoas e órgãos encarregados de garantir os direitos dos cidadãos.
Neste contexto devem ser reafirmados os direitos dos menores no campo da comunicação, dentre os quais certamente não está em último lugar aquele que se refere também à segurança diante dos riscos de indução a comportamentos ilícitos ou de acesso a conteúdos nocivos ou indesejados. Também neste campo é essencial o papel dos pais e, em geral, de todos aqueles que são chamados a ter uma função educativa. A maior segurança das crianças e dos jovens quanto ao acesso a conteúdos ilegais é um ponto que deve merecer atenção também através da maior conscientização dos pais e das mães, que devem se capacitar a conhecer e utilizar estes meios.
Para a «alfabetização» dos pais na utilização da mídia devem colaborar também as instituições públicas, promovendo um uso positivo das novas possibilidades tecnológicas. Às empresas cabe a responsabilidade de colocar no mercado um produto que dê garantias no que se refere à sua utilização pelos menores, superando os limites estabelecidos pelo código de auto-regulamentação assinado pelas operadoras de celulares. Devem também oferecer maiores informações aos adultos que assinam um contrato de utilização, como por exemplo a adoção de bloqueios automáticos de acesso a conteúdos nocivos, se o celular passa às mãos de um menor de idade.

5) VIDEOGAMES

Trata-se de uma indústria global, que conquistou os jovens e não apenas eles. Os números relativos à difusão repentina dos videogames indicam que existem 250 mil sites de videogames, cada um deles propõe uma série de títulos, muitos deles recheados de cenas de sexo e de violência. Uma pesquisa recente do Instituto italiano de medicina social (IIMS) coloca em evidência, entre outras coisas, a escassa informação por parte dos adultos a respeito dos videogames utilizados pelos filhos, o predomínio de temas violentas em mais de 30% de títulos não aconselhados aos menores, o predomínio de personagens virtuais normais que podem se tornar especiais, realizando ações extraordinárias.
Mas, o ponto de risco mais elevado se refere aos pequenos jogadores de videogames, crianças entre seis e nove anos de idade que se submetem a entrar tão intensamente no jogo virtual que chegam a formas de dissociação da realidade e solicitam um monitoramento muito atento da parte dos adultos. A mesma pesquisa indica a presença de videogames em 25% das famílias com crianças de três a cinco anos de idade e em 65,2% das famílias com crianças entre seis e 10 anos de idade. O que produz efeitos negativos no âmbito cognitivo das crianças não parece ser especificamente o meio, mas muito mais os elementos que criam a excitação, tais como a velocidade de produção do estímulo e da resposta, a velocidade das imagens, os efeitos especiais, os contrastes, a fragmentação da história, o binômio rumor-ação. O uso prolongado do jogo inibe, segundo alguns psicólogos, a área da capacidade crítica, provocando passividade e ao mesmo tempo agressividade na criança. Mas, não queremos demolir os videogames, porque existem aqueles que são muito adequados aos mais jovens, com valores de informação e de educação, seja também porque o uso deste meio é na realidade um passo na preparação da criança ao sucessivo e mais sofisticado, que é o uso da internet.
De qualquer maneira, os dados relativos à venda destes produtos de entretenimento mostram um crescimento em todos os lugares e a difusão deste meio é acompanhada de uma aceitação social (ou seria uma resignação?) sempre maior.
É urgente ampliar o percurso de conhecimento e das estratégias internacionais, para monitorar um mercado que está cada vez mais vasto. Parece urgente estabelecer modalidades operativas para o controle dos conteúdos e do sistema de sanções, seja para o produtor como para o vendedor dos serviços. O código de auto-regulamentação Pegi (derivado em 2003 do sistema de avaliação e classificação holandês, Nicam, que assinala os conteúdos inadequados aos menores), adotado pelos industriais de «entertainment» que produzem videogames, é a única forma de auto-regulamentação existente atualmente e que prevê sanções (raramente aplicadas, mesmo diante de casos graves evidentes) para os produtores que colocam no comércio os jogos com indicações de faixas etárias apenas aproximativas.
O código Pegi, ao qual a associação européia Isfe adere em 2002, é evidentemente insuficiente na sua função declarada de «fornecer aos consumidores as informações mais oportunas» e expostas no selo de produção. E, como o setor dos videogames tem hoje um volume de negócios que ultrapassa os 740 milhões de euros, envolvendo 24 milhões de jogadores (43% da população a partir dos quatro anos de idade), com uma venda dos produtos classificados para maiores de três anos de idade que chega aos quase 48% dos consumidores. É um dado que define o impacto deste gênero de meio sobre a infância e a adolescência, mostrando toda a sua periculosidade, seja pelo consumo de conteúdos inadequados, seja pelo excessivo número de horas dedicado neste passatempo, muitas vezes solitário e sem a presença de um adulto ao lado. Se for verdade, como sustenta a indústria, que a produção de videogames violentos é apenas uma mínima parte do mercado, é também verdade que esta representa a fatia mais importante do retorno econômico.
O interesse pelos videogames é alimentado pela sinergia com os filmes que inspiram o jogo homônimo e que torna sempre mais atrativo este gênero, principalmente para os adolescentes. Desta maneira é importante também neste campo o estabelecimento de regras precisas em defesa dos consumidores dentre o público jovem, mais exposto aos riscos destas novas formas de entretenimento cada vez mais sofisticadas e envolventes, por causa da combinação entre narrativa e efeitos gráficos.

6) PUBLICIDADE

O problema da tutela dos menores diante da publicidade se apresenta como um corolário, dentro do quadro mais amplo que regulamenta a difícil relação entre a mídia e as crianças. A televisão, e portanto também a publicidade, se constitui em uma fonte de perigo para os menores, isto é, para a maior parte das crianças, principalmente em idade pré-escolar, que devem saber fazer a diferença entre a publicidade e o resto da programação, e entre os programas de ficção e a realidade. Com essas considerações não significa que exista uma acrítica rejeição da publicidade em si mesma – à qual se reconhece, no entanto, onde proceda corretamente, uma função positiva no processo de formação, de crescimento crítico e de socialização do menor –, mas existe a necessidade de prever um sistema de regras destinado a garantir-lhe um uso adequado.
O efeito dos anúncios publicitários é tão grande que em alguns países estão sendo tomadas medidas drásticas a respeito. No Reino Unido, por exemplo, recentemente foram vetados os anúncios publicitários durante os programas destinados às crianças até nove anos de idade, a partir de 1º de janeiro de 2008 a medida se estenderá à programação para os jovens até 15 anos de idade e até o final de 2008 serão vetados em todos os canais dedicados aos menores. Apesar de se reconhecer que a publicidade serve para financiar os programas, aqueles dedicados às crianças terão que recorrer a outras fontes. Também na França começa a se impor uma «linha dura» a esse respeito: visto a alta incidência de publicidade de merendas, de sucos e doces em geral, a partir de agora os anúncios dedicados às crianças deverão ser precedidos de uma espécie de aviso, que orientará para uma alimentação adequada.
Mas, por que as crianças são tão frágeis diante dos apelos da publicidade? Na Itália, explica Paolo Landi, secretário geral da Adisconsum (Associação de defesa dos consumidores e do ambiente»), em um capítulo de seu estudo «Crianças da multimídia»: «Se consideramos que a publicidade não faz outra coisa que veicular um conhecimento imediatamente concretizável em um “ter”, ou em um “ser”, ou em um “fazer”, a criança absorve sem dificuldades os três componentes que são a obsessão dos expertos de marketing, isto é, o componente cognitivo (como fornecer informações indeléveis sobre um produto ou um serviço), o componente afetivo (como fazer o consumidor reagir de maneira emotiva) e o comportamental (como colocar o pequeno consumidor em movimento na direção da aquisição). A partir deste ponto de vista a criança é o público ideal, o consumidor a quem se pode vender qualquer coisa».
Na Itália está em vigor um código de autodisciplina publicitária que surgiu em 1966, em base a um acordo entre os profissionais do setor. Esta primeira forma de tutela, em grande parte com origem comunitária, tem como protagonistas entidades administrativas independentes: a Autoridade de controle da concorrência e do mercado de setor e a Autoridade de garantia para as comunicações e a editoria. Enquanto isso, para a auto-regulamentação, orientada pelas normas que constam do Código de autodisciplina publicitária, e agora também, embora com força jurídica diferente, pelo Código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual se reconhece um poder de decisão e de sanção, emanando uma ordem e intimando seu cumprimento.
Em todos os países onde a televisão serve de veículo às mensagens publicitárias, o mundo empresarial é plenamente consciente do enorme poder de influência que a publicidade tem sobre as crianças.



NORMATIVA INTERNACIONAL

O assunto relativo à tutela dos menores na mídia é um dos mais debatidos, seja no que se refere às normas nacionais, seja no âmbito internacional. Encontra-se diante da situação de precisar acertas as contas com toda a extensão da rede global da internet. O exemplo que, neste momento de transição, coloca mais em evidência a necessidade de estabelecer leis que estejam em condições de controlar o acesso e uso dos conteúdos nocivos para os menores, é exatamente o da internet. Qualquer pessoa no mundo pode abrir um site considerado «arriscado», contendo elementos ilegais e acessíveis a consumidores despreparados, disponibilizados por quem está do outro lado do mundo.
No que se refere aos princípios gerais no âmbito do direito internacional, é preciso recorrer principalmente à convenção da ONU sobre os direitos da criança, com sede em New York, ratificada pelo Parlamento italiano através da lei nº.176/1991. Esta garante à criança uma «consideração proeminente» também a respeito da liberdade, seja no se refere à expressão, seja quando tutela os conteúdos recebidos. Esta mesma convenção, em seu artigo 17, fala da relação entre menor e televisão, desejando «um sistema normativo que tutele o menor-consumidor, mesmo com todas as dificuldades que se apresentam», seja para individuar os fenômenos que devem ser monitorados, seja sobre as normativas possíveis.
No direito da União européia, tal tutela foi recentemente confirmada pela Carta dos direitos fundamentais da União, aprovada em Nice em 2000, cujo artigo 24 salienta que «os Estados membros reconhecem a importância da função exercida pelos meios de comunicação de massa e cuidam para que a criança possa ter acesso às informações e materiais... com a finalidade de promover o seu bem estar social, espiritual e moral, além de sua saúde física e mental». A normativa seguinte, 89/552/CEE, previu algumas restrições, seja no que se refere aos programas como para as mensagens publicitárias destinadas a este público». O artigo 22 desta normativa conduz a impedir a transmissão de programas que contenham cenas pornográficas ou de violência gratuita, ou outros programas inadequados a este público. Não podemos esquecer de mencionar a determinação expressa de «Televisão sem fronteiras», que está hoje em sua quinta versão atualizada, que o tema da tutela dos menores está relacionado com o estatuto geral dos direitos dos menores e corresponde ao disposto nos artigos 50 e 31 da Constituição italiana.
Se for claro que os princípios normativos são todos a favor da tutela dos menores, é também verdadeiro que uma tecnologia em contínua evolução colocou em crise as velhas regras do jogo. Mas também é claro que não se pode mais adiar a necessidade de estabelecer novos parâmetros normativos, para que as crianças possam utilizar os meios de comunicação próprios de seu tempo, com aproveitamento e serenidade também para as famílias.~

EDUCAÇÃO À MÍDIA NO MUNDO: PARA SABER MAIS

A difusão da educação à mídia é uma resposta à necessidade de se informar sobre as novidades no campo dos novos meios de comunicação. Em seguida citamos apenas alguns sites que em vários países oferecem maiores informações sobre como aprender a usar melhor a mídia, enfrentando a problemática da tutela dos menores e da alfabetização às novas tecnologias por parte dos adultos.
«The Media Awareness Nework-Réseau éducation médias» é uma organização canadense sem fins lucrativos, pioneira no desenvolvimento de programas sobre a educação à mídia. Com esta finalidade ela produz programas online em colaboração com organizações internacionais, convicta que, para interpretar as mensagens de informação, de entretenimento e comerciais, os jovens têm necessidade de instrumentos críticos válidos. Por isso é importante formar também os adultos (famílias e professores) sobre como funciona a mídia e como ela determina o estilo de vida.
A organização realiza uma ação contínua de monitoramento em relação à mídia (televisão, cinema, videogames, imprensa, publicidade, etc.), e sua seção dedicada aos pais oferece uma série de elementos para que estes reflitam com os filhos sobre esses meios, além da seção para os educadores, que inclui lições e materiais de apoio. Uma outra seção é dedicada à análise das questões ligadas à mídia, como a difusão de estereótipos, as representações de violência e da diversidade, a privacidade, a publicidade dirigida aos menores. Seu site é em inglês e francês (http://www.media-awareness.ca).
«Quai des images» é o site dedicado ao ensino de cinema e audiovisual organizado pelo Ministério da Educação francês. Ele propõe atividades ligadas à educação à imagem e de análise dos filmes em consonância com os programas escolares, agrupa os textos oficiais a respeito dos meios audiovisuais, oferece uma série de instrumentos de análise e de estudo completos sobre alguns filmes específicos e sobre certos autores em particular, informa sobre conferências, seminários, cursos e festivais sobre o mundo audiovisual e sua utilização em âmbito educativo e didático. Entre outras coisas, reúne também as propostas e as experiências feitas por professores e seus alunos nas escolas secundárias francesas no campo da educação à imagem, além de organizar um fórum de discussões aberto a todos sobre a educação à mídia (http://www.ac-nancy-metz.fr).
Sempre na França, está em funcionamento o blog «Zéro de conduite», organizado pelos professores e destinados a educadores, pais e estudantes. Promove o uso do cinema como instrumento pedagógico, dedicando-se especialmente à atualidade cinematográfica, mas sem esquecer os clássicos e os documentários. Com várias seções e espaços de aprofundamento, se propõe como um local de discussão de temas em um debate aberto (http://cinema-ducation.fluctuat.net).
A Universidade de Massachussetts organizou o Media Education Foundation – MEF, mídia de desafio, que produz e distribui documentários destinados a estimular o pensamento crítico e o debate sobre a relação entre aqueles que detêm o poder sobre a mídia, os conteúdos da mídia comercial, a exigência democrática de um livre fluxo de informações, as diversas representações de idéias e pensamentos e o direito dos cidadãos de informar e serem informados. Alguns destes temas são abordados criticamente, como a identidade do gênero na publicidade, a imagem de sexo nos videoclipes, o papel da mídia na construção da identidade cultural, mídia e saúde, etc. (http://www.mediaed.org/).

(a cura di M. F. D’A.)

 
At 9/17/2007 2:43 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

AS CRIANÇAS E A MÍDIA (II PARTE):
ACEITAR O DESAFIO EDUCATIVO


O tema da 41ª Jornada das Comunicações Sociais, «As crianças e os meios de comunicação: um desafio para a comunicação», nos convida a refletir a respeito de dois aspectos particularmente importantes. O primeiro é a formação das crianças, para que estejam em condições de receber de maneira crítica aquilo que vêem. O segundo é a formação à consciência e ao uso consciente da mídia, que está em contínua transformação tecnológica.
De fato, é o que especifica Bento XVI no início de sua mensagem, de 20 de maio de 2007, para a Jornada: «Os complexos desafios que a educação contemporânea deve enfrentar são muitas vezes ligados à grande influência dos meios de comunicação no nosso mundo. Como aspecto do fenômeno da globalização e estimulados pelo rápido desenvolvimento da tecnologia, os meios de comunicação delineiam fortemente o ambiente cultural (cf. João Paulo II, O rápido desenvolvimento, nº3). Na realidade, há quem afirma que a influência formativa da mídia está em competição com aquela da escola, da Igreja e, quem sabe, até com aquela da própria família».
De fato, como salienta o Pontifício conselho para as Comunicações Sociais, «para muitas pessoas, a realidade corresponde àquilo que os meios de comunicação definem como tal». Episódios recentes, como a utilização do celular na filmagem de violências nas salas de aula, abusos sofridos por pessoas deficientes, fenômenos de trote e de violência generalizada, demonstram como as crianças que crescem passando uma média de quatro horas por dia diante da televisão, sozinhos em casa, absorveram a lógica do «estou no vídeo, logo existo». Os psicólogos, os pedagogos e os estudiosos dos meios de comunicação estudam há tempos sobre as relações entre o consumo televisivo e o comportamento violento dos menores. Uma grande quantidade de pesquisas realizadas em muitos países ocidentais demonstra como esta correlação seja realmente inegável.


NOVAS LINGUAGENS

O fato que muitas crianças vivem completamente inseridas no mundo dos velhos e novos meios de comunicação, que estão cada vez mais frequentemente em correlação entre eles, é confirmado pela popularidade de alguns modelos televisivos, considerados tão efêmeros quanto penosos «momentos de glória», presentes nos programas com os maiores índices de audiência, dos «reality» aos «talk show», sem falar do «trash», que hoje se tornou um gênero de espetáculo.
Dentre as preferências demonstradas pelos adolescentes italianos que assistem televisão mais do que três horas por dia, encontramos, em primeiro lugar, a figura da «veline» (Ndt: misto de corista e coadjuvante na apresentação de programas populares da televisão italiana), enquanto outros da mesma idade se concentram no mais clássico exemplo, o do jogador de futebol. De toda maneira, a coisa mais importante é aparecer, pouco importa por qual motivo, de ser «alguém» ou «alguma coisa» no Olimpo mediático, mesmo que seja apenas por um instante.
Estes são os exemplos mais negativos dos condicionamentos derivados de um excessivo e acrítico uso dos meios de comunicação. Encontramo-nos diante de uma nova geração que cresceu na frente da televisão, capaz de usar as novas tecnologias que os próprios pais, que as adquiriram e as tornaram disponíveis, muitas vezes se encontram despreparados para utilizá-las.
Tanto é verdade que hoje em dia os filmes são vistos diretamente nos celulares e a televisão pode ser assistida na tela do computador. Hoje se telefona através da internet e graças ao download se descarrega os CDs e DVDs mais recentes, se filma e se faz foto com o celular, e assim por diante.
Nas casas, o vocabulário familiar se reduziu ao gênero dos sms e se fala tendo o som da televisão no fundo, se comunica através de e-mail, se faz «visita virtual» via computador, se percorre através de bibliotecas virtuais, tanto que as fichas e arquivos de papel evocam imagens do outro século, completamente em desuso.
A situação dos nossos filhos é diversa daquela da geração precedente, pois eles abriram seus olhos tendo diante de si estes cenários de profunda, contínua e envolvente transformação tecnológica. Eles se constituem aquela que os estudiosos chamam de geração nascida «com seis dedos»: além dos cinco dedos normais da mão, o sexto é o mouse do computador.
Com o aparecimento do mundo «virtual» da internet e dos videogames criou-se uma defasagem em relação à realidade verdadeira e própria. As duas dimensões parecem muitas vezes, e para muitos jovens, como universos paralelos, com conseqüências não indiferentes no plano do processo de amadurecimento. Têm grande sucesso os sites nos quais se prevê uma segunda vida (basta verificar os milhares de registros nos poucos meses de existência do site italiano de «Second Life», que em todo o mundo já tem sete milhões de inscritos), onde a simulação reproduz todas as situações da vida real. Apenas que tudo é falso, a começar da nova identidade, que pode ser escolhida e com ela se inicia a fazer parte deste mundo fora do mundo, onde se pode ser um «qualquer coisa». Isto é, ninguém.
Assim, o grande desafio cultural de hoje é propriamente a redefinição dos limites, que muitas vezes se apresentam demasiadamente instáveis. Isto é, redefinição dos limites entre o real e o virtual, superando a divisão digital que hoje separa as gerações adultas daqueles mais jovens.


OS JOVENS: PROTAGONISTAS OU VÍTIMAS DAS MUDANÇAS?

A linguagem deles é pobre, muitas vezes recheada de termos tirados do dicionário do internauta: clicar, chatar, messagiar, deletar, são alguns dos neologismos que fazem parte de seu vocabulário quotidiano. Falta uma dimensão humana da tecnologia que esteja em condições de traçar o perímetro cultural entre o real e o virtual. Assim a aldeia global difundiu uma quantidade de modelos comportamentais desviados, ou pelo menos discutíveis.
Desta maneira, os jovens que vivem a milhões de quilômetros de distância jogam o mesmo videogame, vêem o mesmo filme, assim como, de maneira transversal, absorvem modelos e comportamentos semelhantes. Muitas vezes os adultos têm menos domínio no uso das novas tecnologias e observam, com uma preocupação resignada diante de suas próprias limitações, as crianças que navegam facilmente na internet.
As raízes das dificuldades neste campo educativo são muito bem explicadas por Marina D’Amato, professora de sociologia da Universidade de Roma, que salienta: «Cada geração tem necessidade de se encontrar também em um mundo fantástico, que serve a interiorizar o paradigma do bom e do belo, do justo e do errado, do oportuno e do útil, também em relação aos exemplos que procedem da narrativa. Hoje nos encontramos em uma condição na qual os avós e os pais contam cada vez menos histórias aos filhos e aos netos, e este papel foi assumido pela televisão. Mas, na realidade, a televisão “exila” e “con-funde”, isto é, funde os modelos morais que são frutos de ânsias e problemas mal resolvidos, muito mais que de certezas. Embora estes se transformem com freqüência, a cada três ou quatro anos, o fato de serem repropostos continuamente faz com que se justaponham uns aos outros» (ver Come mediare i media, de Mario Russo).
Se for verdade que a televisão é o meio mais usado até a adolescência, imediatamente depois surge a grande atração pela internet. Esta passagem nasce de uma sintonia com a linguagem televisiva, que na idade infantil muitas vezes é ouvida durante muitas horas no dia. Esta linguagem se baseia em uma mediação da realidade e desta maneira ela ativa um processo de recepção que é de tipo emotivo.
Neste registro emocional é mais fácil acabar envolvido por situações e figuras capazes de se proporem como modelos identificadores, preservadores de sentido e de comportamentos a serem imitados.
O poder de concentrar uma vontade emulativa em alguns personagens, que correspondem particularmente às necessidades interiores do jovem (necessidades na maioria das vezes induzidas pela publicidade ou por modelos estimuladores), tem uma forte relação com a quantidade de horas que o jovem passa utilizando os novos ou os velhos meios de comunicação.


EDUCAÇÃO NECESSÁRIA

«A formação adequada a um uso correto dos meios de comunicação é essencial para o desenvolvimento cultural, moral e espiritual das crianças… Educar as crianças a serem seletivas no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja, da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos. Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia, com a certeza de que este difícil, embora gratificante, aspecto da condição de pais, é apoiado por toda a comunidade.»
As palavras do discurso de Bento XVI definem com grande clareza o paradigma de uma justa relação entre a mídia e os menores. Uma clareza que devemos agradecer ao magistério da Igreja, no momento em que o mundo da mídia parece ignorar a verdadeira problemática educativa das crianças e as expectativas de qualidade e de segurança exigidas pelas famílias no que se refere ao uso desses meios, seja do cinema aos videogames, da televisão à internet.
Diante da utilização destorcera do meio televisivo, o mais difundido dentre os meios de comunicação, a Igreja se interroga sobre o porquê da televisão não ter um papel educativo e por que os meios de comunicação não podem ser companheiros confiáveis para os jogos na fase de crescimento da criança. O anúncio de uma recente campanha sobre o uso da mídia, promovida pelo Ministério das Comunicações, mostra os vários membros da família que estão vendo a televisão ao lado de uma criança.
Que se trate do avô ou da mãe, a mensagem é a mesma: não deixar uma criança sozinha diante de um meio que, sem o apoio crítico educativo de um adulto, pode transmitir conteúdos inadequados à idade e à maturidade daquele que o vê. Sem esquecer as responsabilidades dos produtores televisivos, empenhados na organização dos programas, o papel da família é realmente insubstituível.
Se realmente o objetivo de quem administra a sociedade de produção televisiva, ou das multinacionais produtoras de videogames ou das operadoras de celulares, é o de promover e vender o produto, o bem estar psicofísico da criança está no centro do interesse dos educadores, sejam eles os professores ou, em primeiro lugar, os pais.
Isto explica bem a mensagem do Papa, que continua a sua análise, salientando que «educar as crianças a serem seletivos no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja e da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos (ver João Paulo II, «Familiaris Consortio», 76). Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia.»


CONTEÚDO DA MÍDIA

No panorama de uma revolução da multimídia, que está modificando transversalmente os hábitos, a mentalidade, os modelos e as linguagens, deve voltar ao centro do debate a tutela daquilo que é melhor para os menores. Sem acusar a «mídia», que enquanto tal não é nem boa nem má, o importante é partir de uma a análise do produto, para assim poder individuar conteúdos que sejam de melhor qualidade para as crianças e os adolescentes. Porque a televisão é um instrumento que abre janelas de conhecimento para o mundo e, se bem utilizada, de «má professora» pode se tornar uma preciosa fonte de estímulo para o crescimento humano e cultural.
A mesma coisa vale, e com mais razão, para a «rede» que engloba e compreende tudo, e para os videogames, onde, ao invés de violência e monstros, poderia se dedicar a produzir (e isso já ocorre em certos casos) histórias instrutivas e de conteúdo interessante.
Bento XVI coloca justamente em evidência as enormes possibilidades para que seja melhorado o conteúdo deste grande campo de produção multimídia: «A educação através da mídia deveria ser positiva. Colocando as crianças diante de um meio estética e moralmente excelente, estas recebem uma ajuda para que desenvolvam a própria opinião, a prudência e a capacidade de discernimento. É importante aqui reconhecer o valor fundamental do exemplo dos pais e as vantagens de introduzir os jovens aos clássicos da literatura infantil (…). A beleza, quase um espelho do divino, inspira e vivifica os corações e as mentes juvenis, enquanto a feiúra e a vulgaridade têm um impacto deprimente sobre os comportamentos». Diante de uma decadência geral do produto televisivo, a questão da qualidade aparece ainda mais forte e vibrante em grande parte de um público formado de famílias, que pede para não ser apenas um exército indistinto de ouvintes silenciosos, mas um público em condições de exprimir suas preferências por conteúdos formativos e informativos de bom nível.
A mensagem de Bento XVI continua, com algumas importantes indicações: «Como a educação em geral, aquela da mídia requer também uma formação ao exercício da liberdade. Trata-se de uma responsabilidade que compromete. Muitas vezes a liberdade é apresentada como uma incansável procura do prazer ou de novas experiências (…). Este desejo, sentido profundamente pelos pais e educadores, que é o de educar as crianças no caminho da beleza, da verdade e da bondade, pode ser apoiado pela indústria da mídia somente na medida em que se promove a dignidade fundamental do ser humano, o verdadeiro valor da vida familiar, as conquistas positivas e as metas da humanidade. A partir disso, a necessidade de que os meios de comunicação estejam empenhados na efetiva formação e no respeito da ética deve ser vista com interesse particular e com urgência não apenas pelos pais, mas também por aqueles que têm responsabilidade cívica».
Na realidade, nos encontramos na situação de ter que reconhecer que na Itália falta uma verdadeira «cultura da criança»: a situação é tão séria que no âmbito institucional procura-se dar uma nova organização geral para verificar e controlar os conteúdos dos setores de entretenimento, como os videogames, que até agora estão submetidos apenas a códigos de auto-regulamentação, feitos e codificados para uso e consumo pelas indústrias produtoras.
Uma vez mais, o primeiro e indispensável apoio à criança só pode vir da família e de uma relação mais estreita com os professores e educadores, exatamente como salienta Bento XVI, lembrando-nos que a preocupação educativa dos pais não deve se tornar uma preocupação genérica, mas uma atenção constante a tudo aquilo que diz respeito aos filhos.

A INDÚSTRIA DA MÍDIA

1) A TELEVISÃO

Se a televisão convencional se apresenta como um ramo de atividade já «maduro», no entanto se apresenta no horizonte a situação da mídia digital (satélite ou a cabo), também como uma plataforma que consente a ligação entre televisão, internet e outro tipo de mídia através do computador. No que se refere à qualidade da programação, apesar dos inúmeros bons propósitos anunciados no âmbito institucional, parece pequena a atenção às exigências dos menores em suas diversas faixas etárias. A programação para os menores, na realidade é confinada em redes e horários particulares, enquanto o resto da programação na faixa horária considerada «para todos» muitas vezes apresenta conteúdos inadequados aos jovens. Mas, quais são as expectativas das gerações de jovens no que se refere à televisão? É realmente verdade que preferem o «trash», os jogos com prêmios absurdos e as «velines»?
A partir de uma pesquisa recente feita pelo instituto Censis sobre «Comunicação, pluralismo social, sociedade aberta» (2005) surge que a relação entre os menores, e em particular dos adolescentes entre os 14 e 18 anos de idade, e a televisão é determinada por elementos de forte contradição e de passividade. Nessa faixa etária, 100% deles vêem televisão praticamente todos os dias, 86% acompanham um pouco de tudo, com uma relevante predileção pelos filmes (72%), por esporte (32%) e pelos «reality shows» (18%).
No entanto, a amostragem entrevistada não está realmente satisfeita com aquilo que vê. De fato, 36% dos adolescentes denunciam a vulgaridade difundida nos programas e 25% criticam a superficialidade. Dentre eles, 46% consideram a televisão como um meio que «invade», ao mesmo tempo em que é interessante notar que 25% consideram que em geral a programação televisiva alimenta nas crianças menores uma visão consumista da vida. Destes dados surge o contraste entre a procura de distração e a reprovação daquilo que lhes é proposto pela programação. Isto significa que o alto índice de procura não é um indicador de satisfação.
Considerando o axioma de que a televisão seja onipresente, fica claro que são os próprios jovens a pedirem uma maior atenção aos conteúdos: menos violência e menos vulgaridade. A exigência de uma regulamentação diversa, diz claramente o relatório do Censis, «não vem somente daqueles, pais e educadores, que estão preocupados pela possível influência negativa sobre os menores, mas se exprime nitidamente também através dos adolescentes, pelo menos de uma parte mais esperta e consciente dentre eles».
Para tutelar melhor os direitos dos menores, desde 2002 foi instituído junto ao Ministério das Comunicações um código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual aderiram os produtores de televisão, seja no âmbito nacional como local. Baseando-se nos princípios sobre a matéria existentes na Constituição italiana e na Convenção dos direitos da criança, estabelecida em 1989 pela ONU, a comissão que controla sua aplicação avaliou em todos estes anos de atividade os milhares de casos em que foram violadas as normas de tutela, que prevêem a transmissão de programas e imagens adequadas a um público de menores de idade durante aquela que é chamada de «faixa protegida» da programação televisiva (das 7h30 às 22h30), intervindo com denúncias e sanções, que nos casos mais graves foram aplicadas pela Autoridade de garantia no setor das comunicações. Para o futuro, esta comissão deverá se transformar em um organismo mais amplo de controle, que se chamará «Mídia e menores», que além da televisão deverá monitorar também os setores dos vídeos-telefone e dos videogames, além da internet, que é o campo de maior risco.

REGRAS DE TUTELA EM OUTROS PAÍSES

É diversa a situação em outros países, como por exemplo na Grã Bretanha, onde o sistema de regulamentação da mídia é estruturado e complexo e foi atualizado nas últimas décadas, com uma particular atenção à tutela dos menores. As inovações tecnológicas neste setor levaram as normativas inglesas a uma série de novas disposições, como por exemplo, a visão em casa de vídeo exclusivamente para adultos, e que fora de casa seriam vetados aos menores, ou o combate à praga mundial dos sites internet para os pedófilos, que contenham material pornográfico ou com conteúdos que possam esconder o aliciamento de menores (ver a Protection Childres Act, de 1978).
A programação televisiva é regulamentada pelo Broadcasting Act (1996), de onde deriva a instituição da Broadcasting Standard Commission (BSC), um órgão independente de controle que estabelece as normas de avaliação e classificação dos programas, também no que se refere aos conteúdos violentos ou que possam ofender a decência pública (site oficial www.bsc.org.uk). Este organismo BSC funciona internamente à estrutura do Broadcasting, supervisionando e regulamentando todas as emissoras de televisão e de rádio, via cabo ou por satélite. Sua tarefa é a de elaborar os códigos de conduta e de aplicação de modelos que respeitem a justiça, além de monitorar os modelos, verificando que respeitem as leis. Com a transmissão de programas com conteúdos considerados inadequados aos menores de várias idades, há alguns anos a televisão inglesa adotou o sistema «watershed», um «separador de águas» entre um horário de programação familiar e outro para os adultos. Todo o sistema televisivo inglês se apóia sobre a responsabilização das famílias, pois sem a colaboração delas qualquer código de modelos para os programas é praticamente inútil.
Na França, está vigorando já há anos um código através de sinais televisivos, que entra em função para assinalar os programas inadequados aos menores. A avaliação do programa televisivo é feita pelo Conseil Supérieur de l’Audiovisuel (CSA), uma autoridade administrativa independente, que controla a difusão dos filmes e outras transmissões em vários canais privados, nacionais, regionais ou locais. A normativa francesa (lei 719/2002) veta a transmissão de programas que possam prejudicar gravemente a integridade física, mental e moral dos menores, porque divulgam conteúdos de pornografia ou de violência gratuita. As transmissões são classificadas por um código de sinais que, em conjunto com um sistema organizado de faixas horárias de programação, garante às famílias mais clareza sobre os programas destinados aos menores.
Na Alemanha, o tema da infância tem particular atenção da legislação, que considera desde o nascimento o início dos direitos fundamentais do cidadão. A tutela é disciplinada no âmbito público pela JSchG (desde o dia 26 de fevereiro de 1985), enquanto a lei GjSM se ocupa do controle sobre a difusão de publicações e conteúdos mediáticos considerados danosos para os menores. A regulamentação no setor televisivo é feita segundo as normas do acordo sobre a radiodifusão dos Lander federais, que as entidades para a mídia nesses Lander adotaram por base para o estabelecimento das diretivas que tutelam o interesse dos menores nas emissoras privadas. Não são admitidas transmissões que incitem o ódio racial, que exaltem a violência ou a guerra, que ofendam a dignidade do homem, que sejam de gênero pornográfico, que mostrem pessoas moribundas ou com sofrimentos que ofendam a dignidade humana. Os responsáveis pela programação, escolhendo os horários das transmissões, devem cuidar para que os menores não vejam programas que podem prejudicar o seu bem estar psíquico, físico ou mental. As transmissões inadequadas às crianças menores podem ser transmitidas somente depois da autorização da entidade competente do Land interessado.
Os responsáveis pela organização dos programas televisivos em âmbito nacional devem nomear encarregados pela tutela dos menores, que atuam no momento da aquisição, da projeção e da realização dos programas. As emissoras privadas fundaram em 1993 uma associação de autocontrole voluntário da televisão («Freiwillige Selbskontrolle Fernsehen», FSF), à qual devem ser apresentados programas particulares, antes da sua transmissão, e suas avaliações consideradas nas decisões das entidades de controle da mídia nos Lander federais. Existe ainda o órgão comum do cidadão para a tutela dos menores, dos programas, da competência mediática e controle da mídia (GSJP), do qual faz parte um integrante da entidade para a mídia nos Lander federais, que dá o seu parecer a respeito de algumas séries, filmes e espetáculos mais ou menos adequados aos menores. Este órgão, o GSJP, decide sobre pedidos de mudança de horários de transmissão de filmes proibidos para menores, controla a forma de novos programas e experimenta novas disposições para a tutela dos menores na televisão digital. A peculiaridade da jurisdição alemã, seja no setor televisivo como no cinematográfico e da mídia em geral, é a minuciosa atenção às exigências com o desenvolvimento do menor e aos riscos que este pode correr com a observância incorreta das leis.
Nos Estados Unidos, é possível consultar via internet um «guia televisivo para os pais» (ver o site www.mpaa.org), que prevê algumas categorias de audiência aplicadas aos programas televisivos transmitidos a todo o público. Este guia organiza várias siglas para identificar a categoria de audiência para cada transmissão: vai-se do TVY (para todas as crianças) ao TVG (para todos), através de várias faixas etárias, que correspondem à passagem da primeira à segunda infância e desta à adolescência. Depois tem o TVPG («parental guidance», visto na presença de um dos pais), o TV14 («parent strongly cautioned», séria advertência aos pais), para os programas que contêm cenas de sexo e de violência. Enfim, há o TVMA, que prevê um «mature audience only», ou seja, destinado a um público de idade superior a 17 anos, última fronteira para os conteúdos considerados «restricted».
Estas avaliações foram elaboradas baseando-se nas opiniões dos próprios pais e são fáceis de serem encontradas e compreendidas. Esta linha de «guia de televisão para os pais» pode ser usada juntamente ao «v-chip», que é um dispositivo de filtro instalado na maior parte dos mais recentes modelos de aparelhos de televisão, para permitir aos pais de bloquear os programas inadequados.

FICHA 1
Brasil: «O que eu penso da tv»
No Brasil, a audiência infantil é muito alta: aproximadamente 30 milhões de crianças vêem televisão pelo menos durante três horas por dia. Explica a profa. Rosália Duarte, do departamento de Ciência da Educação, da PUC do Rio de Janeiro, que «as crianças são muito perspicazes, mas nós podemos e devemos ajudá-las a ampliar o seu quadro de referências, para que possam discutir ainda melhor sobre o conteúdos daquilo que vêem. Para isso temos necessidade, antes de tudo, de ouvir aquilo que elas têm a dizer sobre o assunto e de dialogar com elas. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e muito mais freqüente, a outras atividades culturais». No âmbito de uma pesquisa feita através de um questionário distribuído nas escolas, intitulado «O que eu penso da tv», apareceu que «as crianças querem seriamente ser ouvidas sobre aquilo que pensam da tv, mas sentem que sua opinião é considerada pouco importante e não estão contentes com o excesso de imagens de violência exibidas na televisão, principalmente a violência “real”, definida como aquela transmitida nos telejornais. Eles adoram ver televisão e não importa o que os adultos pensam e dizem a respeito disso. A eles agradam quase todos os tipos de programas transmitidos: novelas, desenhos animados, programas de humor, filmes, seriados, mas isso não faz deles espectadores “idiotas”, pois fazem críticas muito interessantes, pertinentes e bem elaboradas sobre o que consideram feio ou inadequado na televisão. Para a maior parte deles, a televisão se oferece como principal opção de divertimento (em alguns casos, a única), o que significa um dado muito preocupante. Mas, o que chamou mais a nossa atenção é o grau de experiência com o qual essas crianças analisam a televisão: são expertos e demonstram conhecer a televisão também do lado de dentro, inclusive as linguagens que ela utiliza, a sua estrutura de produção, a sua lógica interna e as suas maneiras de intervenção».
As crianças aprendem os valores e os não-valores através da televisão, não resta dúvida, mas demonstram ter senso crítico a respeito deste assunto, quando afirmam nos textos que os programas transmitidos na tv podem lhes ensinar «a serem bons, a ter coragem e a fazer o bem, a cuidar da natureza e de si mesmos, a serem honestos e a lutar por aquilo que desejam», mas também «a serem cruéis e mentirosos, a roubar e matar, a não respeitar os pais e a comprar tudo aquilo que não têm necessidade». Falando sobre a validade do ensino através da mídia, a profa. Duarte salienta a necessidade de «ouvir aquilo que têm a dizer sobre o assunto e a dialogar com eles. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e mais freqüente, a outras atividades culturais».

FICHA 2
Observadores internacionais
Os dados examinados em janeiro de 2006 pelo OssCom, que é um centro de pesquisa da mídia, deixam evidente a tendência a realizar uma forma de co-regulamentação, onde a ação legislativa dos Estados membros se integra com medidas de auto-regulamentação por parte dos produtores, broadcasters e profissionais da comunicação sob o efeito de controles e sanções. São dois os instrumentos mais utilizados no âmbito europeu, observando-se as diretivas previstas no artigo 22 de «Televisão sem fronteiras»: a definição de faixas horárias protegidas (watershed) e os sinais mostrados na tela (determinados por um sistema de «rating»). Apesar disso, aos campos tradicionalmente problemáticos da violência e da pornografia se juntam novos campos de risco para os menores: a vulgaridade, abusos e dependências de substâncias, linguagem e comportamento vulgares, discriminações e abusos, violações e ofensas à dignidade humana. Os critérios de avaliação dos programas se constituem um problema que é partilhado por muitos países da União européia, ao mesmo tempo em que se prepara uma uniformização internacional dos sistemas de classificação (ver mais adiante, Nicam), baseados na visualização de cinco ícones que ilustram simbolicamente qual é a problemática do programa que está sendo analisado e para quais idades ele é desaconselhado.
Deve ser assinalada a atividade online da European Medi@culture. O projeto é promovido pela Comissão Européia, em Bruxelas, no quadro das iniciativas «e-Learning», administrado pelo centro mediático de Baden-Württemberg. O site apresenta informações sobre a educação à mídia na Europa, particularmente na França, Áustria, Finlândia e Alemanha. A seção de projetos de multimídia agrupa os projetos sobre a mídia desenvolvidos por escolas e associações de jovens ao longo do tempo (ver http://www.european-mediaculture.org).

FICHA 3
África do Sul: Encontro mundial sobre a mídia para a infância
Este encontro trienal se realizou no último mês de março em Johannesburg, na África do Sul, com a participação de expertos do setor representando diversos países. Em conjunto se discutiu sobre a necessidade de uma programação adequada às crianças, procurando entender de que modo a violência na mídia pode influir sobre a psíquico dos menores.
Mas, no 5º Encontro mundial sobre a mídia para a infância apresentaram-se também muitas crianças provenientes de todo o mundo e empenhadas em discutir sobre o difícil tema da «Mídia como instrumento de paz e de democracia global». Vieram guiados por grupos de adultos, dentre eles as diversas organizações católicas que há anos trabalham para promover regras para o bem da infância, a serem respeitadas nas transmissões de rádio e televisão através de códigos de regulamentação que devem ser redigidos ou, como em alguns casos, apenas atualizados. Em muitos países do sul do mundo as novas tecnologias de multimídia já estão muito disseminadas e seu uso merece uma atenção particular para tutelar o público mais jovem.
Especialmente na África, explicou o organizador do encontro, Firdoze Bulbulia, começa-se a examinar o projeto de um «Media center» para as crianças, que possa produzir e distribuir transmissões de rádio e de televisão destinadas ao público mais jovem, com o objetivo de realizar um canal televisivo pan-africano dedicado à infância. Os organizadores do encontro estão também trabalhando no projeto de uma aliança africana dos meios de informação e de comunicação, seguindo o modelo daquela já existente na América latina.

2) INTERNET

Na Itália, 47% das famílias italianas têm um computador em casa, um dado relevante mas sempre muito baixo em relação à média dos outros países europeus. O uso da internet por parte dos adolescentes e jovens, e a familiaridade que têm com tudo aquilo que pode ser digitado ou «descarregado» da internet, apresenta não poucos problemas. Pela sua própria natureza de rede de comunicação global, o problema se apresenta em ótica internacional, procurando garantir a tutela dos menores através de precisos acordos com os provedores para um efetivo controle de conteúdo. No campo italiano, até 2006, a tutela dos menores tinha sido deixada nas mãos dos próprios provedores, que em 19 de novembro de 2003 assinaram um acordo de auto-regulamentação: o Codice Internet e Minori. Embora o acordo tenha sido estipulado entre os representantes dos vários provedores diante do Ministério para a Inovação e a Tecnologia, no entanto ele permanece um acordo privado, com lacunas, principalmente no que se refere às sanções que muitas vezes devem ser aplicadas. Em 2006, na seqüência de numerosos casos de violência sobre menores, muitos dos quais realizados através da difusão de material pedo-pornográfico (quando não se tratava de verdadeiro e próprio aliciamento de menores via internet), foi promulgada a lei 38 de 6 de fevereiro de 2006: «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet».
Enfim, como aplicação da lei 38/2006, em fevereiro da 2007 foi publicado um decreto determinando os requisitos técnicos dos instrumentos de filtragem que os provedores da rede internet devem utilizar para impedir o acesso aos sites já assinalados pelo Centro nacional contra a pedo-pornografia. Mas, isso não basta para superar as dificuldades e impedir que os menores possam navegar de maneira arriscada na «rede das redes».
Atualmente foi reativada a comissão anti-pedofilia e desvios de menores através da internet, o «Ciclope», que tinha sido instituída junto ao Ministério para a Eqüidade, do governo italiano, e que ficou inativa por um ano, até a sua reestruturação junto ao Ministério da Família. Está também para entrar em função um site dedicado ao uso da internet, junto ao Ministério das Comunicações, e um número telefônico de emergência gratuito, organizado pelo mesmo ministério e por «Save the children», que poderá ser utilizado por qualquer cidadão que queira assinalar algum abuso, desvio ou pedo-pornografia. Dentre as iniciativas mais recentes, deve ser assinalado o site www.tiseiconnesso.it criado pelo Ministério das Comunicações italiano, sempre em colaboração com «Save the children», onde é colocada à disposição uma série de informações sobre o conteúdo de certos sites, seja para os pais como para as próprias crianças, em conjunto com a campanha televisiva que tem como slogan «A melhor maneira de ajudar o seu filho a não usar incorretamente as novas tecnologias é conhecê-las».
Deve ser salientado também o fato de como a rede se tornou um grande mercado online. Para alguns produtores, o «e-commerce» de brinquedos corresponde já a 4% das vendas, e apenas em 2005 as vendas online corresponderam a 37.600 ações de compra. As razões para investir no processo online são múltiplas: desde a possibilidade de evitar as dificuldades logísticas de distribuição dos produtos, à ampliação de ofertas diferentes de produtos e também a possibilidade de envolvimento do cliente através de campanhas de mala direta e a criação de comunidades virtuais em torno de alguns produtos.

FICHAS:
Pedo-pornografia e internet
Em março de 2006, entraram em vigor as novas medidas diretas de combate e repressão ao fenômeno de exploração sexual dos menores e a pedo-pornografia, estabelecidas pela lei 38/2006 – «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet» foi publicada no Diário oficial em 15 de fevereiro de 2006, nº.38 – com a qual foram substancialmente modificados e integrados os artigos 600bis e seguintes do Código Penal italiano.
A lei confirma os artigos 527, 528, 529 e 725 do Código Penal italiano, que punem os «atos obscenos em local público, publicações, espetáculos obscenos, desenhos ou figuras que ofendem a decência pública».
Porque em muitas publicações, transmissões televisivas e anúncios publicitários, mesmo que não tenham declaradamente um caráter pornográfico, imagens de crianças e adolescentes são apresentadas de maneira explícita ou mais ou menos sutilmente ilusória e de forma falsa, pede-se um novo empenho das instituições competentes para que sejam observadas as normas em vigor e, se preciso for, que façam apelo aos órgãos de Polícia, o Instituto de autodisciplina publicitária, o Ministério das Comunicações, a Polícia postal ou a «Comissão tv e menor».

3) CINEMA

Confirmando as disposições da Constituição italiana, no que se refere ao direito e ao dever das famílias de serem protagonistas na educação de seus filhos, para muitos é chegada à hora de reelaborar a legislação que define o conceito de «censura» (a lei 161/1962 prevê a possibilidade de negar a autorização de abertura às salas de cinema ou de fazer cortes nos filmes, mesmo em função de um público adulto), que hoje está superado. É preciso com urgência estabelecer um critério de tutela dos menores não apenas no que se refere aos filmes que vêem nos circuitos cinematográficos, mas também sucessivamente em casa, muitas vezes em horários acessíveis na programação da televisão.
Uma avaliação correta e preventiva de um filme permite à família ter à sua disposição os instrumentos para escolher se um espetáculo é mais ou menos oportuno, conhecendo a trama, os eventuais conteúdos mais sensíveis, a classificação que a obra recebeu em outros países, etc. Por isso, é justo que a legislação seja revista, uma operação que requer atenção e perspicácia da parte das instituições em um momento de transição da mídia, como este que estamos vivendo, quando esta se tornou realmente um importante componente na educação dos menores.
Não faltam filmes que atraem o público por causa de seu conteúdo de violência, e no entanto entram no circuito cinematográfico sem qualquer restrição de idade. Para um filme que é notícia nos jornais, existem muitos outros com conteúdos duvidosos ou até mesmo perigosos que conseguem passar através do filtro da comissão de revisão cinematográfica, que atualmente funciona junto ao departamento de cinema do Ministério dos Bens Culturais.
Ao mesmo tempo em que existe um projeto de lei do ministro dos Bens culturais, que deve ainda iniciar os trâmites parlamentares, novas situações se apresentam na Itália, com a autocensura de filmes, feita pelos produtores ou distribuidores cinematográficos, com a introdução de novas e mais específicas faixas etárias para as restrições visando os menores a partir dos 10 anos de idade. As restrições serão feitas baseando-se em uma avaliação classificatória dos conteúdos das obras e sucessivamente serão ainda analisadas por uma comissão de psicólogos, educadores e pais.
Este sistema se inspira no modelo americano da Motion Picture Association of America (MPAA), que há 40 anos representa os interesses da indústria do audiovisual americana no mundo. Funcionando a partir de regras bem precisas (estabelecidas ao longo dos anos, também segundo as sentenças dos tribunais federais nos vários Estados americanos e em base aos protestos dos cidadãos), a autocensura americana prevê a existência de uma única comissão competente para determinar as restrições do PG12 ao «restricted» 17 anos. Esta comissão é composta exclusivamente de pais, considerados os primeiros depositários da educação dos filhos, e representam transversalmente a audiência. Importantes sanções econômicas asseguram que o mecanismo de autocertificação corresponda efetivamente aos interesses dos cidadãos. No site da Motion Picture estão disponíveis aos pais os pontos de referência para a avaliação das obras de entretenimento e são publicadas as restrições aplicadas a cada filme que está em exibição nas salas de cinema. Geralmente as avaliações parecem muito mais severas em relação a outros países. Tudo isso, nos vários anos de sua aplicação, deu uma qualificação à indústria americana e seu correto serviço prestado aos ouvintes. Qualquer estrada que se pretenda seguir na Itália, é importante para as famílias que seja estimulado um mercado de produção adequado à infância: é justo que o mecanismo da indústria cinematográfica continue com o seu ritmo de produção, mas não é justo confundir as classificações de acesso ao produto, como qualquer indústria sabe muito bem.
No que se refere às normas européias de classificação dos filmes, e em geral de todo «entertainment» (neologismo anglo-saxão, que, no entanto encontra sua raiz etimológica na relação entre educação e jogo) acessível aos menores, deve ser citado o sistema NICAM, que funciona na Holanda há alguns anos. Fundado em 1999, o NICAM (Nederlands Instituut voor de Classificatie van Audiovisuele Media) se baseia na lei Media Act, onde os programas de grupos que tiveram a autorização para atividades de «broadcasting» não devem incluir obras audiovisuais que prejudiquem o desenvolvimento físico e psicológico de pessoas com menos de 16 anos de idade, seguindo as diretivas da União européia («Televisão sem fronteiras» IV).
O sistema de classificação preventiva funciona também na Grécia, com a lei 1.597, de maio de 1986, que prevê que antes da projeção nas salas de cinema, cada filme seja submetido pelo produtor ou pela sociedade de importação à Comissão para a juventude, que classifica o filme seja como adequado aos menores, ou proibido aos menores de 13 anos, ou de 17 anos ou ainda, nos casos mais graves, severamente inadequado aos menores. Esta comissão é um órgão do Ministério da Cultura e foi concebida procurando-se estabelecer certa proporcionalidade, sendo composta de representantes do Estado (Ministério da Cultura), das categorias ligadas ao cinema, de psicólogos especializados na educação, de sociólogos, dos jovens, dos educadores e dos pais.
Na Áustria, está em vigor um sistema de avaliação complexo, instituído em base a um princípio constitucional federal que confia a tutela dos menores, no que se refere ao cinema e em geral aos meios de comunicação de massa, à competência específica dos Lander. A lei nacional que engloba a regulamentação da mídia é a ORF-ACT, ou seja, a Austrian Broadcasting Corporation nº. 379/1984, que estabelece quais os critérios sobre os quais deve se basear a proteção aplicada a programas e filmes transmitidos na televisão ou através de outros canais mediáticos. No que se refere à exibição dos filmes, a avaliação preventiva das obras cinematográficas, para que sejam decididas as faixas etárias adequadas, é regulamentada pela lei austríaca para a tutela dos menores, a «Jugendschutzgesetz», aplicada através das leis dos Lander federais. Esta lei estabelece nove faixas de restrições de público a partir dos seis anos de idade, com uma sucessiva graduação que prevê restrições para 10, 12, 14 e 16 anos de idade. Para supervisionar o sistema de classificação cinematográfica, existe uma comissão junto ao Ministério da Educação, em Viena, que comunica seu parecer sobre a idoneidade dos filmes às autoridades locais. Geralmente e de maneira individual os Lander adotam as decisões da comissão, e é em âmbito local que se decide de sua aplicação.
Na Espanha, o artigo 20 da Constituição reconhece o direito do cidadão a exprimir e difundir livremente seu pensamento, suas idéias e suas opiniões através de qualquer meio de divulgação. Se por um lado o exercício de tais direitos «não pode ser restrito através de nenhum tipo de censura prévia», o mesmo artigo especifica que «estas liberdades têm o seu limite no respeito dos limites reconhecidos pelas normativas que exprimem este respeito, especialmente no direito à honra, à privacidade, à própria imagem e à proteção da juventude e da infância».
Baseando-se neste princípio, a qualificação dos filmes (Real decreto 81/1997) e das obras audiovisuais é feita antes de sua difusão, através do Instituto de cinematografia e das artes audiovisuais (ICAA), uma entidade autônoma, mas ao mesmo tempo ligada ao Ministério da Educação e Cultura através da secretaria de Estado para a cultura (ver site www.mcu.es).
A subdireção geral de fomento à indústria cinematográfica e do audiovisual, que faz parte do ICAA, se ocupa, dentre outras funções, da classificação em faixas etárias dos filmes e das outras obras audiovisuais em vista de sua exibição pública e para a sua distribuição. A comissão se encarrega de divulgar as informações sobre os filmes e programas audiovisuais, com classificação que vai desde as «salas X» até as restrições para cada faixa etária do público.
Os filmes de caráter pornográfico não podem receber subvenções do Estado e sua projeção nas salas prevê uma taxa suplementar, destinada em parte para estimular um fundo de proteção cinematográfica. A projeção destes filmes pode ser feita somente nas «salas X», onde não podem ser apresentados outros tipos de obras cinematográficas e onde é proibido o ingresso de menores de 18 anos.

CINEMA NA TV

Devido ao alto consumo de programas de televisão por parte dos menores e levando-se em conta as diretivas da União européia, que promovem a auto-regulamentação no âmbito nacional das emissoras de tv e a participação das famílias nesta obra educativa, há alguns anos estão em vigor na França, na Holanda, na Grã-Bretanha, na Grécia e na Itália os códigos de sinais, que servem para identificar tanto os filmes projetados na salas de cinema como aqueles transmitidos na televisão. A tutela dos menores no âmbito da televisão foi também feita adotando-se o chamado sistema «watershed» (separador das águas), que funciona segundo uma seleção de faixas horárias protegidas, algumas aconselhadas à visão dos menores, outras aconselhadas a todos e outras ainda, principalmente na programação noturna, indicadas somente a um público adulto.
A faixa de idade determinada pela classificação preventiva dos filmes tem obviamente uma repercussão na programação das chamadas faixas horárias protegidas ou distintas nas emissoras de televisão pública em todos os países europeus. A definição das linhas de conduta comuns está à base dos acordos de auto-regulamentação e de co-regulamentação dos programas de televisão, estabelecendo-se um código de procedimento comum para as emissoras tanto públicas como privadas. Criou-se assim uma base normativa, que é assumida pela autoridade do Estado e que recebe a confiança dos consumidores das emissoras públicas ou privadas que adotam este sistema de auto-regulamentação.
Para tornar visível aos adultos as classificações dos programas apropriados aos menores, muitas emissoras européias adotaram um sistema de sinais que através de símbolos, números, cores e sinais acústicos advertem ao público a respeito daquilo que está para ser transmitido.
Mas, apenas este sistema, assim como o de filtragem (tipo v-chip), não basta para garantir uma verdadeira tutela dos menores diante de um conjunto de imagens difíceis de serem decodificadas por um jovem. Deve-se pensar às imagens de guerra dos telejornais, dos filmes escabrosos ou às informações sobre os crimes hediondos, que muitas vezes têm como ambiente o próprio núcleo familiar.
É na colaboração entre Estado, produtores de programas audiovisuais e famílias que pode ser fundamentado um autêntico respeito dos menores que encoraje o crescimento positivo da criança em base aos valores fundamentais da pessoa humana.

4) CELULARES COM VÍDEO

Hoje a difusão dos celulares com vídeo chegou à Itália ao índice se 134%, o que significa que muitas pessoas possuem pelo menos dois celulares, inclusive os jovens e as crianças, que recebem este instrumento dos próprios pais. De fato, de duas crianças entre 8 e 13 anos de idade, uma delas tem um celular no bolso. Aquele que poderia ser um instrumento para controlar melhor os deslocamentos e as necessidades dos filhos, se revela no entanto um perigoso meio que pode expor a outro tipo de utilização por parte dos menores, que não se separam nunca do próprio celular, nem mesmo durante as aulas, como lamentam vários professores. Apesar do código de auto-regulamentação assinado pelas principais operadoras (Código de conduta para a oferta de serviços a pagamento em tutela dos menores), na realidade os novos serviços opcionais do celular o tornaram um «personal computer» capaz de permitir novos usos que antes não tinham.
Os desenvolvimentos tecnológicos que estão se verificando no campo da telefonia móvel – particularmente no que se refere à sinergia com a internet e a adoção dos sistemas DVB de vídeos-telefone – contribuem a aumentar a oportunidade de comunicação também para as novas gerações e, ao mesmo tempo, repropõem em novos termos a questão da tutela dos menores. As evoluções já previstas ulteriormente para os próximos anos e o número sempre crescente de pessoas envolvidas, pedem uma grande consciência social e uma constante atenção das pessoas e órgãos encarregados de garantir os direitos dos cidadãos.
Neste contexto devem ser reafirmados os direitos dos menores no campo da comunicação, dentre os quais certamente não está em último lugar aquele que se refere também à segurança diante dos riscos de indução a comportamentos ilícitos ou de acesso a conteúdos nocivos ou indesejados. Também neste campo é essencial o papel dos pais e, em geral, de todos aqueles que são chamados a ter uma função educativa. A maior segurança das crianças e dos jovens quanto ao acesso a conteúdos ilegais é um ponto que deve merecer atenção também através da maior conscientização dos pais e das mães, que devem se capacitar a conhecer e utilizar estes meios.
Para a «alfabetização» dos pais na utilização da mídia devem colaborar também as instituições públicas, promovendo um uso positivo das novas possibilidades tecnológicas. Às empresas cabe a responsabilidade de colocar no mercado um produto que dê garantias no que se refere à sua utilização pelos menores, superando os limites estabelecidos pelo código de auto-regulamentação assinado pelas operadoras de celulares. Devem também oferecer maiores informações aos adultos que assinam um contrato de utilização, como por exemplo a adoção de bloqueios automáticos de acesso a conteúdos nocivos, se o celular passa às mãos de um menor de idade.

5) VIDEOGAMES

Trata-se de uma indústria global, que conquistou os jovens e não apenas eles. Os números relativos à difusão repentina dos videogames indicam que existem 250 mil sites de videogames, cada um deles propõe uma série de títulos, muitos deles recheados de cenas de sexo e de violência. Uma pesquisa recente do Instituto italiano de medicina social (IIMS) coloca em evidência, entre outras coisas, a escassa informação por parte dos adultos a respeito dos videogames utilizados pelos filhos, o predomínio de temas violentas em mais de 30% de títulos não aconselhados aos menores, o predomínio de personagens virtuais normais que podem se tornar especiais, realizando ações extraordinárias.
Mas, o ponto de risco mais elevado se refere aos pequenos jogadores de videogames, crianças entre seis e nove anos de idade que se submetem a entrar tão intensamente no jogo virtual que chegam a formas de dissociação da realidade e solicitam um monitoramento muito atento da parte dos adultos. A mesma pesquisa indica a presença de videogames em 25% das famílias com crianças de três a cinco anos de idade e em 65,2% das famílias com crianças entre seis e 10 anos de idade. O que produz efeitos negativos no âmbito cognitivo das crianças não parece ser especificamente o meio, mas muito mais os elementos que criam a excitação, tais como a velocidade de produção do estímulo e da resposta, a velocidade das imagens, os efeitos especiais, os contrastes, a fragmentação da história, o binômio rumor-ação. O uso prolongado do jogo inibe, segundo alguns psicólogos, a área da capacidade crítica, provocando passividade e ao mesmo tempo agressividade na criança. Mas, não queremos demolir os videogames, porque existem aqueles que são muito adequados aos mais jovens, com valores de informação e de educação, seja também porque o uso deste meio é na realidade um passo na preparação da criança ao sucessivo e mais sofisticado, que é o uso da internet.
De qualquer maneira, os dados relativos à venda destes produtos de entretenimento mostram um crescimento em todos os lugares e a difusão deste meio é acompanhada de uma aceitação social (ou seria uma resignação?) sempre maior.
É urgente ampliar o percurso de conhecimento e das estratégias internacionais, para monitorar um mercado que está cada vez mais vasto. Parece urgente estabelecer modalidades operativas para o controle dos conteúdos e do sistema de sanções, seja para o produtor como para o vendedor dos serviços. O código de auto-regulamentação Pegi (derivado em 2003 do sistema de avaliação e classificação holandês, Nicam, que assinala os conteúdos inadequados aos menores), adotado pelos industriais de «entertainment» que produzem videogames, é a única forma de auto-regulamentação existente atualmente e que prevê sanções (raramente aplicadas, mesmo diante de casos graves evidentes) para os produtores que colocam no comércio os jogos com indicações de faixas etárias apenas aproximativas.
O código Pegi, ao qual a associação européia Isfe adere em 2002, é evidentemente insuficiente na sua função declarada de «fornecer aos consumidores as informações mais oportunas» e expostas no selo de produção. E, como o setor dos videogames tem hoje um volume de negócios que ultrapassa os 740 milhões de euros, envolvendo 24 milhões de jogadores (43% da população a partir dos quatro anos de idade), com uma venda dos produtos classificados para maiores de três anos de idade que chega aos quase 48% dos consumidores. É um dado que define o impacto deste gênero de meio sobre a infância e a adolescência, mostrando toda a sua periculosidade, seja pelo consumo de conteúdos inadequados, seja pelo excessivo número de horas dedicado neste passatempo, muitas vezes solitário e sem a presença de um adulto ao lado. Se for verdade, como sustenta a indústria, que a produção de videogames violentos é apenas uma mínima parte do mercado, é também verdade que esta representa a fatia mais importante do retorno econômico.
O interesse pelos videogames é alimentado pela sinergia com os filmes que inspiram o jogo homônimo e que torna sempre mais atrativo este gênero, principalmente para os adolescentes. Desta maneira é importante também neste campo o estabelecimento de regras precisas em defesa dos consumidores dentre o público jovem, mais exposto aos riscos destas novas formas de entretenimento cada vez mais sofisticadas e envolventes, por causa da combinação entre narrativa e efeitos gráficos.

6) PUBLICIDADE

O problema da tutela dos menores diante da publicidade se apresenta como um corolário, dentro do quadro mais amplo que regulamenta a difícil relação entre a mídia e as crianças. A televisão, e portanto também a publicidade, se constitui em uma fonte de perigo para os menores, isto é, para a maior parte das crianças, principalmente em idade pré-escolar, que devem saber fazer a diferença entre a publicidade e o resto da programação, e entre os programas de ficção e a realidade. Com essas considerações não significa que exista uma acrítica rejeição da publicidade em si mesma – à qual se reconhece, no entanto, onde proceda corretamente, uma função positiva no processo de formação, de crescimento crítico e de socialização do menor –, mas existe a necessidade de prever um sistema de regras destinado a garantir-lhe um uso adequado.
O efeito dos anúncios publicitários é tão grande que em alguns países estão sendo tomadas medidas drásticas a respeito. No Reino Unido, por exemplo, recentemente foram vetados os anúncios publicitários durante os programas destinados às crianças até nove anos de idade, a partir de 1º de janeiro de 2008 a medida se estenderá à programação para os jovens até 15 anos de idade e até o final de 2008 serão vetados em todos os canais dedicados aos menores. Apesar de se reconhecer que a publicidade serve para financiar os programas, aqueles dedicados às crianças terão que recorrer a outras fontes. Também na França começa a se impor uma «linha dura» a esse respeito: visto a alta incidência de publicidade de merendas, de sucos e doces em geral, a partir de agora os anúncios dedicados às crianças deverão ser precedidos de uma espécie de aviso, que orientará para uma alimentação adequada.
Mas, por que as crianças são tão frágeis diante dos apelos da publicidade? Na Itália, explica Paolo Landi, secretário geral da Adisconsum (Associação de defesa dos consumidores e do ambiente»), em um capítulo de seu estudo «Crianças da multimídia»: «Se consideramos que a publicidade não faz outra coisa que veicular um conhecimento imediatamente concretizável em um “ter”, ou em um “ser”, ou em um “fazer”, a criança absorve sem dificuldades os três componentes que são a obsessão dos expertos de marketing, isto é, o componente cognitivo (como fornecer informações indeléveis sobre um produto ou um serviço), o componente afetivo (como fazer o consumidor reagir de maneira emotiva) e o comportamental (como colocar o pequeno consumidor em movimento na direção da aquisição). A partir deste ponto de vista a criança é o público ideal, o consumidor a quem se pode vender qualquer coisa».
Na Itália está em vigor um código de autodisciplina publicitária que surgiu em 1966, em base a um acordo entre os profissionais do setor. Esta primeira forma de tutela, em grande parte com origem comunitária, tem como protagonistas entidades administrativas independentes: a Autoridade de controle da concorrência e do mercado de setor e a Autoridade de garantia para as comunicações e a editoria. Enquanto isso, para a auto-regulamentação, orientada pelas normas que constam do Código de autodisciplina publicitária, e agora também, embora com força jurídica diferente, pelo Código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual se reconhece um poder de decisão e de sanção, emanando uma ordem e intimando seu cumprimento.
Em todos os países onde a televisão serve de veículo às mensagens publicitárias, o mundo empresarial é plenamente consciente do enorme poder de influência que a publicidade tem sobre as crianças.



NORMATIVA INTERNACIONAL

O assunto relativo à tutela dos menores na mídia é um dos mais debatidos, seja no que se refere às normas nacionais, seja no âmbito internacional. Encontra-se diante da situação de precisar acertas as contas com toda a extensão da rede global da internet. O exemplo que, neste momento de transição, coloca mais em evidência a necessidade de estabelecer leis que estejam em condições de controlar o acesso e uso dos conteúdos nocivos para os menores, é exatamente o da internet. Qualquer pessoa no mundo pode abrir um site considerado «arriscado», contendo elementos ilegais e acessíveis a consumidores despreparados, disponibilizados por quem está do outro lado do mundo.
No que se refere aos princípios gerais no âmbito do direito internacional, é preciso recorrer principalmente à convenção da ONU sobre os direitos da criança, com sede em New York, ratificada pelo Parlamento italiano através da lei nº.176/1991. Esta garante à criança uma «consideração proeminente» também a respeito da liberdade, seja no se refere à expressão, seja quando tutela os conteúdos recebidos. Esta mesma convenção, em seu artigo 17, fala da relação entre menor e televisão, desejando «um sistema normativo que tutele o menor-consumidor, mesmo com todas as dificuldades que se apresentam», seja para individuar os fenômenos que devem ser monitorados, seja sobre as normativas possíveis.
No direito da União européia, tal tutela foi recentemente confirmada pela Carta dos direitos fundamentais da União, aprovada em Nice em 2000, cujo artigo 24 salienta que «os Estados membros reconhecem a importância da função exercida pelos meios de comunicação de massa e cuidam para que a criança possa ter acesso às informações e materiais... com a finalidade de promover o seu bem estar social, espiritual e moral, além de sua saúde física e mental». A normativa seguinte, 89/552/CEE, previu algumas restrições, seja no que se refere aos programas como para as mensagens publicitárias destinadas a este público». O artigo 22 desta normativa conduz a impedir a transmissão de programas que contenham cenas pornográficas ou de violência gratuita, ou outros programas inadequados a este público. Não podemos esquecer de mencionar a determinação expressa de «Televisão sem fronteiras», que está hoje em sua quinta versão atualizada, que o tema da tutela dos menores está relacionado com o estatuto geral dos direitos dos menores e corresponde ao disposto nos artigos 50 e 31 da Constituição italiana.
Se for claro que os princípios normativos são todos a favor da tutela dos menores, é também verdadeiro que uma tecnologia em contínua evolução colocou em crise as velhas regras do jogo. Mas também é claro que não se pode mais adiar a necessidade de estabelecer novos parâmetros normativos, para que as crianças possam utilizar os meios de comunicação próprios de seu tempo, com aproveitamento e serenidade também para as famílias.~

EDUCAÇÃO À MÍDIA NO MUNDO: PARA SABER MAIS

A difusão da educação à mídia é uma resposta à necessidade de se informar sobre as novidades no campo dos novos meios de comunicação. Em seguida citamos apenas alguns sites que em vários países oferecem maiores informações sobre como aprender a usar melhor a mídia, enfrentando a problemática da tutela dos menores e da alfabetização às novas tecnologias por parte dos adultos.
«The Media Awareness Nework-Réseau éducation médias» é uma organização canadense sem fins lucrativos, pioneira no desenvolvimento de programas sobre a educação à mídia. Com esta finalidade ela produz programas online em colaboração com organizações internacionais, convicta que, para interpretar as mensagens de informação, de entretenimento e comerciais, os jovens têm necessidade de instrumentos críticos válidos. Por isso é importante formar também os adultos (famílias e professores) sobre como funciona a mídia e como ela determina o estilo de vida.
A organização realiza uma ação contínua de monitoramento em relação à mídia (televisão, cinema, videogames, imprensa, publicidade, etc.), e sua seção dedicada aos pais oferece uma série de elementos para que estes reflitam com os filhos sobre esses meios, além da seção para os educadores, que inclui lições e materiais de apoio. Uma outra seção é dedicada à análise das questões ligadas à mídia, como a difusão de estereótipos, as representações de violência e da diversidade, a privacidade, a publicidade dirigida aos menores. Seu site é em inglês e francês (http://www.media-awareness.ca).
«Quai des images» é o site dedicado ao ensino de cinema e audiovisual organizado pelo Ministério da Educação francês. Ele propõe atividades ligadas à educação à imagem e de análise dos filmes em consonância com os programas escolares, agrupa os textos oficiais a respeito dos meios audiovisuais, oferece uma série de instrumentos de análise e de estudo completos sobre alguns filmes específicos e sobre certos autores em particular, informa sobre conferências, seminários, cursos e festivais sobre o mundo audiovisual e sua utilização em âmbito educativo e didático. Entre outras coisas, reúne também as propostas e as experiências feitas por professores e seus alunos nas escolas secundárias francesas no campo da educação à imagem, além de organizar um fórum de discussões aberto a todos sobre a educação à mídia (http://www.ac-nancy-metz.fr).
Sempre na França, está em funcionamento o blog «Zéro de conduite», organizado pelos professores e destinados a educadores, pais e estudantes. Promove o uso do cinema como instrumento pedagógico, dedicando-se especialmente à atualidade cinematográfica, mas sem esquecer os clássicos e os documentários. Com várias seções e espaços de aprofundamento, se propõe como um local de discussão de temas em um debate aberto (http://cinema-ducation.fluctuat.net).
A Universidade de Massachussetts organizou o Media Education Foundation – MEF, mídia de desafio, que produz e distribui documentários destinados a estimular o pensamento crítico e o debate sobre a relação entre aqueles que detêm o poder sobre a mídia, os conteúdos da mídia comercial, a exigência democrática de um livre fluxo de informações, as diversas representações de idéias e pensamentos e o direito dos cidadãos de informar e serem informados. Alguns destes temas são abordados criticamente, como a identidade do gênero na publicidade, a imagem de sexo nos videoclipes, o papel da mídia na construção da identidade cultural, mídia e saúde, etc. (http://www.mediaed.org/).

(a cura di M. F. D’A.)

 
At 9/17/2007 2:43 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

AS CRIANÇAS E A MÍDIA (II PARTE):
ACEITAR O DESAFIO EDUCATIVO


O tema da 41ª Jornada das Comunicações Sociais, «As crianças e os meios de comunicação: um desafio para a comunicação», nos convida a refletir a respeito de dois aspectos particularmente importantes. O primeiro é a formação das crianças, para que estejam em condições de receber de maneira crítica aquilo que vêem. O segundo é a formação à consciência e ao uso consciente da mídia, que está em contínua transformação tecnológica.
De fato, é o que especifica Bento XVI no início de sua mensagem, de 20 de maio de 2007, para a Jornada: «Os complexos desafios que a educação contemporânea deve enfrentar são muitas vezes ligados à grande influência dos meios de comunicação no nosso mundo. Como aspecto do fenômeno da globalização e estimulados pelo rápido desenvolvimento da tecnologia, os meios de comunicação delineiam fortemente o ambiente cultural (cf. João Paulo II, O rápido desenvolvimento, nº3). Na realidade, há quem afirma que a influência formativa da mídia está em competição com aquela da escola, da Igreja e, quem sabe, até com aquela da própria família».
De fato, como salienta o Pontifício conselho para as Comunicações Sociais, «para muitas pessoas, a realidade corresponde àquilo que os meios de comunicação definem como tal». Episódios recentes, como a utilização do celular na filmagem de violências nas salas de aula, abusos sofridos por pessoas deficientes, fenômenos de trote e de violência generalizada, demonstram como as crianças que crescem passando uma média de quatro horas por dia diante da televisão, sozinhos em casa, absorveram a lógica do «estou no vídeo, logo existo». Os psicólogos, os pedagogos e os estudiosos dos meios de comunicação estudam há tempos sobre as relações entre o consumo televisivo e o comportamento violento dos menores. Uma grande quantidade de pesquisas realizadas em muitos países ocidentais demonstra como esta correlação seja realmente inegável.


NOVAS LINGUAGENS

O fato que muitas crianças vivem completamente inseridas no mundo dos velhos e novos meios de comunicação, que estão cada vez mais frequentemente em correlação entre eles, é confirmado pela popularidade de alguns modelos televisivos, considerados tão efêmeros quanto penosos «momentos de glória», presentes nos programas com os maiores índices de audiência, dos «reality» aos «talk show», sem falar do «trash», que hoje se tornou um gênero de espetáculo.
Dentre as preferências demonstradas pelos adolescentes italianos que assistem televisão mais do que três horas por dia, encontramos, em primeiro lugar, a figura da «veline» (Ndt: misto de corista e coadjuvante na apresentação de programas populares da televisão italiana), enquanto outros da mesma idade se concentram no mais clássico exemplo, o do jogador de futebol. De toda maneira, a coisa mais importante é aparecer, pouco importa por qual motivo, de ser «alguém» ou «alguma coisa» no Olimpo mediático, mesmo que seja apenas por um instante.
Estes são os exemplos mais negativos dos condicionamentos derivados de um excessivo e acrítico uso dos meios de comunicação. Encontramo-nos diante de uma nova geração que cresceu na frente da televisão, capaz de usar as novas tecnologias que os próprios pais, que as adquiriram e as tornaram disponíveis, muitas vezes se encontram despreparados para utilizá-las.
Tanto é verdade que hoje em dia os filmes são vistos diretamente nos celulares e a televisão pode ser assistida na tela do computador. Hoje se telefona através da internet e graças ao download se descarrega os CDs e DVDs mais recentes, se filma e se faz foto com o celular, e assim por diante.
Nas casas, o vocabulário familiar se reduziu ao gênero dos sms e se fala tendo o som da televisão no fundo, se comunica através de e-mail, se faz «visita virtual» via computador, se percorre através de bibliotecas virtuais, tanto que as fichas e arquivos de papel evocam imagens do outro século, completamente em desuso.
A situação dos nossos filhos é diversa daquela da geração precedente, pois eles abriram seus olhos tendo diante de si estes cenários de profunda, contínua e envolvente transformação tecnológica. Eles se constituem aquela que os estudiosos chamam de geração nascida «com seis dedos»: além dos cinco dedos normais da mão, o sexto é o mouse do computador.
Com o aparecimento do mundo «virtual» da internet e dos videogames criou-se uma defasagem em relação à realidade verdadeira e própria. As duas dimensões parecem muitas vezes, e para muitos jovens, como universos paralelos, com conseqüências não indiferentes no plano do processo de amadurecimento. Têm grande sucesso os sites nos quais se prevê uma segunda vida (basta verificar os milhares de registros nos poucos meses de existência do site italiano de «Second Life», que em todo o mundo já tem sete milhões de inscritos), onde a simulação reproduz todas as situações da vida real. Apenas que tudo é falso, a começar da nova identidade, que pode ser escolhida e com ela se inicia a fazer parte deste mundo fora do mundo, onde se pode ser um «qualquer coisa». Isto é, ninguém.
Assim, o grande desafio cultural de hoje é propriamente a redefinição dos limites, que muitas vezes se apresentam demasiadamente instáveis. Isto é, redefinição dos limites entre o real e o virtual, superando a divisão digital que hoje separa as gerações adultas daqueles mais jovens.


OS JOVENS: PROTAGONISTAS OU VÍTIMAS DAS MUDANÇAS?

A linguagem deles é pobre, muitas vezes recheada de termos tirados do dicionário do internauta: clicar, chatar, messagiar, deletar, são alguns dos neologismos que fazem parte de seu vocabulário quotidiano. Falta uma dimensão humana da tecnologia que esteja em condições de traçar o perímetro cultural entre o real e o virtual. Assim a aldeia global difundiu uma quantidade de modelos comportamentais desviados, ou pelo menos discutíveis.
Desta maneira, os jovens que vivem a milhões de quilômetros de distância jogam o mesmo videogame, vêem o mesmo filme, assim como, de maneira transversal, absorvem modelos e comportamentos semelhantes. Muitas vezes os adultos têm menos domínio no uso das novas tecnologias e observam, com uma preocupação resignada diante de suas próprias limitações, as crianças que navegam facilmente na internet.
As raízes das dificuldades neste campo educativo são muito bem explicadas por Marina D’Amato, professora de sociologia da Universidade de Roma, que salienta: «Cada geração tem necessidade de se encontrar também em um mundo fantástico, que serve a interiorizar o paradigma do bom e do belo, do justo e do errado, do oportuno e do útil, também em relação aos exemplos que procedem da narrativa. Hoje nos encontramos em uma condição na qual os avós e os pais contam cada vez menos histórias aos filhos e aos netos, e este papel foi assumido pela televisão. Mas, na realidade, a televisão “exila” e “con-funde”, isto é, funde os modelos morais que são frutos de ânsias e problemas mal resolvidos, muito mais que de certezas. Embora estes se transformem com freqüência, a cada três ou quatro anos, o fato de serem repropostos continuamente faz com que se justaponham uns aos outros» (ver Come mediare i media, de Mario Russo).
Se for verdade que a televisão é o meio mais usado até a adolescência, imediatamente depois surge a grande atração pela internet. Esta passagem nasce de uma sintonia com a linguagem televisiva, que na idade infantil muitas vezes é ouvida durante muitas horas no dia. Esta linguagem se baseia em uma mediação da realidade e desta maneira ela ativa um processo de recepção que é de tipo emotivo.
Neste registro emocional é mais fácil acabar envolvido por situações e figuras capazes de se proporem como modelos identificadores, preservadores de sentido e de comportamentos a serem imitados.
O poder de concentrar uma vontade emulativa em alguns personagens, que correspondem particularmente às necessidades interiores do jovem (necessidades na maioria das vezes induzidas pela publicidade ou por modelos estimuladores), tem uma forte relação com a quantidade de horas que o jovem passa utilizando os novos ou os velhos meios de comunicação.


EDUCAÇÃO NECESSÁRIA

«A formação adequada a um uso correto dos meios de comunicação é essencial para o desenvolvimento cultural, moral e espiritual das crianças… Educar as crianças a serem seletivas no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja, da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos. Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia, com a certeza de que este difícil, embora gratificante, aspecto da condição de pais, é apoiado por toda a comunidade.»
As palavras do discurso de Bento XVI definem com grande clareza o paradigma de uma justa relação entre a mídia e os menores. Uma clareza que devemos agradecer ao magistério da Igreja, no momento em que o mundo da mídia parece ignorar a verdadeira problemática educativa das crianças e as expectativas de qualidade e de segurança exigidas pelas famílias no que se refere ao uso desses meios, seja do cinema aos videogames, da televisão à internet.
Diante da utilização destorcera do meio televisivo, o mais difundido dentre os meios de comunicação, a Igreja se interroga sobre o porquê da televisão não ter um papel educativo e por que os meios de comunicação não podem ser companheiros confiáveis para os jogos na fase de crescimento da criança. O anúncio de uma recente campanha sobre o uso da mídia, promovida pelo Ministério das Comunicações, mostra os vários membros da família que estão vendo a televisão ao lado de uma criança.
Que se trate do avô ou da mãe, a mensagem é a mesma: não deixar uma criança sozinha diante de um meio que, sem o apoio crítico educativo de um adulto, pode transmitir conteúdos inadequados à idade e à maturidade daquele que o vê. Sem esquecer as responsabilidades dos produtores televisivos, empenhados na organização dos programas, o papel da família é realmente insubstituível.
Se realmente o objetivo de quem administra a sociedade de produção televisiva, ou das multinacionais produtoras de videogames ou das operadoras de celulares, é o de promover e vender o produto, o bem estar psicofísico da criança está no centro do interesse dos educadores, sejam eles os professores ou, em primeiro lugar, os pais.
Isto explica bem a mensagem do Papa, que continua a sua análise, salientando que «educar as crianças a serem seletivos no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja e da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos (ver João Paulo II, «Familiaris Consortio», 76). Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia.»


CONTEÚDO DA MÍDIA

No panorama de uma revolução da multimídia, que está modificando transversalmente os hábitos, a mentalidade, os modelos e as linguagens, deve voltar ao centro do debate a tutela daquilo que é melhor para os menores. Sem acusar a «mídia», que enquanto tal não é nem boa nem má, o importante é partir de uma a análise do produto, para assim poder individuar conteúdos que sejam de melhor qualidade para as crianças e os adolescentes. Porque a televisão é um instrumento que abre janelas de conhecimento para o mundo e, se bem utilizada, de «má professora» pode se tornar uma preciosa fonte de estímulo para o crescimento humano e cultural.
A mesma coisa vale, e com mais razão, para a «rede» que engloba e compreende tudo, e para os videogames, onde, ao invés de violência e monstros, poderia se dedicar a produzir (e isso já ocorre em certos casos) histórias instrutivas e de conteúdo interessante.
Bento XVI coloca justamente em evidência as enormes possibilidades para que seja melhorado o conteúdo deste grande campo de produção multimídia: «A educação através da mídia deveria ser positiva. Colocando as crianças diante de um meio estética e moralmente excelente, estas recebem uma ajuda para que desenvolvam a própria opinião, a prudência e a capacidade de discernimento. É importante aqui reconhecer o valor fundamental do exemplo dos pais e as vantagens de introduzir os jovens aos clássicos da literatura infantil (…). A beleza, quase um espelho do divino, inspira e vivifica os corações e as mentes juvenis, enquanto a feiúra e a vulgaridade têm um impacto deprimente sobre os comportamentos». Diante de uma decadência geral do produto televisivo, a questão da qualidade aparece ainda mais forte e vibrante em grande parte de um público formado de famílias, que pede para não ser apenas um exército indistinto de ouvintes silenciosos, mas um público em condições de exprimir suas preferências por conteúdos formativos e informativos de bom nível.
A mensagem de Bento XVI continua, com algumas importantes indicações: «Como a educação em geral, aquela da mídia requer também uma formação ao exercício da liberdade. Trata-se de uma responsabilidade que compromete. Muitas vezes a liberdade é apresentada como uma incansável procura do prazer ou de novas experiências (…). Este desejo, sentido profundamente pelos pais e educadores, que é o de educar as crianças no caminho da beleza, da verdade e da bondade, pode ser apoiado pela indústria da mídia somente na medida em que se promove a dignidade fundamental do ser humano, o verdadeiro valor da vida familiar, as conquistas positivas e as metas da humanidade. A partir disso, a necessidade de que os meios de comunicação estejam empenhados na efetiva formação e no respeito da ética deve ser vista com interesse particular e com urgência não apenas pelos pais, mas também por aqueles que têm responsabilidade cívica».
Na realidade, nos encontramos na situação de ter que reconhecer que na Itália falta uma verdadeira «cultura da criança»: a situação é tão séria que no âmbito institucional procura-se dar uma nova organização geral para verificar e controlar os conteúdos dos setores de entretenimento, como os videogames, que até agora estão submetidos apenas a códigos de auto-regulamentação, feitos e codificados para uso e consumo pelas indústrias produtoras.
Uma vez mais, o primeiro e indispensável apoio à criança só pode vir da família e de uma relação mais estreita com os professores e educadores, exatamente como salienta Bento XVI, lembrando-nos que a preocupação educativa dos pais não deve se tornar uma preocupação genérica, mas uma atenção constante a tudo aquilo que diz respeito aos filhos.

A INDÚSTRIA DA MÍDIA

1) A TELEVISÃO

Se a televisão convencional se apresenta como um ramo de atividade já «maduro», no entanto se apresenta no horizonte a situação da mídia digital (satélite ou a cabo), também como uma plataforma que consente a ligação entre televisão, internet e outro tipo de mídia através do computador. No que se refere à qualidade da programação, apesar dos inúmeros bons propósitos anunciados no âmbito institucional, parece pequena a atenção às exigências dos menores em suas diversas faixas etárias. A programação para os menores, na realidade é confinada em redes e horários particulares, enquanto o resto da programação na faixa horária considerada «para todos» muitas vezes apresenta conteúdos inadequados aos jovens. Mas, quais são as expectativas das gerações de jovens no que se refere à televisão? É realmente verdade que preferem o «trash», os jogos com prêmios absurdos e as «velines»?
A partir de uma pesquisa recente feita pelo instituto Censis sobre «Comunicação, pluralismo social, sociedade aberta» (2005) surge que a relação entre os menores, e em particular dos adolescentes entre os 14 e 18 anos de idade, e a televisão é determinada por elementos de forte contradição e de passividade. Nessa faixa etária, 100% deles vêem televisão praticamente todos os dias, 86% acompanham um pouco de tudo, com uma relevante predileção pelos filmes (72%), por esporte (32%) e pelos «reality shows» (18%).
No entanto, a amostragem entrevistada não está realmente satisfeita com aquilo que vê. De fato, 36% dos adolescentes denunciam a vulgaridade difundida nos programas e 25% criticam a superficialidade. Dentre eles, 46% consideram a televisão como um meio que «invade», ao mesmo tempo em que é interessante notar que 25% consideram que em geral a programação televisiva alimenta nas crianças menores uma visão consumista da vida. Destes dados surge o contraste entre a procura de distração e a reprovação daquilo que lhes é proposto pela programação. Isto significa que o alto índice de procura não é um indicador de satisfação.
Considerando o axioma de que a televisão seja onipresente, fica claro que são os próprios jovens a pedirem uma maior atenção aos conteúdos: menos violência e menos vulgaridade. A exigência de uma regulamentação diversa, diz claramente o relatório do Censis, «não vem somente daqueles, pais e educadores, que estão preocupados pela possível influência negativa sobre os menores, mas se exprime nitidamente também através dos adolescentes, pelo menos de uma parte mais esperta e consciente dentre eles».
Para tutelar melhor os direitos dos menores, desde 2002 foi instituído junto ao Ministério das Comunicações um código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual aderiram os produtores de televisão, seja no âmbito nacional como local. Baseando-se nos princípios sobre a matéria existentes na Constituição italiana e na Convenção dos direitos da criança, estabelecida em 1989 pela ONU, a comissão que controla sua aplicação avaliou em todos estes anos de atividade os milhares de casos em que foram violadas as normas de tutela, que prevêem a transmissão de programas e imagens adequadas a um público de menores de idade durante aquela que é chamada de «faixa protegida» da programação televisiva (das 7h30 às 22h30), intervindo com denúncias e sanções, que nos casos mais graves foram aplicadas pela Autoridade de garantia no setor das comunicações. Para o futuro, esta comissão deverá se transformar em um organismo mais amplo de controle, que se chamará «Mídia e menores», que além da televisão deverá monitorar também os setores dos vídeos-telefone e dos videogames, além da internet, que é o campo de maior risco.

REGRAS DE TUTELA EM OUTROS PAÍSES

É diversa a situação em outros países, como por exemplo na Grã Bretanha, onde o sistema de regulamentação da mídia é estruturado e complexo e foi atualizado nas últimas décadas, com uma particular atenção à tutela dos menores. As inovações tecnológicas neste setor levaram as normativas inglesas a uma série de novas disposições, como por exemplo, a visão em casa de vídeo exclusivamente para adultos, e que fora de casa seriam vetados aos menores, ou o combate à praga mundial dos sites internet para os pedófilos, que contenham material pornográfico ou com conteúdos que possam esconder o aliciamento de menores (ver a Protection Childres Act, de 1978).
A programação televisiva é regulamentada pelo Broadcasting Act (1996), de onde deriva a instituição da Broadcasting Standard Commission (BSC), um órgão independente de controle que estabelece as normas de avaliação e classificação dos programas, também no que se refere aos conteúdos violentos ou que possam ofender a decência pública (site oficial www.bsc.org.uk). Este organismo BSC funciona internamente à estrutura do Broadcasting, supervisionando e regulamentando todas as emissoras de televisão e de rádio, via cabo ou por satélite. Sua tarefa é a de elaborar os códigos de conduta e de aplicação de modelos que respeitem a justiça, além de monitorar os modelos, verificando que respeitem as leis. Com a transmissão de programas com conteúdos considerados inadequados aos menores de várias idades, há alguns anos a televisão inglesa adotou o sistema «watershed», um «separador de águas» entre um horário de programação familiar e outro para os adultos. Todo o sistema televisivo inglês se apóia sobre a responsabilização das famílias, pois sem a colaboração delas qualquer código de modelos para os programas é praticamente inútil.
Na França, está vigorando já há anos um código através de sinais televisivos, que entra em função para assinalar os programas inadequados aos menores. A avaliação do programa televisivo é feita pelo Conseil Supérieur de l’Audiovisuel (CSA), uma autoridade administrativa independente, que controla a difusão dos filmes e outras transmissões em vários canais privados, nacionais, regionais ou locais. A normativa francesa (lei 719/2002) veta a transmissão de programas que possam prejudicar gravemente a integridade física, mental e moral dos menores, porque divulgam conteúdos de pornografia ou de violência gratuita. As transmissões são classificadas por um código de sinais que, em conjunto com um sistema organizado de faixas horárias de programação, garante às famílias mais clareza sobre os programas destinados aos menores.
Na Alemanha, o tema da infância tem particular atenção da legislação, que considera desde o nascimento o início dos direitos fundamentais do cidadão. A tutela é disciplinada no âmbito público pela JSchG (desde o dia 26 de fevereiro de 1985), enquanto a lei GjSM se ocupa do controle sobre a difusão de publicações e conteúdos mediáticos considerados danosos para os menores. A regulamentação no setor televisivo é feita segundo as normas do acordo sobre a radiodifusão dos Lander federais, que as entidades para a mídia nesses Lander adotaram por base para o estabelecimento das diretivas que tutelam o interesse dos menores nas emissoras privadas. Não são admitidas transmissões que incitem o ódio racial, que exaltem a violência ou a guerra, que ofendam a dignidade do homem, que sejam de gênero pornográfico, que mostrem pessoas moribundas ou com sofrimentos que ofendam a dignidade humana. Os responsáveis pela programação, escolhendo os horários das transmissões, devem cuidar para que os menores não vejam programas que podem prejudicar o seu bem estar psíquico, físico ou mental. As transmissões inadequadas às crianças menores podem ser transmitidas somente depois da autorização da entidade competente do Land interessado.
Os responsáveis pela organização dos programas televisivos em âmbito nacional devem nomear encarregados pela tutela dos menores, que atuam no momento da aquisição, da projeção e da realização dos programas. As emissoras privadas fundaram em 1993 uma associação de autocontrole voluntário da televisão («Freiwillige Selbskontrolle Fernsehen», FSF), à qual devem ser apresentados programas particulares, antes da sua transmissão, e suas avaliações consideradas nas decisões das entidades de controle da mídia nos Lander federais. Existe ainda o órgão comum do cidadão para a tutela dos menores, dos programas, da competência mediática e controle da mídia (GSJP), do qual faz parte um integrante da entidade para a mídia nos Lander federais, que dá o seu parecer a respeito de algumas séries, filmes e espetáculos mais ou menos adequados aos menores. Este órgão, o GSJP, decide sobre pedidos de mudança de horários de transmissão de filmes proibidos para menores, controla a forma de novos programas e experimenta novas disposições para a tutela dos menores na televisão digital. A peculiaridade da jurisdição alemã, seja no setor televisivo como no cinematográfico e da mídia em geral, é a minuciosa atenção às exigências com o desenvolvimento do menor e aos riscos que este pode correr com a observância incorreta das leis.
Nos Estados Unidos, é possível consultar via internet um «guia televisivo para os pais» (ver o site www.mpaa.org), que prevê algumas categorias de audiência aplicadas aos programas televisivos transmitidos a todo o público. Este guia organiza várias siglas para identificar a categoria de audiência para cada transmissão: vai-se do TVY (para todas as crianças) ao TVG (para todos), através de várias faixas etárias, que correspondem à passagem da primeira à segunda infância e desta à adolescência. Depois tem o TVPG («parental guidance», visto na presença de um dos pais), o TV14 («parent strongly cautioned», séria advertência aos pais), para os programas que contêm cenas de sexo e de violência. Enfim, há o TVMA, que prevê um «mature audience only», ou seja, destinado a um público de idade superior a 17 anos, última fronteira para os conteúdos considerados «restricted».
Estas avaliações foram elaboradas baseando-se nas opiniões dos próprios pais e são fáceis de serem encontradas e compreendidas. Esta linha de «guia de televisão para os pais» pode ser usada juntamente ao «v-chip», que é um dispositivo de filtro instalado na maior parte dos mais recentes modelos de aparelhos de televisão, para permitir aos pais de bloquear os programas inadequados.

FICHA 1
Brasil: «O que eu penso da tv»
No Brasil, a audiência infantil é muito alta: aproximadamente 30 milhões de crianças vêem televisão pelo menos durante três horas por dia. Explica a profa. Rosália Duarte, do departamento de Ciência da Educação, da PUC do Rio de Janeiro, que «as crianças são muito perspicazes, mas nós podemos e devemos ajudá-las a ampliar o seu quadro de referências, para que possam discutir ainda melhor sobre o conteúdos daquilo que vêem. Para isso temos necessidade, antes de tudo, de ouvir aquilo que elas têm a dizer sobre o assunto e de dialogar com elas. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e muito mais freqüente, a outras atividades culturais». No âmbito de uma pesquisa feita através de um questionário distribuído nas escolas, intitulado «O que eu penso da tv», apareceu que «as crianças querem seriamente ser ouvidas sobre aquilo que pensam da tv, mas sentem que sua opinião é considerada pouco importante e não estão contentes com o excesso de imagens de violência exibidas na televisão, principalmente a violência “real”, definida como aquela transmitida nos telejornais. Eles adoram ver televisão e não importa o que os adultos pensam e dizem a respeito disso. A eles agradam quase todos os tipos de programas transmitidos: novelas, desenhos animados, programas de humor, filmes, seriados, mas isso não faz deles espectadores “idiotas”, pois fazem críticas muito interessantes, pertinentes e bem elaboradas sobre o que consideram feio ou inadequado na televisão. Para a maior parte deles, a televisão se oferece como principal opção de divertimento (em alguns casos, a única), o que significa um dado muito preocupante. Mas, o que chamou mais a nossa atenção é o grau de experiência com o qual essas crianças analisam a televisão: são expertos e demonstram conhecer a televisão também do lado de dentro, inclusive as linguagens que ela utiliza, a sua estrutura de produção, a sua lógica interna e as suas maneiras de intervenção».
As crianças aprendem os valores e os não-valores através da televisão, não resta dúvida, mas demonstram ter senso crítico a respeito deste assunto, quando afirmam nos textos que os programas transmitidos na tv podem lhes ensinar «a serem bons, a ter coragem e a fazer o bem, a cuidar da natureza e de si mesmos, a serem honestos e a lutar por aquilo que desejam», mas também «a serem cruéis e mentirosos, a roubar e matar, a não respeitar os pais e a comprar tudo aquilo que não têm necessidade». Falando sobre a validade do ensino através da mídia, a profa. Duarte salienta a necessidade de «ouvir aquilo que têm a dizer sobre o assunto e a dialogar com eles. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e mais freqüente, a outras atividades culturais».

FICHA 2
Observadores internacionais
Os dados examinados em janeiro de 2006 pelo OssCom, que é um centro de pesquisa da mídia, deixam evidente a tendência a realizar uma forma de co-regulamentação, onde a ação legislativa dos Estados membros se integra com medidas de auto-regulamentação por parte dos produtores, broadcasters e profissionais da comunicação sob o efeito de controles e sanções. São dois os instrumentos mais utilizados no âmbito europeu, observando-se as diretivas previstas no artigo 22 de «Televisão sem fronteiras»: a definição de faixas horárias protegidas (watershed) e os sinais mostrados na tela (determinados por um sistema de «rating»). Apesar disso, aos campos tradicionalmente problemáticos da violência e da pornografia se juntam novos campos de risco para os menores: a vulgaridade, abusos e dependências de substâncias, linguagem e comportamento vulgares, discriminações e abusos, violações e ofensas à dignidade humana. Os critérios de avaliação dos programas se constituem um problema que é partilhado por muitos países da União européia, ao mesmo tempo em que se prepara uma uniformização internacional dos sistemas de classificação (ver mais adiante, Nicam), baseados na visualização de cinco ícones que ilustram simbolicamente qual é a problemática do programa que está sendo analisado e para quais idades ele é desaconselhado.
Deve ser assinalada a atividade online da European Medi@culture. O projeto é promovido pela Comissão Européia, em Bruxelas, no quadro das iniciativas «e-Learning», administrado pelo centro mediático de Baden-Württemberg. O site apresenta informações sobre a educação à mídia na Europa, particularmente na França, Áustria, Finlândia e Alemanha. A seção de projetos de multimídia agrupa os projetos sobre a mídia desenvolvidos por escolas e associações de jovens ao longo do tempo (ver http://www.european-mediaculture.org).

FICHA 3
África do Sul: Encontro mundial sobre a mídia para a infância
Este encontro trienal se realizou no último mês de março em Johannesburg, na África do Sul, com a participação de expertos do setor representando diversos países. Em conjunto se discutiu sobre a necessidade de uma programação adequada às crianças, procurando entender de que modo a violência na mídia pode influir sobre a psíquico dos menores.
Mas, no 5º Encontro mundial sobre a mídia para a infância apresentaram-se também muitas crianças provenientes de todo o mundo e empenhadas em discutir sobre o difícil tema da «Mídia como instrumento de paz e de democracia global». Vieram guiados por grupos de adultos, dentre eles as diversas organizações católicas que há anos trabalham para promover regras para o bem da infância, a serem respeitadas nas transmissões de rádio e televisão através de códigos de regulamentação que devem ser redigidos ou, como em alguns casos, apenas atualizados. Em muitos países do sul do mundo as novas tecnologias de multimídia já estão muito disseminadas e seu uso merece uma atenção particular para tutelar o público mais jovem.
Especialmente na África, explicou o organizador do encontro, Firdoze Bulbulia, começa-se a examinar o projeto de um «Media center» para as crianças, que possa produzir e distribuir transmissões de rádio e de televisão destinadas ao público mais jovem, com o objetivo de realizar um canal televisivo pan-africano dedicado à infância. Os organizadores do encontro estão também trabalhando no projeto de uma aliança africana dos meios de informação e de comunicação, seguindo o modelo daquela já existente na América latina.

2) INTERNET

Na Itália, 47% das famílias italianas têm um computador em casa, um dado relevante mas sempre muito baixo em relação à média dos outros países europeus. O uso da internet por parte dos adolescentes e jovens, e a familiaridade que têm com tudo aquilo que pode ser digitado ou «descarregado» da internet, apresenta não poucos problemas. Pela sua própria natureza de rede de comunicação global, o problema se apresenta em ótica internacional, procurando garantir a tutela dos menores através de precisos acordos com os provedores para um efetivo controle de conteúdo. No campo italiano, até 2006, a tutela dos menores tinha sido deixada nas mãos dos próprios provedores, que em 19 de novembro de 2003 assinaram um acordo de auto-regulamentação: o Codice Internet e Minori. Embora o acordo tenha sido estipulado entre os representantes dos vários provedores diante do Ministério para a Inovação e a Tecnologia, no entanto ele permanece um acordo privado, com lacunas, principalmente no que se refere às sanções que muitas vezes devem ser aplicadas. Em 2006, na seqüência de numerosos casos de violência sobre menores, muitos dos quais realizados através da difusão de material pedo-pornográfico (quando não se tratava de verdadeiro e próprio aliciamento de menores via internet), foi promulgada a lei 38 de 6 de fevereiro de 2006: «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet».
Enfim, como aplicação da lei 38/2006, em fevereiro da 2007 foi publicado um decreto determinando os requisitos técnicos dos instrumentos de filtragem que os provedores da rede internet devem utilizar para impedir o acesso aos sites já assinalados pelo Centro nacional contra a pedo-pornografia. Mas, isso não basta para superar as dificuldades e impedir que os menores possam navegar de maneira arriscada na «rede das redes».
Atualmente foi reativada a comissão anti-pedofilia e desvios de menores através da internet, o «Ciclope», que tinha sido instituída junto ao Ministério para a Eqüidade, do governo italiano, e que ficou inativa por um ano, até a sua reestruturação junto ao Ministério da Família. Está também para entrar em função um site dedicado ao uso da internet, junto ao Ministério das Comunicações, e um número telefônico de emergência gratuito, organizado pelo mesmo ministério e por «Save the children», que poderá ser utilizado por qualquer cidadão que queira assinalar algum abuso, desvio ou pedo-pornografia. Dentre as iniciativas mais recentes, deve ser assinalado o site www.tiseiconnesso.it criado pelo Ministério das Comunicações italiano, sempre em colaboração com «Save the children», onde é colocada à disposição uma série de informações sobre o conteúdo de certos sites, seja para os pais como para as próprias crianças, em conjunto com a campanha televisiva que tem como slogan «A melhor maneira de ajudar o seu filho a não usar incorretamente as novas tecnologias é conhecê-las».
Deve ser salientado também o fato de como a rede se tornou um grande mercado online. Para alguns produtores, o «e-commerce» de brinquedos corresponde já a 4% das vendas, e apenas em 2005 as vendas online corresponderam a 37.600 ações de compra. As razões para investir no processo online são múltiplas: desde a possibilidade de evitar as dificuldades logísticas de distribuição dos produtos, à ampliação de ofertas diferentes de produtos e também a possibilidade de envolvimento do cliente através de campanhas de mala direta e a criação de comunidades virtuais em torno de alguns produtos.

FICHAS:
Pedo-pornografia e internet
Em março de 2006, entraram em vigor as novas medidas diretas de combate e repressão ao fenômeno de exploração sexual dos menores e a pedo-pornografia, estabelecidas pela lei 38/2006 – «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet» foi publicada no Diário oficial em 15 de fevereiro de 2006, nº.38 – com a qual foram substancialmente modificados e integrados os artigos 600bis e seguintes do Código Penal italiano.
A lei confirma os artigos 527, 528, 529 e 725 do Código Penal italiano, que punem os «atos obscenos em local público, publicações, espetáculos obscenos, desenhos ou figuras que ofendem a decência pública».
Porque em muitas publicações, transmissões televisivas e anúncios publicitários, mesmo que não tenham declaradamente um caráter pornográfico, imagens de crianças e adolescentes são apresentadas de maneira explícita ou mais ou menos sutilmente ilusória e de forma falsa, pede-se um novo empenho das instituições competentes para que sejam observadas as normas em vigor e, se preciso for, que façam apelo aos órgãos de Polícia, o Instituto de autodisciplina publicitária, o Ministério das Comunicações, a Polícia postal ou a «Comissão tv e menor».

3) CINEMA

Confirmando as disposições da Constituição italiana, no que se refere ao direito e ao dever das famílias de serem protagonistas na educação de seus filhos, para muitos é chegada à hora de reelaborar a legislação que define o conceito de «censura» (a lei 161/1962 prevê a possibilidade de negar a autorização de abertura às salas de cinema ou de fazer cortes nos filmes, mesmo em função de um público adulto), que hoje está superado. É preciso com urgência estabelecer um critério de tutela dos menores não apenas no que se refere aos filmes que vêem nos circuitos cinematográficos, mas também sucessivamente em casa, muitas vezes em horários acessíveis na programação da televisão.
Uma avaliação correta e preventiva de um filme permite à família ter à sua disposição os instrumentos para escolher se um espetáculo é mais ou menos oportuno, conhecendo a trama, os eventuais conteúdos mais sensíveis, a classificação que a obra recebeu em outros países, etc. Por isso, é justo que a legislação seja revista, uma operação que requer atenção e perspicácia da parte das instituições em um momento de transição da mídia, como este que estamos vivendo, quando esta se tornou realmente um importante componente na educação dos menores.
Não faltam filmes que atraem o público por causa de seu conteúdo de violência, e no entanto entram no circuito cinematográfico sem qualquer restrição de idade. Para um filme que é notícia nos jornais, existem muitos outros com conteúdos duvidosos ou até mesmo perigosos que conseguem passar através do filtro da comissão de revisão cinematográfica, que atualmente funciona junto ao departamento de cinema do Ministério dos Bens Culturais.
Ao mesmo tempo em que existe um projeto de lei do ministro dos Bens culturais, que deve ainda iniciar os trâmites parlamentares, novas situações se apresentam na Itália, com a autocensura de filmes, feita pelos produtores ou distribuidores cinematográficos, com a introdução de novas e mais específicas faixas etárias para as restrições visando os menores a partir dos 10 anos de idade. As restrições serão feitas baseando-se em uma avaliação classificatória dos conteúdos das obras e sucessivamente serão ainda analisadas por uma comissão de psicólogos, educadores e pais.
Este sistema se inspira no modelo americano da Motion Picture Association of America (MPAA), que há 40 anos representa os interesses da indústria do audiovisual americana no mundo. Funcionando a partir de regras bem precisas (estabelecidas ao longo dos anos, também segundo as sentenças dos tribunais federais nos vários Estados americanos e em base aos protestos dos cidadãos), a autocensura americana prevê a existência de uma única comissão competente para determinar as restrições do PG12 ao «restricted» 17 anos. Esta comissão é composta exclusivamente de pais, considerados os primeiros depositários da educação dos filhos, e representam transversalmente a audiência. Importantes sanções econômicas asseguram que o mecanismo de autocertificação corresponda efetivamente aos interesses dos cidadãos. No site da Motion Picture estão disponíveis aos pais os pontos de referência para a avaliação das obras de entretenimento e são publicadas as restrições aplicadas a cada filme que está em exibição nas salas de cinema. Geralmente as avaliações parecem muito mais severas em relação a outros países. Tudo isso, nos vários anos de sua aplicação, deu uma qualificação à indústria americana e seu correto serviço prestado aos ouvintes. Qualquer estrada que se pretenda seguir na Itália, é importante para as famílias que seja estimulado um mercado de produção adequado à infância: é justo que o mecanismo da indústria cinematográfica continue com o seu ritmo de produção, mas não é justo confundir as classificações de acesso ao produto, como qualquer indústria sabe muito bem.
No que se refere às normas européias de classificação dos filmes, e em geral de todo «entertainment» (neologismo anglo-saxão, que, no entanto encontra sua raiz etimológica na relação entre educação e jogo) acessível aos menores, deve ser citado o sistema NICAM, que funciona na Holanda há alguns anos. Fundado em 1999, o NICAM (Nederlands Instituut voor de Classificatie van Audiovisuele Media) se baseia na lei Media Act, onde os programas de grupos que tiveram a autorização para atividades de «broadcasting» não devem incluir obras audiovisuais que prejudiquem o desenvolvimento físico e psicológico de pessoas com menos de 16 anos de idade, seguindo as diretivas da União européia («Televisão sem fronteiras» IV).
O sistema de classificação preventiva funciona também na Grécia, com a lei 1.597, de maio de 1986, que prevê que antes da projeção nas salas de cinema, cada filme seja submetido pelo produtor ou pela sociedade de importação à Comissão para a juventude, que classifica o filme seja como adequado aos menores, ou proibido aos menores de 13 anos, ou de 17 anos ou ainda, nos casos mais graves, severamente inadequado aos menores. Esta comissão é um órgão do Ministério da Cultura e foi concebida procurando-se estabelecer certa proporcionalidade, sendo composta de representantes do Estado (Ministério da Cultura), das categorias ligadas ao cinema, de psicólogos especializados na educação, de sociólogos, dos jovens, dos educadores e dos pais.
Na Áustria, está em vigor um sistema de avaliação complexo, instituído em base a um princípio constitucional federal que confia a tutela dos menores, no que se refere ao cinema e em geral aos meios de comunicação de massa, à competência específica dos Lander. A lei nacional que engloba a regulamentação da mídia é a ORF-ACT, ou seja, a Austrian Broadcasting Corporation nº. 379/1984, que estabelece quais os critérios sobre os quais deve se basear a proteção aplicada a programas e filmes transmitidos na televisão ou através de outros canais mediáticos. No que se refere à exibição dos filmes, a avaliação preventiva das obras cinematográficas, para que sejam decididas as faixas etárias adequadas, é regulamentada pela lei austríaca para a tutela dos menores, a «Jugendschutzgesetz», aplicada através das leis dos Lander federais. Esta lei estabelece nove faixas de restrições de público a partir dos seis anos de idade, com uma sucessiva graduação que prevê restrições para 10, 12, 14 e 16 anos de idade. Para supervisionar o sistema de classificação cinematográfica, existe uma comissão junto ao Ministério da Educação, em Viena, que comunica seu parecer sobre a idoneidade dos filmes às autoridades locais. Geralmente e de maneira individual os Lander adotam as decisões da comissão, e é em âmbito local que se decide de sua aplicação.
Na Espanha, o artigo 20 da Constituição reconhece o direito do cidadão a exprimir e difundir livremente seu pensamento, suas idéias e suas opiniões através de qualquer meio de divulgação. Se por um lado o exercício de tais direitos «não pode ser restrito através de nenhum tipo de censura prévia», o mesmo artigo especifica que «estas liberdades têm o seu limite no respeito dos limites reconhecidos pelas normativas que exprimem este respeito, especialmente no direito à honra, à privacidade, à própria imagem e à proteção da juventude e da infância».
Baseando-se neste princípio, a qualificação dos filmes (Real decreto 81/1997) e das obras audiovisuais é feita antes de sua difusão, através do Instituto de cinematografia e das artes audiovisuais (ICAA), uma entidade autônoma, mas ao mesmo tempo ligada ao Ministério da Educação e Cultura através da secretaria de Estado para a cultura (ver site www.mcu.es).
A subdireção geral de fomento à indústria cinematográfica e do audiovisual, que faz parte do ICAA, se ocupa, dentre outras funções, da classificação em faixas etárias dos filmes e das outras obras audiovisuais em vista de sua exibição pública e para a sua distribuição. A comissão se encarrega de divulgar as informações sobre os filmes e programas audiovisuais, com classificação que vai desde as «salas X» até as restrições para cada faixa etária do público.
Os filmes de caráter pornográfico não podem receber subvenções do Estado e sua projeção nas salas prevê uma taxa suplementar, destinada em parte para estimular um fundo de proteção cinematográfica. A projeção destes filmes pode ser feita somente nas «salas X», onde não podem ser apresentados outros tipos de obras cinematográficas e onde é proibido o ingresso de menores de 18 anos.

CINEMA NA TV

Devido ao alto consumo de programas de televisão por parte dos menores e levando-se em conta as diretivas da União européia, que promovem a auto-regulamentação no âmbito nacional das emissoras de tv e a participação das famílias nesta obra educativa, há alguns anos estão em vigor na França, na Holanda, na Grã-Bretanha, na Grécia e na Itália os códigos de sinais, que servem para identificar tanto os filmes projetados na salas de cinema como aqueles transmitidos na televisão. A tutela dos menores no âmbito da televisão foi também feita adotando-se o chamado sistema «watershed» (separador das águas), que funciona segundo uma seleção de faixas horárias protegidas, algumas aconselhadas à visão dos menores, outras aconselhadas a todos e outras ainda, principalmente na programação noturna, indicadas somente a um público adulto.
A faixa de idade determinada pela classificação preventiva dos filmes tem obviamente uma repercussão na programação das chamadas faixas horárias protegidas ou distintas nas emissoras de televisão pública em todos os países europeus. A definição das linhas de conduta comuns está à base dos acordos de auto-regulamentação e de co-regulamentação dos programas de televisão, estabelecendo-se um código de procedimento comum para as emissoras tanto públicas como privadas. Criou-se assim uma base normativa, que é assumida pela autoridade do Estado e que recebe a confiança dos consumidores das emissoras públicas ou privadas que adotam este sistema de auto-regulamentação.
Para tornar visível aos adultos as classificações dos programas apropriados aos menores, muitas emissoras européias adotaram um sistema de sinais que através de símbolos, números, cores e sinais acústicos advertem ao público a respeito daquilo que está para ser transmitido.
Mas, apenas este sistema, assim como o de filtragem (tipo v-chip), não basta para garantir uma verdadeira tutela dos menores diante de um conjunto de imagens difíceis de serem decodificadas por um jovem. Deve-se pensar às imagens de guerra dos telejornais, dos filmes escabrosos ou às informações sobre os crimes hediondos, que muitas vezes têm como ambiente o próprio núcleo familiar.
É na colaboração entre Estado, produtores de programas audiovisuais e famílias que pode ser fundamentado um autêntico respeito dos menores que encoraje o crescimento positivo da criança em base aos valores fundamentais da pessoa humana.

4) CELULARES COM VÍDEO

Hoje a difusão dos celulares com vídeo chegou à Itália ao índice se 134%, o que significa que muitas pessoas possuem pelo menos dois celulares, inclusive os jovens e as crianças, que recebem este instrumento dos próprios pais. De fato, de duas crianças entre 8 e 13 anos de idade, uma delas tem um celular no bolso. Aquele que poderia ser um instrumento para controlar melhor os deslocamentos e as necessidades dos filhos, se revela no entanto um perigoso meio que pode expor a outro tipo de utilização por parte dos menores, que não se separam nunca do próprio celular, nem mesmo durante as aulas, como lamentam vários professores. Apesar do código de auto-regulamentação assinado pelas principais operadoras (Código de conduta para a oferta de serviços a pagamento em tutela dos menores), na realidade os novos serviços opcionais do celular o tornaram um «personal computer» capaz de permitir novos usos que antes não tinham.
Os desenvolvimentos tecnológicos que estão se verificando no campo da telefonia móvel – particularmente no que se refere à sinergia com a internet e a adoção dos sistemas DVB de vídeos-telefone – contribuem a aumentar a oportunidade de comunicação também para as novas gerações e, ao mesmo tempo, repropõem em novos termos a questão da tutela dos menores. As evoluções já previstas ulteriormente para os próximos anos e o número sempre crescente de pessoas envolvidas, pedem uma grande consciência social e uma constante atenção das pessoas e órgãos encarregados de garantir os direitos dos cidadãos.
Neste contexto devem ser reafirmados os direitos dos menores no campo da comunicação, dentre os quais certamente não está em último lugar aquele que se refere também à segurança diante dos riscos de indução a comportamentos ilícitos ou de acesso a conteúdos nocivos ou indesejados. Também neste campo é essencial o papel dos pais e, em geral, de todos aqueles que são chamados a ter uma função educativa. A maior segurança das crianças e dos jovens quanto ao acesso a conteúdos ilegais é um ponto que deve merecer atenção também através da maior conscientização dos pais e das mães, que devem se capacitar a conhecer e utilizar estes meios.
Para a «alfabetização» dos pais na utilização da mídia devem colaborar também as instituições públicas, promovendo um uso positivo das novas possibilidades tecnológicas. Às empresas cabe a responsabilidade de colocar no mercado um produto que dê garantias no que se refere à sua utilização pelos menores, superando os limites estabelecidos pelo código de auto-regulamentação assinado pelas operadoras de celulares. Devem também oferecer maiores informações aos adultos que assinam um contrato de utilização, como por exemplo a adoção de bloqueios automáticos de acesso a conteúdos nocivos, se o celular passa às mãos de um menor de idade.

5) VIDEOGAMES

Trata-se de uma indústria global, que conquistou os jovens e não apenas eles. Os números relativos à difusão repentina dos videogames indicam que existem 250 mil sites de videogames, cada um deles propõe uma série de títulos, muitos deles recheados de cenas de sexo e de violência. Uma pesquisa recente do Instituto italiano de medicina social (IIMS) coloca em evidência, entre outras coisas, a escassa informação por parte dos adultos a respeito dos videogames utilizados pelos filhos, o predomínio de temas violentas em mais de 30% de títulos não aconselhados aos menores, o predomínio de personagens virtuais normais que podem se tornar especiais, realizando ações extraordinárias.
Mas, o ponto de risco mais elevado se refere aos pequenos jogadores de videogames, crianças entre seis e nove anos de idade que se submetem a entrar tão intensamente no jogo virtual que chegam a formas de dissociação da realidade e solicitam um monitoramento muito atento da parte dos adultos. A mesma pesquisa indica a presença de videogames em 25% das famílias com crianças de três a cinco anos de idade e em 65,2% das famílias com crianças entre seis e 10 anos de idade. O que produz efeitos negativos no âmbito cognitivo das crianças não parece ser especificamente o meio, mas muito mais os elementos que criam a excitação, tais como a velocidade de produção do estímulo e da resposta, a velocidade das imagens, os efeitos especiais, os contrastes, a fragmentação da história, o binômio rumor-ação. O uso prolongado do jogo inibe, segundo alguns psicólogos, a área da capacidade crítica, provocando passividade e ao mesmo tempo agressividade na criança. Mas, não queremos demolir os videogames, porque existem aqueles que são muito adequados aos mais jovens, com valores de informação e de educação, seja também porque o uso deste meio é na realidade um passo na preparação da criança ao sucessivo e mais sofisticado, que é o uso da internet.
De qualquer maneira, os dados relativos à venda destes produtos de entretenimento mostram um crescimento em todos os lugares e a difusão deste meio é acompanhada de uma aceitação social (ou seria uma resignação?) sempre maior.
É urgente ampliar o percurso de conhecimento e das estratégias internacionais, para monitorar um mercado que está cada vez mais vasto. Parece urgente estabelecer modalidades operativas para o controle dos conteúdos e do sistema de sanções, seja para o produtor como para o vendedor dos serviços. O código de auto-regulamentação Pegi (derivado em 2003 do sistema de avaliação e classificação holandês, Nicam, que assinala os conteúdos inadequados aos menores), adotado pelos industriais de «entertainment» que produzem videogames, é a única forma de auto-regulamentação existente atualmente e que prevê sanções (raramente aplicadas, mesmo diante de casos graves evidentes) para os produtores que colocam no comércio os jogos com indicações de faixas etárias apenas aproximativas.
O código Pegi, ao qual a associação européia Isfe adere em 2002, é evidentemente insuficiente na sua função declarada de «fornecer aos consumidores as informações mais oportunas» e expostas no selo de produção. E, como o setor dos videogames tem hoje um volume de negócios que ultrapassa os 740 milhões de euros, envolvendo 24 milhões de jogadores (43% da população a partir dos quatro anos de idade), com uma venda dos produtos classificados para maiores de três anos de idade que chega aos quase 48% dos consumidores. É um dado que define o impacto deste gênero de meio sobre a infância e a adolescência, mostrando toda a sua periculosidade, seja pelo consumo de conteúdos inadequados, seja pelo excessivo número de horas dedicado neste passatempo, muitas vezes solitário e sem a presença de um adulto ao lado. Se for verdade, como sustenta a indústria, que a produção de videogames violentos é apenas uma mínima parte do mercado, é também verdade que esta representa a fatia mais importante do retorno econômico.
O interesse pelos videogames é alimentado pela sinergia com os filmes que inspiram o jogo homônimo e que torna sempre mais atrativo este gênero, principalmente para os adolescentes. Desta maneira é importante também neste campo o estabelecimento de regras precisas em defesa dos consumidores dentre o público jovem, mais exposto aos riscos destas novas formas de entretenimento cada vez mais sofisticadas e envolventes, por causa da combinação entre narrativa e efeitos gráficos.

6) PUBLICIDADE

O problema da tutela dos menores diante da publicidade se apresenta como um corolário, dentro do quadro mais amplo que regulamenta a difícil relação entre a mídia e as crianças. A televisão, e portanto também a publicidade, se constitui em uma fonte de perigo para os menores, isto é, para a maior parte das crianças, principalmente em idade pré-escolar, que devem saber fazer a diferença entre a publicidade e o resto da programação, e entre os programas de ficção e a realidade. Com essas considerações não significa que exista uma acrítica rejeição da publicidade em si mesma – à qual se reconhece, no entanto, onde proceda corretamente, uma função positiva no processo de formação, de crescimento crítico e de socialização do menor –, mas existe a necessidade de prever um sistema de regras destinado a garantir-lhe um uso adequado.
O efeito dos anúncios publicitários é tão grande que em alguns países estão sendo tomadas medidas drásticas a respeito. No Reino Unido, por exemplo, recentemente foram vetados os anúncios publicitários durante os programas destinados às crianças até nove anos de idade, a partir de 1º de janeiro de 2008 a medida se estenderá à programação para os jovens até 15 anos de idade e até o final de 2008 serão vetados em todos os canais dedicados aos menores. Apesar de se reconhecer que a publicidade serve para financiar os programas, aqueles dedicados às crianças terão que recorrer a outras fontes. Também na França começa a se impor uma «linha dura» a esse respeito: visto a alta incidência de publicidade de merendas, de sucos e doces em geral, a partir de agora os anúncios dedicados às crianças deverão ser precedidos de uma espécie de aviso, que orientará para uma alimentação adequada.
Mas, por que as crianças são tão frágeis diante dos apelos da publicidade? Na Itália, explica Paolo Landi, secretário geral da Adisconsum (Associação de defesa dos consumidores e do ambiente»), em um capítulo de seu estudo «Crianças da multimídia»: «Se consideramos que a publicidade não faz outra coisa que veicular um conhecimento imediatamente concretizável em um “ter”, ou em um “ser”, ou em um “fazer”, a criança absorve sem dificuldades os três componentes que são a obsessão dos expertos de marketing, isto é, o componente cognitivo (como fornecer informações indeléveis sobre um produto ou um serviço), o componente afetivo (como fazer o consumidor reagir de maneira emotiva) e o comportamental (como colocar o pequeno consumidor em movimento na direção da aquisição). A partir deste ponto de vista a criança é o público ideal, o consumidor a quem se pode vender qualquer coisa».
Na Itália está em vigor um código de autodisciplina publicitária que surgiu em 1966, em base a um acordo entre os profissionais do setor. Esta primeira forma de tutela, em grande parte com origem comunitária, tem como protagonistas entidades administrativas independentes: a Autoridade de controle da concorrência e do mercado de setor e a Autoridade de garantia para as comunicações e a editoria. Enquanto isso, para a auto-regulamentação, orientada pelas normas que constam do Código de autodisciplina publicitária, e agora também, embora com força jurídica diferente, pelo Código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual se reconhece um poder de decisão e de sanção, emanando uma ordem e intimando seu cumprimento.
Em todos os países onde a televisão serve de veículo às mensagens publicitárias, o mundo empresarial é plenamente consciente do enorme poder de influência que a publicidade tem sobre as crianças.



NORMATIVA INTERNACIONAL

O assunto relativo à tutela dos menores na mídia é um dos mais debatidos, seja no que se refere às normas nacionais, seja no âmbito internacional. Encontra-se diante da situação de precisar acertas as contas com toda a extensão da rede global da internet. O exemplo que, neste momento de transição, coloca mais em evidência a necessidade de estabelecer leis que estejam em condições de controlar o acesso e uso dos conteúdos nocivos para os menores, é exatamente o da internet. Qualquer pessoa no mundo pode abrir um site considerado «arriscado», contendo elementos ilegais e acessíveis a consumidores despreparados, disponibilizados por quem está do outro lado do mundo.
No que se refere aos princípios gerais no âmbito do direito internacional, é preciso recorrer principalmente à convenção da ONU sobre os direitos da criança, com sede em New York, ratificada pelo Parlamento italiano através da lei nº.176/1991. Esta garante à criança uma «consideração proeminente» também a respeito da liberdade, seja no se refere à expressão, seja quando tutela os conteúdos recebidos. Esta mesma convenção, em seu artigo 17, fala da relação entre menor e televisão, desejando «um sistema normativo que tutele o menor-consumidor, mesmo com todas as dificuldades que se apresentam», seja para individuar os fenômenos que devem ser monitorados, seja sobre as normativas possíveis.
No direito da União européia, tal tutela foi recentemente confirmada pela Carta dos direitos fundamentais da União, aprovada em Nice em 2000, cujo artigo 24 salienta que «os Estados membros reconhecem a importância da função exercida pelos meios de comunicação de massa e cuidam para que a criança possa ter acesso às informações e materiais... com a finalidade de promover o seu bem estar social, espiritual e moral, além de sua saúde física e mental». A normativa seguinte, 89/552/CEE, previu algumas restrições, seja no que se refere aos programas como para as mensagens publicitárias destinadas a este público». O artigo 22 desta normativa conduz a impedir a transmissão de programas que contenham cenas pornográficas ou de violência gratuita, ou outros programas inadequados a este público. Não podemos esquecer de mencionar a determinação expressa de «Televisão sem fronteiras», que está hoje em sua quinta versão atualizada, que o tema da tutela dos menores está relacionado com o estatuto geral dos direitos dos menores e corresponde ao disposto nos artigos 50 e 31 da Constituição italiana.
Se for claro que os princípios normativos são todos a favor da tutela dos menores, é também verdadeiro que uma tecnologia em contínua evolução colocou em crise as velhas regras do jogo. Mas também é claro que não se pode mais adiar a necessidade de estabelecer novos parâmetros normativos, para que as crianças possam utilizar os meios de comunicação próprios de seu tempo, com aproveitamento e serenidade também para as famílias.~

EDUCAÇÃO À MÍDIA NO MUNDO: PARA SABER MAIS

A difusão da educação à mídia é uma resposta à necessidade de se informar sobre as novidades no campo dos novos meios de comunicação. Em seguida citamos apenas alguns sites que em vários países oferecem maiores informações sobre como aprender a usar melhor a mídia, enfrentando a problemática da tutela dos menores e da alfabetização às novas tecnologias por parte dos adultos.
«The Media Awareness Nework-Réseau éducation médias» é uma organização canadense sem fins lucrativos, pioneira no desenvolvimento de programas sobre a educação à mídia. Com esta finalidade ela produz programas online em colaboração com organizações internacionais, convicta que, para interpretar as mensagens de informação, de entretenimento e comerciais, os jovens têm necessidade de instrumentos críticos válidos. Por isso é importante formar também os adultos (famílias e professores) sobre como funciona a mídia e como ela determina o estilo de vida.
A organização realiza uma ação contínua de monitoramento em relação à mídia (televisão, cinema, videogames, imprensa, publicidade, etc.), e sua seção dedicada aos pais oferece uma série de elementos para que estes reflitam com os filhos sobre esses meios, além da seção para os educadores, que inclui lições e materiais de apoio. Uma outra seção é dedicada à análise das questões ligadas à mídia, como a difusão de estereótipos, as representações de violência e da diversidade, a privacidade, a publicidade dirigida aos menores. Seu site é em inglês e francês (http://www.media-awareness.ca).
«Quai des images» é o site dedicado ao ensino de cinema e audiovisual organizado pelo Ministério da Educação francês. Ele propõe atividades ligadas à educação à imagem e de análise dos filmes em consonância com os programas escolares, agrupa os textos oficiais a respeito dos meios audiovisuais, oferece uma série de instrumentos de análise e de estudo completos sobre alguns filmes específicos e sobre certos autores em particular, informa sobre conferências, seminários, cursos e festivais sobre o mundo audiovisual e sua utilização em âmbito educativo e didático. Entre outras coisas, reúne também as propostas e as experiências feitas por professores e seus alunos nas escolas secundárias francesas no campo da educação à imagem, além de organizar um fórum de discussões aberto a todos sobre a educação à mídia (http://www.ac-nancy-metz.fr).
Sempre na França, está em funcionamento o blog «Zéro de conduite», organizado pelos professores e destinados a educadores, pais e estudantes. Promove o uso do cinema como instrumento pedagógico, dedicando-se especialmente à atualidade cinematográfica, mas sem esquecer os clássicos e os documentários. Com várias seções e espaços de aprofundamento, se propõe como um local de discussão de temas em um debate aberto (http://cinema-ducation.fluctuat.net).
A Universidade de Massachussetts organizou o Media Education Foundation – MEF, mídia de desafio, que produz e distribui documentários destinados a estimular o pensamento crítico e o debate sobre a relação entre aqueles que detêm o poder sobre a mídia, os conteúdos da mídia comercial, a exigência democrática de um livre fluxo de informações, as diversas representações de idéias e pensamentos e o direito dos cidadãos de informar e serem informados. Alguns destes temas são abordados criticamente, como a identidade do gênero na publicidade, a imagem de sexo nos videoclipes, o papel da mídia na construção da identidade cultural, mídia e saúde, etc. (http://www.mediaed.org/).

(a cura di M. F. D’A.)

 
At 9/17/2007 2:43 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

AS CRIANÇAS E A MÍDIA (II PARTE):
ACEITAR O DESAFIO EDUCATIVO


O tema da 41ª Jornada das Comunicações Sociais, «As crianças e os meios de comunicação: um desafio para a comunicação», nos convida a refletir a respeito de dois aspectos particularmente importantes. O primeiro é a formação das crianças, para que estejam em condições de receber de maneira crítica aquilo que vêem. O segundo é a formação à consciência e ao uso consciente da mídia, que está em contínua transformação tecnológica.
De fato, é o que especifica Bento XVI no início de sua mensagem, de 20 de maio de 2007, para a Jornada: «Os complexos desafios que a educação contemporânea deve enfrentar são muitas vezes ligados à grande influência dos meios de comunicação no nosso mundo. Como aspecto do fenômeno da globalização e estimulados pelo rápido desenvolvimento da tecnologia, os meios de comunicação delineiam fortemente o ambiente cultural (cf. João Paulo II, O rápido desenvolvimento, nº3). Na realidade, há quem afirma que a influência formativa da mídia está em competição com aquela da escola, da Igreja e, quem sabe, até com aquela da própria família».
De fato, como salienta o Pontifício conselho para as Comunicações Sociais, «para muitas pessoas, a realidade corresponde àquilo que os meios de comunicação definem como tal». Episódios recentes, como a utilização do celular na filmagem de violências nas salas de aula, abusos sofridos por pessoas deficientes, fenômenos de trote e de violência generalizada, demonstram como as crianças que crescem passando uma média de quatro horas por dia diante da televisão, sozinhos em casa, absorveram a lógica do «estou no vídeo, logo existo». Os psicólogos, os pedagogos e os estudiosos dos meios de comunicação estudam há tempos sobre as relações entre o consumo televisivo e o comportamento violento dos menores. Uma grande quantidade de pesquisas realizadas em muitos países ocidentais demonstra como esta correlação seja realmente inegável.


NOVAS LINGUAGENS

O fato que muitas crianças vivem completamente inseridas no mundo dos velhos e novos meios de comunicação, que estão cada vez mais frequentemente em correlação entre eles, é confirmado pela popularidade de alguns modelos televisivos, considerados tão efêmeros quanto penosos «momentos de glória», presentes nos programas com os maiores índices de audiência, dos «reality» aos «talk show», sem falar do «trash», que hoje se tornou um gênero de espetáculo.
Dentre as preferências demonstradas pelos adolescentes italianos que assistem televisão mais do que três horas por dia, encontramos, em primeiro lugar, a figura da «veline» (Ndt: misto de corista e coadjuvante na apresentação de programas populares da televisão italiana), enquanto outros da mesma idade se concentram no mais clássico exemplo, o do jogador de futebol. De toda maneira, a coisa mais importante é aparecer, pouco importa por qual motivo, de ser «alguém» ou «alguma coisa» no Olimpo mediático, mesmo que seja apenas por um instante.
Estes são os exemplos mais negativos dos condicionamentos derivados de um excessivo e acrítico uso dos meios de comunicação. Encontramo-nos diante de uma nova geração que cresceu na frente da televisão, capaz de usar as novas tecnologias que os próprios pais, que as adquiriram e as tornaram disponíveis, muitas vezes se encontram despreparados para utilizá-las.
Tanto é verdade que hoje em dia os filmes são vistos diretamente nos celulares e a televisão pode ser assistida na tela do computador. Hoje se telefona através da internet e graças ao download se descarrega os CDs e DVDs mais recentes, se filma e se faz foto com o celular, e assim por diante.
Nas casas, o vocabulário familiar se reduziu ao gênero dos sms e se fala tendo o som da televisão no fundo, se comunica através de e-mail, se faz «visita virtual» via computador, se percorre através de bibliotecas virtuais, tanto que as fichas e arquivos de papel evocam imagens do outro século, completamente em desuso.
A situação dos nossos filhos é diversa daquela da geração precedente, pois eles abriram seus olhos tendo diante de si estes cenários de profunda, contínua e envolvente transformação tecnológica. Eles se constituem aquela que os estudiosos chamam de geração nascida «com seis dedos»: além dos cinco dedos normais da mão, o sexto é o mouse do computador.
Com o aparecimento do mundo «virtual» da internet e dos videogames criou-se uma defasagem em relação à realidade verdadeira e própria. As duas dimensões parecem muitas vezes, e para muitos jovens, como universos paralelos, com conseqüências não indiferentes no plano do processo de amadurecimento. Têm grande sucesso os sites nos quais se prevê uma segunda vida (basta verificar os milhares de registros nos poucos meses de existência do site italiano de «Second Life», que em todo o mundo já tem sete milhões de inscritos), onde a simulação reproduz todas as situações da vida real. Apenas que tudo é falso, a começar da nova identidade, que pode ser escolhida e com ela se inicia a fazer parte deste mundo fora do mundo, onde se pode ser um «qualquer coisa». Isto é, ninguém.
Assim, o grande desafio cultural de hoje é propriamente a redefinição dos limites, que muitas vezes se apresentam demasiadamente instáveis. Isto é, redefinição dos limites entre o real e o virtual, superando a divisão digital que hoje separa as gerações adultas daqueles mais jovens.


OS JOVENS: PROTAGONISTAS OU VÍTIMAS DAS MUDANÇAS?

A linguagem deles é pobre, muitas vezes recheada de termos tirados do dicionário do internauta: clicar, chatar, messagiar, deletar, são alguns dos neologismos que fazem parte de seu vocabulário quotidiano. Falta uma dimensão humana da tecnologia que esteja em condições de traçar o perímetro cultural entre o real e o virtual. Assim a aldeia global difundiu uma quantidade de modelos comportamentais desviados, ou pelo menos discutíveis.
Desta maneira, os jovens que vivem a milhões de quilômetros de distância jogam o mesmo videogame, vêem o mesmo filme, assim como, de maneira transversal, absorvem modelos e comportamentos semelhantes. Muitas vezes os adultos têm menos domínio no uso das novas tecnologias e observam, com uma preocupação resignada diante de suas próprias limitações, as crianças que navegam facilmente na internet.
As raízes das dificuldades neste campo educativo são muito bem explicadas por Marina D’Amato, professora de sociologia da Universidade de Roma, que salienta: «Cada geração tem necessidade de se encontrar também em um mundo fantástico, que serve a interiorizar o paradigma do bom e do belo, do justo e do errado, do oportuno e do útil, também em relação aos exemplos que procedem da narrativa. Hoje nos encontramos em uma condição na qual os avós e os pais contam cada vez menos histórias aos filhos e aos netos, e este papel foi assumido pela televisão. Mas, na realidade, a televisão “exila” e “con-funde”, isto é, funde os modelos morais que são frutos de ânsias e problemas mal resolvidos, muito mais que de certezas. Embora estes se transformem com freqüência, a cada três ou quatro anos, o fato de serem repropostos continuamente faz com que se justaponham uns aos outros» (ver Come mediare i media, de Mario Russo).
Se for verdade que a televisão é o meio mais usado até a adolescência, imediatamente depois surge a grande atração pela internet. Esta passagem nasce de uma sintonia com a linguagem televisiva, que na idade infantil muitas vezes é ouvida durante muitas horas no dia. Esta linguagem se baseia em uma mediação da realidade e desta maneira ela ativa um processo de recepção que é de tipo emotivo.
Neste registro emocional é mais fácil acabar envolvido por situações e figuras capazes de se proporem como modelos identificadores, preservadores de sentido e de comportamentos a serem imitados.
O poder de concentrar uma vontade emulativa em alguns personagens, que correspondem particularmente às necessidades interiores do jovem (necessidades na maioria das vezes induzidas pela publicidade ou por modelos estimuladores), tem uma forte relação com a quantidade de horas que o jovem passa utilizando os novos ou os velhos meios de comunicação.


EDUCAÇÃO NECESSÁRIA

«A formação adequada a um uso correto dos meios de comunicação é essencial para o desenvolvimento cultural, moral e espiritual das crianças… Educar as crianças a serem seletivas no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja, da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos. Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia, com a certeza de que este difícil, embora gratificante, aspecto da condição de pais, é apoiado por toda a comunidade.»
As palavras do discurso de Bento XVI definem com grande clareza o paradigma de uma justa relação entre a mídia e os menores. Uma clareza que devemos agradecer ao magistério da Igreja, no momento em que o mundo da mídia parece ignorar a verdadeira problemática educativa das crianças e as expectativas de qualidade e de segurança exigidas pelas famílias no que se refere ao uso desses meios, seja do cinema aos videogames, da televisão à internet.
Diante da utilização destorcera do meio televisivo, o mais difundido dentre os meios de comunicação, a Igreja se interroga sobre o porquê da televisão não ter um papel educativo e por que os meios de comunicação não podem ser companheiros confiáveis para os jogos na fase de crescimento da criança. O anúncio de uma recente campanha sobre o uso da mídia, promovida pelo Ministério das Comunicações, mostra os vários membros da família que estão vendo a televisão ao lado de uma criança.
Que se trate do avô ou da mãe, a mensagem é a mesma: não deixar uma criança sozinha diante de um meio que, sem o apoio crítico educativo de um adulto, pode transmitir conteúdos inadequados à idade e à maturidade daquele que o vê. Sem esquecer as responsabilidades dos produtores televisivos, empenhados na organização dos programas, o papel da família é realmente insubstituível.
Se realmente o objetivo de quem administra a sociedade de produção televisiva, ou das multinacionais produtoras de videogames ou das operadoras de celulares, é o de promover e vender o produto, o bem estar psicofísico da criança está no centro do interesse dos educadores, sejam eles os professores ou, em primeiro lugar, os pais.
Isto explica bem a mensagem do Papa, que continua a sua análise, salientando que «educar as crianças a serem seletivos no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja e da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos (ver João Paulo II, «Familiaris Consortio», 76). Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia.»


CONTEÚDO DA MÍDIA

No panorama de uma revolução da multimídia, que está modificando transversalmente os hábitos, a mentalidade, os modelos e as linguagens, deve voltar ao centro do debate a tutela daquilo que é melhor para os menores. Sem acusar a «mídia», que enquanto tal não é nem boa nem má, o importante é partir de uma a análise do produto, para assim poder individuar conteúdos que sejam de melhor qualidade para as crianças e os adolescentes. Porque a televisão é um instrumento que abre janelas de conhecimento para o mundo e, se bem utilizada, de «má professora» pode se tornar uma preciosa fonte de estímulo para o crescimento humano e cultural.
A mesma coisa vale, e com mais razão, para a «rede» que engloba e compreende tudo, e para os videogames, onde, ao invés de violência e monstros, poderia se dedicar a produzir (e isso já ocorre em certos casos) histórias instrutivas e de conteúdo interessante.
Bento XVI coloca justamente em evidência as enormes possibilidades para que seja melhorado o conteúdo deste grande campo de produção multimídia: «A educação através da mídia deveria ser positiva. Colocando as crianças diante de um meio estética e moralmente excelente, estas recebem uma ajuda para que desenvolvam a própria opinião, a prudência e a capacidade de discernimento. É importante aqui reconhecer o valor fundamental do exemplo dos pais e as vantagens de introduzir os jovens aos clássicos da literatura infantil (…). A beleza, quase um espelho do divino, inspira e vivifica os corações e as mentes juvenis, enquanto a feiúra e a vulgaridade têm um impacto deprimente sobre os comportamentos». Diante de uma decadência geral do produto televisivo, a questão da qualidade aparece ainda mais forte e vibrante em grande parte de um público formado de famílias, que pede para não ser apenas um exército indistinto de ouvintes silenciosos, mas um público em condições de exprimir suas preferências por conteúdos formativos e informativos de bom nível.
A mensagem de Bento XVI continua, com algumas importantes indicações: «Como a educação em geral, aquela da mídia requer também uma formação ao exercício da liberdade. Trata-se de uma responsabilidade que compromete. Muitas vezes a liberdade é apresentada como uma incansável procura do prazer ou de novas experiências (…). Este desejo, sentido profundamente pelos pais e educadores, que é o de educar as crianças no caminho da beleza, da verdade e da bondade, pode ser apoiado pela indústria da mídia somente na medida em que se promove a dignidade fundamental do ser humano, o verdadeiro valor da vida familiar, as conquistas positivas e as metas da humanidade. A partir disso, a necessidade de que os meios de comunicação estejam empenhados na efetiva formação e no respeito da ética deve ser vista com interesse particular e com urgência não apenas pelos pais, mas também por aqueles que têm responsabilidade cívica».
Na realidade, nos encontramos na situação de ter que reconhecer que na Itália falta uma verdadeira «cultura da criança»: a situação é tão séria que no âmbito institucional procura-se dar uma nova organização geral para verificar e controlar os conteúdos dos setores de entretenimento, como os videogames, que até agora estão submetidos apenas a códigos de auto-regulamentação, feitos e codificados para uso e consumo pelas indústrias produtoras.
Uma vez mais, o primeiro e indispensável apoio à criança só pode vir da família e de uma relação mais estreita com os professores e educadores, exatamente como salienta Bento XVI, lembrando-nos que a preocupação educativa dos pais não deve se tornar uma preocupação genérica, mas uma atenção constante a tudo aquilo que diz respeito aos filhos.

A INDÚSTRIA DA MÍDIA

1) A TELEVISÃO

Se a televisão convencional se apresenta como um ramo de atividade já «maduro», no entanto se apresenta no horizonte a situação da mídia digital (satélite ou a cabo), também como uma plataforma que consente a ligação entre televisão, internet e outro tipo de mídia através do computador. No que se refere à qualidade da programação, apesar dos inúmeros bons propósitos anunciados no âmbito institucional, parece pequena a atenção às exigências dos menores em suas diversas faixas etárias. A programação para os menores, na realidade é confinada em redes e horários particulares, enquanto o resto da programação na faixa horária considerada «para todos» muitas vezes apresenta conteúdos inadequados aos jovens. Mas, quais são as expectativas das gerações de jovens no que se refere à televisão? É realmente verdade que preferem o «trash», os jogos com prêmios absurdos e as «velines»?
A partir de uma pesquisa recente feita pelo instituto Censis sobre «Comunicação, pluralismo social, sociedade aberta» (2005) surge que a relação entre os menores, e em particular dos adolescentes entre os 14 e 18 anos de idade, e a televisão é determinada por elementos de forte contradição e de passividade. Nessa faixa etária, 100% deles vêem televisão praticamente todos os dias, 86% acompanham um pouco de tudo, com uma relevante predileção pelos filmes (72%), por esporte (32%) e pelos «reality shows» (18%).
No entanto, a amostragem entrevistada não está realmente satisfeita com aquilo que vê. De fato, 36% dos adolescentes denunciam a vulgaridade difundida nos programas e 25% criticam a superficialidade. Dentre eles, 46% consideram a televisão como um meio que «invade», ao mesmo tempo em que é interessante notar que 25% consideram que em geral a programação televisiva alimenta nas crianças menores uma visão consumista da vida. Destes dados surge o contraste entre a procura de distração e a reprovação daquilo que lhes é proposto pela programação. Isto significa que o alto índice de procura não é um indicador de satisfação.
Considerando o axioma de que a televisão seja onipresente, fica claro que são os próprios jovens a pedirem uma maior atenção aos conteúdos: menos violência e menos vulgaridade. A exigência de uma regulamentação diversa, diz claramente o relatório do Censis, «não vem somente daqueles, pais e educadores, que estão preocupados pela possível influência negativa sobre os menores, mas se exprime nitidamente também através dos adolescentes, pelo menos de uma parte mais esperta e consciente dentre eles».
Para tutelar melhor os direitos dos menores, desde 2002 foi instituído junto ao Ministério das Comunicações um código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual aderiram os produtores de televisão, seja no âmbito nacional como local. Baseando-se nos princípios sobre a matéria existentes na Constituição italiana e na Convenção dos direitos da criança, estabelecida em 1989 pela ONU, a comissão que controla sua aplicação avaliou em todos estes anos de atividade os milhares de casos em que foram violadas as normas de tutela, que prevêem a transmissão de programas e imagens adequadas a um público de menores de idade durante aquela que é chamada de «faixa protegida» da programação televisiva (das 7h30 às 22h30), intervindo com denúncias e sanções, que nos casos mais graves foram aplicadas pela Autoridade de garantia no setor das comunicações. Para o futuro, esta comissão deverá se transformar em um organismo mais amplo de controle, que se chamará «Mídia e menores», que além da televisão deverá monitorar também os setores dos vídeos-telefone e dos videogames, além da internet, que é o campo de maior risco.

REGRAS DE TUTELA EM OUTROS PAÍSES

É diversa a situação em outros países, como por exemplo na Grã Bretanha, onde o sistema de regulamentação da mídia é estruturado e complexo e foi atualizado nas últimas décadas, com uma particular atenção à tutela dos menores. As inovações tecnológicas neste setor levaram as normativas inglesas a uma série de novas disposições, como por exemplo, a visão em casa de vídeo exclusivamente para adultos, e que fora de casa seriam vetados aos menores, ou o combate à praga mundial dos sites internet para os pedófilos, que contenham material pornográfico ou com conteúdos que possam esconder o aliciamento de menores (ver a Protection Childres Act, de 1978).
A programação televisiva é regulamentada pelo Broadcasting Act (1996), de onde deriva a instituição da Broadcasting Standard Commission (BSC), um órgão independente de controle que estabelece as normas de avaliação e classificação dos programas, também no que se refere aos conteúdos violentos ou que possam ofender a decência pública (site oficial www.bsc.org.uk). Este organismo BSC funciona internamente à estrutura do Broadcasting, supervisionando e regulamentando todas as emissoras de televisão e de rádio, via cabo ou por satélite. Sua tarefa é a de elaborar os códigos de conduta e de aplicação de modelos que respeitem a justiça, além de monitorar os modelos, verificando que respeitem as leis. Com a transmissão de programas com conteúdos considerados inadequados aos menores de várias idades, há alguns anos a televisão inglesa adotou o sistema «watershed», um «separador de águas» entre um horário de programação familiar e outro para os adultos. Todo o sistema televisivo inglês se apóia sobre a responsabilização das famílias, pois sem a colaboração delas qualquer código de modelos para os programas é praticamente inútil.
Na França, está vigorando já há anos um código através de sinais televisivos, que entra em função para assinalar os programas inadequados aos menores. A avaliação do programa televisivo é feita pelo Conseil Supérieur de l’Audiovisuel (CSA), uma autoridade administrativa independente, que controla a difusão dos filmes e outras transmissões em vários canais privados, nacionais, regionais ou locais. A normativa francesa (lei 719/2002) veta a transmissão de programas que possam prejudicar gravemente a integridade física, mental e moral dos menores, porque divulgam conteúdos de pornografia ou de violência gratuita. As transmissões são classificadas por um código de sinais que, em conjunto com um sistema organizado de faixas horárias de programação, garante às famílias mais clareza sobre os programas destinados aos menores.
Na Alemanha, o tema da infância tem particular atenção da legislação, que considera desde o nascimento o início dos direitos fundamentais do cidadão. A tutela é disciplinada no âmbito público pela JSchG (desde o dia 26 de fevereiro de 1985), enquanto a lei GjSM se ocupa do controle sobre a difusão de publicações e conteúdos mediáticos considerados danosos para os menores. A regulamentação no setor televisivo é feita segundo as normas do acordo sobre a radiodifusão dos Lander federais, que as entidades para a mídia nesses Lander adotaram por base para o estabelecimento das diretivas que tutelam o interesse dos menores nas emissoras privadas. Não são admitidas transmissões que incitem o ódio racial, que exaltem a violência ou a guerra, que ofendam a dignidade do homem, que sejam de gênero pornográfico, que mostrem pessoas moribundas ou com sofrimentos que ofendam a dignidade humana. Os responsáveis pela programação, escolhendo os horários das transmissões, devem cuidar para que os menores não vejam programas que podem prejudicar o seu bem estar psíquico, físico ou mental. As transmissões inadequadas às crianças menores podem ser transmitidas somente depois da autorização da entidade competente do Land interessado.
Os responsáveis pela organização dos programas televisivos em âmbito nacional devem nomear encarregados pela tutela dos menores, que atuam no momento da aquisição, da projeção e da realização dos programas. As emissoras privadas fundaram em 1993 uma associação de autocontrole voluntário da televisão («Freiwillige Selbskontrolle Fernsehen», FSF), à qual devem ser apresentados programas particulares, antes da sua transmissão, e suas avaliações consideradas nas decisões das entidades de controle da mídia nos Lander federais. Existe ainda o órgão comum do cidadão para a tutela dos menores, dos programas, da competência mediática e controle da mídia (GSJP), do qual faz parte um integrante da entidade para a mídia nos Lander federais, que dá o seu parecer a respeito de algumas séries, filmes e espetáculos mais ou menos adequados aos menores. Este órgão, o GSJP, decide sobre pedidos de mudança de horários de transmissão de filmes proibidos para menores, controla a forma de novos programas e experimenta novas disposições para a tutela dos menores na televisão digital. A peculiaridade da jurisdição alemã, seja no setor televisivo como no cinematográfico e da mídia em geral, é a minuciosa atenção às exigências com o desenvolvimento do menor e aos riscos que este pode correr com a observância incorreta das leis.
Nos Estados Unidos, é possível consultar via internet um «guia televisivo para os pais» (ver o site www.mpaa.org), que prevê algumas categorias de audiência aplicadas aos programas televisivos transmitidos a todo o público. Este guia organiza várias siglas para identificar a categoria de audiência para cada transmissão: vai-se do TVY (para todas as crianças) ao TVG (para todos), através de várias faixas etárias, que correspondem à passagem da primeira à segunda infância e desta à adolescência. Depois tem o TVPG («parental guidance», visto na presença de um dos pais), o TV14 («parent strongly cautioned», séria advertência aos pais), para os programas que contêm cenas de sexo e de violência. Enfim, há o TVMA, que prevê um «mature audience only», ou seja, destinado a um público de idade superior a 17 anos, última fronteira para os conteúdos considerados «restricted».
Estas avaliações foram elaboradas baseando-se nas opiniões dos próprios pais e são fáceis de serem encontradas e compreendidas. Esta linha de «guia de televisão para os pais» pode ser usada juntamente ao «v-chip», que é um dispositivo de filtro instalado na maior parte dos mais recentes modelos de aparelhos de televisão, para permitir aos pais de bloquear os programas inadequados.

FICHA 1
Brasil: «O que eu penso da tv»
No Brasil, a audiência infantil é muito alta: aproximadamente 30 milhões de crianças vêem televisão pelo menos durante três horas por dia. Explica a profa. Rosália Duarte, do departamento de Ciência da Educação, da PUC do Rio de Janeiro, que «as crianças são muito perspicazes, mas nós podemos e devemos ajudá-las a ampliar o seu quadro de referências, para que possam discutir ainda melhor sobre o conteúdos daquilo que vêem. Para isso temos necessidade, antes de tudo, de ouvir aquilo que elas têm a dizer sobre o assunto e de dialogar com elas. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e muito mais freqüente, a outras atividades culturais». No âmbito de uma pesquisa feita através de um questionário distribuído nas escolas, intitulado «O que eu penso da tv», apareceu que «as crianças querem seriamente ser ouvidas sobre aquilo que pensam da tv, mas sentem que sua opinião é considerada pouco importante e não estão contentes com o excesso de imagens de violência exibidas na televisão, principalmente a violência “real”, definida como aquela transmitida nos telejornais. Eles adoram ver televisão e não importa o que os adultos pensam e dizem a respeito disso. A eles agradam quase todos os tipos de programas transmitidos: novelas, desenhos animados, programas de humor, filmes, seriados, mas isso não faz deles espectadores “idiotas”, pois fazem críticas muito interessantes, pertinentes e bem elaboradas sobre o que consideram feio ou inadequado na televisão. Para a maior parte deles, a televisão se oferece como principal opção de divertimento (em alguns casos, a única), o que significa um dado muito preocupante. Mas, o que chamou mais a nossa atenção é o grau de experiência com o qual essas crianças analisam a televisão: são expertos e demonstram conhecer a televisão também do lado de dentro, inclusive as linguagens que ela utiliza, a sua estrutura de produção, a sua lógica interna e as suas maneiras de intervenção».
As crianças aprendem os valores e os não-valores através da televisão, não resta dúvida, mas demonstram ter senso crítico a respeito deste assunto, quando afirmam nos textos que os programas transmitidos na tv podem lhes ensinar «a serem bons, a ter coragem e a fazer o bem, a cuidar da natureza e de si mesmos, a serem honestos e a lutar por aquilo que desejam», mas também «a serem cruéis e mentirosos, a roubar e matar, a não respeitar os pais e a comprar tudo aquilo que não têm necessidade». Falando sobre a validade do ensino através da mídia, a profa. Duarte salienta a necessidade de «ouvir aquilo que têm a dizer sobre o assunto e a dialogar com eles. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e mais freqüente, a outras atividades culturais».

FICHA 2
Observadores internacionais
Os dados examinados em janeiro de 2006 pelo OssCom, que é um centro de pesquisa da mídia, deixam evidente a tendência a realizar uma forma de co-regulamentação, onde a ação legislativa dos Estados membros se integra com medidas de auto-regulamentação por parte dos produtores, broadcasters e profissionais da comunicação sob o efeito de controles e sanções. São dois os instrumentos mais utilizados no âmbito europeu, observando-se as diretivas previstas no artigo 22 de «Televisão sem fronteiras»: a definição de faixas horárias protegidas (watershed) e os sinais mostrados na tela (determinados por um sistema de «rating»). Apesar disso, aos campos tradicionalmente problemáticos da violência e da pornografia se juntam novos campos de risco para os menores: a vulgaridade, abusos e dependências de substâncias, linguagem e comportamento vulgares, discriminações e abusos, violações e ofensas à dignidade humana. Os critérios de avaliação dos programas se constituem um problema que é partilhado por muitos países da União européia, ao mesmo tempo em que se prepara uma uniformização internacional dos sistemas de classificação (ver mais adiante, Nicam), baseados na visualização de cinco ícones que ilustram simbolicamente qual é a problemática do programa que está sendo analisado e para quais idades ele é desaconselhado.
Deve ser assinalada a atividade online da European Medi@culture. O projeto é promovido pela Comissão Européia, em Bruxelas, no quadro das iniciativas «e-Learning», administrado pelo centro mediático de Baden-Württemberg. O site apresenta informações sobre a educação à mídia na Europa, particularmente na França, Áustria, Finlândia e Alemanha. A seção de projetos de multimídia agrupa os projetos sobre a mídia desenvolvidos por escolas e associações de jovens ao longo do tempo (ver http://www.european-mediaculture.org).

FICHA 3
África do Sul: Encontro mundial sobre a mídia para a infância
Este encontro trienal se realizou no último mês de março em Johannesburg, na África do Sul, com a participação de expertos do setor representando diversos países. Em conjunto se discutiu sobre a necessidade de uma programação adequada às crianças, procurando entender de que modo a violência na mídia pode influir sobre a psíquico dos menores.
Mas, no 5º Encontro mundial sobre a mídia para a infância apresentaram-se também muitas crianças provenientes de todo o mundo e empenhadas em discutir sobre o difícil tema da «Mídia como instrumento de paz e de democracia global». Vieram guiados por grupos de adultos, dentre eles as diversas organizações católicas que há anos trabalham para promover regras para o bem da infância, a serem respeitadas nas transmissões de rádio e televisão através de códigos de regulamentação que devem ser redigidos ou, como em alguns casos, apenas atualizados. Em muitos países do sul do mundo as novas tecnologias de multimídia já estão muito disseminadas e seu uso merece uma atenção particular para tutelar o público mais jovem.
Especialmente na África, explicou o organizador do encontro, Firdoze Bulbulia, começa-se a examinar o projeto de um «Media center» para as crianças, que possa produzir e distribuir transmissões de rádio e de televisão destinadas ao público mais jovem, com o objetivo de realizar um canal televisivo pan-africano dedicado à infância. Os organizadores do encontro estão também trabalhando no projeto de uma aliança africana dos meios de informação e de comunicação, seguindo o modelo daquela já existente na América latina.

2) INTERNET

Na Itália, 47% das famílias italianas têm um computador em casa, um dado relevante mas sempre muito baixo em relação à média dos outros países europeus. O uso da internet por parte dos adolescentes e jovens, e a familiaridade que têm com tudo aquilo que pode ser digitado ou «descarregado» da internet, apresenta não poucos problemas. Pela sua própria natureza de rede de comunicação global, o problema se apresenta em ótica internacional, procurando garantir a tutela dos menores através de precisos acordos com os provedores para um efetivo controle de conteúdo. No campo italiano, até 2006, a tutela dos menores tinha sido deixada nas mãos dos próprios provedores, que em 19 de novembro de 2003 assinaram um acordo de auto-regulamentação: o Codice Internet e Minori. Embora o acordo tenha sido estipulado entre os representantes dos vários provedores diante do Ministério para a Inovação e a Tecnologia, no entanto ele permanece um acordo privado, com lacunas, principalmente no que se refere às sanções que muitas vezes devem ser aplicadas. Em 2006, na seqüência de numerosos casos de violência sobre menores, muitos dos quais realizados através da difusão de material pedo-pornográfico (quando não se tratava de verdadeiro e próprio aliciamento de menores via internet), foi promulgada a lei 38 de 6 de fevereiro de 2006: «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet».
Enfim, como aplicação da lei 38/2006, em fevereiro da 2007 foi publicado um decreto determinando os requisitos técnicos dos instrumentos de filtragem que os provedores da rede internet devem utilizar para impedir o acesso aos sites já assinalados pelo Centro nacional contra a pedo-pornografia. Mas, isso não basta para superar as dificuldades e impedir que os menores possam navegar de maneira arriscada na «rede das redes».
Atualmente foi reativada a comissão anti-pedofilia e desvios de menores através da internet, o «Ciclope», que tinha sido instituída junto ao Ministério para a Eqüidade, do governo italiano, e que ficou inativa por um ano, até a sua reestruturação junto ao Ministério da Família. Está também para entrar em função um site dedicado ao uso da internet, junto ao Ministério das Comunicações, e um número telefônico de emergência gratuito, organizado pelo mesmo ministério e por «Save the children», que poderá ser utilizado por qualquer cidadão que queira assinalar algum abuso, desvio ou pedo-pornografia. Dentre as iniciativas mais recentes, deve ser assinalado o site www.tiseiconnesso.it criado pelo Ministério das Comunicações italiano, sempre em colaboração com «Save the children», onde é colocada à disposição uma série de informações sobre o conteúdo de certos sites, seja para os pais como para as próprias crianças, em conjunto com a campanha televisiva que tem como slogan «A melhor maneira de ajudar o seu filho a não usar incorretamente as novas tecnologias é conhecê-las».
Deve ser salientado também o fato de como a rede se tornou um grande mercado online. Para alguns produtores, o «e-commerce» de brinquedos corresponde já a 4% das vendas, e apenas em 2005 as vendas online corresponderam a 37.600 ações de compra. As razões para investir no processo online são múltiplas: desde a possibilidade de evitar as dificuldades logísticas de distribuição dos produtos, à ampliação de ofertas diferentes de produtos e também a possibilidade de envolvimento do cliente através de campanhas de mala direta e a criação de comunidades virtuais em torno de alguns produtos.

FICHAS:
Pedo-pornografia e internet
Em março de 2006, entraram em vigor as novas medidas diretas de combate e repressão ao fenômeno de exploração sexual dos menores e a pedo-pornografia, estabelecidas pela lei 38/2006 – «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet» foi publicada no Diário oficial em 15 de fevereiro de 2006, nº.38 – com a qual foram substancialmente modificados e integrados os artigos 600bis e seguintes do Código Penal italiano.
A lei confirma os artigos 527, 528, 529 e 725 do Código Penal italiano, que punem os «atos obscenos em local público, publicações, espetáculos obscenos, desenhos ou figuras que ofendem a decência pública».
Porque em muitas publicações, transmissões televisivas e anúncios publicitários, mesmo que não tenham declaradamente um caráter pornográfico, imagens de crianças e adolescentes são apresentadas de maneira explícita ou mais ou menos sutilmente ilusória e de forma falsa, pede-se um novo empenho das instituições competentes para que sejam observadas as normas em vigor e, se preciso for, que façam apelo aos órgãos de Polícia, o Instituto de autodisciplina publicitária, o Ministério das Comunicações, a Polícia postal ou a «Comissão tv e menor».

3) CINEMA

Confirmando as disposições da Constituição italiana, no que se refere ao direito e ao dever das famílias de serem protagonistas na educação de seus filhos, para muitos é chegada à hora de reelaborar a legislação que define o conceito de «censura» (a lei 161/1962 prevê a possibilidade de negar a autorização de abertura às salas de cinema ou de fazer cortes nos filmes, mesmo em função de um público adulto), que hoje está superado. É preciso com urgência estabelecer um critério de tutela dos menores não apenas no que se refere aos filmes que vêem nos circuitos cinematográficos, mas também sucessivamente em casa, muitas vezes em horários acessíveis na programação da televisão.
Uma avaliação correta e preventiva de um filme permite à família ter à sua disposição os instrumentos para escolher se um espetáculo é mais ou menos oportuno, conhecendo a trama, os eventuais conteúdos mais sensíveis, a classificação que a obra recebeu em outros países, etc. Por isso, é justo que a legislação seja revista, uma operação que requer atenção e perspicácia da parte das instituições em um momento de transição da mídia, como este que estamos vivendo, quando esta se tornou realmente um importante componente na educação dos menores.
Não faltam filmes que atraem o público por causa de seu conteúdo de violência, e no entanto entram no circuito cinematográfico sem qualquer restrição de idade. Para um filme que é notícia nos jornais, existem muitos outros com conteúdos duvidosos ou até mesmo perigosos que conseguem passar através do filtro da comissão de revisão cinematográfica, que atualmente funciona junto ao departamento de cinema do Ministério dos Bens Culturais.
Ao mesmo tempo em que existe um projeto de lei do ministro dos Bens culturais, que deve ainda iniciar os trâmites parlamentares, novas situações se apresentam na Itália, com a autocensura de filmes, feita pelos produtores ou distribuidores cinematográficos, com a introdução de novas e mais específicas faixas etárias para as restrições visando os menores a partir dos 10 anos de idade. As restrições serão feitas baseando-se em uma avaliação classificatória dos conteúdos das obras e sucessivamente serão ainda analisadas por uma comissão de psicólogos, educadores e pais.
Este sistema se inspira no modelo americano da Motion Picture Association of America (MPAA), que há 40 anos representa os interesses da indústria do audiovisual americana no mundo. Funcionando a partir de regras bem precisas (estabelecidas ao longo dos anos, também segundo as sentenças dos tribunais federais nos vários Estados americanos e em base aos protestos dos cidadãos), a autocensura americana prevê a existência de uma única comissão competente para determinar as restrições do PG12 ao «restricted» 17 anos. Esta comissão é composta exclusivamente de pais, considerados os primeiros depositários da educação dos filhos, e representam transversalmente a audiência. Importantes sanções econômicas asseguram que o mecanismo de autocertificação corresponda efetivamente aos interesses dos cidadãos. No site da Motion Picture estão disponíveis aos pais os pontos de referência para a avaliação das obras de entretenimento e são publicadas as restrições aplicadas a cada filme que está em exibição nas salas de cinema. Geralmente as avaliações parecem muito mais severas em relação a outros países. Tudo isso, nos vários anos de sua aplicação, deu uma qualificação à indústria americana e seu correto serviço prestado aos ouvintes. Qualquer estrada que se pretenda seguir na Itália, é importante para as famílias que seja estimulado um mercado de produção adequado à infância: é justo que o mecanismo da indústria cinematográfica continue com o seu ritmo de produção, mas não é justo confundir as classificações de acesso ao produto, como qualquer indústria sabe muito bem.
No que se refere às normas européias de classificação dos filmes, e em geral de todo «entertainment» (neologismo anglo-saxão, que, no entanto encontra sua raiz etimológica na relação entre educação e jogo) acessível aos menores, deve ser citado o sistema NICAM, que funciona na Holanda há alguns anos. Fundado em 1999, o NICAM (Nederlands Instituut voor de Classificatie van Audiovisuele Media) se baseia na lei Media Act, onde os programas de grupos que tiveram a autorização para atividades de «broadcasting» não devem incluir obras audiovisuais que prejudiquem o desenvolvimento físico e psicológico de pessoas com menos de 16 anos de idade, seguindo as diretivas da União européia («Televisão sem fronteiras» IV).
O sistema de classificação preventiva funciona também na Grécia, com a lei 1.597, de maio de 1986, que prevê que antes da projeção nas salas de cinema, cada filme seja submetido pelo produtor ou pela sociedade de importação à Comissão para a juventude, que classifica o filme seja como adequado aos menores, ou proibido aos menores de 13 anos, ou de 17 anos ou ainda, nos casos mais graves, severamente inadequado aos menores. Esta comissão é um órgão do Ministério da Cultura e foi concebida procurando-se estabelecer certa proporcionalidade, sendo composta de representantes do Estado (Ministério da Cultura), das categorias ligadas ao cinema, de psicólogos especializados na educação, de sociólogos, dos jovens, dos educadores e dos pais.
Na Áustria, está em vigor um sistema de avaliação complexo, instituído em base a um princípio constitucional federal que confia a tutela dos menores, no que se refere ao cinema e em geral aos meios de comunicação de massa, à competência específica dos Lander. A lei nacional que engloba a regulamentação da mídia é a ORF-ACT, ou seja, a Austrian Broadcasting Corporation nº. 379/1984, que estabelece quais os critérios sobre os quais deve se basear a proteção aplicada a programas e filmes transmitidos na televisão ou através de outros canais mediáticos. No que se refere à exibição dos filmes, a avaliação preventiva das obras cinematográficas, para que sejam decididas as faixas etárias adequadas, é regulamentada pela lei austríaca para a tutela dos menores, a «Jugendschutzgesetz», aplicada através das leis dos Lander federais. Esta lei estabelece nove faixas de restrições de público a partir dos seis anos de idade, com uma sucessiva graduação que prevê restrições para 10, 12, 14 e 16 anos de idade. Para supervisionar o sistema de classificação cinematográfica, existe uma comissão junto ao Ministério da Educação, em Viena, que comunica seu parecer sobre a idoneidade dos filmes às autoridades locais. Geralmente e de maneira individual os Lander adotam as decisões da comissão, e é em âmbito local que se decide de sua aplicação.
Na Espanha, o artigo 20 da Constituição reconhece o direito do cidadão a exprimir e difundir livremente seu pensamento, suas idéias e suas opiniões através de qualquer meio de divulgação. Se por um lado o exercício de tais direitos «não pode ser restrito através de nenhum tipo de censura prévia», o mesmo artigo especifica que «estas liberdades têm o seu limite no respeito dos limites reconhecidos pelas normativas que exprimem este respeito, especialmente no direito à honra, à privacidade, à própria imagem e à proteção da juventude e da infância».
Baseando-se neste princípio, a qualificação dos filmes (Real decreto 81/1997) e das obras audiovisuais é feita antes de sua difusão, através do Instituto de cinematografia e das artes audiovisuais (ICAA), uma entidade autônoma, mas ao mesmo tempo ligada ao Ministério da Educação e Cultura através da secretaria de Estado para a cultura (ver site www.mcu.es).
A subdireção geral de fomento à indústria cinematográfica e do audiovisual, que faz parte do ICAA, se ocupa, dentre outras funções, da classificação em faixas etárias dos filmes e das outras obras audiovisuais em vista de sua exibição pública e para a sua distribuição. A comissão se encarrega de divulgar as informações sobre os filmes e programas audiovisuais, com classificação que vai desde as «salas X» até as restrições para cada faixa etária do público.
Os filmes de caráter pornográfico não podem receber subvenções do Estado e sua projeção nas salas prevê uma taxa suplementar, destinada em parte para estimular um fundo de proteção cinematográfica. A projeção destes filmes pode ser feita somente nas «salas X», onde não podem ser apresentados outros tipos de obras cinematográficas e onde é proibido o ingresso de menores de 18 anos.

CINEMA NA TV

Devido ao alto consumo de programas de televisão por parte dos menores e levando-se em conta as diretivas da União européia, que promovem a auto-regulamentação no âmbito nacional das emissoras de tv e a participação das famílias nesta obra educativa, há alguns anos estão em vigor na França, na Holanda, na Grã-Bretanha, na Grécia e na Itália os códigos de sinais, que servem para identificar tanto os filmes projetados na salas de cinema como aqueles transmitidos na televisão. A tutela dos menores no âmbito da televisão foi também feita adotando-se o chamado sistema «watershed» (separador das águas), que funciona segundo uma seleção de faixas horárias protegidas, algumas aconselhadas à visão dos menores, outras aconselhadas a todos e outras ainda, principalmente na programação noturna, indicadas somente a um público adulto.
A faixa de idade determinada pela classificação preventiva dos filmes tem obviamente uma repercussão na programação das chamadas faixas horárias protegidas ou distintas nas emissoras de televisão pública em todos os países europeus. A definição das linhas de conduta comuns está à base dos acordos de auto-regulamentação e de co-regulamentação dos programas de televisão, estabelecendo-se um código de procedimento comum para as emissoras tanto públicas como privadas. Criou-se assim uma base normativa, que é assumida pela autoridade do Estado e que recebe a confiança dos consumidores das emissoras públicas ou privadas que adotam este sistema de auto-regulamentação.
Para tornar visível aos adultos as classificações dos programas apropriados aos menores, muitas emissoras européias adotaram um sistema de sinais que através de símbolos, números, cores e sinais acústicos advertem ao público a respeito daquilo que está para ser transmitido.
Mas, apenas este sistema, assim como o de filtragem (tipo v-chip), não basta para garantir uma verdadeira tutela dos menores diante de um conjunto de imagens difíceis de serem decodificadas por um jovem. Deve-se pensar às imagens de guerra dos telejornais, dos filmes escabrosos ou às informações sobre os crimes hediondos, que muitas vezes têm como ambiente o próprio núcleo familiar.
É na colaboração entre Estado, produtores de programas audiovisuais e famílias que pode ser fundamentado um autêntico respeito dos menores que encoraje o crescimento positivo da criança em base aos valores fundamentais da pessoa humana.

4) CELULARES COM VÍDEO

Hoje a difusão dos celulares com vídeo chegou à Itália ao índice se 134%, o que significa que muitas pessoas possuem pelo menos dois celulares, inclusive os jovens e as crianças, que recebem este instrumento dos próprios pais. De fato, de duas crianças entre 8 e 13 anos de idade, uma delas tem um celular no bolso. Aquele que poderia ser um instrumento para controlar melhor os deslocamentos e as necessidades dos filhos, se revela no entanto um perigoso meio que pode expor a outro tipo de utilização por parte dos menores, que não se separam nunca do próprio celular, nem mesmo durante as aulas, como lamentam vários professores. Apesar do código de auto-regulamentação assinado pelas principais operadoras (Código de conduta para a oferta de serviços a pagamento em tutela dos menores), na realidade os novos serviços opcionais do celular o tornaram um «personal computer» capaz de permitir novos usos que antes não tinham.
Os desenvolvimentos tecnológicos que estão se verificando no campo da telefonia móvel – particularmente no que se refere à sinergia com a internet e a adoção dos sistemas DVB de vídeos-telefone – contribuem a aumentar a oportunidade de comunicação também para as novas gerações e, ao mesmo tempo, repropõem em novos termos a questão da tutela dos menores. As evoluções já previstas ulteriormente para os próximos anos e o número sempre crescente de pessoas envolvidas, pedem uma grande consciência social e uma constante atenção das pessoas e órgãos encarregados de garantir os direitos dos cidadãos.
Neste contexto devem ser reafirmados os direitos dos menores no campo da comunicação, dentre os quais certamente não está em último lugar aquele que se refere também à segurança diante dos riscos de indução a comportamentos ilícitos ou de acesso a conteúdos nocivos ou indesejados. Também neste campo é essencial o papel dos pais e, em geral, de todos aqueles que são chamados a ter uma função educativa. A maior segurança das crianças e dos jovens quanto ao acesso a conteúdos ilegais é um ponto que deve merecer atenção também através da maior conscientização dos pais e das mães, que devem se capacitar a conhecer e utilizar estes meios.
Para a «alfabetização» dos pais na utilização da mídia devem colaborar também as instituições públicas, promovendo um uso positivo das novas possibilidades tecnológicas. Às empresas cabe a responsabilidade de colocar no mercado um produto que dê garantias no que se refere à sua utilização pelos menores, superando os limites estabelecidos pelo código de auto-regulamentação assinado pelas operadoras de celulares. Devem também oferecer maiores informações aos adultos que assinam um contrato de utilização, como por exemplo a adoção de bloqueios automáticos de acesso a conteúdos nocivos, se o celular passa às mãos de um menor de idade.

5) VIDEOGAMES

Trata-se de uma indústria global, que conquistou os jovens e não apenas eles. Os números relativos à difusão repentina dos videogames indicam que existem 250 mil sites de videogames, cada um deles propõe uma série de títulos, muitos deles recheados de cenas de sexo e de violência. Uma pesquisa recente do Instituto italiano de medicina social (IIMS) coloca em evidência, entre outras coisas, a escassa informação por parte dos adultos a respeito dos videogames utilizados pelos filhos, o predomínio de temas violentas em mais de 30% de títulos não aconselhados aos menores, o predomínio de personagens virtuais normais que podem se tornar especiais, realizando ações extraordinárias.
Mas, o ponto de risco mais elevado se refere aos pequenos jogadores de videogames, crianças entre seis e nove anos de idade que se submetem a entrar tão intensamente no jogo virtual que chegam a formas de dissociação da realidade e solicitam um monitoramento muito atento da parte dos adultos. A mesma pesquisa indica a presença de videogames em 25% das famílias com crianças de três a cinco anos de idade e em 65,2% das famílias com crianças entre seis e 10 anos de idade. O que produz efeitos negativos no âmbito cognitivo das crianças não parece ser especificamente o meio, mas muito mais os elementos que criam a excitação, tais como a velocidade de produção do estímulo e da resposta, a velocidade das imagens, os efeitos especiais, os contrastes, a fragmentação da história, o binômio rumor-ação. O uso prolongado do jogo inibe, segundo alguns psicólogos, a área da capacidade crítica, provocando passividade e ao mesmo tempo agressividade na criança. Mas, não queremos demolir os videogames, porque existem aqueles que são muito adequados aos mais jovens, com valores de informação e de educação, seja também porque o uso deste meio é na realidade um passo na preparação da criança ao sucessivo e mais sofisticado, que é o uso da internet.
De qualquer maneira, os dados relativos à venda destes produtos de entretenimento mostram um crescimento em todos os lugares e a difusão deste meio é acompanhada de uma aceitação social (ou seria uma resignação?) sempre maior.
É urgente ampliar o percurso de conhecimento e das estratégias internacionais, para monitorar um mercado que está cada vez mais vasto. Parece urgente estabelecer modalidades operativas para o controle dos conteúdos e do sistema de sanções, seja para o produtor como para o vendedor dos serviços. O código de auto-regulamentação Pegi (derivado em 2003 do sistema de avaliação e classificação holandês, Nicam, que assinala os conteúdos inadequados aos menores), adotado pelos industriais de «entertainment» que produzem videogames, é a única forma de auto-regulamentação existente atualmente e que prevê sanções (raramente aplicadas, mesmo diante de casos graves evidentes) para os produtores que colocam no comércio os jogos com indicações de faixas etárias apenas aproximativas.
O código Pegi, ao qual a associação européia Isfe adere em 2002, é evidentemente insuficiente na sua função declarada de «fornecer aos consumidores as informações mais oportunas» e expostas no selo de produção. E, como o setor dos videogames tem hoje um volume de negócios que ultrapassa os 740 milhões de euros, envolvendo 24 milhões de jogadores (43% da população a partir dos quatro anos de idade), com uma venda dos produtos classificados para maiores de três anos de idade que chega aos quase 48% dos consumidores. É um dado que define o impacto deste gênero de meio sobre a infância e a adolescência, mostrando toda a sua periculosidade, seja pelo consumo de conteúdos inadequados, seja pelo excessivo número de horas dedicado neste passatempo, muitas vezes solitário e sem a presença de um adulto ao lado. Se for verdade, como sustenta a indústria, que a produção de videogames violentos é apenas uma mínima parte do mercado, é também verdade que esta representa a fatia mais importante do retorno econômico.
O interesse pelos videogames é alimentado pela sinergia com os filmes que inspiram o jogo homônimo e que torna sempre mais atrativo este gênero, principalmente para os adolescentes. Desta maneira é importante também neste campo o estabelecimento de regras precisas em defesa dos consumidores dentre o público jovem, mais exposto aos riscos destas novas formas de entretenimento cada vez mais sofisticadas e envolventes, por causa da combinação entre narrativa e efeitos gráficos.

6) PUBLICIDADE

O problema da tutela dos menores diante da publicidade se apresenta como um corolário, dentro do quadro mais amplo que regulamenta a difícil relação entre a mídia e as crianças. A televisão, e portanto também a publicidade, se constitui em uma fonte de perigo para os menores, isto é, para a maior parte das crianças, principalmente em idade pré-escolar, que devem saber fazer a diferença entre a publicidade e o resto da programação, e entre os programas de ficção e a realidade. Com essas considerações não significa que exista uma acrítica rejeição da publicidade em si mesma – à qual se reconhece, no entanto, onde proceda corretamente, uma função positiva no processo de formação, de crescimento crítico e de socialização do menor –, mas existe a necessidade de prever um sistema de regras destinado a garantir-lhe um uso adequado.
O efeito dos anúncios publicitários é tão grande que em alguns países estão sendo tomadas medidas drásticas a respeito. No Reino Unido, por exemplo, recentemente foram vetados os anúncios publicitários durante os programas destinados às crianças até nove anos de idade, a partir de 1º de janeiro de 2008 a medida se estenderá à programação para os jovens até 15 anos de idade e até o final de 2008 serão vetados em todos os canais dedicados aos menores. Apesar de se reconhecer que a publicidade serve para financiar os programas, aqueles dedicados às crianças terão que recorrer a outras fontes. Também na França começa a se impor uma «linha dura» a esse respeito: visto a alta incidência de publicidade de merendas, de sucos e doces em geral, a partir de agora os anúncios dedicados às crianças deverão ser precedidos de uma espécie de aviso, que orientará para uma alimentação adequada.
Mas, por que as crianças são tão frágeis diante dos apelos da publicidade? Na Itália, explica Paolo Landi, secretário geral da Adisconsum (Associação de defesa dos consumidores e do ambiente»), em um capítulo de seu estudo «Crianças da multimídia»: «Se consideramos que a publicidade não faz outra coisa que veicular um conhecimento imediatamente concretizável em um “ter”, ou em um “ser”, ou em um “fazer”, a criança absorve sem dificuldades os três componentes que são a obsessão dos expertos de marketing, isto é, o componente cognitivo (como fornecer informações indeléveis sobre um produto ou um serviço), o componente afetivo (como fazer o consumidor reagir de maneira emotiva) e o comportamental (como colocar o pequeno consumidor em movimento na direção da aquisição). A partir deste ponto de vista a criança é o público ideal, o consumidor a quem se pode vender qualquer coisa».
Na Itália está em vigor um código de autodisciplina publicitária que surgiu em 1966, em base a um acordo entre os profissionais do setor. Esta primeira forma de tutela, em grande parte com origem comunitária, tem como protagonistas entidades administrativas independentes: a Autoridade de controle da concorrência e do mercado de setor e a Autoridade de garantia para as comunicações e a editoria. Enquanto isso, para a auto-regulamentação, orientada pelas normas que constam do Código de autodisciplina publicitária, e agora também, embora com força jurídica diferente, pelo Código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual se reconhece um poder de decisão e de sanção, emanando uma ordem e intimando seu cumprimento.
Em todos os países onde a televisão serve de veículo às mensagens publicitárias, o mundo empresarial é plenamente consciente do enorme poder de influência que a publicidade tem sobre as crianças.



NORMATIVA INTERNACIONAL

O assunto relativo à tutela dos menores na mídia é um dos mais debatidos, seja no que se refere às normas nacionais, seja no âmbito internacional. Encontra-se diante da situação de precisar acertas as contas com toda a extensão da rede global da internet. O exemplo que, neste momento de transição, coloca mais em evidência a necessidade de estabelecer leis que estejam em condições de controlar o acesso e uso dos conteúdos nocivos para os menores, é exatamente o da internet. Qualquer pessoa no mundo pode abrir um site considerado «arriscado», contendo elementos ilegais e acessíveis a consumidores despreparados, disponibilizados por quem está do outro lado do mundo.
No que se refere aos princípios gerais no âmbito do direito internacional, é preciso recorrer principalmente à convenção da ONU sobre os direitos da criança, com sede em New York, ratificada pelo Parlamento italiano através da lei nº.176/1991. Esta garante à criança uma «consideração proeminente» também a respeito da liberdade, seja no se refere à expressão, seja quando tutela os conteúdos recebidos. Esta mesma convenção, em seu artigo 17, fala da relação entre menor e televisão, desejando «um sistema normativo que tutele o menor-consumidor, mesmo com todas as dificuldades que se apresentam», seja para individuar os fenômenos que devem ser monitorados, seja sobre as normativas possíveis.
No direito da União européia, tal tutela foi recentemente confirmada pela Carta dos direitos fundamentais da União, aprovada em Nice em 2000, cujo artigo 24 salienta que «os Estados membros reconhecem a importância da função exercida pelos meios de comunicação de massa e cuidam para que a criança possa ter acesso às informações e materiais... com a finalidade de promover o seu bem estar social, espiritual e moral, além de sua saúde física e mental». A normativa seguinte, 89/552/CEE, previu algumas restrições, seja no que se refere aos programas como para as mensagens publicitárias destinadas a este público». O artigo 22 desta normativa conduz a impedir a transmissão de programas que contenham cenas pornográficas ou de violência gratuita, ou outros programas inadequados a este público. Não podemos esquecer de mencionar a determinação expressa de «Televisão sem fronteiras», que está hoje em sua quinta versão atualizada, que o tema da tutela dos menores está relacionado com o estatuto geral dos direitos dos menores e corresponde ao disposto nos artigos 50 e 31 da Constituição italiana.
Se for claro que os princípios normativos são todos a favor da tutela dos menores, é também verdadeiro que uma tecnologia em contínua evolução colocou em crise as velhas regras do jogo. Mas também é claro que não se pode mais adiar a necessidade de estabelecer novos parâmetros normativos, para que as crianças possam utilizar os meios de comunicação próprios de seu tempo, com aproveitamento e serenidade também para as famílias.~

EDUCAÇÃO À MÍDIA NO MUNDO: PARA SABER MAIS

A difusão da educação à mídia é uma resposta à necessidade de se informar sobre as novidades no campo dos novos meios de comunicação. Em seguida citamos apenas alguns sites que em vários países oferecem maiores informações sobre como aprender a usar melhor a mídia, enfrentando a problemática da tutela dos menores e da alfabetização às novas tecnologias por parte dos adultos.
«The Media Awareness Nework-Réseau éducation médias» é uma organização canadense sem fins lucrativos, pioneira no desenvolvimento de programas sobre a educação à mídia. Com esta finalidade ela produz programas online em colaboração com organizações internacionais, convicta que, para interpretar as mensagens de informação, de entretenimento e comerciais, os jovens têm necessidade de instrumentos críticos válidos. Por isso é importante formar também os adultos (famílias e professores) sobre como funciona a mídia e como ela determina o estilo de vida.
A organização realiza uma ação contínua de monitoramento em relação à mídia (televisão, cinema, videogames, imprensa, publicidade, etc.), e sua seção dedicada aos pais oferece uma série de elementos para que estes reflitam com os filhos sobre esses meios, além da seção para os educadores, que inclui lições e materiais de apoio. Uma outra seção é dedicada à análise das questões ligadas à mídia, como a difusão de estereótipos, as representações de violência e da diversidade, a privacidade, a publicidade dirigida aos menores. Seu site é em inglês e francês (http://www.media-awareness.ca).
«Quai des images» é o site dedicado ao ensino de cinema e audiovisual organizado pelo Ministério da Educação francês. Ele propõe atividades ligadas à educação à imagem e de análise dos filmes em consonância com os programas escolares, agrupa os textos oficiais a respeito dos meios audiovisuais, oferece uma série de instrumentos de análise e de estudo completos sobre alguns filmes específicos e sobre certos autores em particular, informa sobre conferências, seminários, cursos e festivais sobre o mundo audiovisual e sua utilização em âmbito educativo e didático. Entre outras coisas, reúne também as propostas e as experiências feitas por professores e seus alunos nas escolas secundárias francesas no campo da educação à imagem, além de organizar um fórum de discussões aberto a todos sobre a educação à mídia (http://www.ac-nancy-metz.fr).
Sempre na França, está em funcionamento o blog «Zéro de conduite», organizado pelos professores e destinados a educadores, pais e estudantes. Promove o uso do cinema como instrumento pedagógico, dedicando-se especialmente à atualidade cinematográfica, mas sem esquecer os clássicos e os documentários. Com várias seções e espaços de aprofundamento, se propõe como um local de discussão de temas em um debate aberto (http://cinema-ducation.fluctuat.net).
A Universidade de Massachussetts organizou o Media Education Foundation – MEF, mídia de desafio, que produz e distribui documentários destinados a estimular o pensamento crítico e o debate sobre a relação entre aqueles que detêm o poder sobre a mídia, os conteúdos da mídia comercial, a exigência democrática de um livre fluxo de informações, as diversas representações de idéias e pensamentos e o direito dos cidadãos de informar e serem informados. Alguns destes temas são abordados criticamente, como a identidade do gênero na publicidade, a imagem de sexo nos videoclipes, o papel da mídia na construção da identidade cultural, mídia e saúde, etc. (http://www.mediaed.org/).

(a cura di M. F. D’A.)

 
At 9/17/2007 2:43 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

AS CRIANÇAS E A MÍDIA (II PARTE):
ACEITAR O DESAFIO EDUCATIVO


O tema da 41ª Jornada das Comunicações Sociais, «As crianças e os meios de comunicação: um desafio para a comunicação», nos convida a refletir a respeito de dois aspectos particularmente importantes. O primeiro é a formação das crianças, para que estejam em condições de receber de maneira crítica aquilo que vêem. O segundo é a formação à consciência e ao uso consciente da mídia, que está em contínua transformação tecnológica.
De fato, é o que especifica Bento XVI no início de sua mensagem, de 20 de maio de 2007, para a Jornada: «Os complexos desafios que a educação contemporânea deve enfrentar são muitas vezes ligados à grande influência dos meios de comunicação no nosso mundo. Como aspecto do fenômeno da globalização e estimulados pelo rápido desenvolvimento da tecnologia, os meios de comunicação delineiam fortemente o ambiente cultural (cf. João Paulo II, O rápido desenvolvimento, nº3). Na realidade, há quem afirma que a influência formativa da mídia está em competição com aquela da escola, da Igreja e, quem sabe, até com aquela da própria família».
De fato, como salienta o Pontifício conselho para as Comunicações Sociais, «para muitas pessoas, a realidade corresponde àquilo que os meios de comunicação definem como tal». Episódios recentes, como a utilização do celular na filmagem de violências nas salas de aula, abusos sofridos por pessoas deficientes, fenômenos de trote e de violência generalizada, demonstram como as crianças que crescem passando uma média de quatro horas por dia diante da televisão, sozinhos em casa, absorveram a lógica do «estou no vídeo, logo existo». Os psicólogos, os pedagogos e os estudiosos dos meios de comunicação estudam há tempos sobre as relações entre o consumo televisivo e o comportamento violento dos menores. Uma grande quantidade de pesquisas realizadas em muitos países ocidentais demonstra como esta correlação seja realmente inegável.


NOVAS LINGUAGENS

O fato que muitas crianças vivem completamente inseridas no mundo dos velhos e novos meios de comunicação, que estão cada vez mais frequentemente em correlação entre eles, é confirmado pela popularidade de alguns modelos televisivos, considerados tão efêmeros quanto penosos «momentos de glória», presentes nos programas com os maiores índices de audiência, dos «reality» aos «talk show», sem falar do «trash», que hoje se tornou um gênero de espetáculo.
Dentre as preferências demonstradas pelos adolescentes italianos que assistem televisão mais do que três horas por dia, encontramos, em primeiro lugar, a figura da «veline» (Ndt: misto de corista e coadjuvante na apresentação de programas populares da televisão italiana), enquanto outros da mesma idade se concentram no mais clássico exemplo, o do jogador de futebol. De toda maneira, a coisa mais importante é aparecer, pouco importa por qual motivo, de ser «alguém» ou «alguma coisa» no Olimpo mediático, mesmo que seja apenas por um instante.
Estes são os exemplos mais negativos dos condicionamentos derivados de um excessivo e acrítico uso dos meios de comunicação. Encontramo-nos diante de uma nova geração que cresceu na frente da televisão, capaz de usar as novas tecnologias que os próprios pais, que as adquiriram e as tornaram disponíveis, muitas vezes se encontram despreparados para utilizá-las.
Tanto é verdade que hoje em dia os filmes são vistos diretamente nos celulares e a televisão pode ser assistida na tela do computador. Hoje se telefona através da internet e graças ao download se descarrega os CDs e DVDs mais recentes, se filma e se faz foto com o celular, e assim por diante.
Nas casas, o vocabulário familiar se reduziu ao gênero dos sms e se fala tendo o som da televisão no fundo, se comunica através de e-mail, se faz «visita virtual» via computador, se percorre através de bibliotecas virtuais, tanto que as fichas e arquivos de papel evocam imagens do outro século, completamente em desuso.
A situação dos nossos filhos é diversa daquela da geração precedente, pois eles abriram seus olhos tendo diante de si estes cenários de profunda, contínua e envolvente transformação tecnológica. Eles se constituem aquela que os estudiosos chamam de geração nascida «com seis dedos»: além dos cinco dedos normais da mão, o sexto é o mouse do computador.
Com o aparecimento do mundo «virtual» da internet e dos videogames criou-se uma defasagem em relação à realidade verdadeira e própria. As duas dimensões parecem muitas vezes, e para muitos jovens, como universos paralelos, com conseqüências não indiferentes no plano do processo de amadurecimento. Têm grande sucesso os sites nos quais se prevê uma segunda vida (basta verificar os milhares de registros nos poucos meses de existência do site italiano de «Second Life», que em todo o mundo já tem sete milhões de inscritos), onde a simulação reproduz todas as situações da vida real. Apenas que tudo é falso, a começar da nova identidade, que pode ser escolhida e com ela se inicia a fazer parte deste mundo fora do mundo, onde se pode ser um «qualquer coisa». Isto é, ninguém.
Assim, o grande desafio cultural de hoje é propriamente a redefinição dos limites, que muitas vezes se apresentam demasiadamente instáveis. Isto é, redefinição dos limites entre o real e o virtual, superando a divisão digital que hoje separa as gerações adultas daqueles mais jovens.


OS JOVENS: PROTAGONISTAS OU VÍTIMAS DAS MUDANÇAS?

A linguagem deles é pobre, muitas vezes recheada de termos tirados do dicionário do internauta: clicar, chatar, messagiar, deletar, são alguns dos neologismos que fazem parte de seu vocabulário quotidiano. Falta uma dimensão humana da tecnologia que esteja em condições de traçar o perímetro cultural entre o real e o virtual. Assim a aldeia global difundiu uma quantidade de modelos comportamentais desviados, ou pelo menos discutíveis.
Desta maneira, os jovens que vivem a milhões de quilômetros de distância jogam o mesmo videogame, vêem o mesmo filme, assim como, de maneira transversal, absorvem modelos e comportamentos semelhantes. Muitas vezes os adultos têm menos domínio no uso das novas tecnologias e observam, com uma preocupação resignada diante de suas próprias limitações, as crianças que navegam facilmente na internet.
As raízes das dificuldades neste campo educativo são muito bem explicadas por Marina D’Amato, professora de sociologia da Universidade de Roma, que salienta: «Cada geração tem necessidade de se encontrar também em um mundo fantástico, que serve a interiorizar o paradigma do bom e do belo, do justo e do errado, do oportuno e do útil, também em relação aos exemplos que procedem da narrativa. Hoje nos encontramos em uma condição na qual os avós e os pais contam cada vez menos histórias aos filhos e aos netos, e este papel foi assumido pela televisão. Mas, na realidade, a televisão “exila” e “con-funde”, isto é, funde os modelos morais que são frutos de ânsias e problemas mal resolvidos, muito mais que de certezas. Embora estes se transformem com freqüência, a cada três ou quatro anos, o fato de serem repropostos continuamente faz com que se justaponham uns aos outros» (ver Come mediare i media, de Mario Russo).
Se for verdade que a televisão é o meio mais usado até a adolescência, imediatamente depois surge a grande atração pela internet. Esta passagem nasce de uma sintonia com a linguagem televisiva, que na idade infantil muitas vezes é ouvida durante muitas horas no dia. Esta linguagem se baseia em uma mediação da realidade e desta maneira ela ativa um processo de recepção que é de tipo emotivo.
Neste registro emocional é mais fácil acabar envolvido por situações e figuras capazes de se proporem como modelos identificadores, preservadores de sentido e de comportamentos a serem imitados.
O poder de concentrar uma vontade emulativa em alguns personagens, que correspondem particularmente às necessidades interiores do jovem (necessidades na maioria das vezes induzidas pela publicidade ou por modelos estimuladores), tem uma forte relação com a quantidade de horas que o jovem passa utilizando os novos ou os velhos meios de comunicação.


EDUCAÇÃO NECESSÁRIA

«A formação adequada a um uso correto dos meios de comunicação é essencial para o desenvolvimento cultural, moral e espiritual das crianças… Educar as crianças a serem seletivas no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja, da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos. Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia, com a certeza de que este difícil, embora gratificante, aspecto da condição de pais, é apoiado por toda a comunidade.»
As palavras do discurso de Bento XVI definem com grande clareza o paradigma de uma justa relação entre a mídia e os menores. Uma clareza que devemos agradecer ao magistério da Igreja, no momento em que o mundo da mídia parece ignorar a verdadeira problemática educativa das crianças e as expectativas de qualidade e de segurança exigidas pelas famílias no que se refere ao uso desses meios, seja do cinema aos videogames, da televisão à internet.
Diante da utilização destorcera do meio televisivo, o mais difundido dentre os meios de comunicação, a Igreja se interroga sobre o porquê da televisão não ter um papel educativo e por que os meios de comunicação não podem ser companheiros confiáveis para os jogos na fase de crescimento da criança. O anúncio de uma recente campanha sobre o uso da mídia, promovida pelo Ministério das Comunicações, mostra os vários membros da família que estão vendo a televisão ao lado de uma criança.
Que se trate do avô ou da mãe, a mensagem é a mesma: não deixar uma criança sozinha diante de um meio que, sem o apoio crítico educativo de um adulto, pode transmitir conteúdos inadequados à idade e à maturidade daquele que o vê. Sem esquecer as responsabilidades dos produtores televisivos, empenhados na organização dos programas, o papel da família é realmente insubstituível.
Se realmente o objetivo de quem administra a sociedade de produção televisiva, ou das multinacionais produtoras de videogames ou das operadoras de celulares, é o de promover e vender o produto, o bem estar psicofísico da criança está no centro do interesse dos educadores, sejam eles os professores ou, em primeiro lugar, os pais.
Isto explica bem a mensagem do Papa, que continua a sua análise, salientando que «educar as crianças a serem seletivos no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja e da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos (ver João Paulo II, «Familiaris Consortio», 76). Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia.»


CONTEÚDO DA MÍDIA

No panorama de uma revolução da multimídia, que está modificando transversalmente os hábitos, a mentalidade, os modelos e as linguagens, deve voltar ao centro do debate a tutela daquilo que é melhor para os menores. Sem acusar a «mídia», que enquanto tal não é nem boa nem má, o importante é partir de uma a análise do produto, para assim poder individuar conteúdos que sejam de melhor qualidade para as crianças e os adolescentes. Porque a televisão é um instrumento que abre janelas de conhecimento para o mundo e, se bem utilizada, de «má professora» pode se tornar uma preciosa fonte de estímulo para o crescimento humano e cultural.
A mesma coisa vale, e com mais razão, para a «rede» que engloba e compreende tudo, e para os videogames, onde, ao invés de violência e monstros, poderia se dedicar a produzir (e isso já ocorre em certos casos) histórias instrutivas e de conteúdo interessante.
Bento XVI coloca justamente em evidência as enormes possibilidades para que seja melhorado o conteúdo deste grande campo de produção multimídia: «A educação através da mídia deveria ser positiva. Colocando as crianças diante de um meio estética e moralmente excelente, estas recebem uma ajuda para que desenvolvam a própria opinião, a prudência e a capacidade de discernimento. É importante aqui reconhecer o valor fundamental do exemplo dos pais e as vantagens de introduzir os jovens aos clássicos da literatura infantil (…). A beleza, quase um espelho do divino, inspira e vivifica os corações e as mentes juvenis, enquanto a feiúra e a vulgaridade têm um impacto deprimente sobre os comportamentos». Diante de uma decadência geral do produto televisivo, a questão da qualidade aparece ainda mais forte e vibrante em grande parte de um público formado de famílias, que pede para não ser apenas um exército indistinto de ouvintes silenciosos, mas um público em condições de exprimir suas preferências por conteúdos formativos e informativos de bom nível.
A mensagem de Bento XVI continua, com algumas importantes indicações: «Como a educação em geral, aquela da mídia requer também uma formação ao exercício da liberdade. Trata-se de uma responsabilidade que compromete. Muitas vezes a liberdade é apresentada como uma incansável procura do prazer ou de novas experiências (…). Este desejo, sentido profundamente pelos pais e educadores, que é o de educar as crianças no caminho da beleza, da verdade e da bondade, pode ser apoiado pela indústria da mídia somente na medida em que se promove a dignidade fundamental do ser humano, o verdadeiro valor da vida familiar, as conquistas positivas e as metas da humanidade. A partir disso, a necessidade de que os meios de comunicação estejam empenhados na efetiva formação e no respeito da ética deve ser vista com interesse particular e com urgência não apenas pelos pais, mas também por aqueles que têm responsabilidade cívica».
Na realidade, nos encontramos na situação de ter que reconhecer que na Itália falta uma verdadeira «cultura da criança»: a situação é tão séria que no âmbito institucional procura-se dar uma nova organização geral para verificar e controlar os conteúdos dos setores de entretenimento, como os videogames, que até agora estão submetidos apenas a códigos de auto-regulamentação, feitos e codificados para uso e consumo pelas indústrias produtoras.
Uma vez mais, o primeiro e indispensável apoio à criança só pode vir da família e de uma relação mais estreita com os professores e educadores, exatamente como salienta Bento XVI, lembrando-nos que a preocupação educativa dos pais não deve se tornar uma preocupação genérica, mas uma atenção constante a tudo aquilo que diz respeito aos filhos.

A INDÚSTRIA DA MÍDIA

1) A TELEVISÃO

Se a televisão convencional se apresenta como um ramo de atividade já «maduro», no entanto se apresenta no horizonte a situação da mídia digital (satélite ou a cabo), também como uma plataforma que consente a ligação entre televisão, internet e outro tipo de mídia através do computador. No que se refere à qualidade da programação, apesar dos inúmeros bons propósitos anunciados no âmbito institucional, parece pequena a atenção às exigências dos menores em suas diversas faixas etárias. A programação para os menores, na realidade é confinada em redes e horários particulares, enquanto o resto da programação na faixa horária considerada «para todos» muitas vezes apresenta conteúdos inadequados aos jovens. Mas, quais são as expectativas das gerações de jovens no que se refere à televisão? É realmente verdade que preferem o «trash», os jogos com prêmios absurdos e as «velines»?
A partir de uma pesquisa recente feita pelo instituto Censis sobre «Comunicação, pluralismo social, sociedade aberta» (2005) surge que a relação entre os menores, e em particular dos adolescentes entre os 14 e 18 anos de idade, e a televisão é determinada por elementos de forte contradição e de passividade. Nessa faixa etária, 100% deles vêem televisão praticamente todos os dias, 86% acompanham um pouco de tudo, com uma relevante predileção pelos filmes (72%), por esporte (32%) e pelos «reality shows» (18%).
No entanto, a amostragem entrevistada não está realmente satisfeita com aquilo que vê. De fato, 36% dos adolescentes denunciam a vulgaridade difundida nos programas e 25% criticam a superficialidade. Dentre eles, 46% consideram a televisão como um meio que «invade», ao mesmo tempo em que é interessante notar que 25% consideram que em geral a programação televisiva alimenta nas crianças menores uma visão consumista da vida. Destes dados surge o contraste entre a procura de distração e a reprovação daquilo que lhes é proposto pela programação. Isto significa que o alto índice de procura não é um indicador de satisfação.
Considerando o axioma de que a televisão seja onipresente, fica claro que são os próprios jovens a pedirem uma maior atenção aos conteúdos: menos violência e menos vulgaridade. A exigência de uma regulamentação diversa, diz claramente o relatório do Censis, «não vem somente daqueles, pais e educadores, que estão preocupados pela possível influência negativa sobre os menores, mas se exprime nitidamente também através dos adolescentes, pelo menos de uma parte mais esperta e consciente dentre eles».
Para tutelar melhor os direitos dos menores, desde 2002 foi instituído junto ao Ministério das Comunicações um código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual aderiram os produtores de televisão, seja no âmbito nacional como local. Baseando-se nos princípios sobre a matéria existentes na Constituição italiana e na Convenção dos direitos da criança, estabelecida em 1989 pela ONU, a comissão que controla sua aplicação avaliou em todos estes anos de atividade os milhares de casos em que foram violadas as normas de tutela, que prevêem a transmissão de programas e imagens adequadas a um público de menores de idade durante aquela que é chamada de «faixa protegida» da programação televisiva (das 7h30 às 22h30), intervindo com denúncias e sanções, que nos casos mais graves foram aplicadas pela Autoridade de garantia no setor das comunicações. Para o futuro, esta comissão deverá se transformar em um organismo mais amplo de controle, que se chamará «Mídia e menores», que além da televisão deverá monitorar também os setores dos vídeos-telefone e dos videogames, além da internet, que é o campo de maior risco.

REGRAS DE TUTELA EM OUTROS PAÍSES

É diversa a situação em outros países, como por exemplo na Grã Bretanha, onde o sistema de regulamentação da mídia é estruturado e complexo e foi atualizado nas últimas décadas, com uma particular atenção à tutela dos menores. As inovações tecnológicas neste setor levaram as normativas inglesas a uma série de novas disposições, como por exemplo, a visão em casa de vídeo exclusivamente para adultos, e que fora de casa seriam vetados aos menores, ou o combate à praga mundial dos sites internet para os pedófilos, que contenham material pornográfico ou com conteúdos que possam esconder o aliciamento de menores (ver a Protection Childres Act, de 1978).
A programação televisiva é regulamentada pelo Broadcasting Act (1996), de onde deriva a instituição da Broadcasting Standard Commission (BSC), um órgão independente de controle que estabelece as normas de avaliação e classificação dos programas, também no que se refere aos conteúdos violentos ou que possam ofender a decência pública (site oficial www.bsc.org.uk). Este organismo BSC funciona internamente à estrutura do Broadcasting, supervisionando e regulamentando todas as emissoras de televisão e de rádio, via cabo ou por satélite. Sua tarefa é a de elaborar os códigos de conduta e de aplicação de modelos que respeitem a justiça, além de monitorar os modelos, verificando que respeitem as leis. Com a transmissão de programas com conteúdos considerados inadequados aos menores de várias idades, há alguns anos a televisão inglesa adotou o sistema «watershed», um «separador de águas» entre um horário de programação familiar e outro para os adultos. Todo o sistema televisivo inglês se apóia sobre a responsabilização das famílias, pois sem a colaboração delas qualquer código de modelos para os programas é praticamente inútil.
Na França, está vigorando já há anos um código através de sinais televisivos, que entra em função para assinalar os programas inadequados aos menores. A avaliação do programa televisivo é feita pelo Conseil Supérieur de l’Audiovisuel (CSA), uma autoridade administrativa independente, que controla a difusão dos filmes e outras transmissões em vários canais privados, nacionais, regionais ou locais. A normativa francesa (lei 719/2002) veta a transmissão de programas que possam prejudicar gravemente a integridade física, mental e moral dos menores, porque divulgam conteúdos de pornografia ou de violência gratuita. As transmissões são classificadas por um código de sinais que, em conjunto com um sistema organizado de faixas horárias de programação, garante às famílias mais clareza sobre os programas destinados aos menores.
Na Alemanha, o tema da infância tem particular atenção da legislação, que considera desde o nascimento o início dos direitos fundamentais do cidadão. A tutela é disciplinada no âmbito público pela JSchG (desde o dia 26 de fevereiro de 1985), enquanto a lei GjSM se ocupa do controle sobre a difusão de publicações e conteúdos mediáticos considerados danosos para os menores. A regulamentação no setor televisivo é feita segundo as normas do acordo sobre a radiodifusão dos Lander federais, que as entidades para a mídia nesses Lander adotaram por base para o estabelecimento das diretivas que tutelam o interesse dos menores nas emissoras privadas. Não são admitidas transmissões que incitem o ódio racial, que exaltem a violência ou a guerra, que ofendam a dignidade do homem, que sejam de gênero pornográfico, que mostrem pessoas moribundas ou com sofrimentos que ofendam a dignidade humana. Os responsáveis pela programação, escolhendo os horários das transmissões, devem cuidar para que os menores não vejam programas que podem prejudicar o seu bem estar psíquico, físico ou mental. As transmissões inadequadas às crianças menores podem ser transmitidas somente depois da autorização da entidade competente do Land interessado.
Os responsáveis pela organização dos programas televisivos em âmbito nacional devem nomear encarregados pela tutela dos menores, que atuam no momento da aquisição, da projeção e da realização dos programas. As emissoras privadas fundaram em 1993 uma associação de autocontrole voluntário da televisão («Freiwillige Selbskontrolle Fernsehen», FSF), à qual devem ser apresentados programas particulares, antes da sua transmissão, e suas avaliações consideradas nas decisões das entidades de controle da mídia nos Lander federais. Existe ainda o órgão comum do cidadão para a tutela dos menores, dos programas, da competência mediática e controle da mídia (GSJP), do qual faz parte um integrante da entidade para a mídia nos Lander federais, que dá o seu parecer a respeito de algumas séries, filmes e espetáculos mais ou menos adequados aos menores. Este órgão, o GSJP, decide sobre pedidos de mudança de horários de transmissão de filmes proibidos para menores, controla a forma de novos programas e experimenta novas disposições para a tutela dos menores na televisão digital. A peculiaridade da jurisdição alemã, seja no setor televisivo como no cinematográfico e da mídia em geral, é a minuciosa atenção às exigências com o desenvolvimento do menor e aos riscos que este pode correr com a observância incorreta das leis.
Nos Estados Unidos, é possível consultar via internet um «guia televisivo para os pais» (ver o site www.mpaa.org), que prevê algumas categorias de audiência aplicadas aos programas televisivos transmitidos a todo o público. Este guia organiza várias siglas para identificar a categoria de audiência para cada transmissão: vai-se do TVY (para todas as crianças) ao TVG (para todos), através de várias faixas etárias, que correspondem à passagem da primeira à segunda infância e desta à adolescência. Depois tem o TVPG («parental guidance», visto na presença de um dos pais), o TV14 («parent strongly cautioned», séria advertência aos pais), para os programas que contêm cenas de sexo e de violência. Enfim, há o TVMA, que prevê um «mature audience only», ou seja, destinado a um público de idade superior a 17 anos, última fronteira para os conteúdos considerados «restricted».
Estas avaliações foram elaboradas baseando-se nas opiniões dos próprios pais e são fáceis de serem encontradas e compreendidas. Esta linha de «guia de televisão para os pais» pode ser usada juntamente ao «v-chip», que é um dispositivo de filtro instalado na maior parte dos mais recentes modelos de aparelhos de televisão, para permitir aos pais de bloquear os programas inadequados.

FICHA 1
Brasil: «O que eu penso da tv»
No Brasil, a audiência infantil é muito alta: aproximadamente 30 milhões de crianças vêem televisão pelo menos durante três horas por dia. Explica a profa. Rosália Duarte, do departamento de Ciência da Educação, da PUC do Rio de Janeiro, que «as crianças são muito perspicazes, mas nós podemos e devemos ajudá-las a ampliar o seu quadro de referências, para que possam discutir ainda melhor sobre o conteúdos daquilo que vêem. Para isso temos necessidade, antes de tudo, de ouvir aquilo que elas têm a dizer sobre o assunto e de dialogar com elas. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e muito mais freqüente, a outras atividades culturais». No âmbito de uma pesquisa feita através de um questionário distribuído nas escolas, intitulado «O que eu penso da tv», apareceu que «as crianças querem seriamente ser ouvidas sobre aquilo que pensam da tv, mas sentem que sua opinião é considerada pouco importante e não estão contentes com o excesso de imagens de violência exibidas na televisão, principalmente a violência “real”, definida como aquela transmitida nos telejornais. Eles adoram ver televisão e não importa o que os adultos pensam e dizem a respeito disso. A eles agradam quase todos os tipos de programas transmitidos: novelas, desenhos animados, programas de humor, filmes, seriados, mas isso não faz deles espectadores “idiotas”, pois fazem críticas muito interessantes, pertinentes e bem elaboradas sobre o que consideram feio ou inadequado na televisão. Para a maior parte deles, a televisão se oferece como principal opção de divertimento (em alguns casos, a única), o que significa um dado muito preocupante. Mas, o que chamou mais a nossa atenção é o grau de experiência com o qual essas crianças analisam a televisão: são expertos e demonstram conhecer a televisão também do lado de dentro, inclusive as linguagens que ela utiliza, a sua estrutura de produção, a sua lógica interna e as suas maneiras de intervenção».
As crianças aprendem os valores e os não-valores através da televisão, não resta dúvida, mas demonstram ter senso crítico a respeito deste assunto, quando afirmam nos textos que os programas transmitidos na tv podem lhes ensinar «a serem bons, a ter coragem e a fazer o bem, a cuidar da natureza e de si mesmos, a serem honestos e a lutar por aquilo que desejam», mas também «a serem cruéis e mentirosos, a roubar e matar, a não respeitar os pais e a comprar tudo aquilo que não têm necessidade». Falando sobre a validade do ensino através da mídia, a profa. Duarte salienta a necessidade de «ouvir aquilo que têm a dizer sobre o assunto e a dialogar com eles. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e mais freqüente, a outras atividades culturais».

FICHA 2
Observadores internacionais
Os dados examinados em janeiro de 2006 pelo OssCom, que é um centro de pesquisa da mídia, deixam evidente a tendência a realizar uma forma de co-regulamentação, onde a ação legislativa dos Estados membros se integra com medidas de auto-regulamentação por parte dos produtores, broadcasters e profissionais da comunicação sob o efeito de controles e sanções. São dois os instrumentos mais utilizados no âmbito europeu, observando-se as diretivas previstas no artigo 22 de «Televisão sem fronteiras»: a definição de faixas horárias protegidas (watershed) e os sinais mostrados na tela (determinados por um sistema de «rating»). Apesar disso, aos campos tradicionalmente problemáticos da violência e da pornografia se juntam novos campos de risco para os menores: a vulgaridade, abusos e dependências de substâncias, linguagem e comportamento vulgares, discriminações e abusos, violações e ofensas à dignidade humana. Os critérios de avaliação dos programas se constituem um problema que é partilhado por muitos países da União européia, ao mesmo tempo em que se prepara uma uniformização internacional dos sistemas de classificação (ver mais adiante, Nicam), baseados na visualização de cinco ícones que ilustram simbolicamente qual é a problemática do programa que está sendo analisado e para quais idades ele é desaconselhado.
Deve ser assinalada a atividade online da European Medi@culture. O projeto é promovido pela Comissão Européia, em Bruxelas, no quadro das iniciativas «e-Learning», administrado pelo centro mediático de Baden-Württemberg. O site apresenta informações sobre a educação à mídia na Europa, particularmente na França, Áustria, Finlândia e Alemanha. A seção de projetos de multimídia agrupa os projetos sobre a mídia desenvolvidos por escolas e associações de jovens ao longo do tempo (ver http://www.european-mediaculture.org).

FICHA 3
África do Sul: Encontro mundial sobre a mídia para a infância
Este encontro trienal se realizou no último mês de março em Johannesburg, na África do Sul, com a participação de expertos do setor representando diversos países. Em conjunto se discutiu sobre a necessidade de uma programação adequada às crianças, procurando entender de que modo a violência na mídia pode influir sobre a psíquico dos menores.
Mas, no 5º Encontro mundial sobre a mídia para a infância apresentaram-se também muitas crianças provenientes de todo o mundo e empenhadas em discutir sobre o difícil tema da «Mídia como instrumento de paz e de democracia global». Vieram guiados por grupos de adultos, dentre eles as diversas organizações católicas que há anos trabalham para promover regras para o bem da infância, a serem respeitadas nas transmissões de rádio e televisão através de códigos de regulamentação que devem ser redigidos ou, como em alguns casos, apenas atualizados. Em muitos países do sul do mundo as novas tecnologias de multimídia já estão muito disseminadas e seu uso merece uma atenção particular para tutelar o público mais jovem.
Especialmente na África, explicou o organizador do encontro, Firdoze Bulbulia, começa-se a examinar o projeto de um «Media center» para as crianças, que possa produzir e distribuir transmissões de rádio e de televisão destinadas ao público mais jovem, com o objetivo de realizar um canal televisivo pan-africano dedicado à infância. Os organizadores do encontro estão também trabalhando no projeto de uma aliança africana dos meios de informação e de comunicação, seguindo o modelo daquela já existente na América latina.

2) INTERNET

Na Itália, 47% das famílias italianas têm um computador em casa, um dado relevante mas sempre muito baixo em relação à média dos outros países europeus. O uso da internet por parte dos adolescentes e jovens, e a familiaridade que têm com tudo aquilo que pode ser digitado ou «descarregado» da internet, apresenta não poucos problemas. Pela sua própria natureza de rede de comunicação global, o problema se apresenta em ótica internacional, procurando garantir a tutela dos menores através de precisos acordos com os provedores para um efetivo controle de conteúdo. No campo italiano, até 2006, a tutela dos menores tinha sido deixada nas mãos dos próprios provedores, que em 19 de novembro de 2003 assinaram um acordo de auto-regulamentação: o Codice Internet e Minori. Embora o acordo tenha sido estipulado entre os representantes dos vários provedores diante do Ministério para a Inovação e a Tecnologia, no entanto ele permanece um acordo privado, com lacunas, principalmente no que se refere às sanções que muitas vezes devem ser aplicadas. Em 2006, na seqüência de numerosos casos de violência sobre menores, muitos dos quais realizados através da difusão de material pedo-pornográfico (quando não se tratava de verdadeiro e próprio aliciamento de menores via internet), foi promulgada a lei 38 de 6 de fevereiro de 2006: «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet».
Enfim, como aplicação da lei 38/2006, em fevereiro da 2007 foi publicado um decreto determinando os requisitos técnicos dos instrumentos de filtragem que os provedores da rede internet devem utilizar para impedir o acesso aos sites já assinalados pelo Centro nacional contra a pedo-pornografia. Mas, isso não basta para superar as dificuldades e impedir que os menores possam navegar de maneira arriscada na «rede das redes».
Atualmente foi reativada a comissão anti-pedofilia e desvios de menores através da internet, o «Ciclope», que tinha sido instituída junto ao Ministério para a Eqüidade, do governo italiano, e que ficou inativa por um ano, até a sua reestruturação junto ao Ministério da Família. Está também para entrar em função um site dedicado ao uso da internet, junto ao Ministério das Comunicações, e um número telefônico de emergência gratuito, organizado pelo mesmo ministério e por «Save the children», que poderá ser utilizado por qualquer cidadão que queira assinalar algum abuso, desvio ou pedo-pornografia. Dentre as iniciativas mais recentes, deve ser assinalado o site www.tiseiconnesso.it criado pelo Ministério das Comunicações italiano, sempre em colaboração com «Save the children», onde é colocada à disposição uma série de informações sobre o conteúdo de certos sites, seja para os pais como para as próprias crianças, em conjunto com a campanha televisiva que tem como slogan «A melhor maneira de ajudar o seu filho a não usar incorretamente as novas tecnologias é conhecê-las».
Deve ser salientado também o fato de como a rede se tornou um grande mercado online. Para alguns produtores, o «e-commerce» de brinquedos corresponde já a 4% das vendas, e apenas em 2005 as vendas online corresponderam a 37.600 ações de compra. As razões para investir no processo online são múltiplas: desde a possibilidade de evitar as dificuldades logísticas de distribuição dos produtos, à ampliação de ofertas diferentes de produtos e também a possibilidade de envolvimento do cliente através de campanhas de mala direta e a criação de comunidades virtuais em torno de alguns produtos.

FICHAS:
Pedo-pornografia e internet
Em março de 2006, entraram em vigor as novas medidas diretas de combate e repressão ao fenômeno de exploração sexual dos menores e a pedo-pornografia, estabelecidas pela lei 38/2006 – «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet» foi publicada no Diário oficial em 15 de fevereiro de 2006, nº.38 – com a qual foram substancialmente modificados e integrados os artigos 600bis e seguintes do Código Penal italiano.
A lei confirma os artigos 527, 528, 529 e 725 do Código Penal italiano, que punem os «atos obscenos em local público, publicações, espetáculos obscenos, desenhos ou figuras que ofendem a decência pública».
Porque em muitas publicações, transmissões televisivas e anúncios publicitários, mesmo que não tenham declaradamente um caráter pornográfico, imagens de crianças e adolescentes são apresentadas de maneira explícita ou mais ou menos sutilmente ilusória e de forma falsa, pede-se um novo empenho das instituições competentes para que sejam observadas as normas em vigor e, se preciso for, que façam apelo aos órgãos de Polícia, o Instituto de autodisciplina publicitária, o Ministério das Comunicações, a Polícia postal ou a «Comissão tv e menor».

3) CINEMA

Confirmando as disposições da Constituição italiana, no que se refere ao direito e ao dever das famílias de serem protagonistas na educação de seus filhos, para muitos é chegada à hora de reelaborar a legislação que define o conceito de «censura» (a lei 161/1962 prevê a possibilidade de negar a autorização de abertura às salas de cinema ou de fazer cortes nos filmes, mesmo em função de um público adulto), que hoje está superado. É preciso com urgência estabelecer um critério de tutela dos menores não apenas no que se refere aos filmes que vêem nos circuitos cinematográficos, mas também sucessivamente em casa, muitas vezes em horários acessíveis na programação da televisão.
Uma avaliação correta e preventiva de um filme permite à família ter à sua disposição os instrumentos para escolher se um espetáculo é mais ou menos oportuno, conhecendo a trama, os eventuais conteúdos mais sensíveis, a classificação que a obra recebeu em outros países, etc. Por isso, é justo que a legislação seja revista, uma operação que requer atenção e perspicácia da parte das instituições em um momento de transição da mídia, como este que estamos vivendo, quando esta se tornou realmente um importante componente na educação dos menores.
Não faltam filmes que atraem o público por causa de seu conteúdo de violência, e no entanto entram no circuito cinematográfico sem qualquer restrição de idade. Para um filme que é notícia nos jornais, existem muitos outros com conteúdos duvidosos ou até mesmo perigosos que conseguem passar através do filtro da comissão de revisão cinematográfica, que atualmente funciona junto ao departamento de cinema do Ministério dos Bens Culturais.
Ao mesmo tempo em que existe um projeto de lei do ministro dos Bens culturais, que deve ainda iniciar os trâmites parlamentares, novas situações se apresentam na Itália, com a autocensura de filmes, feita pelos produtores ou distribuidores cinematográficos, com a introdução de novas e mais específicas faixas etárias para as restrições visando os menores a partir dos 10 anos de idade. As restrições serão feitas baseando-se em uma avaliação classificatória dos conteúdos das obras e sucessivamente serão ainda analisadas por uma comissão de psicólogos, educadores e pais.
Este sistema se inspira no modelo americano da Motion Picture Association of America (MPAA), que há 40 anos representa os interesses da indústria do audiovisual americana no mundo. Funcionando a partir de regras bem precisas (estabelecidas ao longo dos anos, também segundo as sentenças dos tribunais federais nos vários Estados americanos e em base aos protestos dos cidadãos), a autocensura americana prevê a existência de uma única comissão competente para determinar as restrições do PG12 ao «restricted» 17 anos. Esta comissão é composta exclusivamente de pais, considerados os primeiros depositários da educação dos filhos, e representam transversalmente a audiência. Importantes sanções econômicas asseguram que o mecanismo de autocertificação corresponda efetivamente aos interesses dos cidadãos. No site da Motion Picture estão disponíveis aos pais os pontos de referência para a avaliação das obras de entretenimento e são publicadas as restrições aplicadas a cada filme que está em exibição nas salas de cinema. Geralmente as avaliações parecem muito mais severas em relação a outros países. Tudo isso, nos vários anos de sua aplicação, deu uma qualificação à indústria americana e seu correto serviço prestado aos ouvintes. Qualquer estrada que se pretenda seguir na Itália, é importante para as famílias que seja estimulado um mercado de produção adequado à infância: é justo que o mecanismo da indústria cinematográfica continue com o seu ritmo de produção, mas não é justo confundir as classificações de acesso ao produto, como qualquer indústria sabe muito bem.
No que se refere às normas européias de classificação dos filmes, e em geral de todo «entertainment» (neologismo anglo-saxão, que, no entanto encontra sua raiz etimológica na relação entre educação e jogo) acessível aos menores, deve ser citado o sistema NICAM, que funciona na Holanda há alguns anos. Fundado em 1999, o NICAM (Nederlands Instituut voor de Classificatie van Audiovisuele Media) se baseia na lei Media Act, onde os programas de grupos que tiveram a autorização para atividades de «broadcasting» não devem incluir obras audiovisuais que prejudiquem o desenvolvimento físico e psicológico de pessoas com menos de 16 anos de idade, seguindo as diretivas da União européia («Televisão sem fronteiras» IV).
O sistema de classificação preventiva funciona também na Grécia, com a lei 1.597, de maio de 1986, que prevê que antes da projeção nas salas de cinema, cada filme seja submetido pelo produtor ou pela sociedade de importação à Comissão para a juventude, que classifica o filme seja como adequado aos menores, ou proibido aos menores de 13 anos, ou de 17 anos ou ainda, nos casos mais graves, severamente inadequado aos menores. Esta comissão é um órgão do Ministério da Cultura e foi concebida procurando-se estabelecer certa proporcionalidade, sendo composta de representantes do Estado (Ministério da Cultura), das categorias ligadas ao cinema, de psicólogos especializados na educação, de sociólogos, dos jovens, dos educadores e dos pais.
Na Áustria, está em vigor um sistema de avaliação complexo, instituído em base a um princípio constitucional federal que confia a tutela dos menores, no que se refere ao cinema e em geral aos meios de comunicação de massa, à competência específica dos Lander. A lei nacional que engloba a regulamentação da mídia é a ORF-ACT, ou seja, a Austrian Broadcasting Corporation nº. 379/1984, que estabelece quais os critérios sobre os quais deve se basear a proteção aplicada a programas e filmes transmitidos na televisão ou através de outros canais mediáticos. No que se refere à exibição dos filmes, a avaliação preventiva das obras cinematográficas, para que sejam decididas as faixas etárias adequadas, é regulamentada pela lei austríaca para a tutela dos menores, a «Jugendschutzgesetz», aplicada através das leis dos Lander federais. Esta lei estabelece nove faixas de restrições de público a partir dos seis anos de idade, com uma sucessiva graduação que prevê restrições para 10, 12, 14 e 16 anos de idade. Para supervisionar o sistema de classificação cinematográfica, existe uma comissão junto ao Ministério da Educação, em Viena, que comunica seu parecer sobre a idoneidade dos filmes às autoridades locais. Geralmente e de maneira individual os Lander adotam as decisões da comissão, e é em âmbito local que se decide de sua aplicação.
Na Espanha, o artigo 20 da Constituição reconhece o direito do cidadão a exprimir e difundir livremente seu pensamento, suas idéias e suas opiniões através de qualquer meio de divulgação. Se por um lado o exercício de tais direitos «não pode ser restrito através de nenhum tipo de censura prévia», o mesmo artigo especifica que «estas liberdades têm o seu limite no respeito dos limites reconhecidos pelas normativas que exprimem este respeito, especialmente no direito à honra, à privacidade, à própria imagem e à proteção da juventude e da infância».
Baseando-se neste princípio, a qualificação dos filmes (Real decreto 81/1997) e das obras audiovisuais é feita antes de sua difusão, através do Instituto de cinematografia e das artes audiovisuais (ICAA), uma entidade autônoma, mas ao mesmo tempo ligada ao Ministério da Educação e Cultura através da secretaria de Estado para a cultura (ver site www.mcu.es).
A subdireção geral de fomento à indústria cinematográfica e do audiovisual, que faz parte do ICAA, se ocupa, dentre outras funções, da classificação em faixas etárias dos filmes e das outras obras audiovisuais em vista de sua exibição pública e para a sua distribuição. A comissão se encarrega de divulgar as informações sobre os filmes e programas audiovisuais, com classificação que vai desde as «salas X» até as restrições para cada faixa etária do público.
Os filmes de caráter pornográfico não podem receber subvenções do Estado e sua projeção nas salas prevê uma taxa suplementar, destinada em parte para estimular um fundo de proteção cinematográfica. A projeção destes filmes pode ser feita somente nas «salas X», onde não podem ser apresentados outros tipos de obras cinematográficas e onde é proibido o ingresso de menores de 18 anos.

CINEMA NA TV

Devido ao alto consumo de programas de televisão por parte dos menores e levando-se em conta as diretivas da União européia, que promovem a auto-regulamentação no âmbito nacional das emissoras de tv e a participação das famílias nesta obra educativa, há alguns anos estão em vigor na França, na Holanda, na Grã-Bretanha, na Grécia e na Itália os códigos de sinais, que servem para identificar tanto os filmes projetados na salas de cinema como aqueles transmitidos na televisão. A tutela dos menores no âmbito da televisão foi também feita adotando-se o chamado sistema «watershed» (separador das águas), que funciona segundo uma seleção de faixas horárias protegidas, algumas aconselhadas à visão dos menores, outras aconselhadas a todos e outras ainda, principalmente na programação noturna, indicadas somente a um público adulto.
A faixa de idade determinada pela classificação preventiva dos filmes tem obviamente uma repercussão na programação das chamadas faixas horárias protegidas ou distintas nas emissoras de televisão pública em todos os países europeus. A definição das linhas de conduta comuns está à base dos acordos de auto-regulamentação e de co-regulamentação dos programas de televisão, estabelecendo-se um código de procedimento comum para as emissoras tanto públicas como privadas. Criou-se assim uma base normativa, que é assumida pela autoridade do Estado e que recebe a confiança dos consumidores das emissoras públicas ou privadas que adotam este sistema de auto-regulamentação.
Para tornar visível aos adultos as classificações dos programas apropriados aos menores, muitas emissoras européias adotaram um sistema de sinais que através de símbolos, números, cores e sinais acústicos advertem ao público a respeito daquilo que está para ser transmitido.
Mas, apenas este sistema, assim como o de filtragem (tipo v-chip), não basta para garantir uma verdadeira tutela dos menores diante de um conjunto de imagens difíceis de serem decodificadas por um jovem. Deve-se pensar às imagens de guerra dos telejornais, dos filmes escabrosos ou às informações sobre os crimes hediondos, que muitas vezes têm como ambiente o próprio núcleo familiar.
É na colaboração entre Estado, produtores de programas audiovisuais e famílias que pode ser fundamentado um autêntico respeito dos menores que encoraje o crescimento positivo da criança em base aos valores fundamentais da pessoa humana.

4) CELULARES COM VÍDEO

Hoje a difusão dos celulares com vídeo chegou à Itália ao índice se 134%, o que significa que muitas pessoas possuem pelo menos dois celulares, inclusive os jovens e as crianças, que recebem este instrumento dos próprios pais. De fato, de duas crianças entre 8 e 13 anos de idade, uma delas tem um celular no bolso. Aquele que poderia ser um instrumento para controlar melhor os deslocamentos e as necessidades dos filhos, se revela no entanto um perigoso meio que pode expor a outro tipo de utilização por parte dos menores, que não se separam nunca do próprio celular, nem mesmo durante as aulas, como lamentam vários professores. Apesar do código de auto-regulamentação assinado pelas principais operadoras (Código de conduta para a oferta de serviços a pagamento em tutela dos menores), na realidade os novos serviços opcionais do celular o tornaram um «personal computer» capaz de permitir novos usos que antes não tinham.
Os desenvolvimentos tecnológicos que estão se verificando no campo da telefonia móvel – particularmente no que se refere à sinergia com a internet e a adoção dos sistemas DVB de vídeos-telefone – contribuem a aumentar a oportunidade de comunicação também para as novas gerações e, ao mesmo tempo, repropõem em novos termos a questão da tutela dos menores. As evoluções já previstas ulteriormente para os próximos anos e o número sempre crescente de pessoas envolvidas, pedem uma grande consciência social e uma constante atenção das pessoas e órgãos encarregados de garantir os direitos dos cidadãos.
Neste contexto devem ser reafirmados os direitos dos menores no campo da comunicação, dentre os quais certamente não está em último lugar aquele que se refere também à segurança diante dos riscos de indução a comportamentos ilícitos ou de acesso a conteúdos nocivos ou indesejados. Também neste campo é essencial o papel dos pais e, em geral, de todos aqueles que são chamados a ter uma função educativa. A maior segurança das crianças e dos jovens quanto ao acesso a conteúdos ilegais é um ponto que deve merecer atenção também através da maior conscientização dos pais e das mães, que devem se capacitar a conhecer e utilizar estes meios.
Para a «alfabetização» dos pais na utilização da mídia devem colaborar também as instituições públicas, promovendo um uso positivo das novas possibilidades tecnológicas. Às empresas cabe a responsabilidade de colocar no mercado um produto que dê garantias no que se refere à sua utilização pelos menores, superando os limites estabelecidos pelo código de auto-regulamentação assinado pelas operadoras de celulares. Devem também oferecer maiores informações aos adultos que assinam um contrato de utilização, como por exemplo a adoção de bloqueios automáticos de acesso a conteúdos nocivos, se o celular passa às mãos de um menor de idade.

5) VIDEOGAMES

Trata-se de uma indústria global, que conquistou os jovens e não apenas eles. Os números relativos à difusão repentina dos videogames indicam que existem 250 mil sites de videogames, cada um deles propõe uma série de títulos, muitos deles recheados de cenas de sexo e de violência. Uma pesquisa recente do Instituto italiano de medicina social (IIMS) coloca em evidência, entre outras coisas, a escassa informação por parte dos adultos a respeito dos videogames utilizados pelos filhos, o predomínio de temas violentas em mais de 30% de títulos não aconselhados aos menores, o predomínio de personagens virtuais normais que podem se tornar especiais, realizando ações extraordinárias.
Mas, o ponto de risco mais elevado se refere aos pequenos jogadores de videogames, crianças entre seis e nove anos de idade que se submetem a entrar tão intensamente no jogo virtual que chegam a formas de dissociação da realidade e solicitam um monitoramento muito atento da parte dos adultos. A mesma pesquisa indica a presença de videogames em 25% das famílias com crianças de três a cinco anos de idade e em 65,2% das famílias com crianças entre seis e 10 anos de idade. O que produz efeitos negativos no âmbito cognitivo das crianças não parece ser especificamente o meio, mas muito mais os elementos que criam a excitação, tais como a velocidade de produção do estímulo e da resposta, a velocidade das imagens, os efeitos especiais, os contrastes, a fragmentação da história, o binômio rumor-ação. O uso prolongado do jogo inibe, segundo alguns psicólogos, a área da capacidade crítica, provocando passividade e ao mesmo tempo agressividade na criança. Mas, não queremos demolir os videogames, porque existem aqueles que são muito adequados aos mais jovens, com valores de informação e de educação, seja também porque o uso deste meio é na realidade um passo na preparação da criança ao sucessivo e mais sofisticado, que é o uso da internet.
De qualquer maneira, os dados relativos à venda destes produtos de entretenimento mostram um crescimento em todos os lugares e a difusão deste meio é acompanhada de uma aceitação social (ou seria uma resignação?) sempre maior.
É urgente ampliar o percurso de conhecimento e das estratégias internacionais, para monitorar um mercado que está cada vez mais vasto. Parece urgente estabelecer modalidades operativas para o controle dos conteúdos e do sistema de sanções, seja para o produtor como para o vendedor dos serviços. O código de auto-regulamentação Pegi (derivado em 2003 do sistema de avaliação e classificação holandês, Nicam, que assinala os conteúdos inadequados aos menores), adotado pelos industriais de «entertainment» que produzem videogames, é a única forma de auto-regulamentação existente atualmente e que prevê sanções (raramente aplicadas, mesmo diante de casos graves evidentes) para os produtores que colocam no comércio os jogos com indicações de faixas etárias apenas aproximativas.
O código Pegi, ao qual a associação européia Isfe adere em 2002, é evidentemente insuficiente na sua função declarada de «fornecer aos consumidores as informações mais oportunas» e expostas no selo de produção. E, como o setor dos videogames tem hoje um volume de negócios que ultrapassa os 740 milhões de euros, envolvendo 24 milhões de jogadores (43% da população a partir dos quatro anos de idade), com uma venda dos produtos classificados para maiores de três anos de idade que chega aos quase 48% dos consumidores. É um dado que define o impacto deste gênero de meio sobre a infância e a adolescência, mostrando toda a sua periculosidade, seja pelo consumo de conteúdos inadequados, seja pelo excessivo número de horas dedicado neste passatempo, muitas vezes solitário e sem a presença de um adulto ao lado. Se for verdade, como sustenta a indústria, que a produção de videogames violentos é apenas uma mínima parte do mercado, é também verdade que esta representa a fatia mais importante do retorno econômico.
O interesse pelos videogames é alimentado pela sinergia com os filmes que inspiram o jogo homônimo e que torna sempre mais atrativo este gênero, principalmente para os adolescentes. Desta maneira é importante também neste campo o estabelecimento de regras precisas em defesa dos consumidores dentre o público jovem, mais exposto aos riscos destas novas formas de entretenimento cada vez mais sofisticadas e envolventes, por causa da combinação entre narrativa e efeitos gráficos.

6) PUBLICIDADE

O problema da tutela dos menores diante da publicidade se apresenta como um corolário, dentro do quadro mais amplo que regulamenta a difícil relação entre a mídia e as crianças. A televisão, e portanto também a publicidade, se constitui em uma fonte de perigo para os menores, isto é, para a maior parte das crianças, principalmente em idade pré-escolar, que devem saber fazer a diferença entre a publicidade e o resto da programação, e entre os programas de ficção e a realidade. Com essas considerações não significa que exista uma acrítica rejeição da publicidade em si mesma – à qual se reconhece, no entanto, onde proceda corretamente, uma função positiva no processo de formação, de crescimento crítico e de socialização do menor –, mas existe a necessidade de prever um sistema de regras destinado a garantir-lhe um uso adequado.
O efeito dos anúncios publicitários é tão grande que em alguns países estão sendo tomadas medidas drásticas a respeito. No Reino Unido, por exemplo, recentemente foram vetados os anúncios publicitários durante os programas destinados às crianças até nove anos de idade, a partir de 1º de janeiro de 2008 a medida se estenderá à programação para os jovens até 15 anos de idade e até o final de 2008 serão vetados em todos os canais dedicados aos menores. Apesar de se reconhecer que a publicidade serve para financiar os programas, aqueles dedicados às crianças terão que recorrer a outras fontes. Também na França começa a se impor uma «linha dura» a esse respeito: visto a alta incidência de publicidade de merendas, de sucos e doces em geral, a partir de agora os anúncios dedicados às crianças deverão ser precedidos de uma espécie de aviso, que orientará para uma alimentação adequada.
Mas, por que as crianças são tão frágeis diante dos apelos da publicidade? Na Itália, explica Paolo Landi, secretário geral da Adisconsum (Associação de defesa dos consumidores e do ambiente»), em um capítulo de seu estudo «Crianças da multimídia»: «Se consideramos que a publicidade não faz outra coisa que veicular um conhecimento imediatamente concretizável em um “ter”, ou em um “ser”, ou em um “fazer”, a criança absorve sem dificuldades os três componentes que são a obsessão dos expertos de marketing, isto é, o componente cognitivo (como fornecer informações indeléveis sobre um produto ou um serviço), o componente afetivo (como fazer o consumidor reagir de maneira emotiva) e o comportamental (como colocar o pequeno consumidor em movimento na direção da aquisição). A partir deste ponto de vista a criança é o público ideal, o consumidor a quem se pode vender qualquer coisa».
Na Itália está em vigor um código de autodisciplina publicitária que surgiu em 1966, em base a um acordo entre os profissionais do setor. Esta primeira forma de tutela, em grande parte com origem comunitária, tem como protagonistas entidades administrativas independentes: a Autoridade de controle da concorrência e do mercado de setor e a Autoridade de garantia para as comunicações e a editoria. Enquanto isso, para a auto-regulamentação, orientada pelas normas que constam do Código de autodisciplina publicitária, e agora também, embora com força jurídica diferente, pelo Código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual se reconhece um poder de decisão e de sanção, emanando uma ordem e intimando seu cumprimento.
Em todos os países onde a televisão serve de veículo às mensagens publicitárias, o mundo empresarial é plenamente consciente do enorme poder de influência que a publicidade tem sobre as crianças.



NORMATIVA INTERNACIONAL

O assunto relativo à tutela dos menores na mídia é um dos mais debatidos, seja no que se refere às normas nacionais, seja no âmbito internacional. Encontra-se diante da situação de precisar acertas as contas com toda a extensão da rede global da internet. O exemplo que, neste momento de transição, coloca mais em evidência a necessidade de estabelecer leis que estejam em condições de controlar o acesso e uso dos conteúdos nocivos para os menores, é exatamente o da internet. Qualquer pessoa no mundo pode abrir um site considerado «arriscado», contendo elementos ilegais e acessíveis a consumidores despreparados, disponibilizados por quem está do outro lado do mundo.
No que se refere aos princípios gerais no âmbito do direito internacional, é preciso recorrer principalmente à convenção da ONU sobre os direitos da criança, com sede em New York, ratificada pelo Parlamento italiano através da lei nº.176/1991. Esta garante à criança uma «consideração proeminente» também a respeito da liberdade, seja no se refere à expressão, seja quando tutela os conteúdos recebidos. Esta mesma convenção, em seu artigo 17, fala da relação entre menor e televisão, desejando «um sistema normativo que tutele o menor-consumidor, mesmo com todas as dificuldades que se apresentam», seja para individuar os fenômenos que devem ser monitorados, seja sobre as normativas possíveis.
No direito da União européia, tal tutela foi recentemente confirmada pela Carta dos direitos fundamentais da União, aprovada em Nice em 2000, cujo artigo 24 salienta que «os Estados membros reconhecem a importância da função exercida pelos meios de comunicação de massa e cuidam para que a criança possa ter acesso às informações e materiais... com a finalidade de promover o seu bem estar social, espiritual e moral, além de sua saúde física e mental». A normativa seguinte, 89/552/CEE, previu algumas restrições, seja no que se refere aos programas como para as mensagens publicitárias destinadas a este público». O artigo 22 desta normativa conduz a impedir a transmissão de programas que contenham cenas pornográficas ou de violência gratuita, ou outros programas inadequados a este público. Não podemos esquecer de mencionar a determinação expressa de «Televisão sem fronteiras», que está hoje em sua quinta versão atualizada, que o tema da tutela dos menores está relacionado com o estatuto geral dos direitos dos menores e corresponde ao disposto nos artigos 50 e 31 da Constituição italiana.
Se for claro que os princípios normativos são todos a favor da tutela dos menores, é também verdadeiro que uma tecnologia em contínua evolução colocou em crise as velhas regras do jogo. Mas também é claro que não se pode mais adiar a necessidade de estabelecer novos parâmetros normativos, para que as crianças possam utilizar os meios de comunicação próprios de seu tempo, com aproveitamento e serenidade também para as famílias.~

EDUCAÇÃO À MÍDIA NO MUNDO: PARA SABER MAIS

A difusão da educação à mídia é uma resposta à necessidade de se informar sobre as novidades no campo dos novos meios de comunicação. Em seguida citamos apenas alguns sites que em vários países oferecem maiores informações sobre como aprender a usar melhor a mídia, enfrentando a problemática da tutela dos menores e da alfabetização às novas tecnologias por parte dos adultos.
«The Media Awareness Nework-Réseau éducation médias» é uma organização canadense sem fins lucrativos, pioneira no desenvolvimento de programas sobre a educação à mídia. Com esta finalidade ela produz programas online em colaboração com organizações internacionais, convicta que, para interpretar as mensagens de informação, de entretenimento e comerciais, os jovens têm necessidade de instrumentos críticos válidos. Por isso é importante formar também os adultos (famílias e professores) sobre como funciona a mídia e como ela determina o estilo de vida.
A organização realiza uma ação contínua de monitoramento em relação à mídia (televisão, cinema, videogames, imprensa, publicidade, etc.), e sua seção dedicada aos pais oferece uma série de elementos para que estes reflitam com os filhos sobre esses meios, além da seção para os educadores, que inclui lições e materiais de apoio. Uma outra seção é dedicada à análise das questões ligadas à mídia, como a difusão de estereótipos, as representações de violência e da diversidade, a privacidade, a publicidade dirigida aos menores. Seu site é em inglês e francês (http://www.media-awareness.ca).
«Quai des images» é o site dedicado ao ensino de cinema e audiovisual organizado pelo Ministério da Educação francês. Ele propõe atividades ligadas à educação à imagem e de análise dos filmes em consonância com os programas escolares, agrupa os textos oficiais a respeito dos meios audiovisuais, oferece uma série de instrumentos de análise e de estudo completos sobre alguns filmes específicos e sobre certos autores em particular, informa sobre conferências, seminários, cursos e festivais sobre o mundo audiovisual e sua utilização em âmbito educativo e didático. Entre outras coisas, reúne também as propostas e as experiências feitas por professores e seus alunos nas escolas secundárias francesas no campo da educação à imagem, além de organizar um fórum de discussões aberto a todos sobre a educação à mídia (http://www.ac-nancy-metz.fr).
Sempre na França, está em funcionamento o blog «Zéro de conduite», organizado pelos professores e destinados a educadores, pais e estudantes. Promove o uso do cinema como instrumento pedagógico, dedicando-se especialmente à atualidade cinematográfica, mas sem esquecer os clássicos e os documentários. Com várias seções e espaços de aprofundamento, se propõe como um local de discussão de temas em um debate aberto (http://cinema-ducation.fluctuat.net).
A Universidade de Massachussetts organizou o Media Education Foundation – MEF, mídia de desafio, que produz e distribui documentários destinados a estimular o pensamento crítico e o debate sobre a relação entre aqueles que detêm o poder sobre a mídia, os conteúdos da mídia comercial, a exigência democrática de um livre fluxo de informações, as diversas representações de idéias e pensamentos e o direito dos cidadãos de informar e serem informados. Alguns destes temas são abordados criticamente, como a identidade do gênero na publicidade, a imagem de sexo nos videoclipes, o papel da mídia na construção da identidade cultural, mídia e saúde, etc. (http://www.mediaed.org/).

(a cura di M. F. D’A.)

 
At 9/17/2007 2:43 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

AS CRIANÇAS E A MÍDIA (II PARTE):
ACEITAR O DESAFIO EDUCATIVO


O tema da 41ª Jornada das Comunicações Sociais, «As crianças e os meios de comunicação: um desafio para a comunicação», nos convida a refletir a respeito de dois aspectos particularmente importantes. O primeiro é a formação das crianças, para que estejam em condições de receber de maneira crítica aquilo que vêem. O segundo é a formação à consciência e ao uso consciente da mídia, que está em contínua transformação tecnológica.
De fato, é o que especifica Bento XVI no início de sua mensagem, de 20 de maio de 2007, para a Jornada: «Os complexos desafios que a educação contemporânea deve enfrentar são muitas vezes ligados à grande influência dos meios de comunicação no nosso mundo. Como aspecto do fenômeno da globalização e estimulados pelo rápido desenvolvimento da tecnologia, os meios de comunicação delineiam fortemente o ambiente cultural (cf. João Paulo II, O rápido desenvolvimento, nº3). Na realidade, há quem afirma que a influência formativa da mídia está em competição com aquela da escola, da Igreja e, quem sabe, até com aquela da própria família».
De fato, como salienta o Pontifício conselho para as Comunicações Sociais, «para muitas pessoas, a realidade corresponde àquilo que os meios de comunicação definem como tal». Episódios recentes, como a utilização do celular na filmagem de violências nas salas de aula, abusos sofridos por pessoas deficientes, fenômenos de trote e de violência generalizada, demonstram como as crianças que crescem passando uma média de quatro horas por dia diante da televisão, sozinhos em casa, absorveram a lógica do «estou no vídeo, logo existo». Os psicólogos, os pedagogos e os estudiosos dos meios de comunicação estudam há tempos sobre as relações entre o consumo televisivo e o comportamento violento dos menores. Uma grande quantidade de pesquisas realizadas em muitos países ocidentais demonstra como esta correlação seja realmente inegável.


NOVAS LINGUAGENS

O fato que muitas crianças vivem completamente inseridas no mundo dos velhos e novos meios de comunicação, que estão cada vez mais frequentemente em correlação entre eles, é confirmado pela popularidade de alguns modelos televisivos, considerados tão efêmeros quanto penosos «momentos de glória», presentes nos programas com os maiores índices de audiência, dos «reality» aos «talk show», sem falar do «trash», que hoje se tornou um gênero de espetáculo.
Dentre as preferências demonstradas pelos adolescentes italianos que assistem televisão mais do que três horas por dia, encontramos, em primeiro lugar, a figura da «veline» (Ndt: misto de corista e coadjuvante na apresentação de programas populares da televisão italiana), enquanto outros da mesma idade se concentram no mais clássico exemplo, o do jogador de futebol. De toda maneira, a coisa mais importante é aparecer, pouco importa por qual motivo, de ser «alguém» ou «alguma coisa» no Olimpo mediático, mesmo que seja apenas por um instante.
Estes são os exemplos mais negativos dos condicionamentos derivados de um excessivo e acrítico uso dos meios de comunicação. Encontramo-nos diante de uma nova geração que cresceu na frente da televisão, capaz de usar as novas tecnologias que os próprios pais, que as adquiriram e as tornaram disponíveis, muitas vezes se encontram despreparados para utilizá-las.
Tanto é verdade que hoje em dia os filmes são vistos diretamente nos celulares e a televisão pode ser assistida na tela do computador. Hoje se telefona através da internet e graças ao download se descarrega os CDs e DVDs mais recentes, se filma e se faz foto com o celular, e assim por diante.
Nas casas, o vocabulário familiar se reduziu ao gênero dos sms e se fala tendo o som da televisão no fundo, se comunica através de e-mail, se faz «visita virtual» via computador, se percorre através de bibliotecas virtuais, tanto que as fichas e arquivos de papel evocam imagens do outro século, completamente em desuso.
A situação dos nossos filhos é diversa daquela da geração precedente, pois eles abriram seus olhos tendo diante de si estes cenários de profunda, contínua e envolvente transformação tecnológica. Eles se constituem aquela que os estudiosos chamam de geração nascida «com seis dedos»: além dos cinco dedos normais da mão, o sexto é o mouse do computador.
Com o aparecimento do mundo «virtual» da internet e dos videogames criou-se uma defasagem em relação à realidade verdadeira e própria. As duas dimensões parecem muitas vezes, e para muitos jovens, como universos paralelos, com conseqüências não indiferentes no plano do processo de amadurecimento. Têm grande sucesso os sites nos quais se prevê uma segunda vida (basta verificar os milhares de registros nos poucos meses de existência do site italiano de «Second Life», que em todo o mundo já tem sete milhões de inscritos), onde a simulação reproduz todas as situações da vida real. Apenas que tudo é falso, a começar da nova identidade, que pode ser escolhida e com ela se inicia a fazer parte deste mundo fora do mundo, onde se pode ser um «qualquer coisa». Isto é, ninguém.
Assim, o grande desafio cultural de hoje é propriamente a redefinição dos limites, que muitas vezes se apresentam demasiadamente instáveis. Isto é, redefinição dos limites entre o real e o virtual, superando a divisão digital que hoje separa as gerações adultas daqueles mais jovens.


OS JOVENS: PROTAGONISTAS OU VÍTIMAS DAS MUDANÇAS?

A linguagem deles é pobre, muitas vezes recheada de termos tirados do dicionário do internauta: clicar, chatar, messagiar, deletar, são alguns dos neologismos que fazem parte de seu vocabulário quotidiano. Falta uma dimensão humana da tecnologia que esteja em condições de traçar o perímetro cultural entre o real e o virtual. Assim a aldeia global difundiu uma quantidade de modelos comportamentais desviados, ou pelo menos discutíveis.
Desta maneira, os jovens que vivem a milhões de quilômetros de distância jogam o mesmo videogame, vêem o mesmo filme, assim como, de maneira transversal, absorvem modelos e comportamentos semelhantes. Muitas vezes os adultos têm menos domínio no uso das novas tecnologias e observam, com uma preocupação resignada diante de suas próprias limitações, as crianças que navegam facilmente na internet.
As raízes das dificuldades neste campo educativo são muito bem explicadas por Marina D’Amato, professora de sociologia da Universidade de Roma, que salienta: «Cada geração tem necessidade de se encontrar também em um mundo fantástico, que serve a interiorizar o paradigma do bom e do belo, do justo e do errado, do oportuno e do útil, também em relação aos exemplos que procedem da narrativa. Hoje nos encontramos em uma condição na qual os avós e os pais contam cada vez menos histórias aos filhos e aos netos, e este papel foi assumido pela televisão. Mas, na realidade, a televisão “exila” e “con-funde”, isto é, funde os modelos morais que são frutos de ânsias e problemas mal resolvidos, muito mais que de certezas. Embora estes se transformem com freqüência, a cada três ou quatro anos, o fato de serem repropostos continuamente faz com que se justaponham uns aos outros» (ver Come mediare i media, de Mario Russo).
Se for verdade que a televisão é o meio mais usado até a adolescência, imediatamente depois surge a grande atração pela internet. Esta passagem nasce de uma sintonia com a linguagem televisiva, que na idade infantil muitas vezes é ouvida durante muitas horas no dia. Esta linguagem se baseia em uma mediação da realidade e desta maneira ela ativa um processo de recepção que é de tipo emotivo.
Neste registro emocional é mais fácil acabar envolvido por situações e figuras capazes de se proporem como modelos identificadores, preservadores de sentido e de comportamentos a serem imitados.
O poder de concentrar uma vontade emulativa em alguns personagens, que correspondem particularmente às necessidades interiores do jovem (necessidades na maioria das vezes induzidas pela publicidade ou por modelos estimuladores), tem uma forte relação com a quantidade de horas que o jovem passa utilizando os novos ou os velhos meios de comunicação.


EDUCAÇÃO NECESSÁRIA

«A formação adequada a um uso correto dos meios de comunicação é essencial para o desenvolvimento cultural, moral e espiritual das crianças… Educar as crianças a serem seletivas no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja, da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos. Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia, com a certeza de que este difícil, embora gratificante, aspecto da condição de pais, é apoiado por toda a comunidade.»
As palavras do discurso de Bento XVI definem com grande clareza o paradigma de uma justa relação entre a mídia e os menores. Uma clareza que devemos agradecer ao magistério da Igreja, no momento em que o mundo da mídia parece ignorar a verdadeira problemática educativa das crianças e as expectativas de qualidade e de segurança exigidas pelas famílias no que se refere ao uso desses meios, seja do cinema aos videogames, da televisão à internet.
Diante da utilização destorcera do meio televisivo, o mais difundido dentre os meios de comunicação, a Igreja se interroga sobre o porquê da televisão não ter um papel educativo e por que os meios de comunicação não podem ser companheiros confiáveis para os jogos na fase de crescimento da criança. O anúncio de uma recente campanha sobre o uso da mídia, promovida pelo Ministério das Comunicações, mostra os vários membros da família que estão vendo a televisão ao lado de uma criança.
Que se trate do avô ou da mãe, a mensagem é a mesma: não deixar uma criança sozinha diante de um meio que, sem o apoio crítico educativo de um adulto, pode transmitir conteúdos inadequados à idade e à maturidade daquele que o vê. Sem esquecer as responsabilidades dos produtores televisivos, empenhados na organização dos programas, o papel da família é realmente insubstituível.
Se realmente o objetivo de quem administra a sociedade de produção televisiva, ou das multinacionais produtoras de videogames ou das operadoras de celulares, é o de promover e vender o produto, o bem estar psicofísico da criança está no centro do interesse dos educadores, sejam eles os professores ou, em primeiro lugar, os pais.
Isto explica bem a mensagem do Papa, que continua a sua análise, salientando que «educar as crianças a serem seletivos no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja e da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos (ver João Paulo II, «Familiaris Consortio», 76). Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia.»


CONTEÚDO DA MÍDIA

No panorama de uma revolução da multimídia, que está modificando transversalmente os hábitos, a mentalidade, os modelos e as linguagens, deve voltar ao centro do debate a tutela daquilo que é melhor para os menores. Sem acusar a «mídia», que enquanto tal não é nem boa nem má, o importante é partir de uma a análise do produto, para assim poder individuar conteúdos que sejam de melhor qualidade para as crianças e os adolescentes. Porque a televisão é um instrumento que abre janelas de conhecimento para o mundo e, se bem utilizada, de «má professora» pode se tornar uma preciosa fonte de estímulo para o crescimento humano e cultural.
A mesma coisa vale, e com mais razão, para a «rede» que engloba e compreende tudo, e para os videogames, onde, ao invés de violência e monstros, poderia se dedicar a produzir (e isso já ocorre em certos casos) histórias instrutivas e de conteúdo interessante.
Bento XVI coloca justamente em evidência as enormes possibilidades para que seja melhorado o conteúdo deste grande campo de produção multimídia: «A educação através da mídia deveria ser positiva. Colocando as crianças diante de um meio estética e moralmente excelente, estas recebem uma ajuda para que desenvolvam a própria opinião, a prudência e a capacidade de discernimento. É importante aqui reconhecer o valor fundamental do exemplo dos pais e as vantagens de introduzir os jovens aos clássicos da literatura infantil (…). A beleza, quase um espelho do divino, inspira e vivifica os corações e as mentes juvenis, enquanto a feiúra e a vulgaridade têm um impacto deprimente sobre os comportamentos». Diante de uma decadência geral do produto televisivo, a questão da qualidade aparece ainda mais forte e vibrante em grande parte de um público formado de famílias, que pede para não ser apenas um exército indistinto de ouvintes silenciosos, mas um público em condições de exprimir suas preferências por conteúdos formativos e informativos de bom nível.
A mensagem de Bento XVI continua, com algumas importantes indicações: «Como a educação em geral, aquela da mídia requer também uma formação ao exercício da liberdade. Trata-se de uma responsabilidade que compromete. Muitas vezes a liberdade é apresentada como uma incansável procura do prazer ou de novas experiências (…). Este desejo, sentido profundamente pelos pais e educadores, que é o de educar as crianças no caminho da beleza, da verdade e da bondade, pode ser apoiado pela indústria da mídia somente na medida em que se promove a dignidade fundamental do ser humano, o verdadeiro valor da vida familiar, as conquistas positivas e as metas da humanidade. A partir disso, a necessidade de que os meios de comunicação estejam empenhados na efetiva formação e no respeito da ética deve ser vista com interesse particular e com urgência não apenas pelos pais, mas também por aqueles que têm responsabilidade cívica».
Na realidade, nos encontramos na situação de ter que reconhecer que na Itália falta uma verdadeira «cultura da criança»: a situação é tão séria que no âmbito institucional procura-se dar uma nova organização geral para verificar e controlar os conteúdos dos setores de entretenimento, como os videogames, que até agora estão submetidos apenas a códigos de auto-regulamentação, feitos e codificados para uso e consumo pelas indústrias produtoras.
Uma vez mais, o primeiro e indispensável apoio à criança só pode vir da família e de uma relação mais estreita com os professores e educadores, exatamente como salienta Bento XVI, lembrando-nos que a preocupação educativa dos pais não deve se tornar uma preocupação genérica, mas uma atenção constante a tudo aquilo que diz respeito aos filhos.

A INDÚSTRIA DA MÍDIA

1) A TELEVISÃO

Se a televisão convencional se apresenta como um ramo de atividade já «maduro», no entanto se apresenta no horizonte a situação da mídia digital (satélite ou a cabo), também como uma plataforma que consente a ligação entre televisão, internet e outro tipo de mídia através do computador. No que se refere à qualidade da programação, apesar dos inúmeros bons propósitos anunciados no âmbito institucional, parece pequena a atenção às exigências dos menores em suas diversas faixas etárias. A programação para os menores, na realidade é confinada em redes e horários particulares, enquanto o resto da programação na faixa horária considerada «para todos» muitas vezes apresenta conteúdos inadequados aos jovens. Mas, quais são as expectativas das gerações de jovens no que se refere à televisão? É realmente verdade que preferem o «trash», os jogos com prêmios absurdos e as «velines»?
A partir de uma pesquisa recente feita pelo instituto Censis sobre «Comunicação, pluralismo social, sociedade aberta» (2005) surge que a relação entre os menores, e em particular dos adolescentes entre os 14 e 18 anos de idade, e a televisão é determinada por elementos de forte contradição e de passividade. Nessa faixa etária, 100% deles vêem televisão praticamente todos os dias, 86% acompanham um pouco de tudo, com uma relevante predileção pelos filmes (72%), por esporte (32%) e pelos «reality shows» (18%).
No entanto, a amostragem entrevistada não está realmente satisfeita com aquilo que vê. De fato, 36% dos adolescentes denunciam a vulgaridade difundida nos programas e 25% criticam a superficialidade. Dentre eles, 46% consideram a televisão como um meio que «invade», ao mesmo tempo em que é interessante notar que 25% consideram que em geral a programação televisiva alimenta nas crianças menores uma visão consumista da vida. Destes dados surge o contraste entre a procura de distração e a reprovação daquilo que lhes é proposto pela programação. Isto significa que o alto índice de procura não é um indicador de satisfação.
Considerando o axioma de que a televisão seja onipresente, fica claro que são os próprios jovens a pedirem uma maior atenção aos conteúdos: menos violência e menos vulgaridade. A exigência de uma regulamentação diversa, diz claramente o relatório do Censis, «não vem somente daqueles, pais e educadores, que estão preocupados pela possível influência negativa sobre os menores, mas se exprime nitidamente também através dos adolescentes, pelo menos de uma parte mais esperta e consciente dentre eles».
Para tutelar melhor os direitos dos menores, desde 2002 foi instituído junto ao Ministério das Comunicações um código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual aderiram os produtores de televisão, seja no âmbito nacional como local. Baseando-se nos princípios sobre a matéria existentes na Constituição italiana e na Convenção dos direitos da criança, estabelecida em 1989 pela ONU, a comissão que controla sua aplicação avaliou em todos estes anos de atividade os milhares de casos em que foram violadas as normas de tutela, que prevêem a transmissão de programas e imagens adequadas a um público de menores de idade durante aquela que é chamada de «faixa protegida» da programação televisiva (das 7h30 às 22h30), intervindo com denúncias e sanções, que nos casos mais graves foram aplicadas pela Autoridade de garantia no setor das comunicações. Para o futuro, esta comissão deverá se transformar em um organismo mais amplo de controle, que se chamará «Mídia e menores», que além da televisão deverá monitorar também os setores dos vídeos-telefone e dos videogames, além da internet, que é o campo de maior risco.

REGRAS DE TUTELA EM OUTROS PAÍSES

É diversa a situação em outros países, como por exemplo na Grã Bretanha, onde o sistema de regulamentação da mídia é estruturado e complexo e foi atualizado nas últimas décadas, com uma particular atenção à tutela dos menores. As inovações tecnológicas neste setor levaram as normativas inglesas a uma série de novas disposições, como por exemplo, a visão em casa de vídeo exclusivamente para adultos, e que fora de casa seriam vetados aos menores, ou o combate à praga mundial dos sites internet para os pedófilos, que contenham material pornográfico ou com conteúdos que possam esconder o aliciamento de menores (ver a Protection Childres Act, de 1978).
A programação televisiva é regulamentada pelo Broadcasting Act (1996), de onde deriva a instituição da Broadcasting Standard Commission (BSC), um órgão independente de controle que estabelece as normas de avaliação e classificação dos programas, também no que se refere aos conteúdos violentos ou que possam ofender a decência pública (site oficial www.bsc.org.uk). Este organismo BSC funciona internamente à estrutura do Broadcasting, supervisionando e regulamentando todas as emissoras de televisão e de rádio, via cabo ou por satélite. Sua tarefa é a de elaborar os códigos de conduta e de aplicação de modelos que respeitem a justiça, além de monitorar os modelos, verificando que respeitem as leis. Com a transmissão de programas com conteúdos considerados inadequados aos menores de várias idades, há alguns anos a televisão inglesa adotou o sistema «watershed», um «separador de águas» entre um horário de programação familiar e outro para os adultos. Todo o sistema televisivo inglês se apóia sobre a responsabilização das famílias, pois sem a colaboração delas qualquer código de modelos para os programas é praticamente inútil.
Na França, está vigorando já há anos um código através de sinais televisivos, que entra em função para assinalar os programas inadequados aos menores. A avaliação do programa televisivo é feita pelo Conseil Supérieur de l’Audiovisuel (CSA), uma autoridade administrativa independente, que controla a difusão dos filmes e outras transmissões em vários canais privados, nacionais, regionais ou locais. A normativa francesa (lei 719/2002) veta a transmissão de programas que possam prejudicar gravemente a integridade física, mental e moral dos menores, porque divulgam conteúdos de pornografia ou de violência gratuita. As transmissões são classificadas por um código de sinais que, em conjunto com um sistema organizado de faixas horárias de programação, garante às famílias mais clareza sobre os programas destinados aos menores.
Na Alemanha, o tema da infância tem particular atenção da legislação, que considera desde o nascimento o início dos direitos fundamentais do cidadão. A tutela é disciplinada no âmbito público pela JSchG (desde o dia 26 de fevereiro de 1985), enquanto a lei GjSM se ocupa do controle sobre a difusão de publicações e conteúdos mediáticos considerados danosos para os menores. A regulamentação no setor televisivo é feita segundo as normas do acordo sobre a radiodifusão dos Lander federais, que as entidades para a mídia nesses Lander adotaram por base para o estabelecimento das diretivas que tutelam o interesse dos menores nas emissoras privadas. Não são admitidas transmissões que incitem o ódio racial, que exaltem a violência ou a guerra, que ofendam a dignidade do homem, que sejam de gênero pornográfico, que mostrem pessoas moribundas ou com sofrimentos que ofendam a dignidade humana. Os responsáveis pela programação, escolhendo os horários das transmissões, devem cuidar para que os menores não vejam programas que podem prejudicar o seu bem estar psíquico, físico ou mental. As transmissões inadequadas às crianças menores podem ser transmitidas somente depois da autorização da entidade competente do Land interessado.
Os responsáveis pela organização dos programas televisivos em âmbito nacional devem nomear encarregados pela tutela dos menores, que atuam no momento da aquisição, da projeção e da realização dos programas. As emissoras privadas fundaram em 1993 uma associação de autocontrole voluntário da televisão («Freiwillige Selbskontrolle Fernsehen», FSF), à qual devem ser apresentados programas particulares, antes da sua transmissão, e suas avaliações consideradas nas decisões das entidades de controle da mídia nos Lander federais. Existe ainda o órgão comum do cidadão para a tutela dos menores, dos programas, da competência mediática e controle da mídia (GSJP), do qual faz parte um integrante da entidade para a mídia nos Lander federais, que dá o seu parecer a respeito de algumas séries, filmes e espetáculos mais ou menos adequados aos menores. Este órgão, o GSJP, decide sobre pedidos de mudança de horários de transmissão de filmes proibidos para menores, controla a forma de novos programas e experimenta novas disposições para a tutela dos menores na televisão digital. A peculiaridade da jurisdição alemã, seja no setor televisivo como no cinematográfico e da mídia em geral, é a minuciosa atenção às exigências com o desenvolvimento do menor e aos riscos que este pode correr com a observância incorreta das leis.
Nos Estados Unidos, é possível consultar via internet um «guia televisivo para os pais» (ver o site www.mpaa.org), que prevê algumas categorias de audiência aplicadas aos programas televisivos transmitidos a todo o público. Este guia organiza várias siglas para identificar a categoria de audiência para cada transmissão: vai-se do TVY (para todas as crianças) ao TVG (para todos), através de várias faixas etárias, que correspondem à passagem da primeira à segunda infância e desta à adolescência. Depois tem o TVPG («parental guidance», visto na presença de um dos pais), o TV14 («parent strongly cautioned», séria advertência aos pais), para os programas que contêm cenas de sexo e de violência. Enfim, há o TVMA, que prevê um «mature audience only», ou seja, destinado a um público de idade superior a 17 anos, última fronteira para os conteúdos considerados «restricted».
Estas avaliações foram elaboradas baseando-se nas opiniões dos próprios pais e são fáceis de serem encontradas e compreendidas. Esta linha de «guia de televisão para os pais» pode ser usada juntamente ao «v-chip», que é um dispositivo de filtro instalado na maior parte dos mais recentes modelos de aparelhos de televisão, para permitir aos pais de bloquear os programas inadequados.

FICHA 1
Brasil: «O que eu penso da tv»
No Brasil, a audiência infantil é muito alta: aproximadamente 30 milhões de crianças vêem televisão pelo menos durante três horas por dia. Explica a profa. Rosália Duarte, do departamento de Ciência da Educação, da PUC do Rio de Janeiro, que «as crianças são muito perspicazes, mas nós podemos e devemos ajudá-las a ampliar o seu quadro de referências, para que possam discutir ainda melhor sobre o conteúdos daquilo que vêem. Para isso temos necessidade, antes de tudo, de ouvir aquilo que elas têm a dizer sobre o assunto e de dialogar com elas. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e muito mais freqüente, a outras atividades culturais». No âmbito de uma pesquisa feita através de um questionário distribuído nas escolas, intitulado «O que eu penso da tv», apareceu que «as crianças querem seriamente ser ouvidas sobre aquilo que pensam da tv, mas sentem que sua opinião é considerada pouco importante e não estão contentes com o excesso de imagens de violência exibidas na televisão, principalmente a violência “real”, definida como aquela transmitida nos telejornais. Eles adoram ver televisão e não importa o que os adultos pensam e dizem a respeito disso. A eles agradam quase todos os tipos de programas transmitidos: novelas, desenhos animados, programas de humor, filmes, seriados, mas isso não faz deles espectadores “idiotas”, pois fazem críticas muito interessantes, pertinentes e bem elaboradas sobre o que consideram feio ou inadequado na televisão. Para a maior parte deles, a televisão se oferece como principal opção de divertimento (em alguns casos, a única), o que significa um dado muito preocupante. Mas, o que chamou mais a nossa atenção é o grau de experiência com o qual essas crianças analisam a televisão: são expertos e demonstram conhecer a televisão também do lado de dentro, inclusive as linguagens que ela utiliza, a sua estrutura de produção, a sua lógica interna e as suas maneiras de intervenção».
As crianças aprendem os valores e os não-valores através da televisão, não resta dúvida, mas demonstram ter senso crítico a respeito deste assunto, quando afirmam nos textos que os programas transmitidos na tv podem lhes ensinar «a serem bons, a ter coragem e a fazer o bem, a cuidar da natureza e de si mesmos, a serem honestos e a lutar por aquilo que desejam», mas também «a serem cruéis e mentirosos, a roubar e matar, a não respeitar os pais e a comprar tudo aquilo que não têm necessidade». Falando sobre a validade do ensino através da mídia, a profa. Duarte salienta a necessidade de «ouvir aquilo que têm a dizer sobre o assunto e a dialogar com eles. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e mais freqüente, a outras atividades culturais».

FICHA 2
Observadores internacionais
Os dados examinados em janeiro de 2006 pelo OssCom, que é um centro de pesquisa da mídia, deixam evidente a tendência a realizar uma forma de co-regulamentação, onde a ação legislativa dos Estados membros se integra com medidas de auto-regulamentação por parte dos produtores, broadcasters e profissionais da comunicação sob o efeito de controles e sanções. São dois os instrumentos mais utilizados no âmbito europeu, observando-se as diretivas previstas no artigo 22 de «Televisão sem fronteiras»: a definição de faixas horárias protegidas (watershed) e os sinais mostrados na tela (determinados por um sistema de «rating»). Apesar disso, aos campos tradicionalmente problemáticos da violência e da pornografia se juntam novos campos de risco para os menores: a vulgaridade, abusos e dependências de substâncias, linguagem e comportamento vulgares, discriminações e abusos, violações e ofensas à dignidade humana. Os critérios de avaliação dos programas se constituem um problema que é partilhado por muitos países da União européia, ao mesmo tempo em que se prepara uma uniformização internacional dos sistemas de classificação (ver mais adiante, Nicam), baseados na visualização de cinco ícones que ilustram simbolicamente qual é a problemática do programa que está sendo analisado e para quais idades ele é desaconselhado.
Deve ser assinalada a atividade online da European Medi@culture. O projeto é promovido pela Comissão Européia, em Bruxelas, no quadro das iniciativas «e-Learning», administrado pelo centro mediático de Baden-Württemberg. O site apresenta informações sobre a educação à mídia na Europa, particularmente na França, Áustria, Finlândia e Alemanha. A seção de projetos de multimídia agrupa os projetos sobre a mídia desenvolvidos por escolas e associações de jovens ao longo do tempo (ver http://www.european-mediaculture.org).

FICHA 3
África do Sul: Encontro mundial sobre a mídia para a infância
Este encontro trienal se realizou no último mês de março em Johannesburg, na África do Sul, com a participação de expertos do setor representando diversos países. Em conjunto se discutiu sobre a necessidade de uma programação adequada às crianças, procurando entender de que modo a violência na mídia pode influir sobre a psíquico dos menores.
Mas, no 5º Encontro mundial sobre a mídia para a infância apresentaram-se também muitas crianças provenientes de todo o mundo e empenhadas em discutir sobre o difícil tema da «Mídia como instrumento de paz e de democracia global». Vieram guiados por grupos de adultos, dentre eles as diversas organizações católicas que há anos trabalham para promover regras para o bem da infância, a serem respeitadas nas transmissões de rádio e televisão através de códigos de regulamentação que devem ser redigidos ou, como em alguns casos, apenas atualizados. Em muitos países do sul do mundo as novas tecnologias de multimídia já estão muito disseminadas e seu uso merece uma atenção particular para tutelar o público mais jovem.
Especialmente na África, explicou o organizador do encontro, Firdoze Bulbulia, começa-se a examinar o projeto de um «Media center» para as crianças, que possa produzir e distribuir transmissões de rádio e de televisão destinadas ao público mais jovem, com o objetivo de realizar um canal televisivo pan-africano dedicado à infância. Os organizadores do encontro estão também trabalhando no projeto de uma aliança africana dos meios de informação e de comunicação, seguindo o modelo daquela já existente na América latina.

2) INTERNET

Na Itália, 47% das famílias italianas têm um computador em casa, um dado relevante mas sempre muito baixo em relação à média dos outros países europeus. O uso da internet por parte dos adolescentes e jovens, e a familiaridade que têm com tudo aquilo que pode ser digitado ou «descarregado» da internet, apresenta não poucos problemas. Pela sua própria natureza de rede de comunicação global, o problema se apresenta em ótica internacional, procurando garantir a tutela dos menores através de precisos acordos com os provedores para um efetivo controle de conteúdo. No campo italiano, até 2006, a tutela dos menores tinha sido deixada nas mãos dos próprios provedores, que em 19 de novembro de 2003 assinaram um acordo de auto-regulamentação: o Codice Internet e Minori. Embora o acordo tenha sido estipulado entre os representantes dos vários provedores diante do Ministério para a Inovação e a Tecnologia, no entanto ele permanece um acordo privado, com lacunas, principalmente no que se refere às sanções que muitas vezes devem ser aplicadas. Em 2006, na seqüência de numerosos casos de violência sobre menores, muitos dos quais realizados através da difusão de material pedo-pornográfico (quando não se tratava de verdadeiro e próprio aliciamento de menores via internet), foi promulgada a lei 38 de 6 de fevereiro de 2006: «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet».
Enfim, como aplicação da lei 38/2006, em fevereiro da 2007 foi publicado um decreto determinando os requisitos técnicos dos instrumentos de filtragem que os provedores da rede internet devem utilizar para impedir o acesso aos sites já assinalados pelo Centro nacional contra a pedo-pornografia. Mas, isso não basta para superar as dificuldades e impedir que os menores possam navegar de maneira arriscada na «rede das redes».
Atualmente foi reativada a comissão anti-pedofilia e desvios de menores através da internet, o «Ciclope», que tinha sido instituída junto ao Ministério para a Eqüidade, do governo italiano, e que ficou inativa por um ano, até a sua reestruturação junto ao Ministério da Família. Está também para entrar em função um site dedicado ao uso da internet, junto ao Ministério das Comunicações, e um número telefônico de emergência gratuito, organizado pelo mesmo ministério e por «Save the children», que poderá ser utilizado por qualquer cidadão que queira assinalar algum abuso, desvio ou pedo-pornografia. Dentre as iniciativas mais recentes, deve ser assinalado o site www.tiseiconnesso.it criado pelo Ministério das Comunicações italiano, sempre em colaboração com «Save the children», onde é colocada à disposição uma série de informações sobre o conteúdo de certos sites, seja para os pais como para as próprias crianças, em conjunto com a campanha televisiva que tem como slogan «A melhor maneira de ajudar o seu filho a não usar incorretamente as novas tecnologias é conhecê-las».
Deve ser salientado também o fato de como a rede se tornou um grande mercado online. Para alguns produtores, o «e-commerce» de brinquedos corresponde já a 4% das vendas, e apenas em 2005 as vendas online corresponderam a 37.600 ações de compra. As razões para investir no processo online são múltiplas: desde a possibilidade de evitar as dificuldades logísticas de distribuição dos produtos, à ampliação de ofertas diferentes de produtos e também a possibilidade de envolvimento do cliente através de campanhas de mala direta e a criação de comunidades virtuais em torno de alguns produtos.

FICHAS:
Pedo-pornografia e internet
Em março de 2006, entraram em vigor as novas medidas diretas de combate e repressão ao fenômeno de exploração sexual dos menores e a pedo-pornografia, estabelecidas pela lei 38/2006 – «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet» foi publicada no Diário oficial em 15 de fevereiro de 2006, nº.38 – com a qual foram substancialmente modificados e integrados os artigos 600bis e seguintes do Código Penal italiano.
A lei confirma os artigos 527, 528, 529 e 725 do Código Penal italiano, que punem os «atos obscenos em local público, publicações, espetáculos obscenos, desenhos ou figuras que ofendem a decência pública».
Porque em muitas publicações, transmissões televisivas e anúncios publicitários, mesmo que não tenham declaradamente um caráter pornográfico, imagens de crianças e adolescentes são apresentadas de maneira explícita ou mais ou menos sutilmente ilusória e de forma falsa, pede-se um novo empenho das instituições competentes para que sejam observadas as normas em vigor e, se preciso for, que façam apelo aos órgãos de Polícia, o Instituto de autodisciplina publicitária, o Ministério das Comunicações, a Polícia postal ou a «Comissão tv e menor».

3) CINEMA

Confirmando as disposições da Constituição italiana, no que se refere ao direito e ao dever das famílias de serem protagonistas na educação de seus filhos, para muitos é chegada à hora de reelaborar a legislação que define o conceito de «censura» (a lei 161/1962 prevê a possibilidade de negar a autorização de abertura às salas de cinema ou de fazer cortes nos filmes, mesmo em função de um público adulto), que hoje está superado. É preciso com urgência estabelecer um critério de tutela dos menores não apenas no que se refere aos filmes que vêem nos circuitos cinematográficos, mas também sucessivamente em casa, muitas vezes em horários acessíveis na programação da televisão.
Uma avaliação correta e preventiva de um filme permite à família ter à sua disposição os instrumentos para escolher se um espetáculo é mais ou menos oportuno, conhecendo a trama, os eventuais conteúdos mais sensíveis, a classificação que a obra recebeu em outros países, etc. Por isso, é justo que a legislação seja revista, uma operação que requer atenção e perspicácia da parte das instituições em um momento de transição da mídia, como este que estamos vivendo, quando esta se tornou realmente um importante componente na educação dos menores.
Não faltam filmes que atraem o público por causa de seu conteúdo de violência, e no entanto entram no circuito cinematográfico sem qualquer restrição de idade. Para um filme que é notícia nos jornais, existem muitos outros com conteúdos duvidosos ou até mesmo perigosos que conseguem passar através do filtro da comissão de revisão cinematográfica, que atualmente funciona junto ao departamento de cinema do Ministério dos Bens Culturais.
Ao mesmo tempo em que existe um projeto de lei do ministro dos Bens culturais, que deve ainda iniciar os trâmites parlamentares, novas situações se apresentam na Itália, com a autocensura de filmes, feita pelos produtores ou distribuidores cinematográficos, com a introdução de novas e mais específicas faixas etárias para as restrições visando os menores a partir dos 10 anos de idade. As restrições serão feitas baseando-se em uma avaliação classificatória dos conteúdos das obras e sucessivamente serão ainda analisadas por uma comissão de psicólogos, educadores e pais.
Este sistema se inspira no modelo americano da Motion Picture Association of America (MPAA), que há 40 anos representa os interesses da indústria do audiovisual americana no mundo. Funcionando a partir de regras bem precisas (estabelecidas ao longo dos anos, também segundo as sentenças dos tribunais federais nos vários Estados americanos e em base aos protestos dos cidadãos), a autocensura americana prevê a existência de uma única comissão competente para determinar as restrições do PG12 ao «restricted» 17 anos. Esta comissão é composta exclusivamente de pais, considerados os primeiros depositários da educação dos filhos, e representam transversalmente a audiência. Importantes sanções econômicas asseguram que o mecanismo de autocertificação corresponda efetivamente aos interesses dos cidadãos. No site da Motion Picture estão disponíveis aos pais os pontos de referência para a avaliação das obras de entretenimento e são publicadas as restrições aplicadas a cada filme que está em exibição nas salas de cinema. Geralmente as avaliações parecem muito mais severas em relação a outros países. Tudo isso, nos vários anos de sua aplicação, deu uma qualificação à indústria americana e seu correto serviço prestado aos ouvintes. Qualquer estrada que se pretenda seguir na Itália, é importante para as famílias que seja estimulado um mercado de produção adequado à infância: é justo que o mecanismo da indústria cinematográfica continue com o seu ritmo de produção, mas não é justo confundir as classificações de acesso ao produto, como qualquer indústria sabe muito bem.
No que se refere às normas européias de classificação dos filmes, e em geral de todo «entertainment» (neologismo anglo-saxão, que, no entanto encontra sua raiz etimológica na relação entre educação e jogo) acessível aos menores, deve ser citado o sistema NICAM, que funciona na Holanda há alguns anos. Fundado em 1999, o NICAM (Nederlands Instituut voor de Classificatie van Audiovisuele Media) se baseia na lei Media Act, onde os programas de grupos que tiveram a autorização para atividades de «broadcasting» não devem incluir obras audiovisuais que prejudiquem o desenvolvimento físico e psicológico de pessoas com menos de 16 anos de idade, seguindo as diretivas da União européia («Televisão sem fronteiras» IV).
O sistema de classificação preventiva funciona também na Grécia, com a lei 1.597, de maio de 1986, que prevê que antes da projeção nas salas de cinema, cada filme seja submetido pelo produtor ou pela sociedade de importação à Comissão para a juventude, que classifica o filme seja como adequado aos menores, ou proibido aos menores de 13 anos, ou de 17 anos ou ainda, nos casos mais graves, severamente inadequado aos menores. Esta comissão é um órgão do Ministério da Cultura e foi concebida procurando-se estabelecer certa proporcionalidade, sendo composta de representantes do Estado (Ministério da Cultura), das categorias ligadas ao cinema, de psicólogos especializados na educação, de sociólogos, dos jovens, dos educadores e dos pais.
Na Áustria, está em vigor um sistema de avaliação complexo, instituído em base a um princípio constitucional federal que confia a tutela dos menores, no que se refere ao cinema e em geral aos meios de comunicação de massa, à competência específica dos Lander. A lei nacional que engloba a regulamentação da mídia é a ORF-ACT, ou seja, a Austrian Broadcasting Corporation nº. 379/1984, que estabelece quais os critérios sobre os quais deve se basear a proteção aplicada a programas e filmes transmitidos na televisão ou através de outros canais mediáticos. No que se refere à exibição dos filmes, a avaliação preventiva das obras cinematográficas, para que sejam decididas as faixas etárias adequadas, é regulamentada pela lei austríaca para a tutela dos menores, a «Jugendschutzgesetz», aplicada através das leis dos Lander federais. Esta lei estabelece nove faixas de restrições de público a partir dos seis anos de idade, com uma sucessiva graduação que prevê restrições para 10, 12, 14 e 16 anos de idade. Para supervisionar o sistema de classificação cinematográfica, existe uma comissão junto ao Ministério da Educação, em Viena, que comunica seu parecer sobre a idoneidade dos filmes às autoridades locais. Geralmente e de maneira individual os Lander adotam as decisões da comissão, e é em âmbito local que se decide de sua aplicação.
Na Espanha, o artigo 20 da Constituição reconhece o direito do cidadão a exprimir e difundir livremente seu pensamento, suas idéias e suas opiniões através de qualquer meio de divulgação. Se por um lado o exercício de tais direitos «não pode ser restrito através de nenhum tipo de censura prévia», o mesmo artigo especifica que «estas liberdades têm o seu limite no respeito dos limites reconhecidos pelas normativas que exprimem este respeito, especialmente no direito à honra, à privacidade, à própria imagem e à proteção da juventude e da infância».
Baseando-se neste princípio, a qualificação dos filmes (Real decreto 81/1997) e das obras audiovisuais é feita antes de sua difusão, através do Instituto de cinematografia e das artes audiovisuais (ICAA), uma entidade autônoma, mas ao mesmo tempo ligada ao Ministério da Educação e Cultura através da secretaria de Estado para a cultura (ver site www.mcu.es).
A subdireção geral de fomento à indústria cinematográfica e do audiovisual, que faz parte do ICAA, se ocupa, dentre outras funções, da classificação em faixas etárias dos filmes e das outras obras audiovisuais em vista de sua exibição pública e para a sua distribuição. A comissão se encarrega de divulgar as informações sobre os filmes e programas audiovisuais, com classificação que vai desde as «salas X» até as restrições para cada faixa etária do público.
Os filmes de caráter pornográfico não podem receber subvenções do Estado e sua projeção nas salas prevê uma taxa suplementar, destinada em parte para estimular um fundo de proteção cinematográfica. A projeção destes filmes pode ser feita somente nas «salas X», onde não podem ser apresentados outros tipos de obras cinematográficas e onde é proibido o ingresso de menores de 18 anos.

CINEMA NA TV

Devido ao alto consumo de programas de televisão por parte dos menores e levando-se em conta as diretivas da União européia, que promovem a auto-regulamentação no âmbito nacional das emissoras de tv e a participação das famílias nesta obra educativa, há alguns anos estão em vigor na França, na Holanda, na Grã-Bretanha, na Grécia e na Itália os códigos de sinais, que servem para identificar tanto os filmes projetados na salas de cinema como aqueles transmitidos na televisão. A tutela dos menores no âmbito da televisão foi também feita adotando-se o chamado sistema «watershed» (separador das águas), que funciona segundo uma seleção de faixas horárias protegidas, algumas aconselhadas à visão dos menores, outras aconselhadas a todos e outras ainda, principalmente na programação noturna, indicadas somente a um público adulto.
A faixa de idade determinada pela classificação preventiva dos filmes tem obviamente uma repercussão na programação das chamadas faixas horárias protegidas ou distintas nas emissoras de televisão pública em todos os países europeus. A definição das linhas de conduta comuns está à base dos acordos de auto-regulamentação e de co-regulamentação dos programas de televisão, estabelecendo-se um código de procedimento comum para as emissoras tanto públicas como privadas. Criou-se assim uma base normativa, que é assumida pela autoridade do Estado e que recebe a confiança dos consumidores das emissoras públicas ou privadas que adotam este sistema de auto-regulamentação.
Para tornar visível aos adultos as classificações dos programas apropriados aos menores, muitas emissoras européias adotaram um sistema de sinais que através de símbolos, números, cores e sinais acústicos advertem ao público a respeito daquilo que está para ser transmitido.
Mas, apenas este sistema, assim como o de filtragem (tipo v-chip), não basta para garantir uma verdadeira tutela dos menores diante de um conjunto de imagens difíceis de serem decodificadas por um jovem. Deve-se pensar às imagens de guerra dos telejornais, dos filmes escabrosos ou às informações sobre os crimes hediondos, que muitas vezes têm como ambiente o próprio núcleo familiar.
É na colaboração entre Estado, produtores de programas audiovisuais e famílias que pode ser fundamentado um autêntico respeito dos menores que encoraje o crescimento positivo da criança em base aos valores fundamentais da pessoa humana.

4) CELULARES COM VÍDEO

Hoje a difusão dos celulares com vídeo chegou à Itália ao índice se 134%, o que significa que muitas pessoas possuem pelo menos dois celulares, inclusive os jovens e as crianças, que recebem este instrumento dos próprios pais. De fato, de duas crianças entre 8 e 13 anos de idade, uma delas tem um celular no bolso. Aquele que poderia ser um instrumento para controlar melhor os deslocamentos e as necessidades dos filhos, se revela no entanto um perigoso meio que pode expor a outro tipo de utilização por parte dos menores, que não se separam nunca do próprio celular, nem mesmo durante as aulas, como lamentam vários professores. Apesar do código de auto-regulamentação assinado pelas principais operadoras (Código de conduta para a oferta de serviços a pagamento em tutela dos menores), na realidade os novos serviços opcionais do celular o tornaram um «personal computer» capaz de permitir novos usos que antes não tinham.
Os desenvolvimentos tecnológicos que estão se verificando no campo da telefonia móvel – particularmente no que se refere à sinergia com a internet e a adoção dos sistemas DVB de vídeos-telefone – contribuem a aumentar a oportunidade de comunicação também para as novas gerações e, ao mesmo tempo, repropõem em novos termos a questão da tutela dos menores. As evoluções já previstas ulteriormente para os próximos anos e o número sempre crescente de pessoas envolvidas, pedem uma grande consciência social e uma constante atenção das pessoas e órgãos encarregados de garantir os direitos dos cidadãos.
Neste contexto devem ser reafirmados os direitos dos menores no campo da comunicação, dentre os quais certamente não está em último lugar aquele que se refere também à segurança diante dos riscos de indução a comportamentos ilícitos ou de acesso a conteúdos nocivos ou indesejados. Também neste campo é essencial o papel dos pais e, em geral, de todos aqueles que são chamados a ter uma função educativa. A maior segurança das crianças e dos jovens quanto ao acesso a conteúdos ilegais é um ponto que deve merecer atenção também através da maior conscientização dos pais e das mães, que devem se capacitar a conhecer e utilizar estes meios.
Para a «alfabetização» dos pais na utilização da mídia devem colaborar também as instituições públicas, promovendo um uso positivo das novas possibilidades tecnológicas. Às empresas cabe a responsabilidade de colocar no mercado um produto que dê garantias no que se refere à sua utilização pelos menores, superando os limites estabelecidos pelo código de auto-regulamentação assinado pelas operadoras de celulares. Devem também oferecer maiores informações aos adultos que assinam um contrato de utilização, como por exemplo a adoção de bloqueios automáticos de acesso a conteúdos nocivos, se o celular passa às mãos de um menor de idade.

5) VIDEOGAMES

Trata-se de uma indústria global, que conquistou os jovens e não apenas eles. Os números relativos à difusão repentina dos videogames indicam que existem 250 mil sites de videogames, cada um deles propõe uma série de títulos, muitos deles recheados de cenas de sexo e de violência. Uma pesquisa recente do Instituto italiano de medicina social (IIMS) coloca em evidência, entre outras coisas, a escassa informação por parte dos adultos a respeito dos videogames utilizados pelos filhos, o predomínio de temas violentas em mais de 30% de títulos não aconselhados aos menores, o predomínio de personagens virtuais normais que podem se tornar especiais, realizando ações extraordinárias.
Mas, o ponto de risco mais elevado se refere aos pequenos jogadores de videogames, crianças entre seis e nove anos de idade que se submetem a entrar tão intensamente no jogo virtual que chegam a formas de dissociação da realidade e solicitam um monitoramento muito atento da parte dos adultos. A mesma pesquisa indica a presença de videogames em 25% das famílias com crianças de três a cinco anos de idade e em 65,2% das famílias com crianças entre seis e 10 anos de idade. O que produz efeitos negativos no âmbito cognitivo das crianças não parece ser especificamente o meio, mas muito mais os elementos que criam a excitação, tais como a velocidade de produção do estímulo e da resposta, a velocidade das imagens, os efeitos especiais, os contrastes, a fragmentação da história, o binômio rumor-ação. O uso prolongado do jogo inibe, segundo alguns psicólogos, a área da capacidade crítica, provocando passividade e ao mesmo tempo agressividade na criança. Mas, não queremos demolir os videogames, porque existem aqueles que são muito adequados aos mais jovens, com valores de informação e de educação, seja também porque o uso deste meio é na realidade um passo na preparação da criança ao sucessivo e mais sofisticado, que é o uso da internet.
De qualquer maneira, os dados relativos à venda destes produtos de entretenimento mostram um crescimento em todos os lugares e a difusão deste meio é acompanhada de uma aceitação social (ou seria uma resignação?) sempre maior.
É urgente ampliar o percurso de conhecimento e das estratégias internacionais, para monitorar um mercado que está cada vez mais vasto. Parece urgente estabelecer modalidades operativas para o controle dos conteúdos e do sistema de sanções, seja para o produtor como para o vendedor dos serviços. O código de auto-regulamentação Pegi (derivado em 2003 do sistema de avaliação e classificação holandês, Nicam, que assinala os conteúdos inadequados aos menores), adotado pelos industriais de «entertainment» que produzem videogames, é a única forma de auto-regulamentação existente atualmente e que prevê sanções (raramente aplicadas, mesmo diante de casos graves evidentes) para os produtores que colocam no comércio os jogos com indicações de faixas etárias apenas aproximativas.
O código Pegi, ao qual a associação européia Isfe adere em 2002, é evidentemente insuficiente na sua função declarada de «fornecer aos consumidores as informações mais oportunas» e expostas no selo de produção. E, como o setor dos videogames tem hoje um volume de negócios que ultrapassa os 740 milhões de euros, envolvendo 24 milhões de jogadores (43% da população a partir dos quatro anos de idade), com uma venda dos produtos classificados para maiores de três anos de idade que chega aos quase 48% dos consumidores. É um dado que define o impacto deste gênero de meio sobre a infância e a adolescência, mostrando toda a sua periculosidade, seja pelo consumo de conteúdos inadequados, seja pelo excessivo número de horas dedicado neste passatempo, muitas vezes solitário e sem a presença de um adulto ao lado. Se for verdade, como sustenta a indústria, que a produção de videogames violentos é apenas uma mínima parte do mercado, é também verdade que esta representa a fatia mais importante do retorno econômico.
O interesse pelos videogames é alimentado pela sinergia com os filmes que inspiram o jogo homônimo e que torna sempre mais atrativo este gênero, principalmente para os adolescentes. Desta maneira é importante também neste campo o estabelecimento de regras precisas em defesa dos consumidores dentre o público jovem, mais exposto aos riscos destas novas formas de entretenimento cada vez mais sofisticadas e envolventes, por causa da combinação entre narrativa e efeitos gráficos.

6) PUBLICIDADE

O problema da tutela dos menores diante da publicidade se apresenta como um corolário, dentro do quadro mais amplo que regulamenta a difícil relação entre a mídia e as crianças. A televisão, e portanto também a publicidade, se constitui em uma fonte de perigo para os menores, isto é, para a maior parte das crianças, principalmente em idade pré-escolar, que devem saber fazer a diferença entre a publicidade e o resto da programação, e entre os programas de ficção e a realidade. Com essas considerações não significa que exista uma acrítica rejeição da publicidade em si mesma – à qual se reconhece, no entanto, onde proceda corretamente, uma função positiva no processo de formação, de crescimento crítico e de socialização do menor –, mas existe a necessidade de prever um sistema de regras destinado a garantir-lhe um uso adequado.
O efeito dos anúncios publicitários é tão grande que em alguns países estão sendo tomadas medidas drásticas a respeito. No Reino Unido, por exemplo, recentemente foram vetados os anúncios publicitários durante os programas destinados às crianças até nove anos de idade, a partir de 1º de janeiro de 2008 a medida se estenderá à programação para os jovens até 15 anos de idade e até o final de 2008 serão vetados em todos os canais dedicados aos menores. Apesar de se reconhecer que a publicidade serve para financiar os programas, aqueles dedicados às crianças terão que recorrer a outras fontes. Também na França começa a se impor uma «linha dura» a esse respeito: visto a alta incidência de publicidade de merendas, de sucos e doces em geral, a partir de agora os anúncios dedicados às crianças deverão ser precedidos de uma espécie de aviso, que orientará para uma alimentação adequada.
Mas, por que as crianças são tão frágeis diante dos apelos da publicidade? Na Itália, explica Paolo Landi, secretário geral da Adisconsum (Associação de defesa dos consumidores e do ambiente»), em um capítulo de seu estudo «Crianças da multimídia»: «Se consideramos que a publicidade não faz outra coisa que veicular um conhecimento imediatamente concretizável em um “ter”, ou em um “ser”, ou em um “fazer”, a criança absorve sem dificuldades os três componentes que são a obsessão dos expertos de marketing, isto é, o componente cognitivo (como fornecer informações indeléveis sobre um produto ou um serviço), o componente afetivo (como fazer o consumidor reagir de maneira emotiva) e o comportamental (como colocar o pequeno consumidor em movimento na direção da aquisição). A partir deste ponto de vista a criança é o público ideal, o consumidor a quem se pode vender qualquer coisa».
Na Itália está em vigor um código de autodisciplina publicitária que surgiu em 1966, em base a um acordo entre os profissionais do setor. Esta primeira forma de tutela, em grande parte com origem comunitária, tem como protagonistas entidades administrativas independentes: a Autoridade de controle da concorrência e do mercado de setor e a Autoridade de garantia para as comunicações e a editoria. Enquanto isso, para a auto-regulamentação, orientada pelas normas que constam do Código de autodisciplina publicitária, e agora também, embora com força jurídica diferente, pelo Código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual se reconhece um poder de decisão e de sanção, emanando uma ordem e intimando seu cumprimento.
Em todos os países onde a televisão serve de veículo às mensagens publicitárias, o mundo empresarial é plenamente consciente do enorme poder de influência que a publicidade tem sobre as crianças.



NORMATIVA INTERNACIONAL

O assunto relativo à tutela dos menores na mídia é um dos mais debatidos, seja no que se refere às normas nacionais, seja no âmbito internacional. Encontra-se diante da situação de precisar acertas as contas com toda a extensão da rede global da internet. O exemplo que, neste momento de transição, coloca mais em evidência a necessidade de estabelecer leis que estejam em condições de controlar o acesso e uso dos conteúdos nocivos para os menores, é exatamente o da internet. Qualquer pessoa no mundo pode abrir um site considerado «arriscado», contendo elementos ilegais e acessíveis a consumidores despreparados, disponibilizados por quem está do outro lado do mundo.
No que se refere aos princípios gerais no âmbito do direito internacional, é preciso recorrer principalmente à convenção da ONU sobre os direitos da criança, com sede em New York, ratificada pelo Parlamento italiano através da lei nº.176/1991. Esta garante à criança uma «consideração proeminente» também a respeito da liberdade, seja no se refere à expressão, seja quando tutela os conteúdos recebidos. Esta mesma convenção, em seu artigo 17, fala da relação entre menor e televisão, desejando «um sistema normativo que tutele o menor-consumidor, mesmo com todas as dificuldades que se apresentam», seja para individuar os fenômenos que devem ser monitorados, seja sobre as normativas possíveis.
No direito da União européia, tal tutela foi recentemente confirmada pela Carta dos direitos fundamentais da União, aprovada em Nice em 2000, cujo artigo 24 salienta que «os Estados membros reconhecem a importância da função exercida pelos meios de comunicação de massa e cuidam para que a criança possa ter acesso às informações e materiais... com a finalidade de promover o seu bem estar social, espiritual e moral, além de sua saúde física e mental». A normativa seguinte, 89/552/CEE, previu algumas restrições, seja no que se refere aos programas como para as mensagens publicitárias destinadas a este público». O artigo 22 desta normativa conduz a impedir a transmissão de programas que contenham cenas pornográficas ou de violência gratuita, ou outros programas inadequados a este público. Não podemos esquecer de mencionar a determinação expressa de «Televisão sem fronteiras», que está hoje em sua quinta versão atualizada, que o tema da tutela dos menores está relacionado com o estatuto geral dos direitos dos menores e corresponde ao disposto nos artigos 50 e 31 da Constituição italiana.
Se for claro que os princípios normativos são todos a favor da tutela dos menores, é também verdadeiro que uma tecnologia em contínua evolução colocou em crise as velhas regras do jogo. Mas também é claro que não se pode mais adiar a necessidade de estabelecer novos parâmetros normativos, para que as crianças possam utilizar os meios de comunicação próprios de seu tempo, com aproveitamento e serenidade também para as famílias.~

EDUCAÇÃO À MÍDIA NO MUNDO: PARA SABER MAIS

A difusão da educação à mídia é uma resposta à necessidade de se informar sobre as novidades no campo dos novos meios de comunicação. Em seguida citamos apenas alguns sites que em vários países oferecem maiores informações sobre como aprender a usar melhor a mídia, enfrentando a problemática da tutela dos menores e da alfabetização às novas tecnologias por parte dos adultos.
«The Media Awareness Nework-Réseau éducation médias» é uma organização canadense sem fins lucrativos, pioneira no desenvolvimento de programas sobre a educação à mídia. Com esta finalidade ela produz programas online em colaboração com organizações internacionais, convicta que, para interpretar as mensagens de informação, de entretenimento e comerciais, os jovens têm necessidade de instrumentos críticos válidos. Por isso é importante formar também os adultos (famílias e professores) sobre como funciona a mídia e como ela determina o estilo de vida.
A organização realiza uma ação contínua de monitoramento em relação à mídia (televisão, cinema, videogames, imprensa, publicidade, etc.), e sua seção dedicada aos pais oferece uma série de elementos para que estes reflitam com os filhos sobre esses meios, além da seção para os educadores, que inclui lições e materiais de apoio. Uma outra seção é dedicada à análise das questões ligadas à mídia, como a difusão de estereótipos, as representações de violência e da diversidade, a privacidade, a publicidade dirigida aos menores. Seu site é em inglês e francês (http://www.media-awareness.ca).
«Quai des images» é o site dedicado ao ensino de cinema e audiovisual organizado pelo Ministério da Educação francês. Ele propõe atividades ligadas à educação à imagem e de análise dos filmes em consonância com os programas escolares, agrupa os textos oficiais a respeito dos meios audiovisuais, oferece uma série de instrumentos de análise e de estudo completos sobre alguns filmes específicos e sobre certos autores em particular, informa sobre conferências, seminários, cursos e festivais sobre o mundo audiovisual e sua utilização em âmbito educativo e didático. Entre outras coisas, reúne também as propostas e as experiências feitas por professores e seus alunos nas escolas secundárias francesas no campo da educação à imagem, além de organizar um fórum de discussões aberto a todos sobre a educação à mídia (http://www.ac-nancy-metz.fr).
Sempre na França, está em funcionamento o blog «Zéro de conduite», organizado pelos professores e destinados a educadores, pais e estudantes. Promove o uso do cinema como instrumento pedagógico, dedicando-se especialmente à atualidade cinematográfica, mas sem esquecer os clássicos e os documentários. Com várias seções e espaços de aprofundamento, se propõe como um local de discussão de temas em um debate aberto (http://cinema-ducation.fluctuat.net).
A Universidade de Massachussetts organizou o Media Education Foundation – MEF, mídia de desafio, que produz e distribui documentários destinados a estimular o pensamento crítico e o debate sobre a relação entre aqueles que detêm o poder sobre a mídia, os conteúdos da mídia comercial, a exigência democrática de um livre fluxo de informações, as diversas representações de idéias e pensamentos e o direito dos cidadãos de informar e serem informados. Alguns destes temas são abordados criticamente, como a identidade do gênero na publicidade, a imagem de sexo nos videoclipes, o papel da mídia na construção da identidade cultural, mídia e saúde, etc. (http://www.mediaed.org/).

(a cura di M. F. D’A.)

 
At 9/17/2007 2:43 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

AS CRIANÇAS E A MÍDIA (II PARTE):
ACEITAR O DESAFIO EDUCATIVO


O tema da 41ª Jornada das Comunicações Sociais, «As crianças e os meios de comunicação: um desafio para a comunicação», nos convida a refletir a respeito de dois aspectos particularmente importantes. O primeiro é a formação das crianças, para que estejam em condições de receber de maneira crítica aquilo que vêem. O segundo é a formação à consciência e ao uso consciente da mídia, que está em contínua transformação tecnológica.
De fato, é o que especifica Bento XVI no início de sua mensagem, de 20 de maio de 2007, para a Jornada: «Os complexos desafios que a educação contemporânea deve enfrentar são muitas vezes ligados à grande influência dos meios de comunicação no nosso mundo. Como aspecto do fenômeno da globalização e estimulados pelo rápido desenvolvimento da tecnologia, os meios de comunicação delineiam fortemente o ambiente cultural (cf. João Paulo II, O rápido desenvolvimento, nº3). Na realidade, há quem afirma que a influência formativa da mídia está em competição com aquela da escola, da Igreja e, quem sabe, até com aquela da própria família».
De fato, como salienta o Pontifício conselho para as Comunicações Sociais, «para muitas pessoas, a realidade corresponde àquilo que os meios de comunicação definem como tal». Episódios recentes, como a utilização do celular na filmagem de violências nas salas de aula, abusos sofridos por pessoas deficientes, fenômenos de trote e de violência generalizada, demonstram como as crianças que crescem passando uma média de quatro horas por dia diante da televisão, sozinhos em casa, absorveram a lógica do «estou no vídeo, logo existo». Os psicólogos, os pedagogos e os estudiosos dos meios de comunicação estudam há tempos sobre as relações entre o consumo televisivo e o comportamento violento dos menores. Uma grande quantidade de pesquisas realizadas em muitos países ocidentais demonstra como esta correlação seja realmente inegável.


NOVAS LINGUAGENS

O fato que muitas crianças vivem completamente inseridas no mundo dos velhos e novos meios de comunicação, que estão cada vez mais frequentemente em correlação entre eles, é confirmado pela popularidade de alguns modelos televisivos, considerados tão efêmeros quanto penosos «momentos de glória», presentes nos programas com os maiores índices de audiência, dos «reality» aos «talk show», sem falar do «trash», que hoje se tornou um gênero de espetáculo.
Dentre as preferências demonstradas pelos adolescentes italianos que assistem televisão mais do que três horas por dia, encontramos, em primeiro lugar, a figura da «veline» (Ndt: misto de corista e coadjuvante na apresentação de programas populares da televisão italiana), enquanto outros da mesma idade se concentram no mais clássico exemplo, o do jogador de futebol. De toda maneira, a coisa mais importante é aparecer, pouco importa por qual motivo, de ser «alguém» ou «alguma coisa» no Olimpo mediático, mesmo que seja apenas por um instante.
Estes são os exemplos mais negativos dos condicionamentos derivados de um excessivo e acrítico uso dos meios de comunicação. Encontramo-nos diante de uma nova geração que cresceu na frente da televisão, capaz de usar as novas tecnologias que os próprios pais, que as adquiriram e as tornaram disponíveis, muitas vezes se encontram despreparados para utilizá-las.
Tanto é verdade que hoje em dia os filmes são vistos diretamente nos celulares e a televisão pode ser assistida na tela do computador. Hoje se telefona através da internet e graças ao download se descarrega os CDs e DVDs mais recentes, se filma e se faz foto com o celular, e assim por diante.
Nas casas, o vocabulário familiar se reduziu ao gênero dos sms e se fala tendo o som da televisão no fundo, se comunica através de e-mail, se faz «visita virtual» via computador, se percorre através de bibliotecas virtuais, tanto que as fichas e arquivos de papel evocam imagens do outro século, completamente em desuso.
A situação dos nossos filhos é diversa daquela da geração precedente, pois eles abriram seus olhos tendo diante de si estes cenários de profunda, contínua e envolvente transformação tecnológica. Eles se constituem aquela que os estudiosos chamam de geração nascida «com seis dedos»: além dos cinco dedos normais da mão, o sexto é o mouse do computador.
Com o aparecimento do mundo «virtual» da internet e dos videogames criou-se uma defasagem em relação à realidade verdadeira e própria. As duas dimensões parecem muitas vezes, e para muitos jovens, como universos paralelos, com conseqüências não indiferentes no plano do processo de amadurecimento. Têm grande sucesso os sites nos quais se prevê uma segunda vida (basta verificar os milhares de registros nos poucos meses de existência do site italiano de «Second Life», que em todo o mundo já tem sete milhões de inscritos), onde a simulação reproduz todas as situações da vida real. Apenas que tudo é falso, a começar da nova identidade, que pode ser escolhida e com ela se inicia a fazer parte deste mundo fora do mundo, onde se pode ser um «qualquer coisa». Isto é, ninguém.
Assim, o grande desafio cultural de hoje é propriamente a redefinição dos limites, que muitas vezes se apresentam demasiadamente instáveis. Isto é, redefinição dos limites entre o real e o virtual, superando a divisão digital que hoje separa as gerações adultas daqueles mais jovens.


OS JOVENS: PROTAGONISTAS OU VÍTIMAS DAS MUDANÇAS?

A linguagem deles é pobre, muitas vezes recheada de termos tirados do dicionário do internauta: clicar, chatar, messagiar, deletar, são alguns dos neologismos que fazem parte de seu vocabulário quotidiano. Falta uma dimensão humana da tecnologia que esteja em condições de traçar o perímetro cultural entre o real e o virtual. Assim a aldeia global difundiu uma quantidade de modelos comportamentais desviados, ou pelo menos discutíveis.
Desta maneira, os jovens que vivem a milhões de quilômetros de distância jogam o mesmo videogame, vêem o mesmo filme, assim como, de maneira transversal, absorvem modelos e comportamentos semelhantes. Muitas vezes os adultos têm menos domínio no uso das novas tecnologias e observam, com uma preocupação resignada diante de suas próprias limitações, as crianças que navegam facilmente na internet.
As raízes das dificuldades neste campo educativo são muito bem explicadas por Marina D’Amato, professora de sociologia da Universidade de Roma, que salienta: «Cada geração tem necessidade de se encontrar também em um mundo fantástico, que serve a interiorizar o paradigma do bom e do belo, do justo e do errado, do oportuno e do útil, também em relação aos exemplos que procedem da narrativa. Hoje nos encontramos em uma condição na qual os avós e os pais contam cada vez menos histórias aos filhos e aos netos, e este papel foi assumido pela televisão. Mas, na realidade, a televisão “exila” e “con-funde”, isto é, funde os modelos morais que são frutos de ânsias e problemas mal resolvidos, muito mais que de certezas. Embora estes se transformem com freqüência, a cada três ou quatro anos, o fato de serem repropostos continuamente faz com que se justaponham uns aos outros» (ver Come mediare i media, de Mario Russo).
Se for verdade que a televisão é o meio mais usado até a adolescência, imediatamente depois surge a grande atração pela internet. Esta passagem nasce de uma sintonia com a linguagem televisiva, que na idade infantil muitas vezes é ouvida durante muitas horas no dia. Esta linguagem se baseia em uma mediação da realidade e desta maneira ela ativa um processo de recepção que é de tipo emotivo.
Neste registro emocional é mais fácil acabar envolvido por situações e figuras capazes de se proporem como modelos identificadores, preservadores de sentido e de comportamentos a serem imitados.
O poder de concentrar uma vontade emulativa em alguns personagens, que correspondem particularmente às necessidades interiores do jovem (necessidades na maioria das vezes induzidas pela publicidade ou por modelos estimuladores), tem uma forte relação com a quantidade de horas que o jovem passa utilizando os novos ou os velhos meios de comunicação.


EDUCAÇÃO NECESSÁRIA

«A formação adequada a um uso correto dos meios de comunicação é essencial para o desenvolvimento cultural, moral e espiritual das crianças… Educar as crianças a serem seletivas no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja, da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos. Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia, com a certeza de que este difícil, embora gratificante, aspecto da condição de pais, é apoiado por toda a comunidade.»
As palavras do discurso de Bento XVI definem com grande clareza o paradigma de uma justa relação entre a mídia e os menores. Uma clareza que devemos agradecer ao magistério da Igreja, no momento em que o mundo da mídia parece ignorar a verdadeira problemática educativa das crianças e as expectativas de qualidade e de segurança exigidas pelas famílias no que se refere ao uso desses meios, seja do cinema aos videogames, da televisão à internet.
Diante da utilização destorcera do meio televisivo, o mais difundido dentre os meios de comunicação, a Igreja se interroga sobre o porquê da televisão não ter um papel educativo e por que os meios de comunicação não podem ser companheiros confiáveis para os jogos na fase de crescimento da criança. O anúncio de uma recente campanha sobre o uso da mídia, promovida pelo Ministério das Comunicações, mostra os vários membros da família que estão vendo a televisão ao lado de uma criança.
Que se trate do avô ou da mãe, a mensagem é a mesma: não deixar uma criança sozinha diante de um meio que, sem o apoio crítico educativo de um adulto, pode transmitir conteúdos inadequados à idade e à maturidade daquele que o vê. Sem esquecer as responsabilidades dos produtores televisivos, empenhados na organização dos programas, o papel da família é realmente insubstituível.
Se realmente o objetivo de quem administra a sociedade de produção televisiva, ou das multinacionais produtoras de videogames ou das operadoras de celulares, é o de promover e vender o produto, o bem estar psicofísico da criança está no centro do interesse dos educadores, sejam eles os professores ou, em primeiro lugar, os pais.
Isto explica bem a mensagem do Papa, que continua a sua análise, salientando que «educar as crianças a serem seletivos no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja e da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos (ver João Paulo II, «Familiaris Consortio», 76). Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia.»


CONTEÚDO DA MÍDIA

No panorama de uma revolução da multimídia, que está modificando transversalmente os hábitos, a mentalidade, os modelos e as linguagens, deve voltar ao centro do debate a tutela daquilo que é melhor para os menores. Sem acusar a «mídia», que enquanto tal não é nem boa nem má, o importante é partir de uma a análise do produto, para assim poder individuar conteúdos que sejam de melhor qualidade para as crianças e os adolescentes. Porque a televisão é um instrumento que abre janelas de conhecimento para o mundo e, se bem utilizada, de «má professora» pode se tornar uma preciosa fonte de estímulo para o crescimento humano e cultural.
A mesma coisa vale, e com mais razão, para a «rede» que engloba e compreende tudo, e para os videogames, onde, ao invés de violência e monstros, poderia se dedicar a produzir (e isso já ocorre em certos casos) histórias instrutivas e de conteúdo interessante.
Bento XVI coloca justamente em evidência as enormes possibilidades para que seja melhorado o conteúdo deste grande campo de produção multimídia: «A educação através da mídia deveria ser positiva. Colocando as crianças diante de um meio estética e moralmente excelente, estas recebem uma ajuda para que desenvolvam a própria opinião, a prudência e a capacidade de discernimento. É importante aqui reconhecer o valor fundamental do exemplo dos pais e as vantagens de introduzir os jovens aos clássicos da literatura infantil (…). A beleza, quase um espelho do divino, inspira e vivifica os corações e as mentes juvenis, enquanto a feiúra e a vulgaridade têm um impacto deprimente sobre os comportamentos». Diante de uma decadência geral do produto televisivo, a questão da qualidade aparece ainda mais forte e vibrante em grande parte de um público formado de famílias, que pede para não ser apenas um exército indistinto de ouvintes silenciosos, mas um público em condições de exprimir suas preferências por conteúdos formativos e informativos de bom nível.
A mensagem de Bento XVI continua, com algumas importantes indicações: «Como a educação em geral, aquela da mídia requer também uma formação ao exercício da liberdade. Trata-se de uma responsabilidade que compromete. Muitas vezes a liberdade é apresentada como uma incansável procura do prazer ou de novas experiências (…). Este desejo, sentido profundamente pelos pais e educadores, que é o de educar as crianças no caminho da beleza, da verdade e da bondade, pode ser apoiado pela indústria da mídia somente na medida em que se promove a dignidade fundamental do ser humano, o verdadeiro valor da vida familiar, as conquistas positivas e as metas da humanidade. A partir disso, a necessidade de que os meios de comunicação estejam empenhados na efetiva formação e no respeito da ética deve ser vista com interesse particular e com urgência não apenas pelos pais, mas também por aqueles que têm responsabilidade cívica».
Na realidade, nos encontramos na situação de ter que reconhecer que na Itália falta uma verdadeira «cultura da criança»: a situação é tão séria que no âmbito institucional procura-se dar uma nova organização geral para verificar e controlar os conteúdos dos setores de entretenimento, como os videogames, que até agora estão submetidos apenas a códigos de auto-regulamentação, feitos e codificados para uso e consumo pelas indústrias produtoras.
Uma vez mais, o primeiro e indispensável apoio à criança só pode vir da família e de uma relação mais estreita com os professores e educadores, exatamente como salienta Bento XVI, lembrando-nos que a preocupação educativa dos pais não deve se tornar uma preocupação genérica, mas uma atenção constante a tudo aquilo que diz respeito aos filhos.

A INDÚSTRIA DA MÍDIA

1) A TELEVISÃO

Se a televisão convencional se apresenta como um ramo de atividade já «maduro», no entanto se apresenta no horizonte a situação da mídia digital (satélite ou a cabo), também como uma plataforma que consente a ligação entre televisão, internet e outro tipo de mídia através do computador. No que se refere à qualidade da programação, apesar dos inúmeros bons propósitos anunciados no âmbito institucional, parece pequena a atenção às exigências dos menores em suas diversas faixas etárias. A programação para os menores, na realidade é confinada em redes e horários particulares, enquanto o resto da programação na faixa horária considerada «para todos» muitas vezes apresenta conteúdos inadequados aos jovens. Mas, quais são as expectativas das gerações de jovens no que se refere à televisão? É realmente verdade que preferem o «trash», os jogos com prêmios absurdos e as «velines»?
A partir de uma pesquisa recente feita pelo instituto Censis sobre «Comunicação, pluralismo social, sociedade aberta» (2005) surge que a relação entre os menores, e em particular dos adolescentes entre os 14 e 18 anos de idade, e a televisão é determinada por elementos de forte contradição e de passividade. Nessa faixa etária, 100% deles vêem televisão praticamente todos os dias, 86% acompanham um pouco de tudo, com uma relevante predileção pelos filmes (72%), por esporte (32%) e pelos «reality shows» (18%).
No entanto, a amostragem entrevistada não está realmente satisfeita com aquilo que vê. De fato, 36% dos adolescentes denunciam a vulgaridade difundida nos programas e 25% criticam a superficialidade. Dentre eles, 46% consideram a televisão como um meio que «invade», ao mesmo tempo em que é interessante notar que 25% consideram que em geral a programação televisiva alimenta nas crianças menores uma visão consumista da vida. Destes dados surge o contraste entre a procura de distração e a reprovação daquilo que lhes é proposto pela programação. Isto significa que o alto índice de procura não é um indicador de satisfação.
Considerando o axioma de que a televisão seja onipresente, fica claro que são os próprios jovens a pedirem uma maior atenção aos conteúdos: menos violência e menos vulgaridade. A exigência de uma regulamentação diversa, diz claramente o relatório do Censis, «não vem somente daqueles, pais e educadores, que estão preocupados pela possível influência negativa sobre os menores, mas se exprime nitidamente também através dos adolescentes, pelo menos de uma parte mais esperta e consciente dentre eles».
Para tutelar melhor os direitos dos menores, desde 2002 foi instituído junto ao Ministério das Comunicações um código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual aderiram os produtores de televisão, seja no âmbito nacional como local. Baseando-se nos princípios sobre a matéria existentes na Constituição italiana e na Convenção dos direitos da criança, estabelecida em 1989 pela ONU, a comissão que controla sua aplicação avaliou em todos estes anos de atividade os milhares de casos em que foram violadas as normas de tutela, que prevêem a transmissão de programas e imagens adequadas a um público de menores de idade durante aquela que é chamada de «faixa protegida» da programação televisiva (das 7h30 às 22h30), intervindo com denúncias e sanções, que nos casos mais graves foram aplicadas pela Autoridade de garantia no setor das comunicações. Para o futuro, esta comissão deverá se transformar em um organismo mais amplo de controle, que se chamará «Mídia e menores», que além da televisão deverá monitorar também os setores dos vídeos-telefone e dos videogames, além da internet, que é o campo de maior risco.

REGRAS DE TUTELA EM OUTROS PAÍSES

É diversa a situação em outros países, como por exemplo na Grã Bretanha, onde o sistema de regulamentação da mídia é estruturado e complexo e foi atualizado nas últimas décadas, com uma particular atenção à tutela dos menores. As inovações tecnológicas neste setor levaram as normativas inglesas a uma série de novas disposições, como por exemplo, a visão em casa de vídeo exclusivamente para adultos, e que fora de casa seriam vetados aos menores, ou o combate à praga mundial dos sites internet para os pedófilos, que contenham material pornográfico ou com conteúdos que possam esconder o aliciamento de menores (ver a Protection Childres Act, de 1978).
A programação televisiva é regulamentada pelo Broadcasting Act (1996), de onde deriva a instituição da Broadcasting Standard Commission (BSC), um órgão independente de controle que estabelece as normas de avaliação e classificação dos programas, também no que se refere aos conteúdos violentos ou que possam ofender a decência pública (site oficial www.bsc.org.uk). Este organismo BSC funciona internamente à estrutura do Broadcasting, supervisionando e regulamentando todas as emissoras de televisão e de rádio, via cabo ou por satélite. Sua tarefa é a de elaborar os códigos de conduta e de aplicação de modelos que respeitem a justiça, além de monitorar os modelos, verificando que respeitem as leis. Com a transmissão de programas com conteúdos considerados inadequados aos menores de várias idades, há alguns anos a televisão inglesa adotou o sistema «watershed», um «separador de águas» entre um horário de programação familiar e outro para os adultos. Todo o sistema televisivo inglês se apóia sobre a responsabilização das famílias, pois sem a colaboração delas qualquer código de modelos para os programas é praticamente inútil.
Na França, está vigorando já há anos um código através de sinais televisivos, que entra em função para assinalar os programas inadequados aos menores. A avaliação do programa televisivo é feita pelo Conseil Supérieur de l’Audiovisuel (CSA), uma autoridade administrativa independente, que controla a difusão dos filmes e outras transmissões em vários canais privados, nacionais, regionais ou locais. A normativa francesa (lei 719/2002) veta a transmissão de programas que possam prejudicar gravemente a integridade física, mental e moral dos menores, porque divulgam conteúdos de pornografia ou de violência gratuita. As transmissões são classificadas por um código de sinais que, em conjunto com um sistema organizado de faixas horárias de programação, garante às famílias mais clareza sobre os programas destinados aos menores.
Na Alemanha, o tema da infância tem particular atenção da legislação, que considera desde o nascimento o início dos direitos fundamentais do cidadão. A tutela é disciplinada no âmbito público pela JSchG (desde o dia 26 de fevereiro de 1985), enquanto a lei GjSM se ocupa do controle sobre a difusão de publicações e conteúdos mediáticos considerados danosos para os menores. A regulamentação no setor televisivo é feita segundo as normas do acordo sobre a radiodifusão dos Lander federais, que as entidades para a mídia nesses Lander adotaram por base para o estabelecimento das diretivas que tutelam o interesse dos menores nas emissoras privadas. Não são admitidas transmissões que incitem o ódio racial, que exaltem a violência ou a guerra, que ofendam a dignidade do homem, que sejam de gênero pornográfico, que mostrem pessoas moribundas ou com sofrimentos que ofendam a dignidade humana. Os responsáveis pela programação, escolhendo os horários das transmissões, devem cuidar para que os menores não vejam programas que podem prejudicar o seu bem estar psíquico, físico ou mental. As transmissões inadequadas às crianças menores podem ser transmitidas somente depois da autorização da entidade competente do Land interessado.
Os responsáveis pela organização dos programas televisivos em âmbito nacional devem nomear encarregados pela tutela dos menores, que atuam no momento da aquisição, da projeção e da realização dos programas. As emissoras privadas fundaram em 1993 uma associação de autocontrole voluntário da televisão («Freiwillige Selbskontrolle Fernsehen», FSF), à qual devem ser apresentados programas particulares, antes da sua transmissão, e suas avaliações consideradas nas decisões das entidades de controle da mídia nos Lander federais. Existe ainda o órgão comum do cidadão para a tutela dos menores, dos programas, da competência mediática e controle da mídia (GSJP), do qual faz parte um integrante da entidade para a mídia nos Lander federais, que dá o seu parecer a respeito de algumas séries, filmes e espetáculos mais ou menos adequados aos menores. Este órgão, o GSJP, decide sobre pedidos de mudança de horários de transmissão de filmes proibidos para menores, controla a forma de novos programas e experimenta novas disposições para a tutela dos menores na televisão digital. A peculiaridade da jurisdição alemã, seja no setor televisivo como no cinematográfico e da mídia em geral, é a minuciosa atenção às exigências com o desenvolvimento do menor e aos riscos que este pode correr com a observância incorreta das leis.
Nos Estados Unidos, é possível consultar via internet um «guia televisivo para os pais» (ver o site www.mpaa.org), que prevê algumas categorias de audiência aplicadas aos programas televisivos transmitidos a todo o público. Este guia organiza várias siglas para identificar a categoria de audiência para cada transmissão: vai-se do TVY (para todas as crianças) ao TVG (para todos), através de várias faixas etárias, que correspondem à passagem da primeira à segunda infância e desta à adolescência. Depois tem o TVPG («parental guidance», visto na presença de um dos pais), o TV14 («parent strongly cautioned», séria advertência aos pais), para os programas que contêm cenas de sexo e de violência. Enfim, há o TVMA, que prevê um «mature audience only», ou seja, destinado a um público de idade superior a 17 anos, última fronteira para os conteúdos considerados «restricted».
Estas avaliações foram elaboradas baseando-se nas opiniões dos próprios pais e são fáceis de serem encontradas e compreendidas. Esta linha de «guia de televisão para os pais» pode ser usada juntamente ao «v-chip», que é um dispositivo de filtro instalado na maior parte dos mais recentes modelos de aparelhos de televisão, para permitir aos pais de bloquear os programas inadequados.

FICHA 1
Brasil: «O que eu penso da tv»
No Brasil, a audiência infantil é muito alta: aproximadamente 30 milhões de crianças vêem televisão pelo menos durante três horas por dia. Explica a profa. Rosália Duarte, do departamento de Ciência da Educação, da PUC do Rio de Janeiro, que «as crianças são muito perspicazes, mas nós podemos e devemos ajudá-las a ampliar o seu quadro de referências, para que possam discutir ainda melhor sobre o conteúdos daquilo que vêem. Para isso temos necessidade, antes de tudo, de ouvir aquilo que elas têm a dizer sobre o assunto e de dialogar com elas. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e muito mais freqüente, a outras atividades culturais». No âmbito de uma pesquisa feita através de um questionário distribuído nas escolas, intitulado «O que eu penso da tv», apareceu que «as crianças querem seriamente ser ouvidas sobre aquilo que pensam da tv, mas sentem que sua opinião é considerada pouco importante e não estão contentes com o excesso de imagens de violência exibidas na televisão, principalmente a violência “real”, definida como aquela transmitida nos telejornais. Eles adoram ver televisão e não importa o que os adultos pensam e dizem a respeito disso. A eles agradam quase todos os tipos de programas transmitidos: novelas, desenhos animados, programas de humor, filmes, seriados, mas isso não faz deles espectadores “idiotas”, pois fazem críticas muito interessantes, pertinentes e bem elaboradas sobre o que consideram feio ou inadequado na televisão. Para a maior parte deles, a televisão se oferece como principal opção de divertimento (em alguns casos, a única), o que significa um dado muito preocupante. Mas, o que chamou mais a nossa atenção é o grau de experiência com o qual essas crianças analisam a televisão: são expertos e demonstram conhecer a televisão também do lado de dentro, inclusive as linguagens que ela utiliza, a sua estrutura de produção, a sua lógica interna e as suas maneiras de intervenção».
As crianças aprendem os valores e os não-valores através da televisão, não resta dúvida, mas demonstram ter senso crítico a respeito deste assunto, quando afirmam nos textos que os programas transmitidos na tv podem lhes ensinar «a serem bons, a ter coragem e a fazer o bem, a cuidar da natureza e de si mesmos, a serem honestos e a lutar por aquilo que desejam», mas também «a serem cruéis e mentirosos, a roubar e matar, a não respeitar os pais e a comprar tudo aquilo que não têm necessidade». Falando sobre a validade do ensino através da mídia, a profa. Duarte salienta a necessidade de «ouvir aquilo que têm a dizer sobre o assunto e a dialogar com eles. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e mais freqüente, a outras atividades culturais».

FICHA 2
Observadores internacionais
Os dados examinados em janeiro de 2006 pelo OssCom, que é um centro de pesquisa da mídia, deixam evidente a tendência a realizar uma forma de co-regulamentação, onde a ação legislativa dos Estados membros se integra com medidas de auto-regulamentação por parte dos produtores, broadcasters e profissionais da comunicação sob o efeito de controles e sanções. São dois os instrumentos mais utilizados no âmbito europeu, observando-se as diretivas previstas no artigo 22 de «Televisão sem fronteiras»: a definição de faixas horárias protegidas (watershed) e os sinais mostrados na tela (determinados por um sistema de «rating»). Apesar disso, aos campos tradicionalmente problemáticos da violência e da pornografia se juntam novos campos de risco para os menores: a vulgaridade, abusos e dependências de substâncias, linguagem e comportamento vulgares, discriminações e abusos, violações e ofensas à dignidade humana. Os critérios de avaliação dos programas se constituem um problema que é partilhado por muitos países da União européia, ao mesmo tempo em que se prepara uma uniformização internacional dos sistemas de classificação (ver mais adiante, Nicam), baseados na visualização de cinco ícones que ilustram simbolicamente qual é a problemática do programa que está sendo analisado e para quais idades ele é desaconselhado.
Deve ser assinalada a atividade online da European Medi@culture. O projeto é promovido pela Comissão Européia, em Bruxelas, no quadro das iniciativas «e-Learning», administrado pelo centro mediático de Baden-Württemberg. O site apresenta informações sobre a educação à mídia na Europa, particularmente na França, Áustria, Finlândia e Alemanha. A seção de projetos de multimídia agrupa os projetos sobre a mídia desenvolvidos por escolas e associações de jovens ao longo do tempo (ver http://www.european-mediaculture.org).

FICHA 3
África do Sul: Encontro mundial sobre a mídia para a infância
Este encontro trienal se realizou no último mês de março em Johannesburg, na África do Sul, com a participação de expertos do setor representando diversos países. Em conjunto se discutiu sobre a necessidade de uma programação adequada às crianças, procurando entender de que modo a violência na mídia pode influir sobre a psíquico dos menores.
Mas, no 5º Encontro mundial sobre a mídia para a infância apresentaram-se também muitas crianças provenientes de todo o mundo e empenhadas em discutir sobre o difícil tema da «Mídia como instrumento de paz e de democracia global». Vieram guiados por grupos de adultos, dentre eles as diversas organizações católicas que há anos trabalham para promover regras para o bem da infância, a serem respeitadas nas transmissões de rádio e televisão através de códigos de regulamentação que devem ser redigidos ou, como em alguns casos, apenas atualizados. Em muitos países do sul do mundo as novas tecnologias de multimídia já estão muito disseminadas e seu uso merece uma atenção particular para tutelar o público mais jovem.
Especialmente na África, explicou o organizador do encontro, Firdoze Bulbulia, começa-se a examinar o projeto de um «Media center» para as crianças, que possa produzir e distribuir transmissões de rádio e de televisão destinadas ao público mais jovem, com o objetivo de realizar um canal televisivo pan-africano dedicado à infância. Os organizadores do encontro estão também trabalhando no projeto de uma aliança africana dos meios de informação e de comunicação, seguindo o modelo daquela já existente na América latina.

2) INTERNET

Na Itália, 47% das famílias italianas têm um computador em casa, um dado relevante mas sempre muito baixo em relação à média dos outros países europeus. O uso da internet por parte dos adolescentes e jovens, e a familiaridade que têm com tudo aquilo que pode ser digitado ou «descarregado» da internet, apresenta não poucos problemas. Pela sua própria natureza de rede de comunicação global, o problema se apresenta em ótica internacional, procurando garantir a tutela dos menores através de precisos acordos com os provedores para um efetivo controle de conteúdo. No campo italiano, até 2006, a tutela dos menores tinha sido deixada nas mãos dos próprios provedores, que em 19 de novembro de 2003 assinaram um acordo de auto-regulamentação: o Codice Internet e Minori. Embora o acordo tenha sido estipulado entre os representantes dos vários provedores diante do Ministério para a Inovação e a Tecnologia, no entanto ele permanece um acordo privado, com lacunas, principalmente no que se refere às sanções que muitas vezes devem ser aplicadas. Em 2006, na seqüência de numerosos casos de violência sobre menores, muitos dos quais realizados através da difusão de material pedo-pornográfico (quando não se tratava de verdadeiro e próprio aliciamento de menores via internet), foi promulgada a lei 38 de 6 de fevereiro de 2006: «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet».
Enfim, como aplicação da lei 38/2006, em fevereiro da 2007 foi publicado um decreto determinando os requisitos técnicos dos instrumentos de filtragem que os provedores da rede internet devem utilizar para impedir o acesso aos sites já assinalados pelo Centro nacional contra a pedo-pornografia. Mas, isso não basta para superar as dificuldades e impedir que os menores possam navegar de maneira arriscada na «rede das redes».
Atualmente foi reativada a comissão anti-pedofilia e desvios de menores através da internet, o «Ciclope», que tinha sido instituída junto ao Ministério para a Eqüidade, do governo italiano, e que ficou inativa por um ano, até a sua reestruturação junto ao Ministério da Família. Está também para entrar em função um site dedicado ao uso da internet, junto ao Ministério das Comunicações, e um número telefônico de emergência gratuito, organizado pelo mesmo ministério e por «Save the children», que poderá ser utilizado por qualquer cidadão que queira assinalar algum abuso, desvio ou pedo-pornografia. Dentre as iniciativas mais recentes, deve ser assinalado o site www.tiseiconnesso.it criado pelo Ministério das Comunicações italiano, sempre em colaboração com «Save the children», onde é colocada à disposição uma série de informações sobre o conteúdo de certos sites, seja para os pais como para as próprias crianças, em conjunto com a campanha televisiva que tem como slogan «A melhor maneira de ajudar o seu filho a não usar incorretamente as novas tecnologias é conhecê-las».
Deve ser salientado também o fato de como a rede se tornou um grande mercado online. Para alguns produtores, o «e-commerce» de brinquedos corresponde já a 4% das vendas, e apenas em 2005 as vendas online corresponderam a 37.600 ações de compra. As razões para investir no processo online são múltiplas: desde a possibilidade de evitar as dificuldades logísticas de distribuição dos produtos, à ampliação de ofertas diferentes de produtos e também a possibilidade de envolvimento do cliente através de campanhas de mala direta e a criação de comunidades virtuais em torno de alguns produtos.

FICHAS:
Pedo-pornografia e internet
Em março de 2006, entraram em vigor as novas medidas diretas de combate e repressão ao fenômeno de exploração sexual dos menores e a pedo-pornografia, estabelecidas pela lei 38/2006 – «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet» foi publicada no Diário oficial em 15 de fevereiro de 2006, nº.38 – com a qual foram substancialmente modificados e integrados os artigos 600bis e seguintes do Código Penal italiano.
A lei confirma os artigos 527, 528, 529 e 725 do Código Penal italiano, que punem os «atos obscenos em local público, publicações, espetáculos obscenos, desenhos ou figuras que ofendem a decência pública».
Porque em muitas publicações, transmissões televisivas e anúncios publicitários, mesmo que não tenham declaradamente um caráter pornográfico, imagens de crianças e adolescentes são apresentadas de maneira explícita ou mais ou menos sutilmente ilusória e de forma falsa, pede-se um novo empenho das instituições competentes para que sejam observadas as normas em vigor e, se preciso for, que façam apelo aos órgãos de Polícia, o Instituto de autodisciplina publicitária, o Ministério das Comunicações, a Polícia postal ou a «Comissão tv e menor».

3) CINEMA

Confirmando as disposições da Constituição italiana, no que se refere ao direito e ao dever das famílias de serem protagonistas na educação de seus filhos, para muitos é chegada à hora de reelaborar a legislação que define o conceito de «censura» (a lei 161/1962 prevê a possibilidade de negar a autorização de abertura às salas de cinema ou de fazer cortes nos filmes, mesmo em função de um público adulto), que hoje está superado. É preciso com urgência estabelecer um critério de tutela dos menores não apenas no que se refere aos filmes que vêem nos circuitos cinematográficos, mas também sucessivamente em casa, muitas vezes em horários acessíveis na programação da televisão.
Uma avaliação correta e preventiva de um filme permite à família ter à sua disposição os instrumentos para escolher se um espetáculo é mais ou menos oportuno, conhecendo a trama, os eventuais conteúdos mais sensíveis, a classificação que a obra recebeu em outros países, etc. Por isso, é justo que a legislação seja revista, uma operação que requer atenção e perspicácia da parte das instituições em um momento de transição da mídia, como este que estamos vivendo, quando esta se tornou realmente um importante componente na educação dos menores.
Não faltam filmes que atraem o público por causa de seu conteúdo de violência, e no entanto entram no circuito cinematográfico sem qualquer restrição de idade. Para um filme que é notícia nos jornais, existem muitos outros com conteúdos duvidosos ou até mesmo perigosos que conseguem passar através do filtro da comissão de revisão cinematográfica, que atualmente funciona junto ao departamento de cinema do Ministério dos Bens Culturais.
Ao mesmo tempo em que existe um projeto de lei do ministro dos Bens culturais, que deve ainda iniciar os trâmites parlamentares, novas situações se apresentam na Itália, com a autocensura de filmes, feita pelos produtores ou distribuidores cinematográficos, com a introdução de novas e mais específicas faixas etárias para as restrições visando os menores a partir dos 10 anos de idade. As restrições serão feitas baseando-se em uma avaliação classificatória dos conteúdos das obras e sucessivamente serão ainda analisadas por uma comissão de psicólogos, educadores e pais.
Este sistema se inspira no modelo americano da Motion Picture Association of America (MPAA), que há 40 anos representa os interesses da indústria do audiovisual americana no mundo. Funcionando a partir de regras bem precisas (estabelecidas ao longo dos anos, também segundo as sentenças dos tribunais federais nos vários Estados americanos e em base aos protestos dos cidadãos), a autocensura americana prevê a existência de uma única comissão competente para determinar as restrições do PG12 ao «restricted» 17 anos. Esta comissão é composta exclusivamente de pais, considerados os primeiros depositários da educação dos filhos, e representam transversalmente a audiência. Importantes sanções econômicas asseguram que o mecanismo de autocertificação corresponda efetivamente aos interesses dos cidadãos. No site da Motion Picture estão disponíveis aos pais os pontos de referência para a avaliação das obras de entretenimento e são publicadas as restrições aplicadas a cada filme que está em exibição nas salas de cinema. Geralmente as avaliações parecem muito mais severas em relação a outros países. Tudo isso, nos vários anos de sua aplicação, deu uma qualificação à indústria americana e seu correto serviço prestado aos ouvintes. Qualquer estrada que se pretenda seguir na Itália, é importante para as famílias que seja estimulado um mercado de produção adequado à infância: é justo que o mecanismo da indústria cinematográfica continue com o seu ritmo de produção, mas não é justo confundir as classificações de acesso ao produto, como qualquer indústria sabe muito bem.
No que se refere às normas européias de classificação dos filmes, e em geral de todo «entertainment» (neologismo anglo-saxão, que, no entanto encontra sua raiz etimológica na relação entre educação e jogo) acessível aos menores, deve ser citado o sistema NICAM, que funciona na Holanda há alguns anos. Fundado em 1999, o NICAM (Nederlands Instituut voor de Classificatie van Audiovisuele Media) se baseia na lei Media Act, onde os programas de grupos que tiveram a autorização para atividades de «broadcasting» não devem incluir obras audiovisuais que prejudiquem o desenvolvimento físico e psicológico de pessoas com menos de 16 anos de idade, seguindo as diretivas da União européia («Televisão sem fronteiras» IV).
O sistema de classificação preventiva funciona também na Grécia, com a lei 1.597, de maio de 1986, que prevê que antes da projeção nas salas de cinema, cada filme seja submetido pelo produtor ou pela sociedade de importação à Comissão para a juventude, que classifica o filme seja como adequado aos menores, ou proibido aos menores de 13 anos, ou de 17 anos ou ainda, nos casos mais graves, severamente inadequado aos menores. Esta comissão é um órgão do Ministério da Cultura e foi concebida procurando-se estabelecer certa proporcionalidade, sendo composta de representantes do Estado (Ministério da Cultura), das categorias ligadas ao cinema, de psicólogos especializados na educação, de sociólogos, dos jovens, dos educadores e dos pais.
Na Áustria, está em vigor um sistema de avaliação complexo, instituído em base a um princípio constitucional federal que confia a tutela dos menores, no que se refere ao cinema e em geral aos meios de comunicação de massa, à competência específica dos Lander. A lei nacional que engloba a regulamentação da mídia é a ORF-ACT, ou seja, a Austrian Broadcasting Corporation nº. 379/1984, que estabelece quais os critérios sobre os quais deve se basear a proteção aplicada a programas e filmes transmitidos na televisão ou através de outros canais mediáticos. No que se refere à exibição dos filmes, a avaliação preventiva das obras cinematográficas, para que sejam decididas as faixas etárias adequadas, é regulamentada pela lei austríaca para a tutela dos menores, a «Jugendschutzgesetz», aplicada através das leis dos Lander federais. Esta lei estabelece nove faixas de restrições de público a partir dos seis anos de idade, com uma sucessiva graduação que prevê restrições para 10, 12, 14 e 16 anos de idade. Para supervisionar o sistema de classificação cinematográfica, existe uma comissão junto ao Ministério da Educação, em Viena, que comunica seu parecer sobre a idoneidade dos filmes às autoridades locais. Geralmente e de maneira individual os Lander adotam as decisões da comissão, e é em âmbito local que se decide de sua aplicação.
Na Espanha, o artigo 20 da Constituição reconhece o direito do cidadão a exprimir e difundir livremente seu pensamento, suas idéias e suas opiniões através de qualquer meio de divulgação. Se por um lado o exercício de tais direitos «não pode ser restrito através de nenhum tipo de censura prévia», o mesmo artigo especifica que «estas liberdades têm o seu limite no respeito dos limites reconhecidos pelas normativas que exprimem este respeito, especialmente no direito à honra, à privacidade, à própria imagem e à proteção da juventude e da infância».
Baseando-se neste princípio, a qualificação dos filmes (Real decreto 81/1997) e das obras audiovisuais é feita antes de sua difusão, através do Instituto de cinematografia e das artes audiovisuais (ICAA), uma entidade autônoma, mas ao mesmo tempo ligada ao Ministério da Educação e Cultura através da secretaria de Estado para a cultura (ver site www.mcu.es).
A subdireção geral de fomento à indústria cinematográfica e do audiovisual, que faz parte do ICAA, se ocupa, dentre outras funções, da classificação em faixas etárias dos filmes e das outras obras audiovisuais em vista de sua exibição pública e para a sua distribuição. A comissão se encarrega de divulgar as informações sobre os filmes e programas audiovisuais, com classificação que vai desde as «salas X» até as restrições para cada faixa etária do público.
Os filmes de caráter pornográfico não podem receber subvenções do Estado e sua projeção nas salas prevê uma taxa suplementar, destinada em parte para estimular um fundo de proteção cinematográfica. A projeção destes filmes pode ser feita somente nas «salas X», onde não podem ser apresentados outros tipos de obras cinematográficas e onde é proibido o ingresso de menores de 18 anos.

CINEMA NA TV

Devido ao alto consumo de programas de televisão por parte dos menores e levando-se em conta as diretivas da União européia, que promovem a auto-regulamentação no âmbito nacional das emissoras de tv e a participação das famílias nesta obra educativa, há alguns anos estão em vigor na França, na Holanda, na Grã-Bretanha, na Grécia e na Itália os códigos de sinais, que servem para identificar tanto os filmes projetados na salas de cinema como aqueles transmitidos na televisão. A tutela dos menores no âmbito da televisão foi também feita adotando-se o chamado sistema «watershed» (separador das águas), que funciona segundo uma seleção de faixas horárias protegidas, algumas aconselhadas à visão dos menores, outras aconselhadas a todos e outras ainda, principalmente na programação noturna, indicadas somente a um público adulto.
A faixa de idade determinada pela classificação preventiva dos filmes tem obviamente uma repercussão na programação das chamadas faixas horárias protegidas ou distintas nas emissoras de televisão pública em todos os países europeus. A definição das linhas de conduta comuns está à base dos acordos de auto-regulamentação e de co-regulamentação dos programas de televisão, estabelecendo-se um código de procedimento comum para as emissoras tanto públicas como privadas. Criou-se assim uma base normativa, que é assumida pela autoridade do Estado e que recebe a confiança dos consumidores das emissoras públicas ou privadas que adotam este sistema de auto-regulamentação.
Para tornar visível aos adultos as classificações dos programas apropriados aos menores, muitas emissoras européias adotaram um sistema de sinais que através de símbolos, números, cores e sinais acústicos advertem ao público a respeito daquilo que está para ser transmitido.
Mas, apenas este sistema, assim como o de filtragem (tipo v-chip), não basta para garantir uma verdadeira tutela dos menores diante de um conjunto de imagens difíceis de serem decodificadas por um jovem. Deve-se pensar às imagens de guerra dos telejornais, dos filmes escabrosos ou às informações sobre os crimes hediondos, que muitas vezes têm como ambiente o próprio núcleo familiar.
É na colaboração entre Estado, produtores de programas audiovisuais e famílias que pode ser fundamentado um autêntico respeito dos menores que encoraje o crescimento positivo da criança em base aos valores fundamentais da pessoa humana.

4) CELULARES COM VÍDEO

Hoje a difusão dos celulares com vídeo chegou à Itália ao índice se 134%, o que significa que muitas pessoas possuem pelo menos dois celulares, inclusive os jovens e as crianças, que recebem este instrumento dos próprios pais. De fato, de duas crianças entre 8 e 13 anos de idade, uma delas tem um celular no bolso. Aquele que poderia ser um instrumento para controlar melhor os deslocamentos e as necessidades dos filhos, se revela no entanto um perigoso meio que pode expor a outro tipo de utilização por parte dos menores, que não se separam nunca do próprio celular, nem mesmo durante as aulas, como lamentam vários professores. Apesar do código de auto-regulamentação assinado pelas principais operadoras (Código de conduta para a oferta de serviços a pagamento em tutela dos menores), na realidade os novos serviços opcionais do celular o tornaram um «personal computer» capaz de permitir novos usos que antes não tinham.
Os desenvolvimentos tecnológicos que estão se verificando no campo da telefonia móvel – particularmente no que se refere à sinergia com a internet e a adoção dos sistemas DVB de vídeos-telefone – contribuem a aumentar a oportunidade de comunicação também para as novas gerações e, ao mesmo tempo, repropõem em novos termos a questão da tutela dos menores. As evoluções já previstas ulteriormente para os próximos anos e o número sempre crescente de pessoas envolvidas, pedem uma grande consciência social e uma constante atenção das pessoas e órgãos encarregados de garantir os direitos dos cidadãos.
Neste contexto devem ser reafirmados os direitos dos menores no campo da comunicação, dentre os quais certamente não está em último lugar aquele que se refere também à segurança diante dos riscos de indução a comportamentos ilícitos ou de acesso a conteúdos nocivos ou indesejados. Também neste campo é essencial o papel dos pais e, em geral, de todos aqueles que são chamados a ter uma função educativa. A maior segurança das crianças e dos jovens quanto ao acesso a conteúdos ilegais é um ponto que deve merecer atenção também através da maior conscientização dos pais e das mães, que devem se capacitar a conhecer e utilizar estes meios.
Para a «alfabetização» dos pais na utilização da mídia devem colaborar também as instituições públicas, promovendo um uso positivo das novas possibilidades tecnológicas. Às empresas cabe a responsabilidade de colocar no mercado um produto que dê garantias no que se refere à sua utilização pelos menores, superando os limites estabelecidos pelo código de auto-regulamentação assinado pelas operadoras de celulares. Devem também oferecer maiores informações aos adultos que assinam um contrato de utilização, como por exemplo a adoção de bloqueios automáticos de acesso a conteúdos nocivos, se o celular passa às mãos de um menor de idade.

5) VIDEOGAMES

Trata-se de uma indústria global, que conquistou os jovens e não apenas eles. Os números relativos à difusão repentina dos videogames indicam que existem 250 mil sites de videogames, cada um deles propõe uma série de títulos, muitos deles recheados de cenas de sexo e de violência. Uma pesquisa recente do Instituto italiano de medicina social (IIMS) coloca em evidência, entre outras coisas, a escassa informação por parte dos adultos a respeito dos videogames utilizados pelos filhos, o predomínio de temas violentas em mais de 30% de títulos não aconselhados aos menores, o predomínio de personagens virtuais normais que podem se tornar especiais, realizando ações extraordinárias.
Mas, o ponto de risco mais elevado se refere aos pequenos jogadores de videogames, crianças entre seis e nove anos de idade que se submetem a entrar tão intensamente no jogo virtual que chegam a formas de dissociação da realidade e solicitam um monitoramento muito atento da parte dos adultos. A mesma pesquisa indica a presença de videogames em 25% das famílias com crianças de três a cinco anos de idade e em 65,2% das famílias com crianças entre seis e 10 anos de idade. O que produz efeitos negativos no âmbito cognitivo das crianças não parece ser especificamente o meio, mas muito mais os elementos que criam a excitação, tais como a velocidade de produção do estímulo e da resposta, a velocidade das imagens, os efeitos especiais, os contrastes, a fragmentação da história, o binômio rumor-ação. O uso prolongado do jogo inibe, segundo alguns psicólogos, a área da capacidade crítica, provocando passividade e ao mesmo tempo agressividade na criança. Mas, não queremos demolir os videogames, porque existem aqueles que são muito adequados aos mais jovens, com valores de informação e de educação, seja também porque o uso deste meio é na realidade um passo na preparação da criança ao sucessivo e mais sofisticado, que é o uso da internet.
De qualquer maneira, os dados relativos à venda destes produtos de entretenimento mostram um crescimento em todos os lugares e a difusão deste meio é acompanhada de uma aceitação social (ou seria uma resignação?) sempre maior.
É urgente ampliar o percurso de conhecimento e das estratégias internacionais, para monitorar um mercado que está cada vez mais vasto. Parece urgente estabelecer modalidades operativas para o controle dos conteúdos e do sistema de sanções, seja para o produtor como para o vendedor dos serviços. O código de auto-regulamentação Pegi (derivado em 2003 do sistema de avaliação e classificação holandês, Nicam, que assinala os conteúdos inadequados aos menores), adotado pelos industriais de «entertainment» que produzem videogames, é a única forma de auto-regulamentação existente atualmente e que prevê sanções (raramente aplicadas, mesmo diante de casos graves evidentes) para os produtores que colocam no comércio os jogos com indicações de faixas etárias apenas aproximativas.
O código Pegi, ao qual a associação européia Isfe adere em 2002, é evidentemente insuficiente na sua função declarada de «fornecer aos consumidores as informações mais oportunas» e expostas no selo de produção. E, como o setor dos videogames tem hoje um volume de negócios que ultrapassa os 740 milhões de euros, envolvendo 24 milhões de jogadores (43% da população a partir dos quatro anos de idade), com uma venda dos produtos classificados para maiores de três anos de idade que chega aos quase 48% dos consumidores. É um dado que define o impacto deste gênero de meio sobre a infância e a adolescência, mostrando toda a sua periculosidade, seja pelo consumo de conteúdos inadequados, seja pelo excessivo número de horas dedicado neste passatempo, muitas vezes solitário e sem a presença de um adulto ao lado. Se for verdade, como sustenta a indústria, que a produção de videogames violentos é apenas uma mínima parte do mercado, é também verdade que esta representa a fatia mais importante do retorno econômico.
O interesse pelos videogames é alimentado pela sinergia com os filmes que inspiram o jogo homônimo e que torna sempre mais atrativo este gênero, principalmente para os adolescentes. Desta maneira é importante também neste campo o estabelecimento de regras precisas em defesa dos consumidores dentre o público jovem, mais exposto aos riscos destas novas formas de entretenimento cada vez mais sofisticadas e envolventes, por causa da combinação entre narrativa e efeitos gráficos.

6) PUBLICIDADE

O problema da tutela dos menores diante da publicidade se apresenta como um corolário, dentro do quadro mais amplo que regulamenta a difícil relação entre a mídia e as crianças. A televisão, e portanto também a publicidade, se constitui em uma fonte de perigo para os menores, isto é, para a maior parte das crianças, principalmente em idade pré-escolar, que devem saber fazer a diferença entre a publicidade e o resto da programação, e entre os programas de ficção e a realidade. Com essas considerações não significa que exista uma acrítica rejeição da publicidade em si mesma – à qual se reconhece, no entanto, onde proceda corretamente, uma função positiva no processo de formação, de crescimento crítico e de socialização do menor –, mas existe a necessidade de prever um sistema de regras destinado a garantir-lhe um uso adequado.
O efeito dos anúncios publicitários é tão grande que em alguns países estão sendo tomadas medidas drásticas a respeito. No Reino Unido, por exemplo, recentemente foram vetados os anúncios publicitários durante os programas destinados às crianças até nove anos de idade, a partir de 1º de janeiro de 2008 a medida se estenderá à programação para os jovens até 15 anos de idade e até o final de 2008 serão vetados em todos os canais dedicados aos menores. Apesar de se reconhecer que a publicidade serve para financiar os programas, aqueles dedicados às crianças terão que recorrer a outras fontes. Também na França começa a se impor uma «linha dura» a esse respeito: visto a alta incidência de publicidade de merendas, de sucos e doces em geral, a partir de agora os anúncios dedicados às crianças deverão ser precedidos de uma espécie de aviso, que orientará para uma alimentação adequada.
Mas, por que as crianças são tão frágeis diante dos apelos da publicidade? Na Itália, explica Paolo Landi, secretário geral da Adisconsum (Associação de defesa dos consumidores e do ambiente»), em um capítulo de seu estudo «Crianças da multimídia»: «Se consideramos que a publicidade não faz outra coisa que veicular um conhecimento imediatamente concretizável em um “ter”, ou em um “ser”, ou em um “fazer”, a criança absorve sem dificuldades os três componentes que são a obsessão dos expertos de marketing, isto é, o componente cognitivo (como fornecer informações indeléveis sobre um produto ou um serviço), o componente afetivo (como fazer o consumidor reagir de maneira emotiva) e o comportamental (como colocar o pequeno consumidor em movimento na direção da aquisição). A partir deste ponto de vista a criança é o público ideal, o consumidor a quem se pode vender qualquer coisa».
Na Itália está em vigor um código de autodisciplina publicitária que surgiu em 1966, em base a um acordo entre os profissionais do setor. Esta primeira forma de tutela, em grande parte com origem comunitária, tem como protagonistas entidades administrativas independentes: a Autoridade de controle da concorrência e do mercado de setor e a Autoridade de garantia para as comunicações e a editoria. Enquanto isso, para a auto-regulamentação, orientada pelas normas que constam do Código de autodisciplina publicitária, e agora também, embora com força jurídica diferente, pelo Código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual se reconhece um poder de decisão e de sanção, emanando uma ordem e intimando seu cumprimento.
Em todos os países onde a televisão serve de veículo às mensagens publicitárias, o mundo empresarial é plenamente consciente do enorme poder de influência que a publicidade tem sobre as crianças.



NORMATIVA INTERNACIONAL

O assunto relativo à tutela dos menores na mídia é um dos mais debatidos, seja no que se refere às normas nacionais, seja no âmbito internacional. Encontra-se diante da situação de precisar acertas as contas com toda a extensão da rede global da internet. O exemplo que, neste momento de transição, coloca mais em evidência a necessidade de estabelecer leis que estejam em condições de controlar o acesso e uso dos conteúdos nocivos para os menores, é exatamente o da internet. Qualquer pessoa no mundo pode abrir um site considerado «arriscado», contendo elementos ilegais e acessíveis a consumidores despreparados, disponibilizados por quem está do outro lado do mundo.
No que se refere aos princípios gerais no âmbito do direito internacional, é preciso recorrer principalmente à convenção da ONU sobre os direitos da criança, com sede em New York, ratificada pelo Parlamento italiano através da lei nº.176/1991. Esta garante à criança uma «consideração proeminente» também a respeito da liberdade, seja no se refere à expressão, seja quando tutela os conteúdos recebidos. Esta mesma convenção, em seu artigo 17, fala da relação entre menor e televisão, desejando «um sistema normativo que tutele o menor-consumidor, mesmo com todas as dificuldades que se apresentam», seja para individuar os fenômenos que devem ser monitorados, seja sobre as normativas possíveis.
No direito da União européia, tal tutela foi recentemente confirmada pela Carta dos direitos fundamentais da União, aprovada em Nice em 2000, cujo artigo 24 salienta que «os Estados membros reconhecem a importância da função exercida pelos meios de comunicação de massa e cuidam para que a criança possa ter acesso às informações e materiais... com a finalidade de promover o seu bem estar social, espiritual e moral, além de sua saúde física e mental». A normativa seguinte, 89/552/CEE, previu algumas restrições, seja no que se refere aos programas como para as mensagens publicitárias destinadas a este público». O artigo 22 desta normativa conduz a impedir a transmissão de programas que contenham cenas pornográficas ou de violência gratuita, ou outros programas inadequados a este público. Não podemos esquecer de mencionar a determinação expressa de «Televisão sem fronteiras», que está hoje em sua quinta versão atualizada, que o tema da tutela dos menores está relacionado com o estatuto geral dos direitos dos menores e corresponde ao disposto nos artigos 50 e 31 da Constituição italiana.
Se for claro que os princípios normativos são todos a favor da tutela dos menores, é também verdadeiro que uma tecnologia em contínua evolução colocou em crise as velhas regras do jogo. Mas também é claro que não se pode mais adiar a necessidade de estabelecer novos parâmetros normativos, para que as crianças possam utilizar os meios de comunicação próprios de seu tempo, com aproveitamento e serenidade também para as famílias.~

EDUCAÇÃO À MÍDIA NO MUNDO: PARA SABER MAIS

A difusão da educação à mídia é uma resposta à necessidade de se informar sobre as novidades no campo dos novos meios de comunicação. Em seguida citamos apenas alguns sites que em vários países oferecem maiores informações sobre como aprender a usar melhor a mídia, enfrentando a problemática da tutela dos menores e da alfabetização às novas tecnologias por parte dos adultos.
«The Media Awareness Nework-Réseau éducation médias» é uma organização canadense sem fins lucrativos, pioneira no desenvolvimento de programas sobre a educação à mídia. Com esta finalidade ela produz programas online em colaboração com organizações internacionais, convicta que, para interpretar as mensagens de informação, de entretenimento e comerciais, os jovens têm necessidade de instrumentos críticos válidos. Por isso é importante formar também os adultos (famílias e professores) sobre como funciona a mídia e como ela determina o estilo de vida.
A organização realiza uma ação contínua de monitoramento em relação à mídia (televisão, cinema, videogames, imprensa, publicidade, etc.), e sua seção dedicada aos pais oferece uma série de elementos para que estes reflitam com os filhos sobre esses meios, além da seção para os educadores, que inclui lições e materiais de apoio. Uma outra seção é dedicada à análise das questões ligadas à mídia, como a difusão de estereótipos, as representações de violência e da diversidade, a privacidade, a publicidade dirigida aos menores. Seu site é em inglês e francês (http://www.media-awareness.ca).
«Quai des images» é o site dedicado ao ensino de cinema e audiovisual organizado pelo Ministério da Educação francês. Ele propõe atividades ligadas à educação à imagem e de análise dos filmes em consonância com os programas escolares, agrupa os textos oficiais a respeito dos meios audiovisuais, oferece uma série de instrumentos de análise e de estudo completos sobre alguns filmes específicos e sobre certos autores em particular, informa sobre conferências, seminários, cursos e festivais sobre o mundo audiovisual e sua utilização em âmbito educativo e didático. Entre outras coisas, reúne também as propostas e as experiências feitas por professores e seus alunos nas escolas secundárias francesas no campo da educação à imagem, além de organizar um fórum de discussões aberto a todos sobre a educação à mídia (http://www.ac-nancy-metz.fr).
Sempre na França, está em funcionamento o blog «Zéro de conduite», organizado pelos professores e destinados a educadores, pais e estudantes. Promove o uso do cinema como instrumento pedagógico, dedicando-se especialmente à atualidade cinematográfica, mas sem esquecer os clássicos e os documentários. Com várias seções e espaços de aprofundamento, se propõe como um local de discussão de temas em um debate aberto (http://cinema-ducation.fluctuat.net).
A Universidade de Massachussetts organizou o Media Education Foundation – MEF, mídia de desafio, que produz e distribui documentários destinados a estimular o pensamento crítico e o debate sobre a relação entre aqueles que detêm o poder sobre a mídia, os conteúdos da mídia comercial, a exigência democrática de um livre fluxo de informações, as diversas representações de idéias e pensamentos e o direito dos cidadãos de informar e serem informados. Alguns destes temas são abordados criticamente, como a identidade do gênero na publicidade, a imagem de sexo nos videoclipes, o papel da mídia na construção da identidade cultural, mídia e saúde, etc. (http://www.mediaed.org/).

(a cura di M. F. D’A.)

 
At 9/17/2007 2:44 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

AS CRIANÇAS E A MÍDIA (II PARTE):
ACEITAR O DESAFIO EDUCATIVO


O tema da 41ª Jornada das Comunicações Sociais, «As crianças e os meios de comunicação: um desafio para a comunicação», nos convida a refletir a respeito de dois aspectos particularmente importantes. O primeiro é a formação das crianças, para que estejam em condições de receber de maneira crítica aquilo que vêem. O segundo é a formação à consciência e ao uso consciente da mídia, que está em contínua transformação tecnológica.
De fato, é o que especifica Bento XVI no início de sua mensagem, de 20 de maio de 2007, para a Jornada: «Os complexos desafios que a educação contemporânea deve enfrentar são muitas vezes ligados à grande influência dos meios de comunicação no nosso mundo. Como aspecto do fenômeno da globalização e estimulados pelo rápido desenvolvimento da tecnologia, os meios de comunicação delineiam fortemente o ambiente cultural (cf. João Paulo II, O rápido desenvolvimento, nº3). Na realidade, há quem afirma que a influência formativa da mídia está em competição com aquela da escola, da Igreja e, quem sabe, até com aquela da própria família».
De fato, como salienta o Pontifício conselho para as Comunicações Sociais, «para muitas pessoas, a realidade corresponde àquilo que os meios de comunicação definem como tal». Episódios recentes, como a utilização do celular na filmagem de violências nas salas de aula, abusos sofridos por pessoas deficientes, fenômenos de trote e de violência generalizada, demonstram como as crianças que crescem passando uma média de quatro horas por dia diante da televisão, sozinhos em casa, absorveram a lógica do «estou no vídeo, logo existo». Os psicólogos, os pedagogos e os estudiosos dos meios de comunicação estudam há tempos sobre as relações entre o consumo televisivo e o comportamento violento dos menores. Uma grande quantidade de pesquisas realizadas em muitos países ocidentais demonstra como esta correlação seja realmente inegável.


NOVAS LINGUAGENS

O fato que muitas crianças vivem completamente inseridas no mundo dos velhos e novos meios de comunicação, que estão cada vez mais frequentemente em correlação entre eles, é confirmado pela popularidade de alguns modelos televisivos, considerados tão efêmeros quanto penosos «momentos de glória», presentes nos programas com os maiores índices de audiência, dos «reality» aos «talk show», sem falar do «trash», que hoje se tornou um gênero de espetáculo.
Dentre as preferências demonstradas pelos adolescentes italianos que assistem televisão mais do que três horas por dia, encontramos, em primeiro lugar, a figura da «veline» (Ndt: misto de corista e coadjuvante na apresentação de programas populares da televisão italiana), enquanto outros da mesma idade se concentram no mais clássico exemplo, o do jogador de futebol. De toda maneira, a coisa mais importante é aparecer, pouco importa por qual motivo, de ser «alguém» ou «alguma coisa» no Olimpo mediático, mesmo que seja apenas por um instante.
Estes são os exemplos mais negativos dos condicionamentos derivados de um excessivo e acrítico uso dos meios de comunicação. Encontramo-nos diante de uma nova geração que cresceu na frente da televisão, capaz de usar as novas tecnologias que os próprios pais, que as adquiriram e as tornaram disponíveis, muitas vezes se encontram despreparados para utilizá-las.
Tanto é verdade que hoje em dia os filmes são vistos diretamente nos celulares e a televisão pode ser assistida na tela do computador. Hoje se telefona através da internet e graças ao download se descarrega os CDs e DVDs mais recentes, se filma e se faz foto com o celular, e assim por diante.
Nas casas, o vocabulário familiar se reduziu ao gênero dos sms e se fala tendo o som da televisão no fundo, se comunica através de e-mail, se faz «visita virtual» via computador, se percorre através de bibliotecas virtuais, tanto que as fichas e arquivos de papel evocam imagens do outro século, completamente em desuso.
A situação dos nossos filhos é diversa daquela da geração precedente, pois eles abriram seus olhos tendo diante de si estes cenários de profunda, contínua e envolvente transformação tecnológica. Eles se constituem aquela que os estudiosos chamam de geração nascida «com seis dedos»: além dos cinco dedos normais da mão, o sexto é o mouse do computador.
Com o aparecimento do mundo «virtual» da internet e dos videogames criou-se uma defasagem em relação à realidade verdadeira e própria. As duas dimensões parecem muitas vezes, e para muitos jovens, como universos paralelos, com conseqüências não indiferentes no plano do processo de amadurecimento. Têm grande sucesso os sites nos quais se prevê uma segunda vida (basta verificar os milhares de registros nos poucos meses de existência do site italiano de «Second Life», que em todo o mundo já tem sete milhões de inscritos), onde a simulação reproduz todas as situações da vida real. Apenas que tudo é falso, a começar da nova identidade, que pode ser escolhida e com ela se inicia a fazer parte deste mundo fora do mundo, onde se pode ser um «qualquer coisa». Isto é, ninguém.
Assim, o grande desafio cultural de hoje é propriamente a redefinição dos limites, que muitas vezes se apresentam demasiadamente instáveis. Isto é, redefinição dos limites entre o real e o virtual, superando a divisão digital que hoje separa as gerações adultas daqueles mais jovens.


OS JOVENS: PROTAGONISTAS OU VÍTIMAS DAS MUDANÇAS?

A linguagem deles é pobre, muitas vezes recheada de termos tirados do dicionário do internauta: clicar, chatar, messagiar, deletar, são alguns dos neologismos que fazem parte de seu vocabulário quotidiano. Falta uma dimensão humana da tecnologia que esteja em condições de traçar o perímetro cultural entre o real e o virtual. Assim a aldeia global difundiu uma quantidade de modelos comportamentais desviados, ou pelo menos discutíveis.
Desta maneira, os jovens que vivem a milhões de quilômetros de distância jogam o mesmo videogame, vêem o mesmo filme, assim como, de maneira transversal, absorvem modelos e comportamentos semelhantes. Muitas vezes os adultos têm menos domínio no uso das novas tecnologias e observam, com uma preocupação resignada diante de suas próprias limitações, as crianças que navegam facilmente na internet.
As raízes das dificuldades neste campo educativo são muito bem explicadas por Marina D’Amato, professora de sociologia da Universidade de Roma, que salienta: «Cada geração tem necessidade de se encontrar também em um mundo fantástico, que serve a interiorizar o paradigma do bom e do belo, do justo e do errado, do oportuno e do útil, também em relação aos exemplos que procedem da narrativa. Hoje nos encontramos em uma condição na qual os avós e os pais contam cada vez menos histórias aos filhos e aos netos, e este papel foi assumido pela televisão. Mas, na realidade, a televisão “exila” e “con-funde”, isto é, funde os modelos morais que são frutos de ânsias e problemas mal resolvidos, muito mais que de certezas. Embora estes se transformem com freqüência, a cada três ou quatro anos, o fato de serem repropostos continuamente faz com que se justaponham uns aos outros» (ver Come mediare i media, de Mario Russo).
Se for verdade que a televisão é o meio mais usado até a adolescência, imediatamente depois surge a grande atração pela internet. Esta passagem nasce de uma sintonia com a linguagem televisiva, que na idade infantil muitas vezes é ouvida durante muitas horas no dia. Esta linguagem se baseia em uma mediação da realidade e desta maneira ela ativa um processo de recepção que é de tipo emotivo.
Neste registro emocional é mais fácil acabar envolvido por situações e figuras capazes de se proporem como modelos identificadores, preservadores de sentido e de comportamentos a serem imitados.
O poder de concentrar uma vontade emulativa em alguns personagens, que correspondem particularmente às necessidades interiores do jovem (necessidades na maioria das vezes induzidas pela publicidade ou por modelos estimuladores), tem uma forte relação com a quantidade de horas que o jovem passa utilizando os novos ou os velhos meios de comunicação.


EDUCAÇÃO NECESSÁRIA

«A formação adequada a um uso correto dos meios de comunicação é essencial para o desenvolvimento cultural, moral e espiritual das crianças… Educar as crianças a serem seletivas no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja, da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos. Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia, com a certeza de que este difícil, embora gratificante, aspecto da condição de pais, é apoiado por toda a comunidade.»
As palavras do discurso de Bento XVI definem com grande clareza o paradigma de uma justa relação entre a mídia e os menores. Uma clareza que devemos agradecer ao magistério da Igreja, no momento em que o mundo da mídia parece ignorar a verdadeira problemática educativa das crianças e as expectativas de qualidade e de segurança exigidas pelas famílias no que se refere ao uso desses meios, seja do cinema aos videogames, da televisão à internet.
Diante da utilização destorcera do meio televisivo, o mais difundido dentre os meios de comunicação, a Igreja se interroga sobre o porquê da televisão não ter um papel educativo e por que os meios de comunicação não podem ser companheiros confiáveis para os jogos na fase de crescimento da criança. O anúncio de uma recente campanha sobre o uso da mídia, promovida pelo Ministério das Comunicações, mostra os vários membros da família que estão vendo a televisão ao lado de uma criança.
Que se trate do avô ou da mãe, a mensagem é a mesma: não deixar uma criança sozinha diante de um meio que, sem o apoio crítico educativo de um adulto, pode transmitir conteúdos inadequados à idade e à maturidade daquele que o vê. Sem esquecer as responsabilidades dos produtores televisivos, empenhados na organização dos programas, o papel da família é realmente insubstituível.
Se realmente o objetivo de quem administra a sociedade de produção televisiva, ou das multinacionais produtoras de videogames ou das operadoras de celulares, é o de promover e vender o produto, o bem estar psicofísico da criança está no centro do interesse dos educadores, sejam eles os professores ou, em primeiro lugar, os pais.
Isto explica bem a mensagem do Papa, que continua a sua análise, salientando que «educar as crianças a serem seletivos no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja e da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos (ver João Paulo II, «Familiaris Consortio», 76). Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia.»


CONTEÚDO DA MÍDIA

No panorama de uma revolução da multimídia, que está modificando transversalmente os hábitos, a mentalidade, os modelos e as linguagens, deve voltar ao centro do debate a tutela daquilo que é melhor para os menores. Sem acusar a «mídia», que enquanto tal não é nem boa nem má, o importante é partir de uma a análise do produto, para assim poder individuar conteúdos que sejam de melhor qualidade para as crianças e os adolescentes. Porque a televisão é um instrumento que abre janelas de conhecimento para o mundo e, se bem utilizada, de «má professora» pode se tornar uma preciosa fonte de estímulo para o crescimento humano e cultural.
A mesma coisa vale, e com mais razão, para a «rede» que engloba e compreende tudo, e para os videogames, onde, ao invés de violência e monstros, poderia se dedicar a produzir (e isso já ocorre em certos casos) histórias instrutivas e de conteúdo interessante.
Bento XVI coloca justamente em evidência as enormes possibilidades para que seja melhorado o conteúdo deste grande campo de produção multimídia: «A educação através da mídia deveria ser positiva. Colocando as crianças diante de um meio estética e moralmente excelente, estas recebem uma ajuda para que desenvolvam a própria opinião, a prudência e a capacidade de discernimento. É importante aqui reconhecer o valor fundamental do exemplo dos pais e as vantagens de introduzir os jovens aos clássicos da literatura infantil (…). A beleza, quase um espelho do divino, inspira e vivifica os corações e as mentes juvenis, enquanto a feiúra e a vulgaridade têm um impacto deprimente sobre os comportamentos». Diante de uma decadência geral do produto televisivo, a questão da qualidade aparece ainda mais forte e vibrante em grande parte de um público formado de famílias, que pede para não ser apenas um exército indistinto de ouvintes silenciosos, mas um público em condições de exprimir suas preferências por conteúdos formativos e informativos de bom nível.
A mensagem de Bento XVI continua, com algumas importantes indicações: «Como a educação em geral, aquela da mídia requer também uma formação ao exercício da liberdade. Trata-se de uma responsabilidade que compromete. Muitas vezes a liberdade é apresentada como uma incansável procura do prazer ou de novas experiências (…). Este desejo, sentido profundamente pelos pais e educadores, que é o de educar as crianças no caminho da beleza, da verdade e da bondade, pode ser apoiado pela indústria da mídia somente na medida em que se promove a dignidade fundamental do ser humano, o verdadeiro valor da vida familiar, as conquistas positivas e as metas da humanidade. A partir disso, a necessidade de que os meios de comunicação estejam empenhados na efetiva formação e no respeito da ética deve ser vista com interesse particular e com urgência não apenas pelos pais, mas também por aqueles que têm responsabilidade cívica».
Na realidade, nos encontramos na situação de ter que reconhecer que na Itália falta uma verdadeira «cultura da criança»: a situação é tão séria que no âmbito institucional procura-se dar uma nova organização geral para verificar e controlar os conteúdos dos setores de entretenimento, como os videogames, que até agora estão submetidos apenas a códigos de auto-regulamentação, feitos e codificados para uso e consumo pelas indústrias produtoras.
Uma vez mais, o primeiro e indispensável apoio à criança só pode vir da família e de uma relação mais estreita com os professores e educadores, exatamente como salienta Bento XVI, lembrando-nos que a preocupação educativa dos pais não deve se tornar uma preocupação genérica, mas uma atenção constante a tudo aquilo que diz respeito aos filhos.

A INDÚSTRIA DA MÍDIA

1) A TELEVISÃO

Se a televisão convencional se apresenta como um ramo de atividade já «maduro», no entanto se apresenta no horizonte a situação da mídia digital (satélite ou a cabo), também como uma plataforma que consente a ligação entre televisão, internet e outro tipo de mídia através do computador. No que se refere à qualidade da programação, apesar dos inúmeros bons propósitos anunciados no âmbito institucional, parece pequena a atenção às exigências dos menores em suas diversas faixas etárias. A programação para os menores, na realidade é confinada em redes e horários particulares, enquanto o resto da programação na faixa horária considerada «para todos» muitas vezes apresenta conteúdos inadequados aos jovens. Mas, quais são as expectativas das gerações de jovens no que se refere à televisão? É realmente verdade que preferem o «trash», os jogos com prêmios absurdos e as «velines»?
A partir de uma pesquisa recente feita pelo instituto Censis sobre «Comunicação, pluralismo social, sociedade aberta» (2005) surge que a relação entre os menores, e em particular dos adolescentes entre os 14 e 18 anos de idade, e a televisão é determinada por elementos de forte contradição e de passividade. Nessa faixa etária, 100% deles vêem televisão praticamente todos os dias, 86% acompanham um pouco de tudo, com uma relevante predileção pelos filmes (72%), por esporte (32%) e pelos «reality shows» (18%).
No entanto, a amostragem entrevistada não está realmente satisfeita com aquilo que vê. De fato, 36% dos adolescentes denunciam a vulgaridade difundida nos programas e 25% criticam a superficialidade. Dentre eles, 46% consideram a televisão como um meio que «invade», ao mesmo tempo em que é interessante notar que 25% consideram que em geral a programação televisiva alimenta nas crianças menores uma visão consumista da vida. Destes dados surge o contraste entre a procura de distração e a reprovação daquilo que lhes é proposto pela programação. Isto significa que o alto índice de procura não é um indicador de satisfação.
Considerando o axioma de que a televisão seja onipresente, fica claro que são os próprios jovens a pedirem uma maior atenção aos conteúdos: menos violência e menos vulgaridade. A exigência de uma regulamentação diversa, diz claramente o relatório do Censis, «não vem somente daqueles, pais e educadores, que estão preocupados pela possível influência negativa sobre os menores, mas se exprime nitidamente também através dos adolescentes, pelo menos de uma parte mais esperta e consciente dentre eles».
Para tutelar melhor os direitos dos menores, desde 2002 foi instituído junto ao Ministério das Comunicações um código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual aderiram os produtores de televisão, seja no âmbito nacional como local. Baseando-se nos princípios sobre a matéria existentes na Constituição italiana e na Convenção dos direitos da criança, estabelecida em 1989 pela ONU, a comissão que controla sua aplicação avaliou em todos estes anos de atividade os milhares de casos em que foram violadas as normas de tutela, que prevêem a transmissão de programas e imagens adequadas a um público de menores de idade durante aquela que é chamada de «faixa protegida» da programação televisiva (das 7h30 às 22h30), intervindo com denúncias e sanções, que nos casos mais graves foram aplicadas pela Autoridade de garantia no setor das comunicações. Para o futuro, esta comissão deverá se transformar em um organismo mais amplo de controle, que se chamará «Mídia e menores», que além da televisão deverá monitorar também os setores dos vídeos-telefone e dos videogames, além da internet, que é o campo de maior risco.

REGRAS DE TUTELA EM OUTROS PAÍSES

É diversa a situação em outros países, como por exemplo na Grã Bretanha, onde o sistema de regulamentação da mídia é estruturado e complexo e foi atualizado nas últimas décadas, com uma particular atenção à tutela dos menores. As inovações tecnológicas neste setor levaram as normativas inglesas a uma série de novas disposições, como por exemplo, a visão em casa de vídeo exclusivamente para adultos, e que fora de casa seriam vetados aos menores, ou o combate à praga mundial dos sites internet para os pedófilos, que contenham material pornográfico ou com conteúdos que possam esconder o aliciamento de menores (ver a Protection Childres Act, de 1978).
A programação televisiva é regulamentada pelo Broadcasting Act (1996), de onde deriva a instituição da Broadcasting Standard Commission (BSC), um órgão independente de controle que estabelece as normas de avaliação e classificação dos programas, também no que se refere aos conteúdos violentos ou que possam ofender a decência pública (site oficial www.bsc.org.uk). Este organismo BSC funciona internamente à estrutura do Broadcasting, supervisionando e regulamentando todas as emissoras de televisão e de rádio, via cabo ou por satélite. Sua tarefa é a de elaborar os códigos de conduta e de aplicação de modelos que respeitem a justiça, além de monitorar os modelos, verificando que respeitem as leis. Com a transmissão de programas com conteúdos considerados inadequados aos menores de várias idades, há alguns anos a televisão inglesa adotou o sistema «watershed», um «separador de águas» entre um horário de programação familiar e outro para os adultos. Todo o sistema televisivo inglês se apóia sobre a responsabilização das famílias, pois sem a colaboração delas qualquer código de modelos para os programas é praticamente inútil.
Na França, está vigorando já há anos um código através de sinais televisivos, que entra em função para assinalar os programas inadequados aos menores. A avaliação do programa televisivo é feita pelo Conseil Supérieur de l’Audiovisuel (CSA), uma autoridade administrativa independente, que controla a difusão dos filmes e outras transmissões em vários canais privados, nacionais, regionais ou locais. A normativa francesa (lei 719/2002) veta a transmissão de programas que possam prejudicar gravemente a integridade física, mental e moral dos menores, porque divulgam conteúdos de pornografia ou de violência gratuita. As transmissões são classificadas por um código de sinais que, em conjunto com um sistema organizado de faixas horárias de programação, garante às famílias mais clareza sobre os programas destinados aos menores.
Na Alemanha, o tema da infância tem particular atenção da legislação, que considera desde o nascimento o início dos direitos fundamentais do cidadão. A tutela é disciplinada no âmbito público pela JSchG (desde o dia 26 de fevereiro de 1985), enquanto a lei GjSM se ocupa do controle sobre a difusão de publicações e conteúdos mediáticos considerados danosos para os menores. A regulamentação no setor televisivo é feita segundo as normas do acordo sobre a radiodifusão dos Lander federais, que as entidades para a mídia nesses Lander adotaram por base para o estabelecimento das diretivas que tutelam o interesse dos menores nas emissoras privadas. Não são admitidas transmissões que incitem o ódio racial, que exaltem a violência ou a guerra, que ofendam a dignidade do homem, que sejam de gênero pornográfico, que mostrem pessoas moribundas ou com sofrimentos que ofendam a dignidade humana. Os responsáveis pela programação, escolhendo os horários das transmissões, devem cuidar para que os menores não vejam programas que podem prejudicar o seu bem estar psíquico, físico ou mental. As transmissões inadequadas às crianças menores podem ser transmitidas somente depois da autorização da entidade competente do Land interessado.
Os responsáveis pela organização dos programas televisivos em âmbito nacional devem nomear encarregados pela tutela dos menores, que atuam no momento da aquisição, da projeção e da realização dos programas. As emissoras privadas fundaram em 1993 uma associação de autocontrole voluntário da televisão («Freiwillige Selbskontrolle Fernsehen», FSF), à qual devem ser apresentados programas particulares, antes da sua transmissão, e suas avaliações consideradas nas decisões das entidades de controle da mídia nos Lander federais. Existe ainda o órgão comum do cidadão para a tutela dos menores, dos programas, da competência mediática e controle da mídia (GSJP), do qual faz parte um integrante da entidade para a mídia nos Lander federais, que dá o seu parecer a respeito de algumas séries, filmes e espetáculos mais ou menos adequados aos menores. Este órgão, o GSJP, decide sobre pedidos de mudança de horários de transmissão de filmes proibidos para menores, controla a forma de novos programas e experimenta novas disposições para a tutela dos menores na televisão digital. A peculiaridade da jurisdição alemã, seja no setor televisivo como no cinematográfico e da mídia em geral, é a minuciosa atenção às exigências com o desenvolvimento do menor e aos riscos que este pode correr com a observância incorreta das leis.
Nos Estados Unidos, é possível consultar via internet um «guia televisivo para os pais» (ver o site www.mpaa.org), que prevê algumas categorias de audiência aplicadas aos programas televisivos transmitidos a todo o público. Este guia organiza várias siglas para identificar a categoria de audiência para cada transmissão: vai-se do TVY (para todas as crianças) ao TVG (para todos), através de várias faixas etárias, que correspondem à passagem da primeira à segunda infância e desta à adolescência. Depois tem o TVPG («parental guidance», visto na presença de um dos pais), o TV14 («parent strongly cautioned», séria advertência aos pais), para os programas que contêm cenas de sexo e de violência. Enfim, há o TVMA, que prevê um «mature audience only», ou seja, destinado a um público de idade superior a 17 anos, última fronteira para os conteúdos considerados «restricted».
Estas avaliações foram elaboradas baseando-se nas opiniões dos próprios pais e são fáceis de serem encontradas e compreendidas. Esta linha de «guia de televisão para os pais» pode ser usada juntamente ao «v-chip», que é um dispositivo de filtro instalado na maior parte dos mais recentes modelos de aparelhos de televisão, para permitir aos pais de bloquear os programas inadequados.

FICHA 1
Brasil: «O que eu penso da tv»
No Brasil, a audiência infantil é muito alta: aproximadamente 30 milhões de crianças vêem televisão pelo menos durante três horas por dia. Explica a profa. Rosália Duarte, do departamento de Ciência da Educação, da PUC do Rio de Janeiro, que «as crianças são muito perspicazes, mas nós podemos e devemos ajudá-las a ampliar o seu quadro de referências, para que possam discutir ainda melhor sobre o conteúdos daquilo que vêem. Para isso temos necessidade, antes de tudo, de ouvir aquilo que elas têm a dizer sobre o assunto e de dialogar com elas. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e muito mais freqüente, a outras atividades culturais». No âmbito de uma pesquisa feita através de um questionário distribuído nas escolas, intitulado «O que eu penso da tv», apareceu que «as crianças querem seriamente ser ouvidas sobre aquilo que pensam da tv, mas sentem que sua opinião é considerada pouco importante e não estão contentes com o excesso de imagens de violência exibidas na televisão, principalmente a violência “real”, definida como aquela transmitida nos telejornais. Eles adoram ver televisão e não importa o que os adultos pensam e dizem a respeito disso. A eles agradam quase todos os tipos de programas transmitidos: novelas, desenhos animados, programas de humor, filmes, seriados, mas isso não faz deles espectadores “idiotas”, pois fazem críticas muito interessantes, pertinentes e bem elaboradas sobre o que consideram feio ou inadequado na televisão. Para a maior parte deles, a televisão se oferece como principal opção de divertimento (em alguns casos, a única), o que significa um dado muito preocupante. Mas, o que chamou mais a nossa atenção é o grau de experiência com o qual essas crianças analisam a televisão: são expertos e demonstram conhecer a televisão também do lado de dentro, inclusive as linguagens que ela utiliza, a sua estrutura de produção, a sua lógica interna e as suas maneiras de intervenção».
As crianças aprendem os valores e os não-valores através da televisão, não resta dúvida, mas demonstram ter senso crítico a respeito deste assunto, quando afirmam nos textos que os programas transmitidos na tv podem lhes ensinar «a serem bons, a ter coragem e a fazer o bem, a cuidar da natureza e de si mesmos, a serem honestos e a lutar por aquilo que desejam», mas também «a serem cruéis e mentirosos, a roubar e matar, a não respeitar os pais e a comprar tudo aquilo que não têm necessidade». Falando sobre a validade do ensino através da mídia, a profa. Duarte salienta a necessidade de «ouvir aquilo que têm a dizer sobre o assunto e a dialogar com eles. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e mais freqüente, a outras atividades culturais».

FICHA 2
Observadores internacionais
Os dados examinados em janeiro de 2006 pelo OssCom, que é um centro de pesquisa da mídia, deixam evidente a tendência a realizar uma forma de co-regulamentação, onde a ação legislativa dos Estados membros se integra com medidas de auto-regulamentação por parte dos produtores, broadcasters e profissionais da comunicação sob o efeito de controles e sanções. São dois os instrumentos mais utilizados no âmbito europeu, observando-se as diretivas previstas no artigo 22 de «Televisão sem fronteiras»: a definição de faixas horárias protegidas (watershed) e os sinais mostrados na tela (determinados por um sistema de «rating»). Apesar disso, aos campos tradicionalmente problemáticos da violência e da pornografia se juntam novos campos de risco para os menores: a vulgaridade, abusos e dependências de substâncias, linguagem e comportamento vulgares, discriminações e abusos, violações e ofensas à dignidade humana. Os critérios de avaliação dos programas se constituem um problema que é partilhado por muitos países da União européia, ao mesmo tempo em que se prepara uma uniformização internacional dos sistemas de classificação (ver mais adiante, Nicam), baseados na visualização de cinco ícones que ilustram simbolicamente qual é a problemática do programa que está sendo analisado e para quais idades ele é desaconselhado.
Deve ser assinalada a atividade online da European Medi@culture. O projeto é promovido pela Comissão Européia, em Bruxelas, no quadro das iniciativas «e-Learning», administrado pelo centro mediático de Baden-Württemberg. O site apresenta informações sobre a educação à mídia na Europa, particularmente na França, Áustria, Finlândia e Alemanha. A seção de projetos de multimídia agrupa os projetos sobre a mídia desenvolvidos por escolas e associações de jovens ao longo do tempo (ver http://www.european-mediaculture.org).

FICHA 3
África do Sul: Encontro mundial sobre a mídia para a infância
Este encontro trienal se realizou no último mês de março em Johannesburg, na África do Sul, com a participação de expertos do setor representando diversos países. Em conjunto se discutiu sobre a necessidade de uma programação adequada às crianças, procurando entender de que modo a violência na mídia pode influir sobre a psíquico dos menores.
Mas, no 5º Encontro mundial sobre a mídia para a infância apresentaram-se também muitas crianças provenientes de todo o mundo e empenhadas em discutir sobre o difícil tema da «Mídia como instrumento de paz e de democracia global». Vieram guiados por grupos de adultos, dentre eles as diversas organizações católicas que há anos trabalham para promover regras para o bem da infância, a serem respeitadas nas transmissões de rádio e televisão através de códigos de regulamentação que devem ser redigidos ou, como em alguns casos, apenas atualizados. Em muitos países do sul do mundo as novas tecnologias de multimídia já estão muito disseminadas e seu uso merece uma atenção particular para tutelar o público mais jovem.
Especialmente na África, explicou o organizador do encontro, Firdoze Bulbulia, começa-se a examinar o projeto de um «Media center» para as crianças, que possa produzir e distribuir transmissões de rádio e de televisão destinadas ao público mais jovem, com o objetivo de realizar um canal televisivo pan-africano dedicado à infância. Os organizadores do encontro estão também trabalhando no projeto de uma aliança africana dos meios de informação e de comunicação, seguindo o modelo daquela já existente na América latina.

2) INTERNET

Na Itália, 47% das famílias italianas têm um computador em casa, um dado relevante mas sempre muito baixo em relação à média dos outros países europeus. O uso da internet por parte dos adolescentes e jovens, e a familiaridade que têm com tudo aquilo que pode ser digitado ou «descarregado» da internet, apresenta não poucos problemas. Pela sua própria natureza de rede de comunicação global, o problema se apresenta em ótica internacional, procurando garantir a tutela dos menores através de precisos acordos com os provedores para um efetivo controle de conteúdo. No campo italiano, até 2006, a tutela dos menores tinha sido deixada nas mãos dos próprios provedores, que em 19 de novembro de 2003 assinaram um acordo de auto-regulamentação: o Codice Internet e Minori. Embora o acordo tenha sido estipulado entre os representantes dos vários provedores diante do Ministério para a Inovação e a Tecnologia, no entanto ele permanece um acordo privado, com lacunas, principalmente no que se refere às sanções que muitas vezes devem ser aplicadas. Em 2006, na seqüência de numerosos casos de violência sobre menores, muitos dos quais realizados através da difusão de material pedo-pornográfico (quando não se tratava de verdadeiro e próprio aliciamento de menores via internet), foi promulgada a lei 38 de 6 de fevereiro de 2006: «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet».
Enfim, como aplicação da lei 38/2006, em fevereiro da 2007 foi publicado um decreto determinando os requisitos técnicos dos instrumentos de filtragem que os provedores da rede internet devem utilizar para impedir o acesso aos sites já assinalados pelo Centro nacional contra a pedo-pornografia. Mas, isso não basta para superar as dificuldades e impedir que os menores possam navegar de maneira arriscada na «rede das redes».
Atualmente foi reativada a comissão anti-pedofilia e desvios de menores através da internet, o «Ciclope», que tinha sido instituída junto ao Ministério para a Eqüidade, do governo italiano, e que ficou inativa por um ano, até a sua reestruturação junto ao Ministério da Família. Está também para entrar em função um site dedicado ao uso da internet, junto ao Ministério das Comunicações, e um número telefônico de emergência gratuito, organizado pelo mesmo ministério e por «Save the children», que poderá ser utilizado por qualquer cidadão que queira assinalar algum abuso, desvio ou pedo-pornografia. Dentre as iniciativas mais recentes, deve ser assinalado o site www.tiseiconnesso.it criado pelo Ministério das Comunicações italiano, sempre em colaboração com «Save the children», onde é colocada à disposição uma série de informações sobre o conteúdo de certos sites, seja para os pais como para as próprias crianças, em conjunto com a campanha televisiva que tem como slogan «A melhor maneira de ajudar o seu filho a não usar incorretamente as novas tecnologias é conhecê-las».
Deve ser salientado também o fato de como a rede se tornou um grande mercado online. Para alguns produtores, o «e-commerce» de brinquedos corresponde já a 4% das vendas, e apenas em 2005 as vendas online corresponderam a 37.600 ações de compra. As razões para investir no processo online são múltiplas: desde a possibilidade de evitar as dificuldades logísticas de distribuição dos produtos, à ampliação de ofertas diferentes de produtos e também a possibilidade de envolvimento do cliente através de campanhas de mala direta e a criação de comunidades virtuais em torno de alguns produtos.

FICHAS:
Pedo-pornografia e internet
Em março de 2006, entraram em vigor as novas medidas diretas de combate e repressão ao fenômeno de exploração sexual dos menores e a pedo-pornografia, estabelecidas pela lei 38/2006 – «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet» foi publicada no Diário oficial em 15 de fevereiro de 2006, nº.38 – com a qual foram substancialmente modificados e integrados os artigos 600bis e seguintes do Código Penal italiano.
A lei confirma os artigos 527, 528, 529 e 725 do Código Penal italiano, que punem os «atos obscenos em local público, publicações, espetáculos obscenos, desenhos ou figuras que ofendem a decência pública».
Porque em muitas publicações, transmissões televisivas e anúncios publicitários, mesmo que não tenham declaradamente um caráter pornográfico, imagens de crianças e adolescentes são apresentadas de maneira explícita ou mais ou menos sutilmente ilusória e de forma falsa, pede-se um novo empenho das instituições competentes para que sejam observadas as normas em vigor e, se preciso for, que façam apelo aos órgãos de Polícia, o Instituto de autodisciplina publicitária, o Ministério das Comunicações, a Polícia postal ou a «Comissão tv e menor».

3) CINEMA

Confirmando as disposições da Constituição italiana, no que se refere ao direito e ao dever das famílias de serem protagonistas na educação de seus filhos, para muitos é chegada à hora de reelaborar a legislação que define o conceito de «censura» (a lei 161/1962 prevê a possibilidade de negar a autorização de abertura às salas de cinema ou de fazer cortes nos filmes, mesmo em função de um público adulto), que hoje está superado. É preciso com urgência estabelecer um critério de tutela dos menores não apenas no que se refere aos filmes que vêem nos circuitos cinematográficos, mas também sucessivamente em casa, muitas vezes em horários acessíveis na programação da televisão.
Uma avaliação correta e preventiva de um filme permite à família ter à sua disposição os instrumentos para escolher se um espetáculo é mais ou menos oportuno, conhecendo a trama, os eventuais conteúdos mais sensíveis, a classificação que a obra recebeu em outros países, etc. Por isso, é justo que a legislação seja revista, uma operação que requer atenção e perspicácia da parte das instituições em um momento de transição da mídia, como este que estamos vivendo, quando esta se tornou realmente um importante componente na educação dos menores.
Não faltam filmes que atraem o público por causa de seu conteúdo de violência, e no entanto entram no circuito cinematográfico sem qualquer restrição de idade. Para um filme que é notícia nos jornais, existem muitos outros com conteúdos duvidosos ou até mesmo perigosos que conseguem passar através do filtro da comissão de revisão cinematográfica, que atualmente funciona junto ao departamento de cinema do Ministério dos Bens Culturais.
Ao mesmo tempo em que existe um projeto de lei do ministro dos Bens culturais, que deve ainda iniciar os trâmites parlamentares, novas situações se apresentam na Itália, com a autocensura de filmes, feita pelos produtores ou distribuidores cinematográficos, com a introdução de novas e mais específicas faixas etárias para as restrições visando os menores a partir dos 10 anos de idade. As restrições serão feitas baseando-se em uma avaliação classificatória dos conteúdos das obras e sucessivamente serão ainda analisadas por uma comissão de psicólogos, educadores e pais.
Este sistema se inspira no modelo americano da Motion Picture Association of America (MPAA), que há 40 anos representa os interesses da indústria do audiovisual americana no mundo. Funcionando a partir de regras bem precisas (estabelecidas ao longo dos anos, também segundo as sentenças dos tribunais federais nos vários Estados americanos e em base aos protestos dos cidadãos), a autocensura americana prevê a existência de uma única comissão competente para determinar as restrições do PG12 ao «restricted» 17 anos. Esta comissão é composta exclusivamente de pais, considerados os primeiros depositários da educação dos filhos, e representam transversalmente a audiência. Importantes sanções econômicas asseguram que o mecanismo de autocertificação corresponda efetivamente aos interesses dos cidadãos. No site da Motion Picture estão disponíveis aos pais os pontos de referência para a avaliação das obras de entretenimento e são publicadas as restrições aplicadas a cada filme que está em exibição nas salas de cinema. Geralmente as avaliações parecem muito mais severas em relação a outros países. Tudo isso, nos vários anos de sua aplicação, deu uma qualificação à indústria americana e seu correto serviço prestado aos ouvintes. Qualquer estrada que se pretenda seguir na Itália, é importante para as famílias que seja estimulado um mercado de produção adequado à infância: é justo que o mecanismo da indústria cinematográfica continue com o seu ritmo de produção, mas não é justo confundir as classificações de acesso ao produto, como qualquer indústria sabe muito bem.
No que se refere às normas européias de classificação dos filmes, e em geral de todo «entertainment» (neologismo anglo-saxão, que, no entanto encontra sua raiz etimológica na relação entre educação e jogo) acessível aos menores, deve ser citado o sistema NICAM, que funciona na Holanda há alguns anos. Fundado em 1999, o NICAM (Nederlands Instituut voor de Classificatie van Audiovisuele Media) se baseia na lei Media Act, onde os programas de grupos que tiveram a autorização para atividades de «broadcasting» não devem incluir obras audiovisuais que prejudiquem o desenvolvimento físico e psicológico de pessoas com menos de 16 anos de idade, seguindo as diretivas da União européia («Televisão sem fronteiras» IV).
O sistema de classificação preventiva funciona também na Grécia, com a lei 1.597, de maio de 1986, que prevê que antes da projeção nas salas de cinema, cada filme seja submetido pelo produtor ou pela sociedade de importação à Comissão para a juventude, que classifica o filme seja como adequado aos menores, ou proibido aos menores de 13 anos, ou de 17 anos ou ainda, nos casos mais graves, severamente inadequado aos menores. Esta comissão é um órgão do Ministério da Cultura e foi concebida procurando-se estabelecer certa proporcionalidade, sendo composta de representantes do Estado (Ministério da Cultura), das categorias ligadas ao cinema, de psicólogos especializados na educação, de sociólogos, dos jovens, dos educadores e dos pais.
Na Áustria, está em vigor um sistema de avaliação complexo, instituído em base a um princípio constitucional federal que confia a tutela dos menores, no que se refere ao cinema e em geral aos meios de comunicação de massa, à competência específica dos Lander. A lei nacional que engloba a regulamentação da mídia é a ORF-ACT, ou seja, a Austrian Broadcasting Corporation nº. 379/1984, que estabelece quais os critérios sobre os quais deve se basear a proteção aplicada a programas e filmes transmitidos na televisão ou através de outros canais mediáticos. No que se refere à exibição dos filmes, a avaliação preventiva das obras cinematográficas, para que sejam decididas as faixas etárias adequadas, é regulamentada pela lei austríaca para a tutela dos menores, a «Jugendschutzgesetz», aplicada através das leis dos Lander federais. Esta lei estabelece nove faixas de restrições de público a partir dos seis anos de idade, com uma sucessiva graduação que prevê restrições para 10, 12, 14 e 16 anos de idade. Para supervisionar o sistema de classificação cinematográfica, existe uma comissão junto ao Ministério da Educação, em Viena, que comunica seu parecer sobre a idoneidade dos filmes às autoridades locais. Geralmente e de maneira individual os Lander adotam as decisões da comissão, e é em âmbito local que se decide de sua aplicação.
Na Espanha, o artigo 20 da Constituição reconhece o direito do cidadão a exprimir e difundir livremente seu pensamento, suas idéias e suas opiniões através de qualquer meio de divulgação. Se por um lado o exercício de tais direitos «não pode ser restrito através de nenhum tipo de censura prévia», o mesmo artigo especifica que «estas liberdades têm o seu limite no respeito dos limites reconhecidos pelas normativas que exprimem este respeito, especialmente no direito à honra, à privacidade, à própria imagem e à proteção da juventude e da infância».
Baseando-se neste princípio, a qualificação dos filmes (Real decreto 81/1997) e das obras audiovisuais é feita antes de sua difusão, através do Instituto de cinematografia e das artes audiovisuais (ICAA), uma entidade autônoma, mas ao mesmo tempo ligada ao Ministério da Educação e Cultura através da secretaria de Estado para a cultura (ver site www.mcu.es).
A subdireção geral de fomento à indústria cinematográfica e do audiovisual, que faz parte do ICAA, se ocupa, dentre outras funções, da classificação em faixas etárias dos filmes e das outras obras audiovisuais em vista de sua exibição pública e para a sua distribuição. A comissão se encarrega de divulgar as informações sobre os filmes e programas audiovisuais, com classificação que vai desde as «salas X» até as restrições para cada faixa etária do público.
Os filmes de caráter pornográfico não podem receber subvenções do Estado e sua projeção nas salas prevê uma taxa suplementar, destinada em parte para estimular um fundo de proteção cinematográfica. A projeção destes filmes pode ser feita somente nas «salas X», onde não podem ser apresentados outros tipos de obras cinematográficas e onde é proibido o ingresso de menores de 18 anos.

CINEMA NA TV

Devido ao alto consumo de programas de televisão por parte dos menores e levando-se em conta as diretivas da União européia, que promovem a auto-regulamentação no âmbito nacional das emissoras de tv e a participação das famílias nesta obra educativa, há alguns anos estão em vigor na França, na Holanda, na Grã-Bretanha, na Grécia e na Itália os códigos de sinais, que servem para identificar tanto os filmes projetados na salas de cinema como aqueles transmitidos na televisão. A tutela dos menores no âmbito da televisão foi também feita adotando-se o chamado sistema «watershed» (separador das águas), que funciona segundo uma seleção de faixas horárias protegidas, algumas aconselhadas à visão dos menores, outras aconselhadas a todos e outras ainda, principalmente na programação noturna, indicadas somente a um público adulto.
A faixa de idade determinada pela classificação preventiva dos filmes tem obviamente uma repercussão na programação das chamadas faixas horárias protegidas ou distintas nas emissoras de televisão pública em todos os países europeus. A definição das linhas de conduta comuns está à base dos acordos de auto-regulamentação e de co-regulamentação dos programas de televisão, estabelecendo-se um código de procedimento comum para as emissoras tanto públicas como privadas. Criou-se assim uma base normativa, que é assumida pela autoridade do Estado e que recebe a confiança dos consumidores das emissoras públicas ou privadas que adotam este sistema de auto-regulamentação.
Para tornar visível aos adultos as classificações dos programas apropriados aos menores, muitas emissoras européias adotaram um sistema de sinais que através de símbolos, números, cores e sinais acústicos advertem ao público a respeito daquilo que está para ser transmitido.
Mas, apenas este sistema, assim como o de filtragem (tipo v-chip), não basta para garantir uma verdadeira tutela dos menores diante de um conjunto de imagens difíceis de serem decodificadas por um jovem. Deve-se pensar às imagens de guerra dos telejornais, dos filmes escabrosos ou às informações sobre os crimes hediondos, que muitas vezes têm como ambiente o próprio núcleo familiar.
É na colaboração entre Estado, produtores de programas audiovisuais e famílias que pode ser fundamentado um autêntico respeito dos menores que encoraje o crescimento positivo da criança em base aos valores fundamentais da pessoa humana.

4) CELULARES COM VÍDEO

Hoje a difusão dos celulares com vídeo chegou à Itália ao índice se 134%, o que significa que muitas pessoas possuem pelo menos dois celulares, inclusive os jovens e as crianças, que recebem este instrumento dos próprios pais. De fato, de duas crianças entre 8 e 13 anos de idade, uma delas tem um celular no bolso. Aquele que poderia ser um instrumento para controlar melhor os deslocamentos e as necessidades dos filhos, se revela no entanto um perigoso meio que pode expor a outro tipo de utilização por parte dos menores, que não se separam nunca do próprio celular, nem mesmo durante as aulas, como lamentam vários professores. Apesar do código de auto-regulamentação assinado pelas principais operadoras (Código de conduta para a oferta de serviços a pagamento em tutela dos menores), na realidade os novos serviços opcionais do celular o tornaram um «personal computer» capaz de permitir novos usos que antes não tinham.
Os desenvolvimentos tecnológicos que estão se verificando no campo da telefonia móvel – particularmente no que se refere à sinergia com a internet e a adoção dos sistemas DVB de vídeos-telefone – contribuem a aumentar a oportunidade de comunicação também para as novas gerações e, ao mesmo tempo, repropõem em novos termos a questão da tutela dos menores. As evoluções já previstas ulteriormente para os próximos anos e o número sempre crescente de pessoas envolvidas, pedem uma grande consciência social e uma constante atenção das pessoas e órgãos encarregados de garantir os direitos dos cidadãos.
Neste contexto devem ser reafirmados os direitos dos menores no campo da comunicação, dentre os quais certamente não está em último lugar aquele que se refere também à segurança diante dos riscos de indução a comportamentos ilícitos ou de acesso a conteúdos nocivos ou indesejados. Também neste campo é essencial o papel dos pais e, em geral, de todos aqueles que são chamados a ter uma função educativa. A maior segurança das crianças e dos jovens quanto ao acesso a conteúdos ilegais é um ponto que deve merecer atenção também através da maior conscientização dos pais e das mães, que devem se capacitar a conhecer e utilizar estes meios.
Para a «alfabetização» dos pais na utilização da mídia devem colaborar também as instituições públicas, promovendo um uso positivo das novas possibilidades tecnológicas. Às empresas cabe a responsabilidade de colocar no mercado um produto que dê garantias no que se refere à sua utilização pelos menores, superando os limites estabelecidos pelo código de auto-regulamentação assinado pelas operadoras de celulares. Devem também oferecer maiores informações aos adultos que assinam um contrato de utilização, como por exemplo a adoção de bloqueios automáticos de acesso a conteúdos nocivos, se o celular passa às mãos de um menor de idade.

5) VIDEOGAMES

Trata-se de uma indústria global, que conquistou os jovens e não apenas eles. Os números relativos à difusão repentina dos videogames indicam que existem 250 mil sites de videogames, cada um deles propõe uma série de títulos, muitos deles recheados de cenas de sexo e de violência. Uma pesquisa recente do Instituto italiano de medicina social (IIMS) coloca em evidência, entre outras coisas, a escassa informação por parte dos adultos a respeito dos videogames utilizados pelos filhos, o predomínio de temas violentas em mais de 30% de títulos não aconselhados aos menores, o predomínio de personagens virtuais normais que podem se tornar especiais, realizando ações extraordinárias.
Mas, o ponto de risco mais elevado se refere aos pequenos jogadores de videogames, crianças entre seis e nove anos de idade que se submetem a entrar tão intensamente no jogo virtual que chegam a formas de dissociação da realidade e solicitam um monitoramento muito atento da parte dos adultos. A mesma pesquisa indica a presença de videogames em 25% das famílias com crianças de três a cinco anos de idade e em 65,2% das famílias com crianças entre seis e 10 anos de idade. O que produz efeitos negativos no âmbito cognitivo das crianças não parece ser especificamente o meio, mas muito mais os elementos que criam a excitação, tais como a velocidade de produção do estímulo e da resposta, a velocidade das imagens, os efeitos especiais, os contrastes, a fragmentação da história, o binômio rumor-ação. O uso prolongado do jogo inibe, segundo alguns psicólogos, a área da capacidade crítica, provocando passividade e ao mesmo tempo agressividade na criança. Mas, não queremos demolir os videogames, porque existem aqueles que são muito adequados aos mais jovens, com valores de informação e de educação, seja também porque o uso deste meio é na realidade um passo na preparação da criança ao sucessivo e mais sofisticado, que é o uso da internet.
De qualquer maneira, os dados relativos à venda destes produtos de entretenimento mostram um crescimento em todos os lugares e a difusão deste meio é acompanhada de uma aceitação social (ou seria uma resignação?) sempre maior.
É urgente ampliar o percurso de conhecimento e das estratégias internacionais, para monitorar um mercado que está cada vez mais vasto. Parece urgente estabelecer modalidades operativas para o controle dos conteúdos e do sistema de sanções, seja para o produtor como para o vendedor dos serviços. O código de auto-regulamentação Pegi (derivado em 2003 do sistema de avaliação e classificação holandês, Nicam, que assinala os conteúdos inadequados aos menores), adotado pelos industriais de «entertainment» que produzem videogames, é a única forma de auto-regulamentação existente atualmente e que prevê sanções (raramente aplicadas, mesmo diante de casos graves evidentes) para os produtores que colocam no comércio os jogos com indicações de faixas etárias apenas aproximativas.
O código Pegi, ao qual a associação européia Isfe adere em 2002, é evidentemente insuficiente na sua função declarada de «fornecer aos consumidores as informações mais oportunas» e expostas no selo de produção. E, como o setor dos videogames tem hoje um volume de negócios que ultrapassa os 740 milhões de euros, envolvendo 24 milhões de jogadores (43% da população a partir dos quatro anos de idade), com uma venda dos produtos classificados para maiores de três anos de idade que chega aos quase 48% dos consumidores. É um dado que define o impacto deste gênero de meio sobre a infância e a adolescência, mostrando toda a sua periculosidade, seja pelo consumo de conteúdos inadequados, seja pelo excessivo número de horas dedicado neste passatempo, muitas vezes solitário e sem a presença de um adulto ao lado. Se for verdade, como sustenta a indústria, que a produção de videogames violentos é apenas uma mínima parte do mercado, é também verdade que esta representa a fatia mais importante do retorno econômico.
O interesse pelos videogames é alimentado pela sinergia com os filmes que inspiram o jogo homônimo e que torna sempre mais atrativo este gênero, principalmente para os adolescentes. Desta maneira é importante também neste campo o estabelecimento de regras precisas em defesa dos consumidores dentre o público jovem, mais exposto aos riscos destas novas formas de entretenimento cada vez mais sofisticadas e envolventes, por causa da combinação entre narrativa e efeitos gráficos.

6) PUBLICIDADE

O problema da tutela dos menores diante da publicidade se apresenta como um corolário, dentro do quadro mais amplo que regulamenta a difícil relação entre a mídia e as crianças. A televisão, e portanto também a publicidade, se constitui em uma fonte de perigo para os menores, isto é, para a maior parte das crianças, principalmente em idade pré-escolar, que devem saber fazer a diferença entre a publicidade e o resto da programação, e entre os programas de ficção e a realidade. Com essas considerações não significa que exista uma acrítica rejeição da publicidade em si mesma – à qual se reconhece, no entanto, onde proceda corretamente, uma função positiva no processo de formação, de crescimento crítico e de socialização do menor –, mas existe a necessidade de prever um sistema de regras destinado a garantir-lhe um uso adequado.
O efeito dos anúncios publicitários é tão grande que em alguns países estão sendo tomadas medidas drásticas a respeito. No Reino Unido, por exemplo, recentemente foram vetados os anúncios publicitários durante os programas destinados às crianças até nove anos de idade, a partir de 1º de janeiro de 2008 a medida se estenderá à programação para os jovens até 15 anos de idade e até o final de 2008 serão vetados em todos os canais dedicados aos menores. Apesar de se reconhecer que a publicidade serve para financiar os programas, aqueles dedicados às crianças terão que recorrer a outras fontes. Também na França começa a se impor uma «linha dura» a esse respeito: visto a alta incidência de publicidade de merendas, de sucos e doces em geral, a partir de agora os anúncios dedicados às crianças deverão ser precedidos de uma espécie de aviso, que orientará para uma alimentação adequada.
Mas, por que as crianças são tão frágeis diante dos apelos da publicidade? Na Itália, explica Paolo Landi, secretário geral da Adisconsum (Associação de defesa dos consumidores e do ambiente»), em um capítulo de seu estudo «Crianças da multimídia»: «Se consideramos que a publicidade não faz outra coisa que veicular um conhecimento imediatamente concretizável em um “ter”, ou em um “ser”, ou em um “fazer”, a criança absorve sem dificuldades os três componentes que são a obsessão dos expertos de marketing, isto é, o componente cognitivo (como fornecer informações indeléveis sobre um produto ou um serviço), o componente afetivo (como fazer o consumidor reagir de maneira emotiva) e o comportamental (como colocar o pequeno consumidor em movimento na direção da aquisição). A partir deste ponto de vista a criança é o público ideal, o consumidor a quem se pode vender qualquer coisa».
Na Itália está em vigor um código de autodisciplina publicitária que surgiu em 1966, em base a um acordo entre os profissionais do setor. Esta primeira forma de tutela, em grande parte com origem comunitária, tem como protagonistas entidades administrativas independentes: a Autoridade de controle da concorrência e do mercado de setor e a Autoridade de garantia para as comunicações e a editoria. Enquanto isso, para a auto-regulamentação, orientada pelas normas que constam do Código de autodisciplina publicitária, e agora também, embora com força jurídica diferente, pelo Código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual se reconhece um poder de decisão e de sanção, emanando uma ordem e intimando seu cumprimento.
Em todos os países onde a televisão serve de veículo às mensagens publicitárias, o mundo empresarial é plenamente consciente do enorme poder de influência que a publicidade tem sobre as crianças.



NORMATIVA INTERNACIONAL

O assunto relativo à tutela dos menores na mídia é um dos mais debatidos, seja no que se refere às normas nacionais, seja no âmbito internacional. Encontra-se diante da situação de precisar acertas as contas com toda a extensão da rede global da internet. O exemplo que, neste momento de transição, coloca mais em evidência a necessidade de estabelecer leis que estejam em condições de controlar o acesso e uso dos conteúdos nocivos para os menores, é exatamente o da internet. Qualquer pessoa no mundo pode abrir um site considerado «arriscado», contendo elementos ilegais e acessíveis a consumidores despreparados, disponibilizados por quem está do outro lado do mundo.
No que se refere aos princípios gerais no âmbito do direito internacional, é preciso recorrer principalmente à convenção da ONU sobre os direitos da criança, com sede em New York, ratificada pelo Parlamento italiano através da lei nº.176/1991. Esta garante à criança uma «consideração proeminente» também a respeito da liberdade, seja no se refere à expressão, seja quando tutela os conteúdos recebidos. Esta mesma convenção, em seu artigo 17, fala da relação entre menor e televisão, desejando «um sistema normativo que tutele o menor-consumidor, mesmo com todas as dificuldades que se apresentam», seja para individuar os fenômenos que devem ser monitorados, seja sobre as normativas possíveis.
No direito da União européia, tal tutela foi recentemente confirmada pela Carta dos direitos fundamentais da União, aprovada em Nice em 2000, cujo artigo 24 salienta que «os Estados membros reconhecem a importância da função exercida pelos meios de comunicação de massa e cuidam para que a criança possa ter acesso às informações e materiais... com a finalidade de promover o seu bem estar social, espiritual e moral, além de sua saúde física e mental». A normativa seguinte, 89/552/CEE, previu algumas restrições, seja no que se refere aos programas como para as mensagens publicitárias destinadas a este público». O artigo 22 desta normativa conduz a impedir a transmissão de programas que contenham cenas pornográficas ou de violência gratuita, ou outros programas inadequados a este público. Não podemos esquecer de mencionar a determinação expressa de «Televisão sem fronteiras», que está hoje em sua quinta versão atualizada, que o tema da tutela dos menores está relacionado com o estatuto geral dos direitos dos menores e corresponde ao disposto nos artigos 50 e 31 da Constituição italiana.
Se for claro que os princípios normativos são todos a favor da tutela dos menores, é também verdadeiro que uma tecnologia em contínua evolução colocou em crise as velhas regras do jogo. Mas também é claro que não se pode mais adiar a necessidade de estabelecer novos parâmetros normativos, para que as crianças possam utilizar os meios de comunicação próprios de seu tempo, com aproveitamento e serenidade também para as famílias.~

EDUCAÇÃO À MÍDIA NO MUNDO: PARA SABER MAIS

A difusão da educação à mídia é uma resposta à necessidade de se informar sobre as novidades no campo dos novos meios de comunicação. Em seguida citamos apenas alguns sites que em vários países oferecem maiores informações sobre como aprender a usar melhor a mídia, enfrentando a problemática da tutela dos menores e da alfabetização às novas tecnologias por parte dos adultos.
«The Media Awareness Nework-Réseau éducation médias» é uma organização canadense sem fins lucrativos, pioneira no desenvolvimento de programas sobre a educação à mídia. Com esta finalidade ela produz programas online em colaboração com organizações internacionais, convicta que, para interpretar as mensagens de informação, de entretenimento e comerciais, os jovens têm necessidade de instrumentos críticos válidos. Por isso é importante formar também os adultos (famílias e professores) sobre como funciona a mídia e como ela determina o estilo de vida.
A organização realiza uma ação contínua de monitoramento em relação à mídia (televisão, cinema, videogames, imprensa, publicidade, etc.), e sua seção dedicada aos pais oferece uma série de elementos para que estes reflitam com os filhos sobre esses meios, além da seção para os educadores, que inclui lições e materiais de apoio. Uma outra seção é dedicada à análise das questões ligadas à mídia, como a difusão de estereótipos, as representações de violência e da diversidade, a privacidade, a publicidade dirigida aos menores. Seu site é em inglês e francês (http://www.media-awareness.ca).
«Quai des images» é o site dedicado ao ensino de cinema e audiovisual organizado pelo Ministério da Educação francês. Ele propõe atividades ligadas à educação à imagem e de análise dos filmes em consonância com os programas escolares, agrupa os textos oficiais a respeito dos meios audiovisuais, oferece uma série de instrumentos de análise e de estudo completos sobre alguns filmes específicos e sobre certos autores em particular, informa sobre conferências, seminários, cursos e festivais sobre o mundo audiovisual e sua utilização em âmbito educativo e didático. Entre outras coisas, reúne também as propostas e as experiências feitas por professores e seus alunos nas escolas secundárias francesas no campo da educação à imagem, além de organizar um fórum de discussões aberto a todos sobre a educação à mídia (http://www.ac-nancy-metz.fr).
Sempre na França, está em funcionamento o blog «Zéro de conduite», organizado pelos professores e destinados a educadores, pais e estudantes. Promove o uso do cinema como instrumento pedagógico, dedicando-se especialmente à atualidade cinematográfica, mas sem esquecer os clássicos e os documentários. Com várias seções e espaços de aprofundamento, se propõe como um local de discussão de temas em um debate aberto (http://cinema-ducation.fluctuat.net).
A Universidade de Massachussetts organizou o Media Education Foundation – MEF, mídia de desafio, que produz e distribui documentários destinados a estimular o pensamento crítico e o debate sobre a relação entre aqueles que detêm o poder sobre a mídia, os conteúdos da mídia comercial, a exigência democrática de um livre fluxo de informações, as diversas representações de idéias e pensamentos e o direito dos cidadãos de informar e serem informados. Alguns destes temas são abordados criticamente, como a identidade do gênero na publicidade, a imagem de sexo nos videoclipes, o papel da mídia na construção da identidade cultural, mídia e saúde, etc. (http://www.mediaed.org/).

(a cura di M. F. D’A.)

 
At 9/17/2007 2:44 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

AS CRIANÇAS E A MÍDIA (II PARTE):
ACEITAR O DESAFIO EDUCATIVO


O tema da 41ª Jornada das Comunicações Sociais, «As crianças e os meios de comunicação: um desafio para a comunicação», nos convida a refletir a respeito de dois aspectos particularmente importantes. O primeiro é a formação das crianças, para que estejam em condições de receber de maneira crítica aquilo que vêem. O segundo é a formação à consciência e ao uso consciente da mídia, que está em contínua transformação tecnológica.
De fato, é o que especifica Bento XVI no início de sua mensagem, de 20 de maio de 2007, para a Jornada: «Os complexos desafios que a educação contemporânea deve enfrentar são muitas vezes ligados à grande influência dos meios de comunicação no nosso mundo. Como aspecto do fenômeno da globalização e estimulados pelo rápido desenvolvimento da tecnologia, os meios de comunicação delineiam fortemente o ambiente cultural (cf. João Paulo II, O rápido desenvolvimento, nº3). Na realidade, há quem afirma que a influência formativa da mídia está em competição com aquela da escola, da Igreja e, quem sabe, até com aquela da própria família».
De fato, como salienta o Pontifício conselho para as Comunicações Sociais, «para muitas pessoas, a realidade corresponde àquilo que os meios de comunicação definem como tal». Episódios recentes, como a utilização do celular na filmagem de violências nas salas de aula, abusos sofridos por pessoas deficientes, fenômenos de trote e de violência generalizada, demonstram como as crianças que crescem passando uma média de quatro horas por dia diante da televisão, sozinhos em casa, absorveram a lógica do «estou no vídeo, logo existo». Os psicólogos, os pedagogos e os estudiosos dos meios de comunicação estudam há tempos sobre as relações entre o consumo televisivo e o comportamento violento dos menores. Uma grande quantidade de pesquisas realizadas em muitos países ocidentais demonstra como esta correlação seja realmente inegável.


NOVAS LINGUAGENS

O fato que muitas crianças vivem completamente inseridas no mundo dos velhos e novos meios de comunicação, que estão cada vez mais frequentemente em correlação entre eles, é confirmado pela popularidade de alguns modelos televisivos, considerados tão efêmeros quanto penosos «momentos de glória», presentes nos programas com os maiores índices de audiência, dos «reality» aos «talk show», sem falar do «trash», que hoje se tornou um gênero de espetáculo.
Dentre as preferências demonstradas pelos adolescentes italianos que assistem televisão mais do que três horas por dia, encontramos, em primeiro lugar, a figura da «veline» (Ndt: misto de corista e coadjuvante na apresentação de programas populares da televisão italiana), enquanto outros da mesma idade se concentram no mais clássico exemplo, o do jogador de futebol. De toda maneira, a coisa mais importante é aparecer, pouco importa por qual motivo, de ser «alguém» ou «alguma coisa» no Olimpo mediático, mesmo que seja apenas por um instante.
Estes são os exemplos mais negativos dos condicionamentos derivados de um excessivo e acrítico uso dos meios de comunicação. Encontramo-nos diante de uma nova geração que cresceu na frente da televisão, capaz de usar as novas tecnologias que os próprios pais, que as adquiriram e as tornaram disponíveis, muitas vezes se encontram despreparados para utilizá-las.
Tanto é verdade que hoje em dia os filmes são vistos diretamente nos celulares e a televisão pode ser assistida na tela do computador. Hoje se telefona através da internet e graças ao download se descarrega os CDs e DVDs mais recentes, se filma e se faz foto com o celular, e assim por diante.
Nas casas, o vocabulário familiar se reduziu ao gênero dos sms e se fala tendo o som da televisão no fundo, se comunica através de e-mail, se faz «visita virtual» via computador, se percorre através de bibliotecas virtuais, tanto que as fichas e arquivos de papel evocam imagens do outro século, completamente em desuso.
A situação dos nossos filhos é diversa daquela da geração precedente, pois eles abriram seus olhos tendo diante de si estes cenários de profunda, contínua e envolvente transformação tecnológica. Eles se constituem aquela que os estudiosos chamam de geração nascida «com seis dedos»: além dos cinco dedos normais da mão, o sexto é o mouse do computador.
Com o aparecimento do mundo «virtual» da internet e dos videogames criou-se uma defasagem em relação à realidade verdadeira e própria. As duas dimensões parecem muitas vezes, e para muitos jovens, como universos paralelos, com conseqüências não indiferentes no plano do processo de amadurecimento. Têm grande sucesso os sites nos quais se prevê uma segunda vida (basta verificar os milhares de registros nos poucos meses de existência do site italiano de «Second Life», que em todo o mundo já tem sete milhões de inscritos), onde a simulação reproduz todas as situações da vida real. Apenas que tudo é falso, a começar da nova identidade, que pode ser escolhida e com ela se inicia a fazer parte deste mundo fora do mundo, onde se pode ser um «qualquer coisa». Isto é, ninguém.
Assim, o grande desafio cultural de hoje é propriamente a redefinição dos limites, que muitas vezes se apresentam demasiadamente instáveis. Isto é, redefinição dos limites entre o real e o virtual, superando a divisão digital que hoje separa as gerações adultas daqueles mais jovens.


OS JOVENS: PROTAGONISTAS OU VÍTIMAS DAS MUDANÇAS?

A linguagem deles é pobre, muitas vezes recheada de termos tirados do dicionário do internauta: clicar, chatar, messagiar, deletar, são alguns dos neologismos que fazem parte de seu vocabulário quotidiano. Falta uma dimensão humana da tecnologia que esteja em condições de traçar o perímetro cultural entre o real e o virtual. Assim a aldeia global difundiu uma quantidade de modelos comportamentais desviados, ou pelo menos discutíveis.
Desta maneira, os jovens que vivem a milhões de quilômetros de distância jogam o mesmo videogame, vêem o mesmo filme, assim como, de maneira transversal, absorvem modelos e comportamentos semelhantes. Muitas vezes os adultos têm menos domínio no uso das novas tecnologias e observam, com uma preocupação resignada diante de suas próprias limitações, as crianças que navegam facilmente na internet.
As raízes das dificuldades neste campo educativo são muito bem explicadas por Marina D’Amato, professora de sociologia da Universidade de Roma, que salienta: «Cada geração tem necessidade de se encontrar também em um mundo fantástico, que serve a interiorizar o paradigma do bom e do belo, do justo e do errado, do oportuno e do útil, também em relação aos exemplos que procedem da narrativa. Hoje nos encontramos em uma condição na qual os avós e os pais contam cada vez menos histórias aos filhos e aos netos, e este papel foi assumido pela televisão. Mas, na realidade, a televisão “exila” e “con-funde”, isto é, funde os modelos morais que são frutos de ânsias e problemas mal resolvidos, muito mais que de certezas. Embora estes se transformem com freqüência, a cada três ou quatro anos, o fato de serem repropostos continuamente faz com que se justaponham uns aos outros» (ver Come mediare i media, de Mario Russo).
Se for verdade que a televisão é o meio mais usado até a adolescência, imediatamente depois surge a grande atração pela internet. Esta passagem nasce de uma sintonia com a linguagem televisiva, que na idade infantil muitas vezes é ouvida durante muitas horas no dia. Esta linguagem se baseia em uma mediação da realidade e desta maneira ela ativa um processo de recepção que é de tipo emotivo.
Neste registro emocional é mais fácil acabar envolvido por situações e figuras capazes de se proporem como modelos identificadores, preservadores de sentido e de comportamentos a serem imitados.
O poder de concentrar uma vontade emulativa em alguns personagens, que correspondem particularmente às necessidades interiores do jovem (necessidades na maioria das vezes induzidas pela publicidade ou por modelos estimuladores), tem uma forte relação com a quantidade de horas que o jovem passa utilizando os novos ou os velhos meios de comunicação.


EDUCAÇÃO NECESSÁRIA

«A formação adequada a um uso correto dos meios de comunicação é essencial para o desenvolvimento cultural, moral e espiritual das crianças… Educar as crianças a serem seletivas no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja, da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos. Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia, com a certeza de que este difícil, embora gratificante, aspecto da condição de pais, é apoiado por toda a comunidade.»
As palavras do discurso de Bento XVI definem com grande clareza o paradigma de uma justa relação entre a mídia e os menores. Uma clareza que devemos agradecer ao magistério da Igreja, no momento em que o mundo da mídia parece ignorar a verdadeira problemática educativa das crianças e as expectativas de qualidade e de segurança exigidas pelas famílias no que se refere ao uso desses meios, seja do cinema aos videogames, da televisão à internet.
Diante da utilização destorcera do meio televisivo, o mais difundido dentre os meios de comunicação, a Igreja se interroga sobre o porquê da televisão não ter um papel educativo e por que os meios de comunicação não podem ser companheiros confiáveis para os jogos na fase de crescimento da criança. O anúncio de uma recente campanha sobre o uso da mídia, promovida pelo Ministério das Comunicações, mostra os vários membros da família que estão vendo a televisão ao lado de uma criança.
Que se trate do avô ou da mãe, a mensagem é a mesma: não deixar uma criança sozinha diante de um meio que, sem o apoio crítico educativo de um adulto, pode transmitir conteúdos inadequados à idade e à maturidade daquele que o vê. Sem esquecer as responsabilidades dos produtores televisivos, empenhados na organização dos programas, o papel da família é realmente insubstituível.
Se realmente o objetivo de quem administra a sociedade de produção televisiva, ou das multinacionais produtoras de videogames ou das operadoras de celulares, é o de promover e vender o produto, o bem estar psicofísico da criança está no centro do interesse dos educadores, sejam eles os professores ou, em primeiro lugar, os pais.
Isto explica bem a mensagem do Papa, que continua a sua análise, salientando que «educar as crianças a serem seletivos no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja e da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos (ver João Paulo II, «Familiaris Consortio», 76). Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia.»


CONTEÚDO DA MÍDIA

No panorama de uma revolução da multimídia, que está modificando transversalmente os hábitos, a mentalidade, os modelos e as linguagens, deve voltar ao centro do debate a tutela daquilo que é melhor para os menores. Sem acusar a «mídia», que enquanto tal não é nem boa nem má, o importante é partir de uma a análise do produto, para assim poder individuar conteúdos que sejam de melhor qualidade para as crianças e os adolescentes. Porque a televisão é um instrumento que abre janelas de conhecimento para o mundo e, se bem utilizada, de «má professora» pode se tornar uma preciosa fonte de estímulo para o crescimento humano e cultural.
A mesma coisa vale, e com mais razão, para a «rede» que engloba e compreende tudo, e para os videogames, onde, ao invés de violência e monstros, poderia se dedicar a produzir (e isso já ocorre em certos casos) histórias instrutivas e de conteúdo interessante.
Bento XVI coloca justamente em evidência as enormes possibilidades para que seja melhorado o conteúdo deste grande campo de produção multimídia: «A educação através da mídia deveria ser positiva. Colocando as crianças diante de um meio estética e moralmente excelente, estas recebem uma ajuda para que desenvolvam a própria opinião, a prudência e a capacidade de discernimento. É importante aqui reconhecer o valor fundamental do exemplo dos pais e as vantagens de introduzir os jovens aos clássicos da literatura infantil (…). A beleza, quase um espelho do divino, inspira e vivifica os corações e as mentes juvenis, enquanto a feiúra e a vulgaridade têm um impacto deprimente sobre os comportamentos». Diante de uma decadência geral do produto televisivo, a questão da qualidade aparece ainda mais forte e vibrante em grande parte de um público formado de famílias, que pede para não ser apenas um exército indistinto de ouvintes silenciosos, mas um público em condições de exprimir suas preferências por conteúdos formativos e informativos de bom nível.
A mensagem de Bento XVI continua, com algumas importantes indicações: «Como a educação em geral, aquela da mídia requer também uma formação ao exercício da liberdade. Trata-se de uma responsabilidade que compromete. Muitas vezes a liberdade é apresentada como uma incansável procura do prazer ou de novas experiências (…). Este desejo, sentido profundamente pelos pais e educadores, que é o de educar as crianças no caminho da beleza, da verdade e da bondade, pode ser apoiado pela indústria da mídia somente na medida em que se promove a dignidade fundamental do ser humano, o verdadeiro valor da vida familiar, as conquistas positivas e as metas da humanidade. A partir disso, a necessidade de que os meios de comunicação estejam empenhados na efetiva formação e no respeito da ética deve ser vista com interesse particular e com urgência não apenas pelos pais, mas também por aqueles que têm responsabilidade cívica».
Na realidade, nos encontramos na situação de ter que reconhecer que na Itália falta uma verdadeira «cultura da criança»: a situação é tão séria que no âmbito institucional procura-se dar uma nova organização geral para verificar e controlar os conteúdos dos setores de entretenimento, como os videogames, que até agora estão submetidos apenas a códigos de auto-regulamentação, feitos e codificados para uso e consumo pelas indústrias produtoras.
Uma vez mais, o primeiro e indispensável apoio à criança só pode vir da família e de uma relação mais estreita com os professores e educadores, exatamente como salienta Bento XVI, lembrando-nos que a preocupação educativa dos pais não deve se tornar uma preocupação genérica, mas uma atenção constante a tudo aquilo que diz respeito aos filhos.

A INDÚSTRIA DA MÍDIA

1) A TELEVISÃO

Se a televisão convencional se apresenta como um ramo de atividade já «maduro», no entanto se apresenta no horizonte a situação da mídia digital (satélite ou a cabo), também como uma plataforma que consente a ligação entre televisão, internet e outro tipo de mídia através do computador. No que se refere à qualidade da programação, apesar dos inúmeros bons propósitos anunciados no âmbito institucional, parece pequena a atenção às exigências dos menores em suas diversas faixas etárias. A programação para os menores, na realidade é confinada em redes e horários particulares, enquanto o resto da programação na faixa horária considerada «para todos» muitas vezes apresenta conteúdos inadequados aos jovens. Mas, quais são as expectativas das gerações de jovens no que se refere à televisão? É realmente verdade que preferem o «trash», os jogos com prêmios absurdos e as «velines»?
A partir de uma pesquisa recente feita pelo instituto Censis sobre «Comunicação, pluralismo social, sociedade aberta» (2005) surge que a relação entre os menores, e em particular dos adolescentes entre os 14 e 18 anos de idade, e a televisão é determinada por elementos de forte contradição e de passividade. Nessa faixa etária, 100% deles vêem televisão praticamente todos os dias, 86% acompanham um pouco de tudo, com uma relevante predileção pelos filmes (72%), por esporte (32%) e pelos «reality shows» (18%).
No entanto, a amostragem entrevistada não está realmente satisfeita com aquilo que vê. De fato, 36% dos adolescentes denunciam a vulgaridade difundida nos programas e 25% criticam a superficialidade. Dentre eles, 46% consideram a televisão como um meio que «invade», ao mesmo tempo em que é interessante notar que 25% consideram que em geral a programação televisiva alimenta nas crianças menores uma visão consumista da vida. Destes dados surge o contraste entre a procura de distração e a reprovação daquilo que lhes é proposto pela programação. Isto significa que o alto índice de procura não é um indicador de satisfação.
Considerando o axioma de que a televisão seja onipresente, fica claro que são os próprios jovens a pedirem uma maior atenção aos conteúdos: menos violência e menos vulgaridade. A exigência de uma regulamentação diversa, diz claramente o relatório do Censis, «não vem somente daqueles, pais e educadores, que estão preocupados pela possível influência negativa sobre os menores, mas se exprime nitidamente também através dos adolescentes, pelo menos de uma parte mais esperta e consciente dentre eles».
Para tutelar melhor os direitos dos menores, desde 2002 foi instituído junto ao Ministério das Comunicações um código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual aderiram os produtores de televisão, seja no âmbito nacional como local. Baseando-se nos princípios sobre a matéria existentes na Constituição italiana e na Convenção dos direitos da criança, estabelecida em 1989 pela ONU, a comissão que controla sua aplicação avaliou em todos estes anos de atividade os milhares de casos em que foram violadas as normas de tutela, que prevêem a transmissão de programas e imagens adequadas a um público de menores de idade durante aquela que é chamada de «faixa protegida» da programação televisiva (das 7h30 às 22h30), intervindo com denúncias e sanções, que nos casos mais graves foram aplicadas pela Autoridade de garantia no setor das comunicações. Para o futuro, esta comissão deverá se transformar em um organismo mais amplo de controle, que se chamará «Mídia e menores», que além da televisão deverá monitorar também os setores dos vídeos-telefone e dos videogames, além da internet, que é o campo de maior risco.

REGRAS DE TUTELA EM OUTROS PAÍSES

É diversa a situação em outros países, como por exemplo na Grã Bretanha, onde o sistema de regulamentação da mídia é estruturado e complexo e foi atualizado nas últimas décadas, com uma particular atenção à tutela dos menores. As inovações tecnológicas neste setor levaram as normativas inglesas a uma série de novas disposições, como por exemplo, a visão em casa de vídeo exclusivamente para adultos, e que fora de casa seriam vetados aos menores, ou o combate à praga mundial dos sites internet para os pedófilos, que contenham material pornográfico ou com conteúdos que possam esconder o aliciamento de menores (ver a Protection Childres Act, de 1978).
A programação televisiva é regulamentada pelo Broadcasting Act (1996), de onde deriva a instituição da Broadcasting Standard Commission (BSC), um órgão independente de controle que estabelece as normas de avaliação e classificação dos programas, também no que se refere aos conteúdos violentos ou que possam ofender a decência pública (site oficial www.bsc.org.uk). Este organismo BSC funciona internamente à estrutura do Broadcasting, supervisionando e regulamentando todas as emissoras de televisão e de rádio, via cabo ou por satélite. Sua tarefa é a de elaborar os códigos de conduta e de aplicação de modelos que respeitem a justiça, além de monitorar os modelos, verificando que respeitem as leis. Com a transmissão de programas com conteúdos considerados inadequados aos menores de várias idades, há alguns anos a televisão inglesa adotou o sistema «watershed», um «separador de águas» entre um horário de programação familiar e outro para os adultos. Todo o sistema televisivo inglês se apóia sobre a responsabilização das famílias, pois sem a colaboração delas qualquer código de modelos para os programas é praticamente inútil.
Na França, está vigorando já há anos um código através de sinais televisivos, que entra em função para assinalar os programas inadequados aos menores. A avaliação do programa televisivo é feita pelo Conseil Supérieur de l’Audiovisuel (CSA), uma autoridade administrativa independente, que controla a difusão dos filmes e outras transmissões em vários canais privados, nacionais, regionais ou locais. A normativa francesa (lei 719/2002) veta a transmissão de programas que possam prejudicar gravemente a integridade física, mental e moral dos menores, porque divulgam conteúdos de pornografia ou de violência gratuita. As transmissões são classificadas por um código de sinais que, em conjunto com um sistema organizado de faixas horárias de programação, garante às famílias mais clareza sobre os programas destinados aos menores.
Na Alemanha, o tema da infância tem particular atenção da legislação, que considera desde o nascimento o início dos direitos fundamentais do cidadão. A tutela é disciplinada no âmbito público pela JSchG (desde o dia 26 de fevereiro de 1985), enquanto a lei GjSM se ocupa do controle sobre a difusão de publicações e conteúdos mediáticos considerados danosos para os menores. A regulamentação no setor televisivo é feita segundo as normas do acordo sobre a radiodifusão dos Lander federais, que as entidades para a mídia nesses Lander adotaram por base para o estabelecimento das diretivas que tutelam o interesse dos menores nas emissoras privadas. Não são admitidas transmissões que incitem o ódio racial, que exaltem a violência ou a guerra, que ofendam a dignidade do homem, que sejam de gênero pornográfico, que mostrem pessoas moribundas ou com sofrimentos que ofendam a dignidade humana. Os responsáveis pela programação, escolhendo os horários das transmissões, devem cuidar para que os menores não vejam programas que podem prejudicar o seu bem estar psíquico, físico ou mental. As transmissões inadequadas às crianças menores podem ser transmitidas somente depois da autorização da entidade competente do Land interessado.
Os responsáveis pela organização dos programas televisivos em âmbito nacional devem nomear encarregados pela tutela dos menores, que atuam no momento da aquisição, da projeção e da realização dos programas. As emissoras privadas fundaram em 1993 uma associação de autocontrole voluntário da televisão («Freiwillige Selbskontrolle Fernsehen», FSF), à qual devem ser apresentados programas particulares, antes da sua transmissão, e suas avaliações consideradas nas decisões das entidades de controle da mídia nos Lander federais. Existe ainda o órgão comum do cidadão para a tutela dos menores, dos programas, da competência mediática e controle da mídia (GSJP), do qual faz parte um integrante da entidade para a mídia nos Lander federais, que dá o seu parecer a respeito de algumas séries, filmes e espetáculos mais ou menos adequados aos menores. Este órgão, o GSJP, decide sobre pedidos de mudança de horários de transmissão de filmes proibidos para menores, controla a forma de novos programas e experimenta novas disposições para a tutela dos menores na televisão digital. A peculiaridade da jurisdição alemã, seja no setor televisivo como no cinematográfico e da mídia em geral, é a minuciosa atenção às exigências com o desenvolvimento do menor e aos riscos que este pode correr com a observância incorreta das leis.
Nos Estados Unidos, é possível consultar via internet um «guia televisivo para os pais» (ver o site www.mpaa.org), que prevê algumas categorias de audiência aplicadas aos programas televisivos transmitidos a todo o público. Este guia organiza várias siglas para identificar a categoria de audiência para cada transmissão: vai-se do TVY (para todas as crianças) ao TVG (para todos), através de várias faixas etárias, que correspondem à passagem da primeira à segunda infância e desta à adolescência. Depois tem o TVPG («parental guidance», visto na presença de um dos pais), o TV14 («parent strongly cautioned», séria advertência aos pais), para os programas que contêm cenas de sexo e de violência. Enfim, há o TVMA, que prevê um «mature audience only», ou seja, destinado a um público de idade superior a 17 anos, última fronteira para os conteúdos considerados «restricted».
Estas avaliações foram elaboradas baseando-se nas opiniões dos próprios pais e são fáceis de serem encontradas e compreendidas. Esta linha de «guia de televisão para os pais» pode ser usada juntamente ao «v-chip», que é um dispositivo de filtro instalado na maior parte dos mais recentes modelos de aparelhos de televisão, para permitir aos pais de bloquear os programas inadequados.

FICHA 1
Brasil: «O que eu penso da tv»
No Brasil, a audiência infantil é muito alta: aproximadamente 30 milhões de crianças vêem televisão pelo menos durante três horas por dia. Explica a profa. Rosália Duarte, do departamento de Ciência da Educação, da PUC do Rio de Janeiro, que «as crianças são muito perspicazes, mas nós podemos e devemos ajudá-las a ampliar o seu quadro de referências, para que possam discutir ainda melhor sobre o conteúdos daquilo que vêem. Para isso temos necessidade, antes de tudo, de ouvir aquilo que elas têm a dizer sobre o assunto e de dialogar com elas. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e muito mais freqüente, a outras atividades culturais». No âmbito de uma pesquisa feita através de um questionário distribuído nas escolas, intitulado «O que eu penso da tv», apareceu que «as crianças querem seriamente ser ouvidas sobre aquilo que pensam da tv, mas sentem que sua opinião é considerada pouco importante e não estão contentes com o excesso de imagens de violência exibidas na televisão, principalmente a violência “real”, definida como aquela transmitida nos telejornais. Eles adoram ver televisão e não importa o que os adultos pensam e dizem a respeito disso. A eles agradam quase todos os tipos de programas transmitidos: novelas, desenhos animados, programas de humor, filmes, seriados, mas isso não faz deles espectadores “idiotas”, pois fazem críticas muito interessantes, pertinentes e bem elaboradas sobre o que consideram feio ou inadequado na televisão. Para a maior parte deles, a televisão se oferece como principal opção de divertimento (em alguns casos, a única), o que significa um dado muito preocupante. Mas, o que chamou mais a nossa atenção é o grau de experiência com o qual essas crianças analisam a televisão: são expertos e demonstram conhecer a televisão também do lado de dentro, inclusive as linguagens que ela utiliza, a sua estrutura de produção, a sua lógica interna e as suas maneiras de intervenção».
As crianças aprendem os valores e os não-valores através da televisão, não resta dúvida, mas demonstram ter senso crítico a respeito deste assunto, quando afirmam nos textos que os programas transmitidos na tv podem lhes ensinar «a serem bons, a ter coragem e a fazer o bem, a cuidar da natureza e de si mesmos, a serem honestos e a lutar por aquilo que desejam», mas também «a serem cruéis e mentirosos, a roubar e matar, a não respeitar os pais e a comprar tudo aquilo que não têm necessidade». Falando sobre a validade do ensino através da mídia, a profa. Duarte salienta a necessidade de «ouvir aquilo que têm a dizer sobre o assunto e a dialogar com eles. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e mais freqüente, a outras atividades culturais».

FICHA 2
Observadores internacionais
Os dados examinados em janeiro de 2006 pelo OssCom, que é um centro de pesquisa da mídia, deixam evidente a tendência a realizar uma forma de co-regulamentação, onde a ação legislativa dos Estados membros se integra com medidas de auto-regulamentação por parte dos produtores, broadcasters e profissionais da comunicação sob o efeito de controles e sanções. São dois os instrumentos mais utilizados no âmbito europeu, observando-se as diretivas previstas no artigo 22 de «Televisão sem fronteiras»: a definição de faixas horárias protegidas (watershed) e os sinais mostrados na tela (determinados por um sistema de «rating»). Apesar disso, aos campos tradicionalmente problemáticos da violência e da pornografia se juntam novos campos de risco para os menores: a vulgaridade, abusos e dependências de substâncias, linguagem e comportamento vulgares, discriminações e abusos, violações e ofensas à dignidade humana. Os critérios de avaliação dos programas se constituem um problema que é partilhado por muitos países da União européia, ao mesmo tempo em que se prepara uma uniformização internacional dos sistemas de classificação (ver mais adiante, Nicam), baseados na visualização de cinco ícones que ilustram simbolicamente qual é a problemática do programa que está sendo analisado e para quais idades ele é desaconselhado.
Deve ser assinalada a atividade online da European Medi@culture. O projeto é promovido pela Comissão Européia, em Bruxelas, no quadro das iniciativas «e-Learning», administrado pelo centro mediático de Baden-Württemberg. O site apresenta informações sobre a educação à mídia na Europa, particularmente na França, Áustria, Finlândia e Alemanha. A seção de projetos de multimídia agrupa os projetos sobre a mídia desenvolvidos por escolas e associações de jovens ao longo do tempo (ver http://www.european-mediaculture.org).

FICHA 3
África do Sul: Encontro mundial sobre a mídia para a infância
Este encontro trienal se realizou no último mês de março em Johannesburg, na África do Sul, com a participação de expertos do setor representando diversos países. Em conjunto se discutiu sobre a necessidade de uma programação adequada às crianças, procurando entender de que modo a violência na mídia pode influir sobre a psíquico dos menores.
Mas, no 5º Encontro mundial sobre a mídia para a infância apresentaram-se também muitas crianças provenientes de todo o mundo e empenhadas em discutir sobre o difícil tema da «Mídia como instrumento de paz e de democracia global». Vieram guiados por grupos de adultos, dentre eles as diversas organizações católicas que há anos trabalham para promover regras para o bem da infância, a serem respeitadas nas transmissões de rádio e televisão através de códigos de regulamentação que devem ser redigidos ou, como em alguns casos, apenas atualizados. Em muitos países do sul do mundo as novas tecnologias de multimídia já estão muito disseminadas e seu uso merece uma atenção particular para tutelar o público mais jovem.
Especialmente na África, explicou o organizador do encontro, Firdoze Bulbulia, começa-se a examinar o projeto de um «Media center» para as crianças, que possa produzir e distribuir transmissões de rádio e de televisão destinadas ao público mais jovem, com o objetivo de realizar um canal televisivo pan-africano dedicado à infância. Os organizadores do encontro estão também trabalhando no projeto de uma aliança africana dos meios de informação e de comunicação, seguindo o modelo daquela já existente na América latina.

2) INTERNET

Na Itália, 47% das famílias italianas têm um computador em casa, um dado relevante mas sempre muito baixo em relação à média dos outros países europeus. O uso da internet por parte dos adolescentes e jovens, e a familiaridade que têm com tudo aquilo que pode ser digitado ou «descarregado» da internet, apresenta não poucos problemas. Pela sua própria natureza de rede de comunicação global, o problema se apresenta em ótica internacional, procurando garantir a tutela dos menores através de precisos acordos com os provedores para um efetivo controle de conteúdo. No campo italiano, até 2006, a tutela dos menores tinha sido deixada nas mãos dos próprios provedores, que em 19 de novembro de 2003 assinaram um acordo de auto-regulamentação: o Codice Internet e Minori. Embora o acordo tenha sido estipulado entre os representantes dos vários provedores diante do Ministério para a Inovação e a Tecnologia, no entanto ele permanece um acordo privado, com lacunas, principalmente no que se refere às sanções que muitas vezes devem ser aplicadas. Em 2006, na seqüência de numerosos casos de violência sobre menores, muitos dos quais realizados através da difusão de material pedo-pornográfico (quando não se tratava de verdadeiro e próprio aliciamento de menores via internet), foi promulgada a lei 38 de 6 de fevereiro de 2006: «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet».
Enfim, como aplicação da lei 38/2006, em fevereiro da 2007 foi publicado um decreto determinando os requisitos técnicos dos instrumentos de filtragem que os provedores da rede internet devem utilizar para impedir o acesso aos sites já assinalados pelo Centro nacional contra a pedo-pornografia. Mas, isso não basta para superar as dificuldades e impedir que os menores possam navegar de maneira arriscada na «rede das redes».
Atualmente foi reativada a comissão anti-pedofilia e desvios de menores através da internet, o «Ciclope», que tinha sido instituída junto ao Ministério para a Eqüidade, do governo italiano, e que ficou inativa por um ano, até a sua reestruturação junto ao Ministério da Família. Está também para entrar em função um site dedicado ao uso da internet, junto ao Ministério das Comunicações, e um número telefônico de emergência gratuito, organizado pelo mesmo ministério e por «Save the children», que poderá ser utilizado por qualquer cidadão que queira assinalar algum abuso, desvio ou pedo-pornografia. Dentre as iniciativas mais recentes, deve ser assinalado o site www.tiseiconnesso.it criado pelo Ministério das Comunicações italiano, sempre em colaboração com «Save the children», onde é colocada à disposição uma série de informações sobre o conteúdo de certos sites, seja para os pais como para as próprias crianças, em conjunto com a campanha televisiva que tem como slogan «A melhor maneira de ajudar o seu filho a não usar incorretamente as novas tecnologias é conhecê-las».
Deve ser salientado também o fato de como a rede se tornou um grande mercado online. Para alguns produtores, o «e-commerce» de brinquedos corresponde já a 4% das vendas, e apenas em 2005 as vendas online corresponderam a 37.600 ações de compra. As razões para investir no processo online são múltiplas: desde a possibilidade de evitar as dificuldades logísticas de distribuição dos produtos, à ampliação de ofertas diferentes de produtos e também a possibilidade de envolvimento do cliente através de campanhas de mala direta e a criação de comunidades virtuais em torno de alguns produtos.

FICHAS:
Pedo-pornografia e internet
Em março de 2006, entraram em vigor as novas medidas diretas de combate e repressão ao fenômeno de exploração sexual dos menores e a pedo-pornografia, estabelecidas pela lei 38/2006 – «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet» foi publicada no Diário oficial em 15 de fevereiro de 2006, nº.38 – com a qual foram substancialmente modificados e integrados os artigos 600bis e seguintes do Código Penal italiano.
A lei confirma os artigos 527, 528, 529 e 725 do Código Penal italiano, que punem os «atos obscenos em local público, publicações, espetáculos obscenos, desenhos ou figuras que ofendem a decência pública».
Porque em muitas publicações, transmissões televisivas e anúncios publicitários, mesmo que não tenham declaradamente um caráter pornográfico, imagens de crianças e adolescentes são apresentadas de maneira explícita ou mais ou menos sutilmente ilusória e de forma falsa, pede-se um novo empenho das instituições competentes para que sejam observadas as normas em vigor e, se preciso for, que façam apelo aos órgãos de Polícia, o Instituto de autodisciplina publicitária, o Ministério das Comunicações, a Polícia postal ou a «Comissão tv e menor».

3) CINEMA

Confirmando as disposições da Constituição italiana, no que se refere ao direito e ao dever das famílias de serem protagonistas na educação de seus filhos, para muitos é chegada à hora de reelaborar a legislação que define o conceito de «censura» (a lei 161/1962 prevê a possibilidade de negar a autorização de abertura às salas de cinema ou de fazer cortes nos filmes, mesmo em função de um público adulto), que hoje está superado. É preciso com urgência estabelecer um critério de tutela dos menores não apenas no que se refere aos filmes que vêem nos circuitos cinematográficos, mas também sucessivamente em casa, muitas vezes em horários acessíveis na programação da televisão.
Uma avaliação correta e preventiva de um filme permite à família ter à sua disposição os instrumentos para escolher se um espetáculo é mais ou menos oportuno, conhecendo a trama, os eventuais conteúdos mais sensíveis, a classificação que a obra recebeu em outros países, etc. Por isso, é justo que a legislação seja revista, uma operação que requer atenção e perspicácia da parte das instituições em um momento de transição da mídia, como este que estamos vivendo, quando esta se tornou realmente um importante componente na educação dos menores.
Não faltam filmes que atraem o público por causa de seu conteúdo de violência, e no entanto entram no circuito cinematográfico sem qualquer restrição de idade. Para um filme que é notícia nos jornais, existem muitos outros com conteúdos duvidosos ou até mesmo perigosos que conseguem passar através do filtro da comissão de revisão cinematográfica, que atualmente funciona junto ao departamento de cinema do Ministério dos Bens Culturais.
Ao mesmo tempo em que existe um projeto de lei do ministro dos Bens culturais, que deve ainda iniciar os trâmites parlamentares, novas situações se apresentam na Itália, com a autocensura de filmes, feita pelos produtores ou distribuidores cinematográficos, com a introdução de novas e mais específicas faixas etárias para as restrições visando os menores a partir dos 10 anos de idade. As restrições serão feitas baseando-se em uma avaliação classificatória dos conteúdos das obras e sucessivamente serão ainda analisadas por uma comissão de psicólogos, educadores e pais.
Este sistema se inspira no modelo americano da Motion Picture Association of America (MPAA), que há 40 anos representa os interesses da indústria do audiovisual americana no mundo. Funcionando a partir de regras bem precisas (estabelecidas ao longo dos anos, também segundo as sentenças dos tribunais federais nos vários Estados americanos e em base aos protestos dos cidadãos), a autocensura americana prevê a existência de uma única comissão competente para determinar as restrições do PG12 ao «restricted» 17 anos. Esta comissão é composta exclusivamente de pais, considerados os primeiros depositários da educação dos filhos, e representam transversalmente a audiência. Importantes sanções econômicas asseguram que o mecanismo de autocertificação corresponda efetivamente aos interesses dos cidadãos. No site da Motion Picture estão disponíveis aos pais os pontos de referência para a avaliação das obras de entretenimento e são publicadas as restrições aplicadas a cada filme que está em exibição nas salas de cinema. Geralmente as avaliações parecem muito mais severas em relação a outros países. Tudo isso, nos vários anos de sua aplicação, deu uma qualificação à indústria americana e seu correto serviço prestado aos ouvintes. Qualquer estrada que se pretenda seguir na Itália, é importante para as famílias que seja estimulado um mercado de produção adequado à infância: é justo que o mecanismo da indústria cinematográfica continue com o seu ritmo de produção, mas não é justo confundir as classificações de acesso ao produto, como qualquer indústria sabe muito bem.
No que se refere às normas européias de classificação dos filmes, e em geral de todo «entertainment» (neologismo anglo-saxão, que, no entanto encontra sua raiz etimológica na relação entre educação e jogo) acessível aos menores, deve ser citado o sistema NICAM, que funciona na Holanda há alguns anos. Fundado em 1999, o NICAM (Nederlands Instituut voor de Classificatie van Audiovisuele Media) se baseia na lei Media Act, onde os programas de grupos que tiveram a autorização para atividades de «broadcasting» não devem incluir obras audiovisuais que prejudiquem o desenvolvimento físico e psicológico de pessoas com menos de 16 anos de idade, seguindo as diretivas da União européia («Televisão sem fronteiras» IV).
O sistema de classificação preventiva funciona também na Grécia, com a lei 1.597, de maio de 1986, que prevê que antes da projeção nas salas de cinema, cada filme seja submetido pelo produtor ou pela sociedade de importação à Comissão para a juventude, que classifica o filme seja como adequado aos menores, ou proibido aos menores de 13 anos, ou de 17 anos ou ainda, nos casos mais graves, severamente inadequado aos menores. Esta comissão é um órgão do Ministério da Cultura e foi concebida procurando-se estabelecer certa proporcionalidade, sendo composta de representantes do Estado (Ministério da Cultura), das categorias ligadas ao cinema, de psicólogos especializados na educação, de sociólogos, dos jovens, dos educadores e dos pais.
Na Áustria, está em vigor um sistema de avaliação complexo, instituído em base a um princípio constitucional federal que confia a tutela dos menores, no que se refere ao cinema e em geral aos meios de comunicação de massa, à competência específica dos Lander. A lei nacional que engloba a regulamentação da mídia é a ORF-ACT, ou seja, a Austrian Broadcasting Corporation nº. 379/1984, que estabelece quais os critérios sobre os quais deve se basear a proteção aplicada a programas e filmes transmitidos na televisão ou através de outros canais mediáticos. No que se refere à exibição dos filmes, a avaliação preventiva das obras cinematográficas, para que sejam decididas as faixas etárias adequadas, é regulamentada pela lei austríaca para a tutela dos menores, a «Jugendschutzgesetz», aplicada através das leis dos Lander federais. Esta lei estabelece nove faixas de restrições de público a partir dos seis anos de idade, com uma sucessiva graduação que prevê restrições para 10, 12, 14 e 16 anos de idade. Para supervisionar o sistema de classificação cinematográfica, existe uma comissão junto ao Ministério da Educação, em Viena, que comunica seu parecer sobre a idoneidade dos filmes às autoridades locais. Geralmente e de maneira individual os Lander adotam as decisões da comissão, e é em âmbito local que se decide de sua aplicação.
Na Espanha, o artigo 20 da Constituição reconhece o direito do cidadão a exprimir e difundir livremente seu pensamento, suas idéias e suas opiniões através de qualquer meio de divulgação. Se por um lado o exercício de tais direitos «não pode ser restrito através de nenhum tipo de censura prévia», o mesmo artigo especifica que «estas liberdades têm o seu limite no respeito dos limites reconhecidos pelas normativas que exprimem este respeito, especialmente no direito à honra, à privacidade, à própria imagem e à proteção da juventude e da infância».
Baseando-se neste princípio, a qualificação dos filmes (Real decreto 81/1997) e das obras audiovisuais é feita antes de sua difusão, através do Instituto de cinematografia e das artes audiovisuais (ICAA), uma entidade autônoma, mas ao mesmo tempo ligada ao Ministério da Educação e Cultura através da secretaria de Estado para a cultura (ver site www.mcu.es).
A subdireção geral de fomento à indústria cinematográfica e do audiovisual, que faz parte do ICAA, se ocupa, dentre outras funções, da classificação em faixas etárias dos filmes e das outras obras audiovisuais em vista de sua exibição pública e para a sua distribuição. A comissão se encarrega de divulgar as informações sobre os filmes e programas audiovisuais, com classificação que vai desde as «salas X» até as restrições para cada faixa etária do público.
Os filmes de caráter pornográfico não podem receber subvenções do Estado e sua projeção nas salas prevê uma taxa suplementar, destinada em parte para estimular um fundo de proteção cinematográfica. A projeção destes filmes pode ser feita somente nas «salas X», onde não podem ser apresentados outros tipos de obras cinematográficas e onde é proibido o ingresso de menores de 18 anos.

CINEMA NA TV

Devido ao alto consumo de programas de televisão por parte dos menores e levando-se em conta as diretivas da União européia, que promovem a auto-regulamentação no âmbito nacional das emissoras de tv e a participação das famílias nesta obra educativa, há alguns anos estão em vigor na França, na Holanda, na Grã-Bretanha, na Grécia e na Itália os códigos de sinais, que servem para identificar tanto os filmes projetados na salas de cinema como aqueles transmitidos na televisão. A tutela dos menores no âmbito da televisão foi também feita adotando-se o chamado sistema «watershed» (separador das águas), que funciona segundo uma seleção de faixas horárias protegidas, algumas aconselhadas à visão dos menores, outras aconselhadas a todos e outras ainda, principalmente na programação noturna, indicadas somente a um público adulto.
A faixa de idade determinada pela classificação preventiva dos filmes tem obviamente uma repercussão na programação das chamadas faixas horárias protegidas ou distintas nas emissoras de televisão pública em todos os países europeus. A definição das linhas de conduta comuns está à base dos acordos de auto-regulamentação e de co-regulamentação dos programas de televisão, estabelecendo-se um código de procedimento comum para as emissoras tanto públicas como privadas. Criou-se assim uma base normativa, que é assumida pela autoridade do Estado e que recebe a confiança dos consumidores das emissoras públicas ou privadas que adotam este sistema de auto-regulamentação.
Para tornar visível aos adultos as classificações dos programas apropriados aos menores, muitas emissoras européias adotaram um sistema de sinais que através de símbolos, números, cores e sinais acústicos advertem ao público a respeito daquilo que está para ser transmitido.
Mas, apenas este sistema, assim como o de filtragem (tipo v-chip), não basta para garantir uma verdadeira tutela dos menores diante de um conjunto de imagens difíceis de serem decodificadas por um jovem. Deve-se pensar às imagens de guerra dos telejornais, dos filmes escabrosos ou às informações sobre os crimes hediondos, que muitas vezes têm como ambiente o próprio núcleo familiar.
É na colaboração entre Estado, produtores de programas audiovisuais e famílias que pode ser fundamentado um autêntico respeito dos menores que encoraje o crescimento positivo da criança em base aos valores fundamentais da pessoa humana.

4) CELULARES COM VÍDEO

Hoje a difusão dos celulares com vídeo chegou à Itália ao índice se 134%, o que significa que muitas pessoas possuem pelo menos dois celulares, inclusive os jovens e as crianças, que recebem este instrumento dos próprios pais. De fato, de duas crianças entre 8 e 13 anos de idade, uma delas tem um celular no bolso. Aquele que poderia ser um instrumento para controlar melhor os deslocamentos e as necessidades dos filhos, se revela no entanto um perigoso meio que pode expor a outro tipo de utilização por parte dos menores, que não se separam nunca do próprio celular, nem mesmo durante as aulas, como lamentam vários professores. Apesar do código de auto-regulamentação assinado pelas principais operadoras (Código de conduta para a oferta de serviços a pagamento em tutela dos menores), na realidade os novos serviços opcionais do celular o tornaram um «personal computer» capaz de permitir novos usos que antes não tinham.
Os desenvolvimentos tecnológicos que estão se verificando no campo da telefonia móvel – particularmente no que se refere à sinergia com a internet e a adoção dos sistemas DVB de vídeos-telefone – contribuem a aumentar a oportunidade de comunicação também para as novas gerações e, ao mesmo tempo, repropõem em novos termos a questão da tutela dos menores. As evoluções já previstas ulteriormente para os próximos anos e o número sempre crescente de pessoas envolvidas, pedem uma grande consciência social e uma constante atenção das pessoas e órgãos encarregados de garantir os direitos dos cidadãos.
Neste contexto devem ser reafirmados os direitos dos menores no campo da comunicação, dentre os quais certamente não está em último lugar aquele que se refere também à segurança diante dos riscos de indução a comportamentos ilícitos ou de acesso a conteúdos nocivos ou indesejados. Também neste campo é essencial o papel dos pais e, em geral, de todos aqueles que são chamados a ter uma função educativa. A maior segurança das crianças e dos jovens quanto ao acesso a conteúdos ilegais é um ponto que deve merecer atenção também através da maior conscientização dos pais e das mães, que devem se capacitar a conhecer e utilizar estes meios.
Para a «alfabetização» dos pais na utilização da mídia devem colaborar também as instituições públicas, promovendo um uso positivo das novas possibilidades tecnológicas. Às empresas cabe a responsabilidade de colocar no mercado um produto que dê garantias no que se refere à sua utilização pelos menores, superando os limites estabelecidos pelo código de auto-regulamentação assinado pelas operadoras de celulares. Devem também oferecer maiores informações aos adultos que assinam um contrato de utilização, como por exemplo a adoção de bloqueios automáticos de acesso a conteúdos nocivos, se o celular passa às mãos de um menor de idade.

5) VIDEOGAMES

Trata-se de uma indústria global, que conquistou os jovens e não apenas eles. Os números relativos à difusão repentina dos videogames indicam que existem 250 mil sites de videogames, cada um deles propõe uma série de títulos, muitos deles recheados de cenas de sexo e de violência. Uma pesquisa recente do Instituto italiano de medicina social (IIMS) coloca em evidência, entre outras coisas, a escassa informação por parte dos adultos a respeito dos videogames utilizados pelos filhos, o predomínio de temas violentas em mais de 30% de títulos não aconselhados aos menores, o predomínio de personagens virtuais normais que podem se tornar especiais, realizando ações extraordinárias.
Mas, o ponto de risco mais elevado se refere aos pequenos jogadores de videogames, crianças entre seis e nove anos de idade que se submetem a entrar tão intensamente no jogo virtual que chegam a formas de dissociação da realidade e solicitam um monitoramento muito atento da parte dos adultos. A mesma pesquisa indica a presença de videogames em 25% das famílias com crianças de três a cinco anos de idade e em 65,2% das famílias com crianças entre seis e 10 anos de idade. O que produz efeitos negativos no âmbito cognitivo das crianças não parece ser especificamente o meio, mas muito mais os elementos que criam a excitação, tais como a velocidade de produção do estímulo e da resposta, a velocidade das imagens, os efeitos especiais, os contrastes, a fragmentação da história, o binômio rumor-ação. O uso prolongado do jogo inibe, segundo alguns psicólogos, a área da capacidade crítica, provocando passividade e ao mesmo tempo agressividade na criança. Mas, não queremos demolir os videogames, porque existem aqueles que são muito adequados aos mais jovens, com valores de informação e de educação, seja também porque o uso deste meio é na realidade um passo na preparação da criança ao sucessivo e mais sofisticado, que é o uso da internet.
De qualquer maneira, os dados relativos à venda destes produtos de entretenimento mostram um crescimento em todos os lugares e a difusão deste meio é acompanhada de uma aceitação social (ou seria uma resignação?) sempre maior.
É urgente ampliar o percurso de conhecimento e das estratégias internacionais, para monitorar um mercado que está cada vez mais vasto. Parece urgente estabelecer modalidades operativas para o controle dos conteúdos e do sistema de sanções, seja para o produtor como para o vendedor dos serviços. O código de auto-regulamentação Pegi (derivado em 2003 do sistema de avaliação e classificação holandês, Nicam, que assinala os conteúdos inadequados aos menores), adotado pelos industriais de «entertainment» que produzem videogames, é a única forma de auto-regulamentação existente atualmente e que prevê sanções (raramente aplicadas, mesmo diante de casos graves evidentes) para os produtores que colocam no comércio os jogos com indicações de faixas etárias apenas aproximativas.
O código Pegi, ao qual a associação européia Isfe adere em 2002, é evidentemente insuficiente na sua função declarada de «fornecer aos consumidores as informações mais oportunas» e expostas no selo de produção. E, como o setor dos videogames tem hoje um volume de negócios que ultrapassa os 740 milhões de euros, envolvendo 24 milhões de jogadores (43% da população a partir dos quatro anos de idade), com uma venda dos produtos classificados para maiores de três anos de idade que chega aos quase 48% dos consumidores. É um dado que define o impacto deste gênero de meio sobre a infância e a adolescência, mostrando toda a sua periculosidade, seja pelo consumo de conteúdos inadequados, seja pelo excessivo número de horas dedicado neste passatempo, muitas vezes solitário e sem a presença de um adulto ao lado. Se for verdade, como sustenta a indústria, que a produção de videogames violentos é apenas uma mínima parte do mercado, é também verdade que esta representa a fatia mais importante do retorno econômico.
O interesse pelos videogames é alimentado pela sinergia com os filmes que inspiram o jogo homônimo e que torna sempre mais atrativo este gênero, principalmente para os adolescentes. Desta maneira é importante também neste campo o estabelecimento de regras precisas em defesa dos consumidores dentre o público jovem, mais exposto aos riscos destas novas formas de entretenimento cada vez mais sofisticadas e envolventes, por causa da combinação entre narrativa e efeitos gráficos.

6) PUBLICIDADE

O problema da tutela dos menores diante da publicidade se apresenta como um corolário, dentro do quadro mais amplo que regulamenta a difícil relação entre a mídia e as crianças. A televisão, e portanto também a publicidade, se constitui em uma fonte de perigo para os menores, isto é, para a maior parte das crianças, principalmente em idade pré-escolar, que devem saber fazer a diferença entre a publicidade e o resto da programação, e entre os programas de ficção e a realidade. Com essas considerações não significa que exista uma acrítica rejeição da publicidade em si mesma – à qual se reconhece, no entanto, onde proceda corretamente, uma função positiva no processo de formação, de crescimento crítico e de socialização do menor –, mas existe a necessidade de prever um sistema de regras destinado a garantir-lhe um uso adequado.
O efeito dos anúncios publicitários é tão grande que em alguns países estão sendo tomadas medidas drásticas a respeito. No Reino Unido, por exemplo, recentemente foram vetados os anúncios publicitários durante os programas destinados às crianças até nove anos de idade, a partir de 1º de janeiro de 2008 a medida se estenderá à programação para os jovens até 15 anos de idade e até o final de 2008 serão vetados em todos os canais dedicados aos menores. Apesar de se reconhecer que a publicidade serve para financiar os programas, aqueles dedicados às crianças terão que recorrer a outras fontes. Também na França começa a se impor uma «linha dura» a esse respeito: visto a alta incidência de publicidade de merendas, de sucos e doces em geral, a partir de agora os anúncios dedicados às crianças deverão ser precedidos de uma espécie de aviso, que orientará para uma alimentação adequada.
Mas, por que as crianças são tão frágeis diante dos apelos da publicidade? Na Itália, explica Paolo Landi, secretário geral da Adisconsum (Associação de defesa dos consumidores e do ambiente»), em um capítulo de seu estudo «Crianças da multimídia»: «Se consideramos que a publicidade não faz outra coisa que veicular um conhecimento imediatamente concretizável em um “ter”, ou em um “ser”, ou em um “fazer”, a criança absorve sem dificuldades os três componentes que são a obsessão dos expertos de marketing, isto é, o componente cognitivo (como fornecer informações indeléveis sobre um produto ou um serviço), o componente afetivo (como fazer o consumidor reagir de maneira emotiva) e o comportamental (como colocar o pequeno consumidor em movimento na direção da aquisição). A partir deste ponto de vista a criança é o público ideal, o consumidor a quem se pode vender qualquer coisa».
Na Itália está em vigor um código de autodisciplina publicitária que surgiu em 1966, em base a um acordo entre os profissionais do setor. Esta primeira forma de tutela, em grande parte com origem comunitária, tem como protagonistas entidades administrativas independentes: a Autoridade de controle da concorrência e do mercado de setor e a Autoridade de garantia para as comunicações e a editoria. Enquanto isso, para a auto-regulamentação, orientada pelas normas que constam do Código de autodisciplina publicitária, e agora também, embora com força jurídica diferente, pelo Código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual se reconhece um poder de decisão e de sanção, emanando uma ordem e intimando seu cumprimento.
Em todos os países onde a televisão serve de veículo às mensagens publicitárias, o mundo empresarial é plenamente consciente do enorme poder de influência que a publicidade tem sobre as crianças.



NORMATIVA INTERNACIONAL

O assunto relativo à tutela dos menores na mídia é um dos mais debatidos, seja no que se refere às normas nacionais, seja no âmbito internacional. Encontra-se diante da situação de precisar acertas as contas com toda a extensão da rede global da internet. O exemplo que, neste momento de transição, coloca mais em evidência a necessidade de estabelecer leis que estejam em condições de controlar o acesso e uso dos conteúdos nocivos para os menores, é exatamente o da internet. Qualquer pessoa no mundo pode abrir um site considerado «arriscado», contendo elementos ilegais e acessíveis a consumidores despreparados, disponibilizados por quem está do outro lado do mundo.
No que se refere aos princípios gerais no âmbito do direito internacional, é preciso recorrer principalmente à convenção da ONU sobre os direitos da criança, com sede em New York, ratificada pelo Parlamento italiano através da lei nº.176/1991. Esta garante à criança uma «consideração proeminente» também a respeito da liberdade, seja no se refere à expressão, seja quando tutela os conteúdos recebidos. Esta mesma convenção, em seu artigo 17, fala da relação entre menor e televisão, desejando «um sistema normativo que tutele o menor-consumidor, mesmo com todas as dificuldades que se apresentam», seja para individuar os fenômenos que devem ser monitorados, seja sobre as normativas possíveis.
No direito da União européia, tal tutela foi recentemente confirmada pela Carta dos direitos fundamentais da União, aprovada em Nice em 2000, cujo artigo 24 salienta que «os Estados membros reconhecem a importância da função exercida pelos meios de comunicação de massa e cuidam para que a criança possa ter acesso às informações e materiais... com a finalidade de promover o seu bem estar social, espiritual e moral, além de sua saúde física e mental». A normativa seguinte, 89/552/CEE, previu algumas restrições, seja no que se refere aos programas como para as mensagens publicitárias destinadas a este público». O artigo 22 desta normativa conduz a impedir a transmissão de programas que contenham cenas pornográficas ou de violência gratuita, ou outros programas inadequados a este público. Não podemos esquecer de mencionar a determinação expressa de «Televisão sem fronteiras», que está hoje em sua quinta versão atualizada, que o tema da tutela dos menores está relacionado com o estatuto geral dos direitos dos menores e corresponde ao disposto nos artigos 50 e 31 da Constituição italiana.
Se for claro que os princípios normativos são todos a favor da tutela dos menores, é também verdadeiro que uma tecnologia em contínua evolução colocou em crise as velhas regras do jogo. Mas também é claro que não se pode mais adiar a necessidade de estabelecer novos parâmetros normativos, para que as crianças possam utilizar os meios de comunicação próprios de seu tempo, com aproveitamento e serenidade também para as famílias.~

EDUCAÇÃO À MÍDIA NO MUNDO: PARA SABER MAIS

A difusão da educação à mídia é uma resposta à necessidade de se informar sobre as novidades no campo dos novos meios de comunicação. Em seguida citamos apenas alguns sites que em vários países oferecem maiores informações sobre como aprender a usar melhor a mídia, enfrentando a problemática da tutela dos menores e da alfabetização às novas tecnologias por parte dos adultos.
«The Media Awareness Nework-Réseau éducation médias» é uma organização canadense sem fins lucrativos, pioneira no desenvolvimento de programas sobre a educação à mídia. Com esta finalidade ela produz programas online em colaboração com organizações internacionais, convicta que, para interpretar as mensagens de informação, de entretenimento e comerciais, os jovens têm necessidade de instrumentos críticos válidos. Por isso é importante formar também os adultos (famílias e professores) sobre como funciona a mídia e como ela determina o estilo de vida.
A organização realiza uma ação contínua de monitoramento em relação à mídia (televisão, cinema, videogames, imprensa, publicidade, etc.), e sua seção dedicada aos pais oferece uma série de elementos para que estes reflitam com os filhos sobre esses meios, além da seção para os educadores, que inclui lições e materiais de apoio. Uma outra seção é dedicada à análise das questões ligadas à mídia, como a difusão de estereótipos, as representações de violência e da diversidade, a privacidade, a publicidade dirigida aos menores. Seu site é em inglês e francês (http://www.media-awareness.ca).
«Quai des images» é o site dedicado ao ensino de cinema e audiovisual organizado pelo Ministério da Educação francês. Ele propõe atividades ligadas à educação à imagem e de análise dos filmes em consonância com os programas escolares, agrupa os textos oficiais a respeito dos meios audiovisuais, oferece uma série de instrumentos de análise e de estudo completos sobre alguns filmes específicos e sobre certos autores em particular, informa sobre conferências, seminários, cursos e festivais sobre o mundo audiovisual e sua utilização em âmbito educativo e didático. Entre outras coisas, reúne também as propostas e as experiências feitas por professores e seus alunos nas escolas secundárias francesas no campo da educação à imagem, além de organizar um fórum de discussões aberto a todos sobre a educação à mídia (http://www.ac-nancy-metz.fr).
Sempre na França, está em funcionamento o blog «Zéro de conduite», organizado pelos professores e destinados a educadores, pais e estudantes. Promove o uso do cinema como instrumento pedagógico, dedicando-se especialmente à atualidade cinematográfica, mas sem esquecer os clássicos e os documentários. Com várias seções e espaços de aprofundamento, se propõe como um local de discussão de temas em um debate aberto (http://cinema-ducation.fluctuat.net).
A Universidade de Massachussetts organizou o Media Education Foundation – MEF, mídia de desafio, que produz e distribui documentários destinados a estimular o pensamento crítico e o debate sobre a relação entre aqueles que detêm o poder sobre a mídia, os conteúdos da mídia comercial, a exigência democrática de um livre fluxo de informações, as diversas representações de idéias e pensamentos e o direito dos cidadãos de informar e serem informados. Alguns destes temas são abordados criticamente, como a identidade do gênero na publicidade, a imagem de sexo nos videoclipes, o papel da mídia na construção da identidade cultural, mídia e saúde, etc. (http://www.mediaed.org/).

(a cura di M. F. D’A.)

 
At 9/17/2007 2:44 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

AS CRIANÇAS E A MÍDIA (II PARTE):
ACEITAR O DESAFIO EDUCATIVO


O tema da 41ª Jornada das Comunicações Sociais, «As crianças e os meios de comunicação: um desafio para a comunicação», nos convida a refletir a respeito de dois aspectos particularmente importantes. O primeiro é a formação das crianças, para que estejam em condições de receber de maneira crítica aquilo que vêem. O segundo é a formação à consciência e ao uso consciente da mídia, que está em contínua transformação tecnológica.
De fato, é o que especifica Bento XVI no início de sua mensagem, de 20 de maio de 2007, para a Jornada: «Os complexos desafios que a educação contemporânea deve enfrentar são muitas vezes ligados à grande influência dos meios de comunicação no nosso mundo. Como aspecto do fenômeno da globalização e estimulados pelo rápido desenvolvimento da tecnologia, os meios de comunicação delineiam fortemente o ambiente cultural (cf. João Paulo II, O rápido desenvolvimento, nº3). Na realidade, há quem afirma que a influência formativa da mídia está em competição com aquela da escola, da Igreja e, quem sabe, até com aquela da própria família».
De fato, como salienta o Pontifício conselho para as Comunicações Sociais, «para muitas pessoas, a realidade corresponde àquilo que os meios de comunicação definem como tal». Episódios recentes, como a utilização do celular na filmagem de violências nas salas de aula, abusos sofridos por pessoas deficientes, fenômenos de trote e de violência generalizada, demonstram como as crianças que crescem passando uma média de quatro horas por dia diante da televisão, sozinhos em casa, absorveram a lógica do «estou no vídeo, logo existo». Os psicólogos, os pedagogos e os estudiosos dos meios de comunicação estudam há tempos sobre as relações entre o consumo televisivo e o comportamento violento dos menores. Uma grande quantidade de pesquisas realizadas em muitos países ocidentais demonstra como esta correlação seja realmente inegável.


NOVAS LINGUAGENS

O fato que muitas crianças vivem completamente inseridas no mundo dos velhos e novos meios de comunicação, que estão cada vez mais frequentemente em correlação entre eles, é confirmado pela popularidade de alguns modelos televisivos, considerados tão efêmeros quanto penosos «momentos de glória», presentes nos programas com os maiores índices de audiência, dos «reality» aos «talk show», sem falar do «trash», que hoje se tornou um gênero de espetáculo.
Dentre as preferências demonstradas pelos adolescentes italianos que assistem televisão mais do que três horas por dia, encontramos, em primeiro lugar, a figura da «veline» (Ndt: misto de corista e coadjuvante na apresentação de programas populares da televisão italiana), enquanto outros da mesma idade se concentram no mais clássico exemplo, o do jogador de futebol. De toda maneira, a coisa mais importante é aparecer, pouco importa por qual motivo, de ser «alguém» ou «alguma coisa» no Olimpo mediático, mesmo que seja apenas por um instante.
Estes são os exemplos mais negativos dos condicionamentos derivados de um excessivo e acrítico uso dos meios de comunicação. Encontramo-nos diante de uma nova geração que cresceu na frente da televisão, capaz de usar as novas tecnologias que os próprios pais, que as adquiriram e as tornaram disponíveis, muitas vezes se encontram despreparados para utilizá-las.
Tanto é verdade que hoje em dia os filmes são vistos diretamente nos celulares e a televisão pode ser assistida na tela do computador. Hoje se telefona através da internet e graças ao download se descarrega os CDs e DVDs mais recentes, se filma e se faz foto com o celular, e assim por diante.
Nas casas, o vocabulário familiar se reduziu ao gênero dos sms e se fala tendo o som da televisão no fundo, se comunica através de e-mail, se faz «visita virtual» via computador, se percorre através de bibliotecas virtuais, tanto que as fichas e arquivos de papel evocam imagens do outro século, completamente em desuso.
A situação dos nossos filhos é diversa daquela da geração precedente, pois eles abriram seus olhos tendo diante de si estes cenários de profunda, contínua e envolvente transformação tecnológica. Eles se constituem aquela que os estudiosos chamam de geração nascida «com seis dedos»: além dos cinco dedos normais da mão, o sexto é o mouse do computador.
Com o aparecimento do mundo «virtual» da internet e dos videogames criou-se uma defasagem em relação à realidade verdadeira e própria. As duas dimensões parecem muitas vezes, e para muitos jovens, como universos paralelos, com conseqüências não indiferentes no plano do processo de amadurecimento. Têm grande sucesso os sites nos quais se prevê uma segunda vida (basta verificar os milhares de registros nos poucos meses de existência do site italiano de «Second Life», que em todo o mundo já tem sete milhões de inscritos), onde a simulação reproduz todas as situações da vida real. Apenas que tudo é falso, a começar da nova identidade, que pode ser escolhida e com ela se inicia a fazer parte deste mundo fora do mundo, onde se pode ser um «qualquer coisa». Isto é, ninguém.
Assim, o grande desafio cultural de hoje é propriamente a redefinição dos limites, que muitas vezes se apresentam demasiadamente instáveis. Isto é, redefinição dos limites entre o real e o virtual, superando a divisão digital que hoje separa as gerações adultas daqueles mais jovens.


OS JOVENS: PROTAGONISTAS OU VÍTIMAS DAS MUDANÇAS?

A linguagem deles é pobre, muitas vezes recheada de termos tirados do dicionário do internauta: clicar, chatar, messagiar, deletar, são alguns dos neologismos que fazem parte de seu vocabulário quotidiano. Falta uma dimensão humana da tecnologia que esteja em condições de traçar o perímetro cultural entre o real e o virtual. Assim a aldeia global difundiu uma quantidade de modelos comportamentais desviados, ou pelo menos discutíveis.
Desta maneira, os jovens que vivem a milhões de quilômetros de distância jogam o mesmo videogame, vêem o mesmo filme, assim como, de maneira transversal, absorvem modelos e comportamentos semelhantes. Muitas vezes os adultos têm menos domínio no uso das novas tecnologias e observam, com uma preocupação resignada diante de suas próprias limitações, as crianças que navegam facilmente na internet.
As raízes das dificuldades neste campo educativo são muito bem explicadas por Marina D’Amato, professora de sociologia da Universidade de Roma, que salienta: «Cada geração tem necessidade de se encontrar também em um mundo fantástico, que serve a interiorizar o paradigma do bom e do belo, do justo e do errado, do oportuno e do útil, também em relação aos exemplos que procedem da narrativa. Hoje nos encontramos em uma condição na qual os avós e os pais contam cada vez menos histórias aos filhos e aos netos, e este papel foi assumido pela televisão. Mas, na realidade, a televisão “exila” e “con-funde”, isto é, funde os modelos morais que são frutos de ânsias e problemas mal resolvidos, muito mais que de certezas. Embora estes se transformem com freqüência, a cada três ou quatro anos, o fato de serem repropostos continuamente faz com que se justaponham uns aos outros» (ver Come mediare i media, de Mario Russo).
Se for verdade que a televisão é o meio mais usado até a adolescência, imediatamente depois surge a grande atração pela internet. Esta passagem nasce de uma sintonia com a linguagem televisiva, que na idade infantil muitas vezes é ouvida durante muitas horas no dia. Esta linguagem se baseia em uma mediação da realidade e desta maneira ela ativa um processo de recepção que é de tipo emotivo.
Neste registro emocional é mais fácil acabar envolvido por situações e figuras capazes de se proporem como modelos identificadores, preservadores de sentido e de comportamentos a serem imitados.
O poder de concentrar uma vontade emulativa em alguns personagens, que correspondem particularmente às necessidades interiores do jovem (necessidades na maioria das vezes induzidas pela publicidade ou por modelos estimuladores), tem uma forte relação com a quantidade de horas que o jovem passa utilizando os novos ou os velhos meios de comunicação.


EDUCAÇÃO NECESSÁRIA

«A formação adequada a um uso correto dos meios de comunicação é essencial para o desenvolvimento cultural, moral e espiritual das crianças… Educar as crianças a serem seletivas no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja, da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos. Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia, com a certeza de que este difícil, embora gratificante, aspecto da condição de pais, é apoiado por toda a comunidade.»
As palavras do discurso de Bento XVI definem com grande clareza o paradigma de uma justa relação entre a mídia e os menores. Uma clareza que devemos agradecer ao magistério da Igreja, no momento em que o mundo da mídia parece ignorar a verdadeira problemática educativa das crianças e as expectativas de qualidade e de segurança exigidas pelas famílias no que se refere ao uso desses meios, seja do cinema aos videogames, da televisão à internet.
Diante da utilização destorcera do meio televisivo, o mais difundido dentre os meios de comunicação, a Igreja se interroga sobre o porquê da televisão não ter um papel educativo e por que os meios de comunicação não podem ser companheiros confiáveis para os jogos na fase de crescimento da criança. O anúncio de uma recente campanha sobre o uso da mídia, promovida pelo Ministério das Comunicações, mostra os vários membros da família que estão vendo a televisão ao lado de uma criança.
Que se trate do avô ou da mãe, a mensagem é a mesma: não deixar uma criança sozinha diante de um meio que, sem o apoio crítico educativo de um adulto, pode transmitir conteúdos inadequados à idade e à maturidade daquele que o vê. Sem esquecer as responsabilidades dos produtores televisivos, empenhados na organização dos programas, o papel da família é realmente insubstituível.
Se realmente o objetivo de quem administra a sociedade de produção televisiva, ou das multinacionais produtoras de videogames ou das operadoras de celulares, é o de promover e vender o produto, o bem estar psicofísico da criança está no centro do interesse dos educadores, sejam eles os professores ou, em primeiro lugar, os pais.
Isto explica bem a mensagem do Papa, que continua a sua análise, salientando que «educar as crianças a serem seletivos no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja e da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos (ver João Paulo II, «Familiaris Consortio», 76). Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia.»


CONTEÚDO DA MÍDIA

No panorama de uma revolução da multimídia, que está modificando transversalmente os hábitos, a mentalidade, os modelos e as linguagens, deve voltar ao centro do debate a tutela daquilo que é melhor para os menores. Sem acusar a «mídia», que enquanto tal não é nem boa nem má, o importante é partir de uma a análise do produto, para assim poder individuar conteúdos que sejam de melhor qualidade para as crianças e os adolescentes. Porque a televisão é um instrumento que abre janelas de conhecimento para o mundo e, se bem utilizada, de «má professora» pode se tornar uma preciosa fonte de estímulo para o crescimento humano e cultural.
A mesma coisa vale, e com mais razão, para a «rede» que engloba e compreende tudo, e para os videogames, onde, ao invés de violência e monstros, poderia se dedicar a produzir (e isso já ocorre em certos casos) histórias instrutivas e de conteúdo interessante.
Bento XVI coloca justamente em evidência as enormes possibilidades para que seja melhorado o conteúdo deste grande campo de produção multimídia: «A educação através da mídia deveria ser positiva. Colocando as crianças diante de um meio estética e moralmente excelente, estas recebem uma ajuda para que desenvolvam a própria opinião, a prudência e a capacidade de discernimento. É importante aqui reconhecer o valor fundamental do exemplo dos pais e as vantagens de introduzir os jovens aos clássicos da literatura infantil (…). A beleza, quase um espelho do divino, inspira e vivifica os corações e as mentes juvenis, enquanto a feiúra e a vulgaridade têm um impacto deprimente sobre os comportamentos». Diante de uma decadência geral do produto televisivo, a questão da qualidade aparece ainda mais forte e vibrante em grande parte de um público formado de famílias, que pede para não ser apenas um exército indistinto de ouvintes silenciosos, mas um público em condições de exprimir suas preferências por conteúdos formativos e informativos de bom nível.
A mensagem de Bento XVI continua, com algumas importantes indicações: «Como a educação em geral, aquela da mídia requer também uma formação ao exercício da liberdade. Trata-se de uma responsabilidade que compromete. Muitas vezes a liberdade é apresentada como uma incansável procura do prazer ou de novas experiências (…). Este desejo, sentido profundamente pelos pais e educadores, que é o de educar as crianças no caminho da beleza, da verdade e da bondade, pode ser apoiado pela indústria da mídia somente na medida em que se promove a dignidade fundamental do ser humano, o verdadeiro valor da vida familiar, as conquistas positivas e as metas da humanidade. A partir disso, a necessidade de que os meios de comunicação estejam empenhados na efetiva formação e no respeito da ética deve ser vista com interesse particular e com urgência não apenas pelos pais, mas também por aqueles que têm responsabilidade cívica».
Na realidade, nos encontramos na situação de ter que reconhecer que na Itália falta uma verdadeira «cultura da criança»: a situação é tão séria que no âmbito institucional procura-se dar uma nova organização geral para verificar e controlar os conteúdos dos setores de entretenimento, como os videogames, que até agora estão submetidos apenas a códigos de auto-regulamentação, feitos e codificados para uso e consumo pelas indústrias produtoras.
Uma vez mais, o primeiro e indispensável apoio à criança só pode vir da família e de uma relação mais estreita com os professores e educadores, exatamente como salienta Bento XVI, lembrando-nos que a preocupação educativa dos pais não deve se tornar uma preocupação genérica, mas uma atenção constante a tudo aquilo que diz respeito aos filhos.

A INDÚSTRIA DA MÍDIA

1) A TELEVISÃO

Se a televisão convencional se apresenta como um ramo de atividade já «maduro», no entanto se apresenta no horizonte a situação da mídia digital (satélite ou a cabo), também como uma plataforma que consente a ligação entre televisão, internet e outro tipo de mídia através do computador. No que se refere à qualidade da programação, apesar dos inúmeros bons propósitos anunciados no âmbito institucional, parece pequena a atenção às exigências dos menores em suas diversas faixas etárias. A programação para os menores, na realidade é confinada em redes e horários particulares, enquanto o resto da programação na faixa horária considerada «para todos» muitas vezes apresenta conteúdos inadequados aos jovens. Mas, quais são as expectativas das gerações de jovens no que se refere à televisão? É realmente verdade que preferem o «trash», os jogos com prêmios absurdos e as «velines»?
A partir de uma pesquisa recente feita pelo instituto Censis sobre «Comunicação, pluralismo social, sociedade aberta» (2005) surge que a relação entre os menores, e em particular dos adolescentes entre os 14 e 18 anos de idade, e a televisão é determinada por elementos de forte contradição e de passividade. Nessa faixa etária, 100% deles vêem televisão praticamente todos os dias, 86% acompanham um pouco de tudo, com uma relevante predileção pelos filmes (72%), por esporte (32%) e pelos «reality shows» (18%).
No entanto, a amostragem entrevistada não está realmente satisfeita com aquilo que vê. De fato, 36% dos adolescentes denunciam a vulgaridade difundida nos programas e 25% criticam a superficialidade. Dentre eles, 46% consideram a televisão como um meio que «invade», ao mesmo tempo em que é interessante notar que 25% consideram que em geral a programação televisiva alimenta nas crianças menores uma visão consumista da vida. Destes dados surge o contraste entre a procura de distração e a reprovação daquilo que lhes é proposto pela programação. Isto significa que o alto índice de procura não é um indicador de satisfação.
Considerando o axioma de que a televisão seja onipresente, fica claro que são os próprios jovens a pedirem uma maior atenção aos conteúdos: menos violência e menos vulgaridade. A exigência de uma regulamentação diversa, diz claramente o relatório do Censis, «não vem somente daqueles, pais e educadores, que estão preocupados pela possível influência negativa sobre os menores, mas se exprime nitidamente também através dos adolescentes, pelo menos de uma parte mais esperta e consciente dentre eles».
Para tutelar melhor os direitos dos menores, desde 2002 foi instituído junto ao Ministério das Comunicações um código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual aderiram os produtores de televisão, seja no âmbito nacional como local. Baseando-se nos princípios sobre a matéria existentes na Constituição italiana e na Convenção dos direitos da criança, estabelecida em 1989 pela ONU, a comissão que controla sua aplicação avaliou em todos estes anos de atividade os milhares de casos em que foram violadas as normas de tutela, que prevêem a transmissão de programas e imagens adequadas a um público de menores de idade durante aquela que é chamada de «faixa protegida» da programação televisiva (das 7h30 às 22h30), intervindo com denúncias e sanções, que nos casos mais graves foram aplicadas pela Autoridade de garantia no setor das comunicações. Para o futuro, esta comissão deverá se transformar em um organismo mais amplo de controle, que se chamará «Mídia e menores», que além da televisão deverá monitorar também os setores dos vídeos-telefone e dos videogames, além da internet, que é o campo de maior risco.

REGRAS DE TUTELA EM OUTROS PAÍSES

É diversa a situação em outros países, como por exemplo na Grã Bretanha, onde o sistema de regulamentação da mídia é estruturado e complexo e foi atualizado nas últimas décadas, com uma particular atenção à tutela dos menores. As inovações tecnológicas neste setor levaram as normativas inglesas a uma série de novas disposições, como por exemplo, a visão em casa de vídeo exclusivamente para adultos, e que fora de casa seriam vetados aos menores, ou o combate à praga mundial dos sites internet para os pedófilos, que contenham material pornográfico ou com conteúdos que possam esconder o aliciamento de menores (ver a Protection Childres Act, de 1978).
A programação televisiva é regulamentada pelo Broadcasting Act (1996), de onde deriva a instituição da Broadcasting Standard Commission (BSC), um órgão independente de controle que estabelece as normas de avaliação e classificação dos programas, também no que se refere aos conteúdos violentos ou que possam ofender a decência pública (site oficial www.bsc.org.uk). Este organismo BSC funciona internamente à estrutura do Broadcasting, supervisionando e regulamentando todas as emissoras de televisão e de rádio, via cabo ou por satélite. Sua tarefa é a de elaborar os códigos de conduta e de aplicação de modelos que respeitem a justiça, além de monitorar os modelos, verificando que respeitem as leis. Com a transmissão de programas com conteúdos considerados inadequados aos menores de várias idades, há alguns anos a televisão inglesa adotou o sistema «watershed», um «separador de águas» entre um horário de programação familiar e outro para os adultos. Todo o sistema televisivo inglês se apóia sobre a responsabilização das famílias, pois sem a colaboração delas qualquer código de modelos para os programas é praticamente inútil.
Na França, está vigorando já há anos um código através de sinais televisivos, que entra em função para assinalar os programas inadequados aos menores. A avaliação do programa televisivo é feita pelo Conseil Supérieur de l’Audiovisuel (CSA), uma autoridade administrativa independente, que controla a difusão dos filmes e outras transmissões em vários canais privados, nacionais, regionais ou locais. A normativa francesa (lei 719/2002) veta a transmissão de programas que possam prejudicar gravemente a integridade física, mental e moral dos menores, porque divulgam conteúdos de pornografia ou de violência gratuita. As transmissões são classificadas por um código de sinais que, em conjunto com um sistema organizado de faixas horárias de programação, garante às famílias mais clareza sobre os programas destinados aos menores.
Na Alemanha, o tema da infância tem particular atenção da legislação, que considera desde o nascimento o início dos direitos fundamentais do cidadão. A tutela é disciplinada no âmbito público pela JSchG (desde o dia 26 de fevereiro de 1985), enquanto a lei GjSM se ocupa do controle sobre a difusão de publicações e conteúdos mediáticos considerados danosos para os menores. A regulamentação no setor televisivo é feita segundo as normas do acordo sobre a radiodifusão dos Lander federais, que as entidades para a mídia nesses Lander adotaram por base para o estabelecimento das diretivas que tutelam o interesse dos menores nas emissoras privadas. Não são admitidas transmissões que incitem o ódio racial, que exaltem a violência ou a guerra, que ofendam a dignidade do homem, que sejam de gênero pornográfico, que mostrem pessoas moribundas ou com sofrimentos que ofendam a dignidade humana. Os responsáveis pela programação, escolhendo os horários das transmissões, devem cuidar para que os menores não vejam programas que podem prejudicar o seu bem estar psíquico, físico ou mental. As transmissões inadequadas às crianças menores podem ser transmitidas somente depois da autorização da entidade competente do Land interessado.
Os responsáveis pela organização dos programas televisivos em âmbito nacional devem nomear encarregados pela tutela dos menores, que atuam no momento da aquisição, da projeção e da realização dos programas. As emissoras privadas fundaram em 1993 uma associação de autocontrole voluntário da televisão («Freiwillige Selbskontrolle Fernsehen», FSF), à qual devem ser apresentados programas particulares, antes da sua transmissão, e suas avaliações consideradas nas decisões das entidades de controle da mídia nos Lander federais. Existe ainda o órgão comum do cidadão para a tutela dos menores, dos programas, da competência mediática e controle da mídia (GSJP), do qual faz parte um integrante da entidade para a mídia nos Lander federais, que dá o seu parecer a respeito de algumas séries, filmes e espetáculos mais ou menos adequados aos menores. Este órgão, o GSJP, decide sobre pedidos de mudança de horários de transmissão de filmes proibidos para menores, controla a forma de novos programas e experimenta novas disposições para a tutela dos menores na televisão digital. A peculiaridade da jurisdição alemã, seja no setor televisivo como no cinematográfico e da mídia em geral, é a minuciosa atenção às exigências com o desenvolvimento do menor e aos riscos que este pode correr com a observância incorreta das leis.
Nos Estados Unidos, é possível consultar via internet um «guia televisivo para os pais» (ver o site www.mpaa.org), que prevê algumas categorias de audiência aplicadas aos programas televisivos transmitidos a todo o público. Este guia organiza várias siglas para identificar a categoria de audiência para cada transmissão: vai-se do TVY (para todas as crianças) ao TVG (para todos), através de várias faixas etárias, que correspondem à passagem da primeira à segunda infância e desta à adolescência. Depois tem o TVPG («parental guidance», visto na presença de um dos pais), o TV14 («parent strongly cautioned», séria advertência aos pais), para os programas que contêm cenas de sexo e de violência. Enfim, há o TVMA, que prevê um «mature audience only», ou seja, destinado a um público de idade superior a 17 anos, última fronteira para os conteúdos considerados «restricted».
Estas avaliações foram elaboradas baseando-se nas opiniões dos próprios pais e são fáceis de serem encontradas e compreendidas. Esta linha de «guia de televisão para os pais» pode ser usada juntamente ao «v-chip», que é um dispositivo de filtro instalado na maior parte dos mais recentes modelos de aparelhos de televisão, para permitir aos pais de bloquear os programas inadequados.

FICHA 1
Brasil: «O que eu penso da tv»
No Brasil, a audiência infantil é muito alta: aproximadamente 30 milhões de crianças vêem televisão pelo menos durante três horas por dia. Explica a profa. Rosália Duarte, do departamento de Ciência da Educação, da PUC do Rio de Janeiro, que «as crianças são muito perspicazes, mas nós podemos e devemos ajudá-las a ampliar o seu quadro de referências, para que possam discutir ainda melhor sobre o conteúdos daquilo que vêem. Para isso temos necessidade, antes de tudo, de ouvir aquilo que elas têm a dizer sobre o assunto e de dialogar com elas. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e muito mais freqüente, a outras atividades culturais». No âmbito de uma pesquisa feita através de um questionário distribuído nas escolas, intitulado «O que eu penso da tv», apareceu que «as crianças querem seriamente ser ouvidas sobre aquilo que pensam da tv, mas sentem que sua opinião é considerada pouco importante e não estão contentes com o excesso de imagens de violência exibidas na televisão, principalmente a violência “real”, definida como aquela transmitida nos telejornais. Eles adoram ver televisão e não importa o que os adultos pensam e dizem a respeito disso. A eles agradam quase todos os tipos de programas transmitidos: novelas, desenhos animados, programas de humor, filmes, seriados, mas isso não faz deles espectadores “idiotas”, pois fazem críticas muito interessantes, pertinentes e bem elaboradas sobre o que consideram feio ou inadequado na televisão. Para a maior parte deles, a televisão se oferece como principal opção de divertimento (em alguns casos, a única), o que significa um dado muito preocupante. Mas, o que chamou mais a nossa atenção é o grau de experiência com o qual essas crianças analisam a televisão: são expertos e demonstram conhecer a televisão também do lado de dentro, inclusive as linguagens que ela utiliza, a sua estrutura de produção, a sua lógica interna e as suas maneiras de intervenção».
As crianças aprendem os valores e os não-valores através da televisão, não resta dúvida, mas demonstram ter senso crítico a respeito deste assunto, quando afirmam nos textos que os programas transmitidos na tv podem lhes ensinar «a serem bons, a ter coragem e a fazer o bem, a cuidar da natureza e de si mesmos, a serem honestos e a lutar por aquilo que desejam», mas também «a serem cruéis e mentirosos, a roubar e matar, a não respeitar os pais e a comprar tudo aquilo que não têm necessidade». Falando sobre a validade do ensino através da mídia, a profa. Duarte salienta a necessidade de «ouvir aquilo que têm a dizer sobre o assunto e a dialogar com eles. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e mais freqüente, a outras atividades culturais».

FICHA 2
Observadores internacionais
Os dados examinados em janeiro de 2006 pelo OssCom, que é um centro de pesquisa da mídia, deixam evidente a tendência a realizar uma forma de co-regulamentação, onde a ação legislativa dos Estados membros se integra com medidas de auto-regulamentação por parte dos produtores, broadcasters e profissionais da comunicação sob o efeito de controles e sanções. São dois os instrumentos mais utilizados no âmbito europeu, observando-se as diretivas previstas no artigo 22 de «Televisão sem fronteiras»: a definição de faixas horárias protegidas (watershed) e os sinais mostrados na tela (determinados por um sistema de «rating»). Apesar disso, aos campos tradicionalmente problemáticos da violência e da pornografia se juntam novos campos de risco para os menores: a vulgaridade, abusos e dependências de substâncias, linguagem e comportamento vulgares, discriminações e abusos, violações e ofensas à dignidade humana. Os critérios de avaliação dos programas se constituem um problema que é partilhado por muitos países da União européia, ao mesmo tempo em que se prepara uma uniformização internacional dos sistemas de classificação (ver mais adiante, Nicam), baseados na visualização de cinco ícones que ilustram simbolicamente qual é a problemática do programa que está sendo analisado e para quais idades ele é desaconselhado.
Deve ser assinalada a atividade online da European Medi@culture. O projeto é promovido pela Comissão Européia, em Bruxelas, no quadro das iniciativas «e-Learning», administrado pelo centro mediático de Baden-Württemberg. O site apresenta informações sobre a educação à mídia na Europa, particularmente na França, Áustria, Finlândia e Alemanha. A seção de projetos de multimídia agrupa os projetos sobre a mídia desenvolvidos por escolas e associações de jovens ao longo do tempo (ver http://www.european-mediaculture.org).

FICHA 3
África do Sul: Encontro mundial sobre a mídia para a infância
Este encontro trienal se realizou no último mês de março em Johannesburg, na África do Sul, com a participação de expertos do setor representando diversos países. Em conjunto se discutiu sobre a necessidade de uma programação adequada às crianças, procurando entender de que modo a violência na mídia pode influir sobre a psíquico dos menores.
Mas, no 5º Encontro mundial sobre a mídia para a infância apresentaram-se também muitas crianças provenientes de todo o mundo e empenhadas em discutir sobre o difícil tema da «Mídia como instrumento de paz e de democracia global». Vieram guiados por grupos de adultos, dentre eles as diversas organizações católicas que há anos trabalham para promover regras para o bem da infância, a serem respeitadas nas transmissões de rádio e televisão através de códigos de regulamentação que devem ser redigidos ou, como em alguns casos, apenas atualizados. Em muitos países do sul do mundo as novas tecnologias de multimídia já estão muito disseminadas e seu uso merece uma atenção particular para tutelar o público mais jovem.
Especialmente na África, explicou o organizador do encontro, Firdoze Bulbulia, começa-se a examinar o projeto de um «Media center» para as crianças, que possa produzir e distribuir transmissões de rádio e de televisão destinadas ao público mais jovem, com o objetivo de realizar um canal televisivo pan-africano dedicado à infância. Os organizadores do encontro estão também trabalhando no projeto de uma aliança africana dos meios de informação e de comunicação, seguindo o modelo daquela já existente na América latina.

2) INTERNET

Na Itália, 47% das famílias italianas têm um computador em casa, um dado relevante mas sempre muito baixo em relação à média dos outros países europeus. O uso da internet por parte dos adolescentes e jovens, e a familiaridade que têm com tudo aquilo que pode ser digitado ou «descarregado» da internet, apresenta não poucos problemas. Pela sua própria natureza de rede de comunicação global, o problema se apresenta em ótica internacional, procurando garantir a tutela dos menores através de precisos acordos com os provedores para um efetivo controle de conteúdo. No campo italiano, até 2006, a tutela dos menores tinha sido deixada nas mãos dos próprios provedores, que em 19 de novembro de 2003 assinaram um acordo de auto-regulamentação: o Codice Internet e Minori. Embora o acordo tenha sido estipulado entre os representantes dos vários provedores diante do Ministério para a Inovação e a Tecnologia, no entanto ele permanece um acordo privado, com lacunas, principalmente no que se refere às sanções que muitas vezes devem ser aplicadas. Em 2006, na seqüência de numerosos casos de violência sobre menores, muitos dos quais realizados através da difusão de material pedo-pornográfico (quando não se tratava de verdadeiro e próprio aliciamento de menores via internet), foi promulgada a lei 38 de 6 de fevereiro de 2006: «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet».
Enfim, como aplicação da lei 38/2006, em fevereiro da 2007 foi publicado um decreto determinando os requisitos técnicos dos instrumentos de filtragem que os provedores da rede internet devem utilizar para impedir o acesso aos sites já assinalados pelo Centro nacional contra a pedo-pornografia. Mas, isso não basta para superar as dificuldades e impedir que os menores possam navegar de maneira arriscada na «rede das redes».
Atualmente foi reativada a comissão anti-pedofilia e desvios de menores através da internet, o «Ciclope», que tinha sido instituída junto ao Ministério para a Eqüidade, do governo italiano, e que ficou inativa por um ano, até a sua reestruturação junto ao Ministério da Família. Está também para entrar em função um site dedicado ao uso da internet, junto ao Ministério das Comunicações, e um número telefônico de emergência gratuito, organizado pelo mesmo ministério e por «Save the children», que poderá ser utilizado por qualquer cidadão que queira assinalar algum abuso, desvio ou pedo-pornografia. Dentre as iniciativas mais recentes, deve ser assinalado o site www.tiseiconnesso.it criado pelo Ministério das Comunicações italiano, sempre em colaboração com «Save the children», onde é colocada à disposição uma série de informações sobre o conteúdo de certos sites, seja para os pais como para as próprias crianças, em conjunto com a campanha televisiva que tem como slogan «A melhor maneira de ajudar o seu filho a não usar incorretamente as novas tecnologias é conhecê-las».
Deve ser salientado também o fato de como a rede se tornou um grande mercado online. Para alguns produtores, o «e-commerce» de brinquedos corresponde já a 4% das vendas, e apenas em 2005 as vendas online corresponderam a 37.600 ações de compra. As razões para investir no processo online são múltiplas: desde a possibilidade de evitar as dificuldades logísticas de distribuição dos produtos, à ampliação de ofertas diferentes de produtos e também a possibilidade de envolvimento do cliente através de campanhas de mala direta e a criação de comunidades virtuais em torno de alguns produtos.

FICHAS:
Pedo-pornografia e internet
Em março de 2006, entraram em vigor as novas medidas diretas de combate e repressão ao fenômeno de exploração sexual dos menores e a pedo-pornografia, estabelecidas pela lei 38/2006 – «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet» foi publicada no Diário oficial em 15 de fevereiro de 2006, nº.38 – com a qual foram substancialmente modificados e integrados os artigos 600bis e seguintes do Código Penal italiano.
A lei confirma os artigos 527, 528, 529 e 725 do Código Penal italiano, que punem os «atos obscenos em local público, publicações, espetáculos obscenos, desenhos ou figuras que ofendem a decência pública».
Porque em muitas publicações, transmissões televisivas e anúncios publicitários, mesmo que não tenham declaradamente um caráter pornográfico, imagens de crianças e adolescentes são apresentadas de maneira explícita ou mais ou menos sutilmente ilusória e de forma falsa, pede-se um novo empenho das instituições competentes para que sejam observadas as normas em vigor e, se preciso for, que façam apelo aos órgãos de Polícia, o Instituto de autodisciplina publicitária, o Ministério das Comunicações, a Polícia postal ou a «Comissão tv e menor».

3) CINEMA

Confirmando as disposições da Constituição italiana, no que se refere ao direito e ao dever das famílias de serem protagonistas na educação de seus filhos, para muitos é chegada à hora de reelaborar a legislação que define o conceito de «censura» (a lei 161/1962 prevê a possibilidade de negar a autorização de abertura às salas de cinema ou de fazer cortes nos filmes, mesmo em função de um público adulto), que hoje está superado. É preciso com urgência estabelecer um critério de tutela dos menores não apenas no que se refere aos filmes que vêem nos circuitos cinematográficos, mas também sucessivamente em casa, muitas vezes em horários acessíveis na programação da televisão.
Uma avaliação correta e preventiva de um filme permite à família ter à sua disposição os instrumentos para escolher se um espetáculo é mais ou menos oportuno, conhecendo a trama, os eventuais conteúdos mais sensíveis, a classificação que a obra recebeu em outros países, etc. Por isso, é justo que a legislação seja revista, uma operação que requer atenção e perspicácia da parte das instituições em um momento de transição da mídia, como este que estamos vivendo, quando esta se tornou realmente um importante componente na educação dos menores.
Não faltam filmes que atraem o público por causa de seu conteúdo de violência, e no entanto entram no circuito cinematográfico sem qualquer restrição de idade. Para um filme que é notícia nos jornais, existem muitos outros com conteúdos duvidosos ou até mesmo perigosos que conseguem passar através do filtro da comissão de revisão cinematográfica, que atualmente funciona junto ao departamento de cinema do Ministério dos Bens Culturais.
Ao mesmo tempo em que existe um projeto de lei do ministro dos Bens culturais, que deve ainda iniciar os trâmites parlamentares, novas situações se apresentam na Itália, com a autocensura de filmes, feita pelos produtores ou distribuidores cinematográficos, com a introdução de novas e mais específicas faixas etárias para as restrições visando os menores a partir dos 10 anos de idade. As restrições serão feitas baseando-se em uma avaliação classificatória dos conteúdos das obras e sucessivamente serão ainda analisadas por uma comissão de psicólogos, educadores e pais.
Este sistema se inspira no modelo americano da Motion Picture Association of America (MPAA), que há 40 anos representa os interesses da indústria do audiovisual americana no mundo. Funcionando a partir de regras bem precisas (estabelecidas ao longo dos anos, também segundo as sentenças dos tribunais federais nos vários Estados americanos e em base aos protestos dos cidadãos), a autocensura americana prevê a existência de uma única comissão competente para determinar as restrições do PG12 ao «restricted» 17 anos. Esta comissão é composta exclusivamente de pais, considerados os primeiros depositários da educação dos filhos, e representam transversalmente a audiência. Importantes sanções econômicas asseguram que o mecanismo de autocertificação corresponda efetivamente aos interesses dos cidadãos. No site da Motion Picture estão disponíveis aos pais os pontos de referência para a avaliação das obras de entretenimento e são publicadas as restrições aplicadas a cada filme que está em exibição nas salas de cinema. Geralmente as avaliações parecem muito mais severas em relação a outros países. Tudo isso, nos vários anos de sua aplicação, deu uma qualificação à indústria americana e seu correto serviço prestado aos ouvintes. Qualquer estrada que se pretenda seguir na Itália, é importante para as famílias que seja estimulado um mercado de produção adequado à infância: é justo que o mecanismo da indústria cinematográfica continue com o seu ritmo de produção, mas não é justo confundir as classificações de acesso ao produto, como qualquer indústria sabe muito bem.
No que se refere às normas européias de classificação dos filmes, e em geral de todo «entertainment» (neologismo anglo-saxão, que, no entanto encontra sua raiz etimológica na relação entre educação e jogo) acessível aos menores, deve ser citado o sistema NICAM, que funciona na Holanda há alguns anos. Fundado em 1999, o NICAM (Nederlands Instituut voor de Classificatie van Audiovisuele Media) se baseia na lei Media Act, onde os programas de grupos que tiveram a autorização para atividades de «broadcasting» não devem incluir obras audiovisuais que prejudiquem o desenvolvimento físico e psicológico de pessoas com menos de 16 anos de idade, seguindo as diretivas da União européia («Televisão sem fronteiras» IV).
O sistema de classificação preventiva funciona também na Grécia, com a lei 1.597, de maio de 1986, que prevê que antes da projeção nas salas de cinema, cada filme seja submetido pelo produtor ou pela sociedade de importação à Comissão para a juventude, que classifica o filme seja como adequado aos menores, ou proibido aos menores de 13 anos, ou de 17 anos ou ainda, nos casos mais graves, severamente inadequado aos menores. Esta comissão é um órgão do Ministério da Cultura e foi concebida procurando-se estabelecer certa proporcionalidade, sendo composta de representantes do Estado (Ministério da Cultura), das categorias ligadas ao cinema, de psicólogos especializados na educação, de sociólogos, dos jovens, dos educadores e dos pais.
Na Áustria, está em vigor um sistema de avaliação complexo, instituído em base a um princípio constitucional federal que confia a tutela dos menores, no que se refere ao cinema e em geral aos meios de comunicação de massa, à competência específica dos Lander. A lei nacional que engloba a regulamentação da mídia é a ORF-ACT, ou seja, a Austrian Broadcasting Corporation nº. 379/1984, que estabelece quais os critérios sobre os quais deve se basear a proteção aplicada a programas e filmes transmitidos na televisão ou através de outros canais mediáticos. No que se refere à exibição dos filmes, a avaliação preventiva das obras cinematográficas, para que sejam decididas as faixas etárias adequadas, é regulamentada pela lei austríaca para a tutela dos menores, a «Jugendschutzgesetz», aplicada através das leis dos Lander federais. Esta lei estabelece nove faixas de restrições de público a partir dos seis anos de idade, com uma sucessiva graduação que prevê restrições para 10, 12, 14 e 16 anos de idade. Para supervisionar o sistema de classificação cinematográfica, existe uma comissão junto ao Ministério da Educação, em Viena, que comunica seu parecer sobre a idoneidade dos filmes às autoridades locais. Geralmente e de maneira individual os Lander adotam as decisões da comissão, e é em âmbito local que se decide de sua aplicação.
Na Espanha, o artigo 20 da Constituição reconhece o direito do cidadão a exprimir e difundir livremente seu pensamento, suas idéias e suas opiniões através de qualquer meio de divulgação. Se por um lado o exercício de tais direitos «não pode ser restrito através de nenhum tipo de censura prévia», o mesmo artigo especifica que «estas liberdades têm o seu limite no respeito dos limites reconhecidos pelas normativas que exprimem este respeito, especialmente no direito à honra, à privacidade, à própria imagem e à proteção da juventude e da infância».
Baseando-se neste princípio, a qualificação dos filmes (Real decreto 81/1997) e das obras audiovisuais é feita antes de sua difusão, através do Instituto de cinematografia e das artes audiovisuais (ICAA), uma entidade autônoma, mas ao mesmo tempo ligada ao Ministério da Educação e Cultura através da secretaria de Estado para a cultura (ver site www.mcu.es).
A subdireção geral de fomento à indústria cinematográfica e do audiovisual, que faz parte do ICAA, se ocupa, dentre outras funções, da classificação em faixas etárias dos filmes e das outras obras audiovisuais em vista de sua exibição pública e para a sua distribuição. A comissão se encarrega de divulgar as informações sobre os filmes e programas audiovisuais, com classificação que vai desde as «salas X» até as restrições para cada faixa etária do público.
Os filmes de caráter pornográfico não podem receber subvenções do Estado e sua projeção nas salas prevê uma taxa suplementar, destinada em parte para estimular um fundo de proteção cinematográfica. A projeção destes filmes pode ser feita somente nas «salas X», onde não podem ser apresentados outros tipos de obras cinematográficas e onde é proibido o ingresso de menores de 18 anos.

CINEMA NA TV

Devido ao alto consumo de programas de televisão por parte dos menores e levando-se em conta as diretivas da União européia, que promovem a auto-regulamentação no âmbito nacional das emissoras de tv e a participação das famílias nesta obra educativa, há alguns anos estão em vigor na França, na Holanda, na Grã-Bretanha, na Grécia e na Itália os códigos de sinais, que servem para identificar tanto os filmes projetados na salas de cinema como aqueles transmitidos na televisão. A tutela dos menores no âmbito da televisão foi também feita adotando-se o chamado sistema «watershed» (separador das águas), que funciona segundo uma seleção de faixas horárias protegidas, algumas aconselhadas à visão dos menores, outras aconselhadas a todos e outras ainda, principalmente na programação noturna, indicadas somente a um público adulto.
A faixa de idade determinada pela classificação preventiva dos filmes tem obviamente uma repercussão na programação das chamadas faixas horárias protegidas ou distintas nas emissoras de televisão pública em todos os países europeus. A definição das linhas de conduta comuns está à base dos acordos de auto-regulamentação e de co-regulamentação dos programas de televisão, estabelecendo-se um código de procedimento comum para as emissoras tanto públicas como privadas. Criou-se assim uma base normativa, que é assumida pela autoridade do Estado e que recebe a confiança dos consumidores das emissoras públicas ou privadas que adotam este sistema de auto-regulamentação.
Para tornar visível aos adultos as classificações dos programas apropriados aos menores, muitas emissoras européias adotaram um sistema de sinais que através de símbolos, números, cores e sinais acústicos advertem ao público a respeito daquilo que está para ser transmitido.
Mas, apenas este sistema, assim como o de filtragem (tipo v-chip), não basta para garantir uma verdadeira tutela dos menores diante de um conjunto de imagens difíceis de serem decodificadas por um jovem. Deve-se pensar às imagens de guerra dos telejornais, dos filmes escabrosos ou às informações sobre os crimes hediondos, que muitas vezes têm como ambiente o próprio núcleo familiar.
É na colaboração entre Estado, produtores de programas audiovisuais e famílias que pode ser fundamentado um autêntico respeito dos menores que encoraje o crescimento positivo da criança em base aos valores fundamentais da pessoa humana.

4) CELULARES COM VÍDEO

Hoje a difusão dos celulares com vídeo chegou à Itália ao índice se 134%, o que significa que muitas pessoas possuem pelo menos dois celulares, inclusive os jovens e as crianças, que recebem este instrumento dos próprios pais. De fato, de duas crianças entre 8 e 13 anos de idade, uma delas tem um celular no bolso. Aquele que poderia ser um instrumento para controlar melhor os deslocamentos e as necessidades dos filhos, se revela no entanto um perigoso meio que pode expor a outro tipo de utilização por parte dos menores, que não se separam nunca do próprio celular, nem mesmo durante as aulas, como lamentam vários professores. Apesar do código de auto-regulamentação assinado pelas principais operadoras (Código de conduta para a oferta de serviços a pagamento em tutela dos menores), na realidade os novos serviços opcionais do celular o tornaram um «personal computer» capaz de permitir novos usos que antes não tinham.
Os desenvolvimentos tecnológicos que estão se verificando no campo da telefonia móvel – particularmente no que se refere à sinergia com a internet e a adoção dos sistemas DVB de vídeos-telefone – contribuem a aumentar a oportunidade de comunicação também para as novas gerações e, ao mesmo tempo, repropõem em novos termos a questão da tutela dos menores. As evoluções já previstas ulteriormente para os próximos anos e o número sempre crescente de pessoas envolvidas, pedem uma grande consciência social e uma constante atenção das pessoas e órgãos encarregados de garantir os direitos dos cidadãos.
Neste contexto devem ser reafirmados os direitos dos menores no campo da comunicação, dentre os quais certamente não está em último lugar aquele que se refere também à segurança diante dos riscos de indução a comportamentos ilícitos ou de acesso a conteúdos nocivos ou indesejados. Também neste campo é essencial o papel dos pais e, em geral, de todos aqueles que são chamados a ter uma função educativa. A maior segurança das crianças e dos jovens quanto ao acesso a conteúdos ilegais é um ponto que deve merecer atenção também através da maior conscientização dos pais e das mães, que devem se capacitar a conhecer e utilizar estes meios.
Para a «alfabetização» dos pais na utilização da mídia devem colaborar também as instituições públicas, promovendo um uso positivo das novas possibilidades tecnológicas. Às empresas cabe a responsabilidade de colocar no mercado um produto que dê garantias no que se refere à sua utilização pelos menores, superando os limites estabelecidos pelo código de auto-regulamentação assinado pelas operadoras de celulares. Devem também oferecer maiores informações aos adultos que assinam um contrato de utilização, como por exemplo a adoção de bloqueios automáticos de acesso a conteúdos nocivos, se o celular passa às mãos de um menor de idade.

5) VIDEOGAMES

Trata-se de uma indústria global, que conquistou os jovens e não apenas eles. Os números relativos à difusão repentina dos videogames indicam que existem 250 mil sites de videogames, cada um deles propõe uma série de títulos, muitos deles recheados de cenas de sexo e de violência. Uma pesquisa recente do Instituto italiano de medicina social (IIMS) coloca em evidência, entre outras coisas, a escassa informação por parte dos adultos a respeito dos videogames utilizados pelos filhos, o predomínio de temas violentas em mais de 30% de títulos não aconselhados aos menores, o predomínio de personagens virtuais normais que podem se tornar especiais, realizando ações extraordinárias.
Mas, o ponto de risco mais elevado se refere aos pequenos jogadores de videogames, crianças entre seis e nove anos de idade que se submetem a entrar tão intensamente no jogo virtual que chegam a formas de dissociação da realidade e solicitam um monitoramento muito atento da parte dos adultos. A mesma pesquisa indica a presença de videogames em 25% das famílias com crianças de três a cinco anos de idade e em 65,2% das famílias com crianças entre seis e 10 anos de idade. O que produz efeitos negativos no âmbito cognitivo das crianças não parece ser especificamente o meio, mas muito mais os elementos que criam a excitação, tais como a velocidade de produção do estímulo e da resposta, a velocidade das imagens, os efeitos especiais, os contrastes, a fragmentação da história, o binômio rumor-ação. O uso prolongado do jogo inibe, segundo alguns psicólogos, a área da capacidade crítica, provocando passividade e ao mesmo tempo agressividade na criança. Mas, não queremos demolir os videogames, porque existem aqueles que são muito adequados aos mais jovens, com valores de informação e de educação, seja também porque o uso deste meio é na realidade um passo na preparação da criança ao sucessivo e mais sofisticado, que é o uso da internet.
De qualquer maneira, os dados relativos à venda destes produtos de entretenimento mostram um crescimento em todos os lugares e a difusão deste meio é acompanhada de uma aceitação social (ou seria uma resignação?) sempre maior.
É urgente ampliar o percurso de conhecimento e das estratégias internacionais, para monitorar um mercado que está cada vez mais vasto. Parece urgente estabelecer modalidades operativas para o controle dos conteúdos e do sistema de sanções, seja para o produtor como para o vendedor dos serviços. O código de auto-regulamentação Pegi (derivado em 2003 do sistema de avaliação e classificação holandês, Nicam, que assinala os conteúdos inadequados aos menores), adotado pelos industriais de «entertainment» que produzem videogames, é a única forma de auto-regulamentação existente atualmente e que prevê sanções (raramente aplicadas, mesmo diante de casos graves evidentes) para os produtores que colocam no comércio os jogos com indicações de faixas etárias apenas aproximativas.
O código Pegi, ao qual a associação européia Isfe adere em 2002, é evidentemente insuficiente na sua função declarada de «fornecer aos consumidores as informações mais oportunas» e expostas no selo de produção. E, como o setor dos videogames tem hoje um volume de negócios que ultrapassa os 740 milhões de euros, envolvendo 24 milhões de jogadores (43% da população a partir dos quatro anos de idade), com uma venda dos produtos classificados para maiores de três anos de idade que chega aos quase 48% dos consumidores. É um dado que define o impacto deste gênero de meio sobre a infância e a adolescência, mostrando toda a sua periculosidade, seja pelo consumo de conteúdos inadequados, seja pelo excessivo número de horas dedicado neste passatempo, muitas vezes solitário e sem a presença de um adulto ao lado. Se for verdade, como sustenta a indústria, que a produção de videogames violentos é apenas uma mínima parte do mercado, é também verdade que esta representa a fatia mais importante do retorno econômico.
O interesse pelos videogames é alimentado pela sinergia com os filmes que inspiram o jogo homônimo e que torna sempre mais atrativo este gênero, principalmente para os adolescentes. Desta maneira é importante também neste campo o estabelecimento de regras precisas em defesa dos consumidores dentre o público jovem, mais exposto aos riscos destas novas formas de entretenimento cada vez mais sofisticadas e envolventes, por causa da combinação entre narrativa e efeitos gráficos.

6) PUBLICIDADE

O problema da tutela dos menores diante da publicidade se apresenta como um corolário, dentro do quadro mais amplo que regulamenta a difícil relação entre a mídia e as crianças. A televisão, e portanto também a publicidade, se constitui em uma fonte de perigo para os menores, isto é, para a maior parte das crianças, principalmente em idade pré-escolar, que devem saber fazer a diferença entre a publicidade e o resto da programação, e entre os programas de ficção e a realidade. Com essas considerações não significa que exista uma acrítica rejeição da publicidade em si mesma – à qual se reconhece, no entanto, onde proceda corretamente, uma função positiva no processo de formação, de crescimento crítico e de socialização do menor –, mas existe a necessidade de prever um sistema de regras destinado a garantir-lhe um uso adequado.
O efeito dos anúncios publicitários é tão grande que em alguns países estão sendo tomadas medidas drásticas a respeito. No Reino Unido, por exemplo, recentemente foram vetados os anúncios publicitários durante os programas destinados às crianças até nove anos de idade, a partir de 1º de janeiro de 2008 a medida se estenderá à programação para os jovens até 15 anos de idade e até o final de 2008 serão vetados em todos os canais dedicados aos menores. Apesar de se reconhecer que a publicidade serve para financiar os programas, aqueles dedicados às crianças terão que recorrer a outras fontes. Também na França começa a se impor uma «linha dura» a esse respeito: visto a alta incidência de publicidade de merendas, de sucos e doces em geral, a partir de agora os anúncios dedicados às crianças deverão ser precedidos de uma espécie de aviso, que orientará para uma alimentação adequada.
Mas, por que as crianças são tão frágeis diante dos apelos da publicidade? Na Itália, explica Paolo Landi, secretário geral da Adisconsum (Associação de defesa dos consumidores e do ambiente»), em um capítulo de seu estudo «Crianças da multimídia»: «Se consideramos que a publicidade não faz outra coisa que veicular um conhecimento imediatamente concretizável em um “ter”, ou em um “ser”, ou em um “fazer”, a criança absorve sem dificuldades os três componentes que são a obsessão dos expertos de marketing, isto é, o componente cognitivo (como fornecer informações indeléveis sobre um produto ou um serviço), o componente afetivo (como fazer o consumidor reagir de maneira emotiva) e o comportamental (como colocar o pequeno consumidor em movimento na direção da aquisição). A partir deste ponto de vista a criança é o público ideal, o consumidor a quem se pode vender qualquer coisa».
Na Itália está em vigor um código de autodisciplina publicitária que surgiu em 1966, em base a um acordo entre os profissionais do setor. Esta primeira forma de tutela, em grande parte com origem comunitária, tem como protagonistas entidades administrativas independentes: a Autoridade de controle da concorrência e do mercado de setor e a Autoridade de garantia para as comunicações e a editoria. Enquanto isso, para a auto-regulamentação, orientada pelas normas que constam do Código de autodisciplina publicitária, e agora também, embora com força jurídica diferente, pelo Código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual se reconhece um poder de decisão e de sanção, emanando uma ordem e intimando seu cumprimento.
Em todos os países onde a televisão serve de veículo às mensagens publicitárias, o mundo empresarial é plenamente consciente do enorme poder de influência que a publicidade tem sobre as crianças.



NORMATIVA INTERNACIONAL

O assunto relativo à tutela dos menores na mídia é um dos mais debatidos, seja no que se refere às normas nacionais, seja no âmbito internacional. Encontra-se diante da situação de precisar acertas as contas com toda a extensão da rede global da internet. O exemplo que, neste momento de transição, coloca mais em evidência a necessidade de estabelecer leis que estejam em condições de controlar o acesso e uso dos conteúdos nocivos para os menores, é exatamente o da internet. Qualquer pessoa no mundo pode abrir um site considerado «arriscado», contendo elementos ilegais e acessíveis a consumidores despreparados, disponibilizados por quem está do outro lado do mundo.
No que se refere aos princípios gerais no âmbito do direito internacional, é preciso recorrer principalmente à convenção da ONU sobre os direitos da criança, com sede em New York, ratificada pelo Parlamento italiano através da lei nº.176/1991. Esta garante à criança uma «consideração proeminente» também a respeito da liberdade, seja no se refere à expressão, seja quando tutela os conteúdos recebidos. Esta mesma convenção, em seu artigo 17, fala da relação entre menor e televisão, desejando «um sistema normativo que tutele o menor-consumidor, mesmo com todas as dificuldades que se apresentam», seja para individuar os fenômenos que devem ser monitorados, seja sobre as normativas possíveis.
No direito da União européia, tal tutela foi recentemente confirmada pela Carta dos direitos fundamentais da União, aprovada em Nice em 2000, cujo artigo 24 salienta que «os Estados membros reconhecem a importância da função exercida pelos meios de comunicação de massa e cuidam para que a criança possa ter acesso às informações e materiais... com a finalidade de promover o seu bem estar social, espiritual e moral, além de sua saúde física e mental». A normativa seguinte, 89/552/CEE, previu algumas restrições, seja no que se refere aos programas como para as mensagens publicitárias destinadas a este público». O artigo 22 desta normativa conduz a impedir a transmissão de programas que contenham cenas pornográficas ou de violência gratuita, ou outros programas inadequados a este público. Não podemos esquecer de mencionar a determinação expressa de «Televisão sem fronteiras», que está hoje em sua quinta versão atualizada, que o tema da tutela dos menores está relacionado com o estatuto geral dos direitos dos menores e corresponde ao disposto nos artigos 50 e 31 da Constituição italiana.
Se for claro que os princípios normativos são todos a favor da tutela dos menores, é também verdadeiro que uma tecnologia em contínua evolução colocou em crise as velhas regras do jogo. Mas também é claro que não se pode mais adiar a necessidade de estabelecer novos parâmetros normativos, para que as crianças possam utilizar os meios de comunicação próprios de seu tempo, com aproveitamento e serenidade também para as famílias.~

EDUCAÇÃO À MÍDIA NO MUNDO: PARA SABER MAIS

A difusão da educação à mídia é uma resposta à necessidade de se informar sobre as novidades no campo dos novos meios de comunicação. Em seguida citamos apenas alguns sites que em vários países oferecem maiores informações sobre como aprender a usar melhor a mídia, enfrentando a problemática da tutela dos menores e da alfabetização às novas tecnologias por parte dos adultos.
«The Media Awareness Nework-Réseau éducation médias» é uma organização canadense sem fins lucrativos, pioneira no desenvolvimento de programas sobre a educação à mídia. Com esta finalidade ela produz programas online em colaboração com organizações internacionais, convicta que, para interpretar as mensagens de informação, de entretenimento e comerciais, os jovens têm necessidade de instrumentos críticos válidos. Por isso é importante formar também os adultos (famílias e professores) sobre como funciona a mídia e como ela determina o estilo de vida.
A organização realiza uma ação contínua de monitoramento em relação à mídia (televisão, cinema, videogames, imprensa, publicidade, etc.), e sua seção dedicada aos pais oferece uma série de elementos para que estes reflitam com os filhos sobre esses meios, além da seção para os educadores, que inclui lições e materiais de apoio. Uma outra seção é dedicada à análise das questões ligadas à mídia, como a difusão de estereótipos, as representações de violência e da diversidade, a privacidade, a publicidade dirigida aos menores. Seu site é em inglês e francês (http://www.media-awareness.ca).
«Quai des images» é o site dedicado ao ensino de cinema e audiovisual organizado pelo Ministério da Educação francês. Ele propõe atividades ligadas à educação à imagem e de análise dos filmes em consonância com os programas escolares, agrupa os textos oficiais a respeito dos meios audiovisuais, oferece uma série de instrumentos de análise e de estudo completos sobre alguns filmes específicos e sobre certos autores em particular, informa sobre conferências, seminários, cursos e festivais sobre o mundo audiovisual e sua utilização em âmbito educativo e didático. Entre outras coisas, reúne também as propostas e as experiências feitas por professores e seus alunos nas escolas secundárias francesas no campo da educação à imagem, além de organizar um fórum de discussões aberto a todos sobre a educação à mídia (http://www.ac-nancy-metz.fr).
Sempre na França, está em funcionamento o blog «Zéro de conduite», organizado pelos professores e destinados a educadores, pais e estudantes. Promove o uso do cinema como instrumento pedagógico, dedicando-se especialmente à atualidade cinematográfica, mas sem esquecer os clássicos e os documentários. Com várias seções e espaços de aprofundamento, se propõe como um local de discussão de temas em um debate aberto (http://cinema-ducation.fluctuat.net).
A Universidade de Massachussetts organizou o Media Education Foundation – MEF, mídia de desafio, que produz e distribui documentários destinados a estimular o pensamento crítico e o debate sobre a relação entre aqueles que detêm o poder sobre a mídia, os conteúdos da mídia comercial, a exigência democrática de um livre fluxo de informações, as diversas representações de idéias e pensamentos e o direito dos cidadãos de informar e serem informados. Alguns destes temas são abordados criticamente, como a identidade do gênero na publicidade, a imagem de sexo nos videoclipes, o papel da mídia na construção da identidade cultural, mídia e saúde, etc. (http://www.mediaed.org/).

(a cura di M. F. D’A.)

 
At 9/17/2007 2:44 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

AS CRIANÇAS E A MÍDIA (II PARTE):
ACEITAR O DESAFIO EDUCATIVO


O tema da 41ª Jornada das Comunicações Sociais, «As crianças e os meios de comunicação: um desafio para a comunicação», nos convida a refletir a respeito de dois aspectos particularmente importantes. O primeiro é a formação das crianças, para que estejam em condições de receber de maneira crítica aquilo que vêem. O segundo é a formação à consciência e ao uso consciente da mídia, que está em contínua transformação tecnológica.
De fato, é o que especifica Bento XVI no início de sua mensagem, de 20 de maio de 2007, para a Jornada: «Os complexos desafios que a educação contemporânea deve enfrentar são muitas vezes ligados à grande influência dos meios de comunicação no nosso mundo. Como aspecto do fenômeno da globalização e estimulados pelo rápido desenvolvimento da tecnologia, os meios de comunicação delineiam fortemente o ambiente cultural (cf. João Paulo II, O rápido desenvolvimento, nº3). Na realidade, há quem afirma que a influência formativa da mídia está em competição com aquela da escola, da Igreja e, quem sabe, até com aquela da própria família».
De fato, como salienta o Pontifício conselho para as Comunicações Sociais, «para muitas pessoas, a realidade corresponde àquilo que os meios de comunicação definem como tal». Episódios recentes, como a utilização do celular na filmagem de violências nas salas de aula, abusos sofridos por pessoas deficientes, fenômenos de trote e de violência generalizada, demonstram como as crianças que crescem passando uma média de quatro horas por dia diante da televisão, sozinhos em casa, absorveram a lógica do «estou no vídeo, logo existo». Os psicólogos, os pedagogos e os estudiosos dos meios de comunicação estudam há tempos sobre as relações entre o consumo televisivo e o comportamento violento dos menores. Uma grande quantidade de pesquisas realizadas em muitos países ocidentais demonstra como esta correlação seja realmente inegável.


NOVAS LINGUAGENS

O fato que muitas crianças vivem completamente inseridas no mundo dos velhos e novos meios de comunicação, que estão cada vez mais frequentemente em correlação entre eles, é confirmado pela popularidade de alguns modelos televisivos, considerados tão efêmeros quanto penosos «momentos de glória», presentes nos programas com os maiores índices de audiência, dos «reality» aos «talk show», sem falar do «trash», que hoje se tornou um gênero de espetáculo.
Dentre as preferências demonstradas pelos adolescentes italianos que assistem televisão mais do que três horas por dia, encontramos, em primeiro lugar, a figura da «veline» (Ndt: misto de corista e coadjuvante na apresentação de programas populares da televisão italiana), enquanto outros da mesma idade se concentram no mais clássico exemplo, o do jogador de futebol. De toda maneira, a coisa mais importante é aparecer, pouco importa por qual motivo, de ser «alguém» ou «alguma coisa» no Olimpo mediático, mesmo que seja apenas por um instante.
Estes são os exemplos mais negativos dos condicionamentos derivados de um excessivo e acrítico uso dos meios de comunicação. Encontramo-nos diante de uma nova geração que cresceu na frente da televisão, capaz de usar as novas tecnologias que os próprios pais, que as adquiriram e as tornaram disponíveis, muitas vezes se encontram despreparados para utilizá-las.
Tanto é verdade que hoje em dia os filmes são vistos diretamente nos celulares e a televisão pode ser assistida na tela do computador. Hoje se telefona através da internet e graças ao download se descarrega os CDs e DVDs mais recentes, se filma e se faz foto com o celular, e assim por diante.
Nas casas, o vocabulário familiar se reduziu ao gênero dos sms e se fala tendo o som da televisão no fundo, se comunica através de e-mail, se faz «visita virtual» via computador, se percorre através de bibliotecas virtuais, tanto que as fichas e arquivos de papel evocam imagens do outro século, completamente em desuso.
A situação dos nossos filhos é diversa daquela da geração precedente, pois eles abriram seus olhos tendo diante de si estes cenários de profunda, contínua e envolvente transformação tecnológica. Eles se constituem aquela que os estudiosos chamam de geração nascida «com seis dedos»: além dos cinco dedos normais da mão, o sexto é o mouse do computador.
Com o aparecimento do mundo «virtual» da internet e dos videogames criou-se uma defasagem em relação à realidade verdadeira e própria. As duas dimensões parecem muitas vezes, e para muitos jovens, como universos paralelos, com conseqüências não indiferentes no plano do processo de amadurecimento. Têm grande sucesso os sites nos quais se prevê uma segunda vida (basta verificar os milhares de registros nos poucos meses de existência do site italiano de «Second Life», que em todo o mundo já tem sete milhões de inscritos), onde a simulação reproduz todas as situações da vida real. Apenas que tudo é falso, a começar da nova identidade, que pode ser escolhida e com ela se inicia a fazer parte deste mundo fora do mundo, onde se pode ser um «qualquer coisa». Isto é, ninguém.
Assim, o grande desafio cultural de hoje é propriamente a redefinição dos limites, que muitas vezes se apresentam demasiadamente instáveis. Isto é, redefinição dos limites entre o real e o virtual, superando a divisão digital que hoje separa as gerações adultas daqueles mais jovens.


OS JOVENS: PROTAGONISTAS OU VÍTIMAS DAS MUDANÇAS?

A linguagem deles é pobre, muitas vezes recheada de termos tirados do dicionário do internauta: clicar, chatar, messagiar, deletar, são alguns dos neologismos que fazem parte de seu vocabulário quotidiano. Falta uma dimensão humana da tecnologia que esteja em condições de traçar o perímetro cultural entre o real e o virtual. Assim a aldeia global difundiu uma quantidade de modelos comportamentais desviados, ou pelo menos discutíveis.
Desta maneira, os jovens que vivem a milhões de quilômetros de distância jogam o mesmo videogame, vêem o mesmo filme, assim como, de maneira transversal, absorvem modelos e comportamentos semelhantes. Muitas vezes os adultos têm menos domínio no uso das novas tecnologias e observam, com uma preocupação resignada diante de suas próprias limitações, as crianças que navegam facilmente na internet.
As raízes das dificuldades neste campo educativo são muito bem explicadas por Marina D’Amato, professora de sociologia da Universidade de Roma, que salienta: «Cada geração tem necessidade de se encontrar também em um mundo fantástico, que serve a interiorizar o paradigma do bom e do belo, do justo e do errado, do oportuno e do útil, também em relação aos exemplos que procedem da narrativa. Hoje nos encontramos em uma condição na qual os avós e os pais contam cada vez menos histórias aos filhos e aos netos, e este papel foi assumido pela televisão. Mas, na realidade, a televisão “exila” e “con-funde”, isto é, funde os modelos morais que são frutos de ânsias e problemas mal resolvidos, muito mais que de certezas. Embora estes se transformem com freqüência, a cada três ou quatro anos, o fato de serem repropostos continuamente faz com que se justaponham uns aos outros» (ver Come mediare i media, de Mario Russo).
Se for verdade que a televisão é o meio mais usado até a adolescência, imediatamente depois surge a grande atração pela internet. Esta passagem nasce de uma sintonia com a linguagem televisiva, que na idade infantil muitas vezes é ouvida durante muitas horas no dia. Esta linguagem se baseia em uma mediação da realidade e desta maneira ela ativa um processo de recepção que é de tipo emotivo.
Neste registro emocional é mais fácil acabar envolvido por situações e figuras capazes de se proporem como modelos identificadores, preservadores de sentido e de comportamentos a serem imitados.
O poder de concentrar uma vontade emulativa em alguns personagens, que correspondem particularmente às necessidades interiores do jovem (necessidades na maioria das vezes induzidas pela publicidade ou por modelos estimuladores), tem uma forte relação com a quantidade de horas que o jovem passa utilizando os novos ou os velhos meios de comunicação.


EDUCAÇÃO NECESSÁRIA

«A formação adequada a um uso correto dos meios de comunicação é essencial para o desenvolvimento cultural, moral e espiritual das crianças… Educar as crianças a serem seletivas no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja, da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos. Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia, com a certeza de que este difícil, embora gratificante, aspecto da condição de pais, é apoiado por toda a comunidade.»
As palavras do discurso de Bento XVI definem com grande clareza o paradigma de uma justa relação entre a mídia e os menores. Uma clareza que devemos agradecer ao magistério da Igreja, no momento em que o mundo da mídia parece ignorar a verdadeira problemática educativa das crianças e as expectativas de qualidade e de segurança exigidas pelas famílias no que se refere ao uso desses meios, seja do cinema aos videogames, da televisão à internet.
Diante da utilização destorcera do meio televisivo, o mais difundido dentre os meios de comunicação, a Igreja se interroga sobre o porquê da televisão não ter um papel educativo e por que os meios de comunicação não podem ser companheiros confiáveis para os jogos na fase de crescimento da criança. O anúncio de uma recente campanha sobre o uso da mídia, promovida pelo Ministério das Comunicações, mostra os vários membros da família que estão vendo a televisão ao lado de uma criança.
Que se trate do avô ou da mãe, a mensagem é a mesma: não deixar uma criança sozinha diante de um meio que, sem o apoio crítico educativo de um adulto, pode transmitir conteúdos inadequados à idade e à maturidade daquele que o vê. Sem esquecer as responsabilidades dos produtores televisivos, empenhados na organização dos programas, o papel da família é realmente insubstituível.
Se realmente o objetivo de quem administra a sociedade de produção televisiva, ou das multinacionais produtoras de videogames ou das operadoras de celulares, é o de promover e vender o produto, o bem estar psicofísico da criança está no centro do interesse dos educadores, sejam eles os professores ou, em primeiro lugar, os pais.
Isto explica bem a mensagem do Papa, que continua a sua análise, salientando que «educar as crianças a serem seletivos no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja e da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos (ver João Paulo II, «Familiaris Consortio», 76). Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia.»


CONTEÚDO DA MÍDIA

No panorama de uma revolução da multimídia, que está modificando transversalmente os hábitos, a mentalidade, os modelos e as linguagens, deve voltar ao centro do debate a tutela daquilo que é melhor para os menores. Sem acusar a «mídia», que enquanto tal não é nem boa nem má, o importante é partir de uma a análise do produto, para assim poder individuar conteúdos que sejam de melhor qualidade para as crianças e os adolescentes. Porque a televisão é um instrumento que abre janelas de conhecimento para o mundo e, se bem utilizada, de «má professora» pode se tornar uma preciosa fonte de estímulo para o crescimento humano e cultural.
A mesma coisa vale, e com mais razão, para a «rede» que engloba e compreende tudo, e para os videogames, onde, ao invés de violência e monstros, poderia se dedicar a produzir (e isso já ocorre em certos casos) histórias instrutivas e de conteúdo interessante.
Bento XVI coloca justamente em evidência as enormes possibilidades para que seja melhorado o conteúdo deste grande campo de produção multimídia: «A educação através da mídia deveria ser positiva. Colocando as crianças diante de um meio estética e moralmente excelente, estas recebem uma ajuda para que desenvolvam a própria opinião, a prudência e a capacidade de discernimento. É importante aqui reconhecer o valor fundamental do exemplo dos pais e as vantagens de introduzir os jovens aos clássicos da literatura infantil (…). A beleza, quase um espelho do divino, inspira e vivifica os corações e as mentes juvenis, enquanto a feiúra e a vulgaridade têm um impacto deprimente sobre os comportamentos». Diante de uma decadência geral do produto televisivo, a questão da qualidade aparece ainda mais forte e vibrante em grande parte de um público formado de famílias, que pede para não ser apenas um exército indistinto de ouvintes silenciosos, mas um público em condições de exprimir suas preferências por conteúdos formativos e informativos de bom nível.
A mensagem de Bento XVI continua, com algumas importantes indicações: «Como a educação em geral, aquela da mídia requer também uma formação ao exercício da liberdade. Trata-se de uma responsabilidade que compromete. Muitas vezes a liberdade é apresentada como uma incansável procura do prazer ou de novas experiências (…). Este desejo, sentido profundamente pelos pais e educadores, que é o de educar as crianças no caminho da beleza, da verdade e da bondade, pode ser apoiado pela indústria da mídia somente na medida em que se promove a dignidade fundamental do ser humano, o verdadeiro valor da vida familiar, as conquistas positivas e as metas da humanidade. A partir disso, a necessidade de que os meios de comunicação estejam empenhados na efetiva formação e no respeito da ética deve ser vista com interesse particular e com urgência não apenas pelos pais, mas também por aqueles que têm responsabilidade cívica».
Na realidade, nos encontramos na situação de ter que reconhecer que na Itália falta uma verdadeira «cultura da criança»: a situação é tão séria que no âmbito institucional procura-se dar uma nova organização geral para verificar e controlar os conteúdos dos setores de entretenimento, como os videogames, que até agora estão submetidos apenas a códigos de auto-regulamentação, feitos e codificados para uso e consumo pelas indústrias produtoras.
Uma vez mais, o primeiro e indispensável apoio à criança só pode vir da família e de uma relação mais estreita com os professores e educadores, exatamente como salienta Bento XVI, lembrando-nos que a preocupação educativa dos pais não deve se tornar uma preocupação genérica, mas uma atenção constante a tudo aquilo que diz respeito aos filhos.

A INDÚSTRIA DA MÍDIA

1) A TELEVISÃO

Se a televisão convencional se apresenta como um ramo de atividade já «maduro», no entanto se apresenta no horizonte a situação da mídia digital (satélite ou a cabo), também como uma plataforma que consente a ligação entre televisão, internet e outro tipo de mídia através do computador. No que se refere à qualidade da programação, apesar dos inúmeros bons propósitos anunciados no âmbito institucional, parece pequena a atenção às exigências dos menores em suas diversas faixas etárias. A programação para os menores, na realidade é confinada em redes e horários particulares, enquanto o resto da programação na faixa horária considerada «para todos» muitas vezes apresenta conteúdos inadequados aos jovens. Mas, quais são as expectativas das gerações de jovens no que se refere à televisão? É realmente verdade que preferem o «trash», os jogos com prêmios absurdos e as «velines»?
A partir de uma pesquisa recente feita pelo instituto Censis sobre «Comunicação, pluralismo social, sociedade aberta» (2005) surge que a relação entre os menores, e em particular dos adolescentes entre os 14 e 18 anos de idade, e a televisão é determinada por elementos de forte contradição e de passividade. Nessa faixa etária, 100% deles vêem televisão praticamente todos os dias, 86% acompanham um pouco de tudo, com uma relevante predileção pelos filmes (72%), por esporte (32%) e pelos «reality shows» (18%).
No entanto, a amostragem entrevistada não está realmente satisfeita com aquilo que vê. De fato, 36% dos adolescentes denunciam a vulgaridade difundida nos programas e 25% criticam a superficialidade. Dentre eles, 46% consideram a televisão como um meio que «invade», ao mesmo tempo em que é interessante notar que 25% consideram que em geral a programação televisiva alimenta nas crianças menores uma visão consumista da vida. Destes dados surge o contraste entre a procura de distração e a reprovação daquilo que lhes é proposto pela programação. Isto significa que o alto índice de procura não é um indicador de satisfação.
Considerando o axioma de que a televisão seja onipresente, fica claro que são os próprios jovens a pedirem uma maior atenção aos conteúdos: menos violência e menos vulgaridade. A exigência de uma regulamentação diversa, diz claramente o relatório do Censis, «não vem somente daqueles, pais e educadores, que estão preocupados pela possível influência negativa sobre os menores, mas se exprime nitidamente também através dos adolescentes, pelo menos de uma parte mais esperta e consciente dentre eles».
Para tutelar melhor os direitos dos menores, desde 2002 foi instituído junto ao Ministério das Comunicações um código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual aderiram os produtores de televisão, seja no âmbito nacional como local. Baseando-se nos princípios sobre a matéria existentes na Constituição italiana e na Convenção dos direitos da criança, estabelecida em 1989 pela ONU, a comissão que controla sua aplicação avaliou em todos estes anos de atividade os milhares de casos em que foram violadas as normas de tutela, que prevêem a transmissão de programas e imagens adequadas a um público de menores de idade durante aquela que é chamada de «faixa protegida» da programação televisiva (das 7h30 às 22h30), intervindo com denúncias e sanções, que nos casos mais graves foram aplicadas pela Autoridade de garantia no setor das comunicações. Para o futuro, esta comissão deverá se transformar em um organismo mais amplo de controle, que se chamará «Mídia e menores», que além da televisão deverá monitorar também os setores dos vídeos-telefone e dos videogames, além da internet, que é o campo de maior risco.

REGRAS DE TUTELA EM OUTROS PAÍSES

É diversa a situação em outros países, como por exemplo na Grã Bretanha, onde o sistema de regulamentação da mídia é estruturado e complexo e foi atualizado nas últimas décadas, com uma particular atenção à tutela dos menores. As inovações tecnológicas neste setor levaram as normativas inglesas a uma série de novas disposições, como por exemplo, a visão em casa de vídeo exclusivamente para adultos, e que fora de casa seriam vetados aos menores, ou o combate à praga mundial dos sites internet para os pedófilos, que contenham material pornográfico ou com conteúdos que possam esconder o aliciamento de menores (ver a Protection Childres Act, de 1978).
A programação televisiva é regulamentada pelo Broadcasting Act (1996), de onde deriva a instituição da Broadcasting Standard Commission (BSC), um órgão independente de controle que estabelece as normas de avaliação e classificação dos programas, também no que se refere aos conteúdos violentos ou que possam ofender a decência pública (site oficial www.bsc.org.uk). Este organismo BSC funciona internamente à estrutura do Broadcasting, supervisionando e regulamentando todas as emissoras de televisão e de rádio, via cabo ou por satélite. Sua tarefa é a de elaborar os códigos de conduta e de aplicação de modelos que respeitem a justiça, além de monitorar os modelos, verificando que respeitem as leis. Com a transmissão de programas com conteúdos considerados inadequados aos menores de várias idades, há alguns anos a televisão inglesa adotou o sistema «watershed», um «separador de águas» entre um horário de programação familiar e outro para os adultos. Todo o sistema televisivo inglês se apóia sobre a responsabilização das famílias, pois sem a colaboração delas qualquer código de modelos para os programas é praticamente inútil.
Na França, está vigorando já há anos um código através de sinais televisivos, que entra em função para assinalar os programas inadequados aos menores. A avaliação do programa televisivo é feita pelo Conseil Supérieur de l’Audiovisuel (CSA), uma autoridade administrativa independente, que controla a difusão dos filmes e outras transmissões em vários canais privados, nacionais, regionais ou locais. A normativa francesa (lei 719/2002) veta a transmissão de programas que possam prejudicar gravemente a integridade física, mental e moral dos menores, porque divulgam conteúdos de pornografia ou de violência gratuita. As transmissões são classificadas por um código de sinais que, em conjunto com um sistema organizado de faixas horárias de programação, garante às famílias mais clareza sobre os programas destinados aos menores.
Na Alemanha, o tema da infância tem particular atenção da legislação, que considera desde o nascimento o início dos direitos fundamentais do cidadão. A tutela é disciplinada no âmbito público pela JSchG (desde o dia 26 de fevereiro de 1985), enquanto a lei GjSM se ocupa do controle sobre a difusão de publicações e conteúdos mediáticos considerados danosos para os menores. A regulamentação no setor televisivo é feita segundo as normas do acordo sobre a radiodifusão dos Lander federais, que as entidades para a mídia nesses Lander adotaram por base para o estabelecimento das diretivas que tutelam o interesse dos menores nas emissoras privadas. Não são admitidas transmissões que incitem o ódio racial, que exaltem a violência ou a guerra, que ofendam a dignidade do homem, que sejam de gênero pornográfico, que mostrem pessoas moribundas ou com sofrimentos que ofendam a dignidade humana. Os responsáveis pela programação, escolhendo os horários das transmissões, devem cuidar para que os menores não vejam programas que podem prejudicar o seu bem estar psíquico, físico ou mental. As transmissões inadequadas às crianças menores podem ser transmitidas somente depois da autorização da entidade competente do Land interessado.
Os responsáveis pela organização dos programas televisivos em âmbito nacional devem nomear encarregados pela tutela dos menores, que atuam no momento da aquisição, da projeção e da realização dos programas. As emissoras privadas fundaram em 1993 uma associação de autocontrole voluntário da televisão («Freiwillige Selbskontrolle Fernsehen», FSF), à qual devem ser apresentados programas particulares, antes da sua transmissão, e suas avaliações consideradas nas decisões das entidades de controle da mídia nos Lander federais. Existe ainda o órgão comum do cidadão para a tutela dos menores, dos programas, da competência mediática e controle da mídia (GSJP), do qual faz parte um integrante da entidade para a mídia nos Lander federais, que dá o seu parecer a respeito de algumas séries, filmes e espetáculos mais ou menos adequados aos menores. Este órgão, o GSJP, decide sobre pedidos de mudança de horários de transmissão de filmes proibidos para menores, controla a forma de novos programas e experimenta novas disposições para a tutela dos menores na televisão digital. A peculiaridade da jurisdição alemã, seja no setor televisivo como no cinematográfico e da mídia em geral, é a minuciosa atenção às exigências com o desenvolvimento do menor e aos riscos que este pode correr com a observância incorreta das leis.
Nos Estados Unidos, é possível consultar via internet um «guia televisivo para os pais» (ver o site www.mpaa.org), que prevê algumas categorias de audiência aplicadas aos programas televisivos transmitidos a todo o público. Este guia organiza várias siglas para identificar a categoria de audiência para cada transmissão: vai-se do TVY (para todas as crianças) ao TVG (para todos), através de várias faixas etárias, que correspondem à passagem da primeira à segunda infância e desta à adolescência. Depois tem o TVPG («parental guidance», visto na presença de um dos pais), o TV14 («parent strongly cautioned», séria advertência aos pais), para os programas que contêm cenas de sexo e de violência. Enfim, há o TVMA, que prevê um «mature audience only», ou seja, destinado a um público de idade superior a 17 anos, última fronteira para os conteúdos considerados «restricted».
Estas avaliações foram elaboradas baseando-se nas opiniões dos próprios pais e são fáceis de serem encontradas e compreendidas. Esta linha de «guia de televisão para os pais» pode ser usada juntamente ao «v-chip», que é um dispositivo de filtro instalado na maior parte dos mais recentes modelos de aparelhos de televisão, para permitir aos pais de bloquear os programas inadequados.

FICHA 1
Brasil: «O que eu penso da tv»
No Brasil, a audiência infantil é muito alta: aproximadamente 30 milhões de crianças vêem televisão pelo menos durante três horas por dia. Explica a profa. Rosália Duarte, do departamento de Ciência da Educação, da PUC do Rio de Janeiro, que «as crianças são muito perspicazes, mas nós podemos e devemos ajudá-las a ampliar o seu quadro de referências, para que possam discutir ainda melhor sobre o conteúdos daquilo que vêem. Para isso temos necessidade, antes de tudo, de ouvir aquilo que elas têm a dizer sobre o assunto e de dialogar com elas. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e muito mais freqüente, a outras atividades culturais». No âmbito de uma pesquisa feita através de um questionário distribuído nas escolas, intitulado «O que eu penso da tv», apareceu que «as crianças querem seriamente ser ouvidas sobre aquilo que pensam da tv, mas sentem que sua opinião é considerada pouco importante e não estão contentes com o excesso de imagens de violência exibidas na televisão, principalmente a violência “real”, definida como aquela transmitida nos telejornais. Eles adoram ver televisão e não importa o que os adultos pensam e dizem a respeito disso. A eles agradam quase todos os tipos de programas transmitidos: novelas, desenhos animados, programas de humor, filmes, seriados, mas isso não faz deles espectadores “idiotas”, pois fazem críticas muito interessantes, pertinentes e bem elaboradas sobre o que consideram feio ou inadequado na televisão. Para a maior parte deles, a televisão se oferece como principal opção de divertimento (em alguns casos, a única), o que significa um dado muito preocupante. Mas, o que chamou mais a nossa atenção é o grau de experiência com o qual essas crianças analisam a televisão: são expertos e demonstram conhecer a televisão também do lado de dentro, inclusive as linguagens que ela utiliza, a sua estrutura de produção, a sua lógica interna e as suas maneiras de intervenção».
As crianças aprendem os valores e os não-valores através da televisão, não resta dúvida, mas demonstram ter senso crítico a respeito deste assunto, quando afirmam nos textos que os programas transmitidos na tv podem lhes ensinar «a serem bons, a ter coragem e a fazer o bem, a cuidar da natureza e de si mesmos, a serem honestos e a lutar por aquilo que desejam», mas também «a serem cruéis e mentirosos, a roubar e matar, a não respeitar os pais e a comprar tudo aquilo que não têm necessidade». Falando sobre a validade do ensino através da mídia, a profa. Duarte salienta a necessidade de «ouvir aquilo que têm a dizer sobre o assunto e a dialogar com eles. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e mais freqüente, a outras atividades culturais».

FICHA 2
Observadores internacionais
Os dados examinados em janeiro de 2006 pelo OssCom, que é um centro de pesquisa da mídia, deixam evidente a tendência a realizar uma forma de co-regulamentação, onde a ação legislativa dos Estados membros se integra com medidas de auto-regulamentação por parte dos produtores, broadcasters e profissionais da comunicação sob o efeito de controles e sanções. São dois os instrumentos mais utilizados no âmbito europeu, observando-se as diretivas previstas no artigo 22 de «Televisão sem fronteiras»: a definição de faixas horárias protegidas (watershed) e os sinais mostrados na tela (determinados por um sistema de «rating»). Apesar disso, aos campos tradicionalmente problemáticos da violência e da pornografia se juntam novos campos de risco para os menores: a vulgaridade, abusos e dependências de substâncias, linguagem e comportamento vulgares, discriminações e abusos, violações e ofensas à dignidade humana. Os critérios de avaliação dos programas se constituem um problema que é partilhado por muitos países da União européia, ao mesmo tempo em que se prepara uma uniformização internacional dos sistemas de classificação (ver mais adiante, Nicam), baseados na visualização de cinco ícones que ilustram simbolicamente qual é a problemática do programa que está sendo analisado e para quais idades ele é desaconselhado.
Deve ser assinalada a atividade online da European Medi@culture. O projeto é promovido pela Comissão Européia, em Bruxelas, no quadro das iniciativas «e-Learning», administrado pelo centro mediático de Baden-Württemberg. O site apresenta informações sobre a educação à mídia na Europa, particularmente na França, Áustria, Finlândia e Alemanha. A seção de projetos de multimídia agrupa os projetos sobre a mídia desenvolvidos por escolas e associações de jovens ao longo do tempo (ver http://www.european-mediaculture.org).

FICHA 3
África do Sul: Encontro mundial sobre a mídia para a infância
Este encontro trienal se realizou no último mês de março em Johannesburg, na África do Sul, com a participação de expertos do setor representando diversos países. Em conjunto se discutiu sobre a necessidade de uma programação adequada às crianças, procurando entender de que modo a violência na mídia pode influir sobre a psíquico dos menores.
Mas, no 5º Encontro mundial sobre a mídia para a infância apresentaram-se também muitas crianças provenientes de todo o mundo e empenhadas em discutir sobre o difícil tema da «Mídia como instrumento de paz e de democracia global». Vieram guiados por grupos de adultos, dentre eles as diversas organizações católicas que há anos trabalham para promover regras para o bem da infância, a serem respeitadas nas transmissões de rádio e televisão através de códigos de regulamentação que devem ser redigidos ou, como em alguns casos, apenas atualizados. Em muitos países do sul do mundo as novas tecnologias de multimídia já estão muito disseminadas e seu uso merece uma atenção particular para tutelar o público mais jovem.
Especialmente na África, explicou o organizador do encontro, Firdoze Bulbulia, começa-se a examinar o projeto de um «Media center» para as crianças, que possa produzir e distribuir transmissões de rádio e de televisão destinadas ao público mais jovem, com o objetivo de realizar um canal televisivo pan-africano dedicado à infância. Os organizadores do encontro estão também trabalhando no projeto de uma aliança africana dos meios de informação e de comunicação, seguindo o modelo daquela já existente na América latina.

2) INTERNET

Na Itália, 47% das famílias italianas têm um computador em casa, um dado relevante mas sempre muito baixo em relação à média dos outros países europeus. O uso da internet por parte dos adolescentes e jovens, e a familiaridade que têm com tudo aquilo que pode ser digitado ou «descarregado» da internet, apresenta não poucos problemas. Pela sua própria natureza de rede de comunicação global, o problema se apresenta em ótica internacional, procurando garantir a tutela dos menores através de precisos acordos com os provedores para um efetivo controle de conteúdo. No campo italiano, até 2006, a tutela dos menores tinha sido deixada nas mãos dos próprios provedores, que em 19 de novembro de 2003 assinaram um acordo de auto-regulamentação: o Codice Internet e Minori. Embora o acordo tenha sido estipulado entre os representantes dos vários provedores diante do Ministério para a Inovação e a Tecnologia, no entanto ele permanece um acordo privado, com lacunas, principalmente no que se refere às sanções que muitas vezes devem ser aplicadas. Em 2006, na seqüência de numerosos casos de violência sobre menores, muitos dos quais realizados através da difusão de material pedo-pornográfico (quando não se tratava de verdadeiro e próprio aliciamento de menores via internet), foi promulgada a lei 38 de 6 de fevereiro de 2006: «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet».
Enfim, como aplicação da lei 38/2006, em fevereiro da 2007 foi publicado um decreto determinando os requisitos técnicos dos instrumentos de filtragem que os provedores da rede internet devem utilizar para impedir o acesso aos sites já assinalados pelo Centro nacional contra a pedo-pornografia. Mas, isso não basta para superar as dificuldades e impedir que os menores possam navegar de maneira arriscada na «rede das redes».
Atualmente foi reativada a comissão anti-pedofilia e desvios de menores através da internet, o «Ciclope», que tinha sido instituída junto ao Ministério para a Eqüidade, do governo italiano, e que ficou inativa por um ano, até a sua reestruturação junto ao Ministério da Família. Está também para entrar em função um site dedicado ao uso da internet, junto ao Ministério das Comunicações, e um número telefônico de emergência gratuito, organizado pelo mesmo ministério e por «Save the children», que poderá ser utilizado por qualquer cidadão que queira assinalar algum abuso, desvio ou pedo-pornografia. Dentre as iniciativas mais recentes, deve ser assinalado o site www.tiseiconnesso.it criado pelo Ministério das Comunicações italiano, sempre em colaboração com «Save the children», onde é colocada à disposição uma série de informações sobre o conteúdo de certos sites, seja para os pais como para as próprias crianças, em conjunto com a campanha televisiva que tem como slogan «A melhor maneira de ajudar o seu filho a não usar incorretamente as novas tecnologias é conhecê-las».
Deve ser salientado também o fato de como a rede se tornou um grande mercado online. Para alguns produtores, o «e-commerce» de brinquedos corresponde já a 4% das vendas, e apenas em 2005 as vendas online corresponderam a 37.600 ações de compra. As razões para investir no processo online são múltiplas: desde a possibilidade de evitar as dificuldades logísticas de distribuição dos produtos, à ampliação de ofertas diferentes de produtos e também a possibilidade de envolvimento do cliente através de campanhas de mala direta e a criação de comunidades virtuais em torno de alguns produtos.

FICHAS:
Pedo-pornografia e internet
Em março de 2006, entraram em vigor as novas medidas diretas de combate e repressão ao fenômeno de exploração sexual dos menores e a pedo-pornografia, estabelecidas pela lei 38/2006 – «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet» foi publicada no Diário oficial em 15 de fevereiro de 2006, nº.38 – com a qual foram substancialmente modificados e integrados os artigos 600bis e seguintes do Código Penal italiano.
A lei confirma os artigos 527, 528, 529 e 725 do Código Penal italiano, que punem os «atos obscenos em local público, publicações, espetáculos obscenos, desenhos ou figuras que ofendem a decência pública».
Porque em muitas publicações, transmissões televisivas e anúncios publicitários, mesmo que não tenham declaradamente um caráter pornográfico, imagens de crianças e adolescentes são apresentadas de maneira explícita ou mais ou menos sutilmente ilusória e de forma falsa, pede-se um novo empenho das instituições competentes para que sejam observadas as normas em vigor e, se preciso for, que façam apelo aos órgãos de Polícia, o Instituto de autodisciplina publicitária, o Ministério das Comunicações, a Polícia postal ou a «Comissão tv e menor».

3) CINEMA

Confirmando as disposições da Constituição italiana, no que se refere ao direito e ao dever das famílias de serem protagonistas na educação de seus filhos, para muitos é chegada à hora de reelaborar a legislação que define o conceito de «censura» (a lei 161/1962 prevê a possibilidade de negar a autorização de abertura às salas de cinema ou de fazer cortes nos filmes, mesmo em função de um público adulto), que hoje está superado. É preciso com urgência estabelecer um critério de tutela dos menores não apenas no que se refere aos filmes que vêem nos circuitos cinematográficos, mas também sucessivamente em casa, muitas vezes em horários acessíveis na programação da televisão.
Uma avaliação correta e preventiva de um filme permite à família ter à sua disposição os instrumentos para escolher se um espetáculo é mais ou menos oportuno, conhecendo a trama, os eventuais conteúdos mais sensíveis, a classificação que a obra recebeu em outros países, etc. Por isso, é justo que a legislação seja revista, uma operação que requer atenção e perspicácia da parte das instituições em um momento de transição da mídia, como este que estamos vivendo, quando esta se tornou realmente um importante componente na educação dos menores.
Não faltam filmes que atraem o público por causa de seu conteúdo de violência, e no entanto entram no circuito cinematográfico sem qualquer restrição de idade. Para um filme que é notícia nos jornais, existem muitos outros com conteúdos duvidosos ou até mesmo perigosos que conseguem passar através do filtro da comissão de revisão cinematográfica, que atualmente funciona junto ao departamento de cinema do Ministério dos Bens Culturais.
Ao mesmo tempo em que existe um projeto de lei do ministro dos Bens culturais, que deve ainda iniciar os trâmites parlamentares, novas situações se apresentam na Itália, com a autocensura de filmes, feita pelos produtores ou distribuidores cinematográficos, com a introdução de novas e mais específicas faixas etárias para as restrições visando os menores a partir dos 10 anos de idade. As restrições serão feitas baseando-se em uma avaliação classificatória dos conteúdos das obras e sucessivamente serão ainda analisadas por uma comissão de psicólogos, educadores e pais.
Este sistema se inspira no modelo americano da Motion Picture Association of America (MPAA), que há 40 anos representa os interesses da indústria do audiovisual americana no mundo. Funcionando a partir de regras bem precisas (estabelecidas ao longo dos anos, também segundo as sentenças dos tribunais federais nos vários Estados americanos e em base aos protestos dos cidadãos), a autocensura americana prevê a existência de uma única comissão competente para determinar as restrições do PG12 ao «restricted» 17 anos. Esta comissão é composta exclusivamente de pais, considerados os primeiros depositários da educação dos filhos, e representam transversalmente a audiência. Importantes sanções econômicas asseguram que o mecanismo de autocertificação corresponda efetivamente aos interesses dos cidadãos. No site da Motion Picture estão disponíveis aos pais os pontos de referência para a avaliação das obras de entretenimento e são publicadas as restrições aplicadas a cada filme que está em exibição nas salas de cinema. Geralmente as avaliações parecem muito mais severas em relação a outros países. Tudo isso, nos vários anos de sua aplicação, deu uma qualificação à indústria americana e seu correto serviço prestado aos ouvintes. Qualquer estrada que se pretenda seguir na Itália, é importante para as famílias que seja estimulado um mercado de produção adequado à infância: é justo que o mecanismo da indústria cinematográfica continue com o seu ritmo de produção, mas não é justo confundir as classificações de acesso ao produto, como qualquer indústria sabe muito bem.
No que se refere às normas européias de classificação dos filmes, e em geral de todo «entertainment» (neologismo anglo-saxão, que, no entanto encontra sua raiz etimológica na relação entre educação e jogo) acessível aos menores, deve ser citado o sistema NICAM, que funciona na Holanda há alguns anos. Fundado em 1999, o NICAM (Nederlands Instituut voor de Classificatie van Audiovisuele Media) se baseia na lei Media Act, onde os programas de grupos que tiveram a autorização para atividades de «broadcasting» não devem incluir obras audiovisuais que prejudiquem o desenvolvimento físico e psicológico de pessoas com menos de 16 anos de idade, seguindo as diretivas da União européia («Televisão sem fronteiras» IV).
O sistema de classificação preventiva funciona também na Grécia, com a lei 1.597, de maio de 1986, que prevê que antes da projeção nas salas de cinema, cada filme seja submetido pelo produtor ou pela sociedade de importação à Comissão para a juventude, que classifica o filme seja como adequado aos menores, ou proibido aos menores de 13 anos, ou de 17 anos ou ainda, nos casos mais graves, severamente inadequado aos menores. Esta comissão é um órgão do Ministério da Cultura e foi concebida procurando-se estabelecer certa proporcionalidade, sendo composta de representantes do Estado (Ministério da Cultura), das categorias ligadas ao cinema, de psicólogos especializados na educação, de sociólogos, dos jovens, dos educadores e dos pais.
Na Áustria, está em vigor um sistema de avaliação complexo, instituído em base a um princípio constitucional federal que confia a tutela dos menores, no que se refere ao cinema e em geral aos meios de comunicação de massa, à competência específica dos Lander. A lei nacional que engloba a regulamentação da mídia é a ORF-ACT, ou seja, a Austrian Broadcasting Corporation nº. 379/1984, que estabelece quais os critérios sobre os quais deve se basear a proteção aplicada a programas e filmes transmitidos na televisão ou através de outros canais mediáticos. No que se refere à exibição dos filmes, a avaliação preventiva das obras cinematográficas, para que sejam decididas as faixas etárias adequadas, é regulamentada pela lei austríaca para a tutela dos menores, a «Jugendschutzgesetz», aplicada através das leis dos Lander federais. Esta lei estabelece nove faixas de restrições de público a partir dos seis anos de idade, com uma sucessiva graduação que prevê restrições para 10, 12, 14 e 16 anos de idade. Para supervisionar o sistema de classificação cinematográfica, existe uma comissão junto ao Ministério da Educação, em Viena, que comunica seu parecer sobre a idoneidade dos filmes às autoridades locais. Geralmente e de maneira individual os Lander adotam as decisões da comissão, e é em âmbito local que se decide de sua aplicação.
Na Espanha, o artigo 20 da Constituição reconhece o direito do cidadão a exprimir e difundir livremente seu pensamento, suas idéias e suas opiniões através de qualquer meio de divulgação. Se por um lado o exercício de tais direitos «não pode ser restrito através de nenhum tipo de censura prévia», o mesmo artigo especifica que «estas liberdades têm o seu limite no respeito dos limites reconhecidos pelas normativas que exprimem este respeito, especialmente no direito à honra, à privacidade, à própria imagem e à proteção da juventude e da infância».
Baseando-se neste princípio, a qualificação dos filmes (Real decreto 81/1997) e das obras audiovisuais é feita antes de sua difusão, através do Instituto de cinematografia e das artes audiovisuais (ICAA), uma entidade autônoma, mas ao mesmo tempo ligada ao Ministério da Educação e Cultura através da secretaria de Estado para a cultura (ver site www.mcu.es).
A subdireção geral de fomento à indústria cinematográfica e do audiovisual, que faz parte do ICAA, se ocupa, dentre outras funções, da classificação em faixas etárias dos filmes e das outras obras audiovisuais em vista de sua exibição pública e para a sua distribuição. A comissão se encarrega de divulgar as informações sobre os filmes e programas audiovisuais, com classificação que vai desde as «salas X» até as restrições para cada faixa etária do público.
Os filmes de caráter pornográfico não podem receber subvenções do Estado e sua projeção nas salas prevê uma taxa suplementar, destinada em parte para estimular um fundo de proteção cinematográfica. A projeção destes filmes pode ser feita somente nas «salas X», onde não podem ser apresentados outros tipos de obras cinematográficas e onde é proibido o ingresso de menores de 18 anos.

CINEMA NA TV

Devido ao alto consumo de programas de televisão por parte dos menores e levando-se em conta as diretivas da União européia, que promovem a auto-regulamentação no âmbito nacional das emissoras de tv e a participação das famílias nesta obra educativa, há alguns anos estão em vigor na França, na Holanda, na Grã-Bretanha, na Grécia e na Itália os códigos de sinais, que servem para identificar tanto os filmes projetados na salas de cinema como aqueles transmitidos na televisão. A tutela dos menores no âmbito da televisão foi também feita adotando-se o chamado sistema «watershed» (separador das águas), que funciona segundo uma seleção de faixas horárias protegidas, algumas aconselhadas à visão dos menores, outras aconselhadas a todos e outras ainda, principalmente na programação noturna, indicadas somente a um público adulto.
A faixa de idade determinada pela classificação preventiva dos filmes tem obviamente uma repercussão na programação das chamadas faixas horárias protegidas ou distintas nas emissoras de televisão pública em todos os países europeus. A definição das linhas de conduta comuns está à base dos acordos de auto-regulamentação e de co-regulamentação dos programas de televisão, estabelecendo-se um código de procedimento comum para as emissoras tanto públicas como privadas. Criou-se assim uma base normativa, que é assumida pela autoridade do Estado e que recebe a confiança dos consumidores das emissoras públicas ou privadas que adotam este sistema de auto-regulamentação.
Para tornar visível aos adultos as classificações dos programas apropriados aos menores, muitas emissoras européias adotaram um sistema de sinais que através de símbolos, números, cores e sinais acústicos advertem ao público a respeito daquilo que está para ser transmitido.
Mas, apenas este sistema, assim como o de filtragem (tipo v-chip), não basta para garantir uma verdadeira tutela dos menores diante de um conjunto de imagens difíceis de serem decodificadas por um jovem. Deve-se pensar às imagens de guerra dos telejornais, dos filmes escabrosos ou às informações sobre os crimes hediondos, que muitas vezes têm como ambiente o próprio núcleo familiar.
É na colaboração entre Estado, produtores de programas audiovisuais e famílias que pode ser fundamentado um autêntico respeito dos menores que encoraje o crescimento positivo da criança em base aos valores fundamentais da pessoa humana.

4) CELULARES COM VÍDEO

Hoje a difusão dos celulares com vídeo chegou à Itália ao índice se 134%, o que significa que muitas pessoas possuem pelo menos dois celulares, inclusive os jovens e as crianças, que recebem este instrumento dos próprios pais. De fato, de duas crianças entre 8 e 13 anos de idade, uma delas tem um celular no bolso. Aquele que poderia ser um instrumento para controlar melhor os deslocamentos e as necessidades dos filhos, se revela no entanto um perigoso meio que pode expor a outro tipo de utilização por parte dos menores, que não se separam nunca do próprio celular, nem mesmo durante as aulas, como lamentam vários professores. Apesar do código de auto-regulamentação assinado pelas principais operadoras (Código de conduta para a oferta de serviços a pagamento em tutela dos menores), na realidade os novos serviços opcionais do celular o tornaram um «personal computer» capaz de permitir novos usos que antes não tinham.
Os desenvolvimentos tecnológicos que estão se verificando no campo da telefonia móvel – particularmente no que se refere à sinergia com a internet e a adoção dos sistemas DVB de vídeos-telefone – contribuem a aumentar a oportunidade de comunicação também para as novas gerações e, ao mesmo tempo, repropõem em novos termos a questão da tutela dos menores. As evoluções já previstas ulteriormente para os próximos anos e o número sempre crescente de pessoas envolvidas, pedem uma grande consciência social e uma constante atenção das pessoas e órgãos encarregados de garantir os direitos dos cidadãos.
Neste contexto devem ser reafirmados os direitos dos menores no campo da comunicação, dentre os quais certamente não está em último lugar aquele que se refere também à segurança diante dos riscos de indução a comportamentos ilícitos ou de acesso a conteúdos nocivos ou indesejados. Também neste campo é essencial o papel dos pais e, em geral, de todos aqueles que são chamados a ter uma função educativa. A maior segurança das crianças e dos jovens quanto ao acesso a conteúdos ilegais é um ponto que deve merecer atenção também através da maior conscientização dos pais e das mães, que devem se capacitar a conhecer e utilizar estes meios.
Para a «alfabetização» dos pais na utilização da mídia devem colaborar também as instituições públicas, promovendo um uso positivo das novas possibilidades tecnológicas. Às empresas cabe a responsabilidade de colocar no mercado um produto que dê garantias no que se refere à sua utilização pelos menores, superando os limites estabelecidos pelo código de auto-regulamentação assinado pelas operadoras de celulares. Devem também oferecer maiores informações aos adultos que assinam um contrato de utilização, como por exemplo a adoção de bloqueios automáticos de acesso a conteúdos nocivos, se o celular passa às mãos de um menor de idade.

5) VIDEOGAMES

Trata-se de uma indústria global, que conquistou os jovens e não apenas eles. Os números relativos à difusão repentina dos videogames indicam que existem 250 mil sites de videogames, cada um deles propõe uma série de títulos, muitos deles recheados de cenas de sexo e de violência. Uma pesquisa recente do Instituto italiano de medicina social (IIMS) coloca em evidência, entre outras coisas, a escassa informação por parte dos adultos a respeito dos videogames utilizados pelos filhos, o predomínio de temas violentas em mais de 30% de títulos não aconselhados aos menores, o predomínio de personagens virtuais normais que podem se tornar especiais, realizando ações extraordinárias.
Mas, o ponto de risco mais elevado se refere aos pequenos jogadores de videogames, crianças entre seis e nove anos de idade que se submetem a entrar tão intensamente no jogo virtual que chegam a formas de dissociação da realidade e solicitam um monitoramento muito atento da parte dos adultos. A mesma pesquisa indica a presença de videogames em 25% das famílias com crianças de três a cinco anos de idade e em 65,2% das famílias com crianças entre seis e 10 anos de idade. O que produz efeitos negativos no âmbito cognitivo das crianças não parece ser especificamente o meio, mas muito mais os elementos que criam a excitação, tais como a velocidade de produção do estímulo e da resposta, a velocidade das imagens, os efeitos especiais, os contrastes, a fragmentação da história, o binômio rumor-ação. O uso prolongado do jogo inibe, segundo alguns psicólogos, a área da capacidade crítica, provocando passividade e ao mesmo tempo agressividade na criança. Mas, não queremos demolir os videogames, porque existem aqueles que são muito adequados aos mais jovens, com valores de informação e de educação, seja também porque o uso deste meio é na realidade um passo na preparação da criança ao sucessivo e mais sofisticado, que é o uso da internet.
De qualquer maneira, os dados relativos à venda destes produtos de entretenimento mostram um crescimento em todos os lugares e a difusão deste meio é acompanhada de uma aceitação social (ou seria uma resignação?) sempre maior.
É urgente ampliar o percurso de conhecimento e das estratégias internacionais, para monitorar um mercado que está cada vez mais vasto. Parece urgente estabelecer modalidades operativas para o controle dos conteúdos e do sistema de sanções, seja para o produtor como para o vendedor dos serviços. O código de auto-regulamentação Pegi (derivado em 2003 do sistema de avaliação e classificação holandês, Nicam, que assinala os conteúdos inadequados aos menores), adotado pelos industriais de «entertainment» que produzem videogames, é a única forma de auto-regulamentação existente atualmente e que prevê sanções (raramente aplicadas, mesmo diante de casos graves evidentes) para os produtores que colocam no comércio os jogos com indicações de faixas etárias apenas aproximativas.
O código Pegi, ao qual a associação européia Isfe adere em 2002, é evidentemente insuficiente na sua função declarada de «fornecer aos consumidores as informações mais oportunas» e expostas no selo de produção. E, como o setor dos videogames tem hoje um volume de negócios que ultrapassa os 740 milhões de euros, envolvendo 24 milhões de jogadores (43% da população a partir dos quatro anos de idade), com uma venda dos produtos classificados para maiores de três anos de idade que chega aos quase 48% dos consumidores. É um dado que define o impacto deste gênero de meio sobre a infância e a adolescência, mostrando toda a sua periculosidade, seja pelo consumo de conteúdos inadequados, seja pelo excessivo número de horas dedicado neste passatempo, muitas vezes solitário e sem a presença de um adulto ao lado. Se for verdade, como sustenta a indústria, que a produção de videogames violentos é apenas uma mínima parte do mercado, é também verdade que esta representa a fatia mais importante do retorno econômico.
O interesse pelos videogames é alimentado pela sinergia com os filmes que inspiram o jogo homônimo e que torna sempre mais atrativo este gênero, principalmente para os adolescentes. Desta maneira é importante também neste campo o estabelecimento de regras precisas em defesa dos consumidores dentre o público jovem, mais exposto aos riscos destas novas formas de entretenimento cada vez mais sofisticadas e envolventes, por causa da combinação entre narrativa e efeitos gráficos.

6) PUBLICIDADE

O problema da tutela dos menores diante da publicidade se apresenta como um corolário, dentro do quadro mais amplo que regulamenta a difícil relação entre a mídia e as crianças. A televisão, e portanto também a publicidade, se constitui em uma fonte de perigo para os menores, isto é, para a maior parte das crianças, principalmente em idade pré-escolar, que devem saber fazer a diferença entre a publicidade e o resto da programação, e entre os programas de ficção e a realidade. Com essas considerações não significa que exista uma acrítica rejeição da publicidade em si mesma – à qual se reconhece, no entanto, onde proceda corretamente, uma função positiva no processo de formação, de crescimento crítico e de socialização do menor –, mas existe a necessidade de prever um sistema de regras destinado a garantir-lhe um uso adequado.
O efeito dos anúncios publicitários é tão grande que em alguns países estão sendo tomadas medidas drásticas a respeito. No Reino Unido, por exemplo, recentemente foram vetados os anúncios publicitários durante os programas destinados às crianças até nove anos de idade, a partir de 1º de janeiro de 2008 a medida se estenderá à programação para os jovens até 15 anos de idade e até o final de 2008 serão vetados em todos os canais dedicados aos menores. Apesar de se reconhecer que a publicidade serve para financiar os programas, aqueles dedicados às crianças terão que recorrer a outras fontes. Também na França começa a se impor uma «linha dura» a esse respeito: visto a alta incidência de publicidade de merendas, de sucos e doces em geral, a partir de agora os anúncios dedicados às crianças deverão ser precedidos de uma espécie de aviso, que orientará para uma alimentação adequada.
Mas, por que as crianças são tão frágeis diante dos apelos da publicidade? Na Itália, explica Paolo Landi, secretário geral da Adisconsum (Associação de defesa dos consumidores e do ambiente»), em um capítulo de seu estudo «Crianças da multimídia»: «Se consideramos que a publicidade não faz outra coisa que veicular um conhecimento imediatamente concretizável em um “ter”, ou em um “ser”, ou em um “fazer”, a criança absorve sem dificuldades os três componentes que são a obsessão dos expertos de marketing, isto é, o componente cognitivo (como fornecer informações indeléveis sobre um produto ou um serviço), o componente afetivo (como fazer o consumidor reagir de maneira emotiva) e o comportamental (como colocar o pequeno consumidor em movimento na direção da aquisição). A partir deste ponto de vista a criança é o público ideal, o consumidor a quem se pode vender qualquer coisa».
Na Itália está em vigor um código de autodisciplina publicitária que surgiu em 1966, em base a um acordo entre os profissionais do setor. Esta primeira forma de tutela, em grande parte com origem comunitária, tem como protagonistas entidades administrativas independentes: a Autoridade de controle da concorrência e do mercado de setor e a Autoridade de garantia para as comunicações e a editoria. Enquanto isso, para a auto-regulamentação, orientada pelas normas que constam do Código de autodisciplina publicitária, e agora também, embora com força jurídica diferente, pelo Código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual se reconhece um poder de decisão e de sanção, emanando uma ordem e intimando seu cumprimento.
Em todos os países onde a televisão serve de veículo às mensagens publicitárias, o mundo empresarial é plenamente consciente do enorme poder de influência que a publicidade tem sobre as crianças.



NORMATIVA INTERNACIONAL

O assunto relativo à tutela dos menores na mídia é um dos mais debatidos, seja no que se refere às normas nacionais, seja no âmbito internacional. Encontra-se diante da situação de precisar acertas as contas com toda a extensão da rede global da internet. O exemplo que, neste momento de transição, coloca mais em evidência a necessidade de estabelecer leis que estejam em condições de controlar o acesso e uso dos conteúdos nocivos para os menores, é exatamente o da internet. Qualquer pessoa no mundo pode abrir um site considerado «arriscado», contendo elementos ilegais e acessíveis a consumidores despreparados, disponibilizados por quem está do outro lado do mundo.
No que se refere aos princípios gerais no âmbito do direito internacional, é preciso recorrer principalmente à convenção da ONU sobre os direitos da criança, com sede em New York, ratificada pelo Parlamento italiano através da lei nº.176/1991. Esta garante à criança uma «consideração proeminente» também a respeito da liberdade, seja no se refere à expressão, seja quando tutela os conteúdos recebidos. Esta mesma convenção, em seu artigo 17, fala da relação entre menor e televisão, desejando «um sistema normativo que tutele o menor-consumidor, mesmo com todas as dificuldades que se apresentam», seja para individuar os fenômenos que devem ser monitorados, seja sobre as normativas possíveis.
No direito da União européia, tal tutela foi recentemente confirmada pela Carta dos direitos fundamentais da União, aprovada em Nice em 2000, cujo artigo 24 salienta que «os Estados membros reconhecem a importância da função exercida pelos meios de comunicação de massa e cuidam para que a criança possa ter acesso às informações e materiais... com a finalidade de promover o seu bem estar social, espiritual e moral, além de sua saúde física e mental». A normativa seguinte, 89/552/CEE, previu algumas restrições, seja no que se refere aos programas como para as mensagens publicitárias destinadas a este público». O artigo 22 desta normativa conduz a impedir a transmissão de programas que contenham cenas pornográficas ou de violência gratuita, ou outros programas inadequados a este público. Não podemos esquecer de mencionar a determinação expressa de «Televisão sem fronteiras», que está hoje em sua quinta versão atualizada, que o tema da tutela dos menores está relacionado com o estatuto geral dos direitos dos menores e corresponde ao disposto nos artigos 50 e 31 da Constituição italiana.
Se for claro que os princípios normativos são todos a favor da tutela dos menores, é também verdadeiro que uma tecnologia em contínua evolução colocou em crise as velhas regras do jogo. Mas também é claro que não se pode mais adiar a necessidade de estabelecer novos parâmetros normativos, para que as crianças possam utilizar os meios de comunicação próprios de seu tempo, com aproveitamento e serenidade também para as famílias.~

EDUCAÇÃO À MÍDIA NO MUNDO: PARA SABER MAIS

A difusão da educação à mídia é uma resposta à necessidade de se informar sobre as novidades no campo dos novos meios de comunicação. Em seguida citamos apenas alguns sites que em vários países oferecem maiores informações sobre como aprender a usar melhor a mídia, enfrentando a problemática da tutela dos menores e da alfabetização às novas tecnologias por parte dos adultos.
«The Media Awareness Nework-Réseau éducation médias» é uma organização canadense sem fins lucrativos, pioneira no desenvolvimento de programas sobre a educação à mídia. Com esta finalidade ela produz programas online em colaboração com organizações internacionais, convicta que, para interpretar as mensagens de informação, de entretenimento e comerciais, os jovens têm necessidade de instrumentos críticos válidos. Por isso é importante formar também os adultos (famílias e professores) sobre como funciona a mídia e como ela determina o estilo de vida.
A organização realiza uma ação contínua de monitoramento em relação à mídia (televisão, cinema, videogames, imprensa, publicidade, etc.), e sua seção dedicada aos pais oferece uma série de elementos para que estes reflitam com os filhos sobre esses meios, além da seção para os educadores, que inclui lições e materiais de apoio. Uma outra seção é dedicada à análise das questões ligadas à mídia, como a difusão de estereótipos, as representações de violência e da diversidade, a privacidade, a publicidade dirigida aos menores. Seu site é em inglês e francês (http://www.media-awareness.ca).
«Quai des images» é o site dedicado ao ensino de cinema e audiovisual organizado pelo Ministério da Educação francês. Ele propõe atividades ligadas à educação à imagem e de análise dos filmes em consonância com os programas escolares, agrupa os textos oficiais a respeito dos meios audiovisuais, oferece uma série de instrumentos de análise e de estudo completos sobre alguns filmes específicos e sobre certos autores em particular, informa sobre conferências, seminários, cursos e festivais sobre o mundo audiovisual e sua utilização em âmbito educativo e didático. Entre outras coisas, reúne também as propostas e as experiências feitas por professores e seus alunos nas escolas secundárias francesas no campo da educação à imagem, além de organizar um fórum de discussões aberto a todos sobre a educação à mídia (http://www.ac-nancy-metz.fr).
Sempre na França, está em funcionamento o blog «Zéro de conduite», organizado pelos professores e destinados a educadores, pais e estudantes. Promove o uso do cinema como instrumento pedagógico, dedicando-se especialmente à atualidade cinematográfica, mas sem esquecer os clássicos e os documentários. Com várias seções e espaços de aprofundamento, se propõe como um local de discussão de temas em um debate aberto (http://cinema-ducation.fluctuat.net).
A Universidade de Massachussetts organizou o Media Education Foundation – MEF, mídia de desafio, que produz e distribui documentários destinados a estimular o pensamento crítico e o debate sobre a relação entre aqueles que detêm o poder sobre a mídia, os conteúdos da mídia comercial, a exigência democrática de um livre fluxo de informações, as diversas representações de idéias e pensamentos e o direito dos cidadãos de informar e serem informados. Alguns destes temas são abordados criticamente, como a identidade do gênero na publicidade, a imagem de sexo nos videoclipes, o papel da mídia na construção da identidade cultural, mídia e saúde, etc. (http://www.mediaed.org/).

(a cura di M. F. D’A.)

 
At 9/17/2007 2:44 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

AS CRIANÇAS E A MÍDIA (II PARTE):
ACEITAR O DESAFIO EDUCATIVO


O tema da 41ª Jornada das Comunicações Sociais, «As crianças e os meios de comunicação: um desafio para a comunicação», nos convida a refletir a respeito de dois aspectos particularmente importantes. O primeiro é a formação das crianças, para que estejam em condições de receber de maneira crítica aquilo que vêem. O segundo é a formação à consciência e ao uso consciente da mídia, que está em contínua transformação tecnológica.
De fato, é o que especifica Bento XVI no início de sua mensagem, de 20 de maio de 2007, para a Jornada: «Os complexos desafios que a educação contemporânea deve enfrentar são muitas vezes ligados à grande influência dos meios de comunicação no nosso mundo. Como aspecto do fenômeno da globalização e estimulados pelo rápido desenvolvimento da tecnologia, os meios de comunicação delineiam fortemente o ambiente cultural (cf. João Paulo II, O rápido desenvolvimento, nº3). Na realidade, há quem afirma que a influência formativa da mídia está em competição com aquela da escola, da Igreja e, quem sabe, até com aquela da própria família».
De fato, como salienta o Pontifício conselho para as Comunicações Sociais, «para muitas pessoas, a realidade corresponde àquilo que os meios de comunicação definem como tal». Episódios recentes, como a utilização do celular na filmagem de violências nas salas de aula, abusos sofridos por pessoas deficientes, fenômenos de trote e de violência generalizada, demonstram como as crianças que crescem passando uma média de quatro horas por dia diante da televisão, sozinhos em casa, absorveram a lógica do «estou no vídeo, logo existo». Os psicólogos, os pedagogos e os estudiosos dos meios de comunicação estudam há tempos sobre as relações entre o consumo televisivo e o comportamento violento dos menores. Uma grande quantidade de pesquisas realizadas em muitos países ocidentais demonstra como esta correlação seja realmente inegável.


NOVAS LINGUAGENS

O fato que muitas crianças vivem completamente inseridas no mundo dos velhos e novos meios de comunicação, que estão cada vez mais frequentemente em correlação entre eles, é confirmado pela popularidade de alguns modelos televisivos, considerados tão efêmeros quanto penosos «momentos de glória», presentes nos programas com os maiores índices de audiência, dos «reality» aos «talk show», sem falar do «trash», que hoje se tornou um gênero de espetáculo.
Dentre as preferências demonstradas pelos adolescentes italianos que assistem televisão mais do que três horas por dia, encontramos, em primeiro lugar, a figura da «veline» (Ndt: misto de corista e coadjuvante na apresentação de programas populares da televisão italiana), enquanto outros da mesma idade se concentram no mais clássico exemplo, o do jogador de futebol. De toda maneira, a coisa mais importante é aparecer, pouco importa por qual motivo, de ser «alguém» ou «alguma coisa» no Olimpo mediático, mesmo que seja apenas por um instante.
Estes são os exemplos mais negativos dos condicionamentos derivados de um excessivo e acrítico uso dos meios de comunicação. Encontramo-nos diante de uma nova geração que cresceu na frente da televisão, capaz de usar as novas tecnologias que os próprios pais, que as adquiriram e as tornaram disponíveis, muitas vezes se encontram despreparados para utilizá-las.
Tanto é verdade que hoje em dia os filmes são vistos diretamente nos celulares e a televisão pode ser assistida na tela do computador. Hoje se telefona através da internet e graças ao download se descarrega os CDs e DVDs mais recentes, se filma e se faz foto com o celular, e assim por diante.
Nas casas, o vocabulário familiar se reduziu ao gênero dos sms e se fala tendo o som da televisão no fundo, se comunica através de e-mail, se faz «visita virtual» via computador, se percorre através de bibliotecas virtuais, tanto que as fichas e arquivos de papel evocam imagens do outro século, completamente em desuso.
A situação dos nossos filhos é diversa daquela da geração precedente, pois eles abriram seus olhos tendo diante de si estes cenários de profunda, contínua e envolvente transformação tecnológica. Eles se constituem aquela que os estudiosos chamam de geração nascida «com seis dedos»: além dos cinco dedos normais da mão, o sexto é o mouse do computador.
Com o aparecimento do mundo «virtual» da internet e dos videogames criou-se uma defasagem em relação à realidade verdadeira e própria. As duas dimensões parecem muitas vezes, e para muitos jovens, como universos paralelos, com conseqüências não indiferentes no plano do processo de amadurecimento. Têm grande sucesso os sites nos quais se prevê uma segunda vida (basta verificar os milhares de registros nos poucos meses de existência do site italiano de «Second Life», que em todo o mundo já tem sete milhões de inscritos), onde a simulação reproduz todas as situações da vida real. Apenas que tudo é falso, a começar da nova identidade, que pode ser escolhida e com ela se inicia a fazer parte deste mundo fora do mundo, onde se pode ser um «qualquer coisa». Isto é, ninguém.
Assim, o grande desafio cultural de hoje é propriamente a redefinição dos limites, que muitas vezes se apresentam demasiadamente instáveis. Isto é, redefinição dos limites entre o real e o virtual, superando a divisão digital que hoje separa as gerações adultas daqueles mais jovens.


OS JOVENS: PROTAGONISTAS OU VÍTIMAS DAS MUDANÇAS?

A linguagem deles é pobre, muitas vezes recheada de termos tirados do dicionário do internauta: clicar, chatar, messagiar, deletar, são alguns dos neologismos que fazem parte de seu vocabulário quotidiano. Falta uma dimensão humana da tecnologia que esteja em condições de traçar o perímetro cultural entre o real e o virtual. Assim a aldeia global difundiu uma quantidade de modelos comportamentais desviados, ou pelo menos discutíveis.
Desta maneira, os jovens que vivem a milhões de quilômetros de distância jogam o mesmo videogame, vêem o mesmo filme, assim como, de maneira transversal, absorvem modelos e comportamentos semelhantes. Muitas vezes os adultos têm menos domínio no uso das novas tecnologias e observam, com uma preocupação resignada diante de suas próprias limitações, as crianças que navegam facilmente na internet.
As raízes das dificuldades neste campo educativo são muito bem explicadas por Marina D’Amato, professora de sociologia da Universidade de Roma, que salienta: «Cada geração tem necessidade de se encontrar também em um mundo fantástico, que serve a interiorizar o paradigma do bom e do belo, do justo e do errado, do oportuno e do útil, também em relação aos exemplos que procedem da narrativa. Hoje nos encontramos em uma condição na qual os avós e os pais contam cada vez menos histórias aos filhos e aos netos, e este papel foi assumido pela televisão. Mas, na realidade, a televisão “exila” e “con-funde”, isto é, funde os modelos morais que são frutos de ânsias e problemas mal resolvidos, muito mais que de certezas. Embora estes se transformem com freqüência, a cada três ou quatro anos, o fato de serem repropostos continuamente faz com que se justaponham uns aos outros» (ver Come mediare i media, de Mario Russo).
Se for verdade que a televisão é o meio mais usado até a adolescência, imediatamente depois surge a grande atração pela internet. Esta passagem nasce de uma sintonia com a linguagem televisiva, que na idade infantil muitas vezes é ouvida durante muitas horas no dia. Esta linguagem se baseia em uma mediação da realidade e desta maneira ela ativa um processo de recepção que é de tipo emotivo.
Neste registro emocional é mais fácil acabar envolvido por situações e figuras capazes de se proporem como modelos identificadores, preservadores de sentido e de comportamentos a serem imitados.
O poder de concentrar uma vontade emulativa em alguns personagens, que correspondem particularmente às necessidades interiores do jovem (necessidades na maioria das vezes induzidas pela publicidade ou por modelos estimuladores), tem uma forte relação com a quantidade de horas que o jovem passa utilizando os novos ou os velhos meios de comunicação.


EDUCAÇÃO NECESSÁRIA

«A formação adequada a um uso correto dos meios de comunicação é essencial para o desenvolvimento cultural, moral e espiritual das crianças… Educar as crianças a serem seletivas no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja, da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos. Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia, com a certeza de que este difícil, embora gratificante, aspecto da condição de pais, é apoiado por toda a comunidade.»
As palavras do discurso de Bento XVI definem com grande clareza o paradigma de uma justa relação entre a mídia e os menores. Uma clareza que devemos agradecer ao magistério da Igreja, no momento em que o mundo da mídia parece ignorar a verdadeira problemática educativa das crianças e as expectativas de qualidade e de segurança exigidas pelas famílias no que se refere ao uso desses meios, seja do cinema aos videogames, da televisão à internet.
Diante da utilização destorcera do meio televisivo, o mais difundido dentre os meios de comunicação, a Igreja se interroga sobre o porquê da televisão não ter um papel educativo e por que os meios de comunicação não podem ser companheiros confiáveis para os jogos na fase de crescimento da criança. O anúncio de uma recente campanha sobre o uso da mídia, promovida pelo Ministério das Comunicações, mostra os vários membros da família que estão vendo a televisão ao lado de uma criança.
Que se trate do avô ou da mãe, a mensagem é a mesma: não deixar uma criança sozinha diante de um meio que, sem o apoio crítico educativo de um adulto, pode transmitir conteúdos inadequados à idade e à maturidade daquele que o vê. Sem esquecer as responsabilidades dos produtores televisivos, empenhados na organização dos programas, o papel da família é realmente insubstituível.
Se realmente o objetivo de quem administra a sociedade de produção televisiva, ou das multinacionais produtoras de videogames ou das operadoras de celulares, é o de promover e vender o produto, o bem estar psicofísico da criança está no centro do interesse dos educadores, sejam eles os professores ou, em primeiro lugar, os pais.
Isto explica bem a mensagem do Papa, que continua a sua análise, salientando que «educar as crianças a serem seletivos no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja e da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos (ver João Paulo II, «Familiaris Consortio», 76). Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia.»


CONTEÚDO DA MÍDIA

No panorama de uma revolução da multimídia, que está modificando transversalmente os hábitos, a mentalidade, os modelos e as linguagens, deve voltar ao centro do debate a tutela daquilo que é melhor para os menores. Sem acusar a «mídia», que enquanto tal não é nem boa nem má, o importante é partir de uma a análise do produto, para assim poder individuar conteúdos que sejam de melhor qualidade para as crianças e os adolescentes. Porque a televisão é um instrumento que abre janelas de conhecimento para o mundo e, se bem utilizada, de «má professora» pode se tornar uma preciosa fonte de estímulo para o crescimento humano e cultural.
A mesma coisa vale, e com mais razão, para a «rede» que engloba e compreende tudo, e para os videogames, onde, ao invés de violência e monstros, poderia se dedicar a produzir (e isso já ocorre em certos casos) histórias instrutivas e de conteúdo interessante.
Bento XVI coloca justamente em evidência as enormes possibilidades para que seja melhorado o conteúdo deste grande campo de produção multimídia: «A educação através da mídia deveria ser positiva. Colocando as crianças diante de um meio estética e moralmente excelente, estas recebem uma ajuda para que desenvolvam a própria opinião, a prudência e a capacidade de discernimento. É importante aqui reconhecer o valor fundamental do exemplo dos pais e as vantagens de introduzir os jovens aos clássicos da literatura infantil (…). A beleza, quase um espelho do divino, inspira e vivifica os corações e as mentes juvenis, enquanto a feiúra e a vulgaridade têm um impacto deprimente sobre os comportamentos». Diante de uma decadência geral do produto televisivo, a questão da qualidade aparece ainda mais forte e vibrante em grande parte de um público formado de famílias, que pede para não ser apenas um exército indistinto de ouvintes silenciosos, mas um público em condições de exprimir suas preferências por conteúdos formativos e informativos de bom nível.
A mensagem de Bento XVI continua, com algumas importantes indicações: «Como a educação em geral, aquela da mídia requer também uma formação ao exercício da liberdade. Trata-se de uma responsabilidade que compromete. Muitas vezes a liberdade é apresentada como uma incansável procura do prazer ou de novas experiências (…). Este desejo, sentido profundamente pelos pais e educadores, que é o de educar as crianças no caminho da beleza, da verdade e da bondade, pode ser apoiado pela indústria da mídia somente na medida em que se promove a dignidade fundamental do ser humano, o verdadeiro valor da vida familiar, as conquistas positivas e as metas da humanidade. A partir disso, a necessidade de que os meios de comunicação estejam empenhados na efetiva formação e no respeito da ética deve ser vista com interesse particular e com urgência não apenas pelos pais, mas também por aqueles que têm responsabilidade cívica».
Na realidade, nos encontramos na situação de ter que reconhecer que na Itália falta uma verdadeira «cultura da criança»: a situação é tão séria que no âmbito institucional procura-se dar uma nova organização geral para verificar e controlar os conteúdos dos setores de entretenimento, como os videogames, que até agora estão submetidos apenas a códigos de auto-regulamentação, feitos e codificados para uso e consumo pelas indústrias produtoras.
Uma vez mais, o primeiro e indispensável apoio à criança só pode vir da família e de uma relação mais estreita com os professores e educadores, exatamente como salienta Bento XVI, lembrando-nos que a preocupação educativa dos pais não deve se tornar uma preocupação genérica, mas uma atenção constante a tudo aquilo que diz respeito aos filhos.

A INDÚSTRIA DA MÍDIA

1) A TELEVISÃO

Se a televisão convencional se apresenta como um ramo de atividade já «maduro», no entanto se apresenta no horizonte a situação da mídia digital (satélite ou a cabo), também como uma plataforma que consente a ligação entre televisão, internet e outro tipo de mídia através do computador. No que se refere à qualidade da programação, apesar dos inúmeros bons propósitos anunciados no âmbito institucional, parece pequena a atenção às exigências dos menores em suas diversas faixas etárias. A programação para os menores, na realidade é confinada em redes e horários particulares, enquanto o resto da programação na faixa horária considerada «para todos» muitas vezes apresenta conteúdos inadequados aos jovens. Mas, quais são as expectativas das gerações de jovens no que se refere à televisão? É realmente verdade que preferem o «trash», os jogos com prêmios absurdos e as «velines»?
A partir de uma pesquisa recente feita pelo instituto Censis sobre «Comunicação, pluralismo social, sociedade aberta» (2005) surge que a relação entre os menores, e em particular dos adolescentes entre os 14 e 18 anos de idade, e a televisão é determinada por elementos de forte contradição e de passividade. Nessa faixa etária, 100% deles vêem televisão praticamente todos os dias, 86% acompanham um pouco de tudo, com uma relevante predileção pelos filmes (72%), por esporte (32%) e pelos «reality shows» (18%).
No entanto, a amostragem entrevistada não está realmente satisfeita com aquilo que vê. De fato, 36% dos adolescentes denunciam a vulgaridade difundida nos programas e 25% criticam a superficialidade. Dentre eles, 46% consideram a televisão como um meio que «invade», ao mesmo tempo em que é interessante notar que 25% consideram que em geral a programação televisiva alimenta nas crianças menores uma visão consumista da vida. Destes dados surge o contraste entre a procura de distração e a reprovação daquilo que lhes é proposto pela programação. Isto significa que o alto índice de procura não é um indicador de satisfação.
Considerando o axioma de que a televisão seja onipresente, fica claro que são os próprios jovens a pedirem uma maior atenção aos conteúdos: menos violência e menos vulgaridade. A exigência de uma regulamentação diversa, diz claramente o relatório do Censis, «não vem somente daqueles, pais e educadores, que estão preocupados pela possível influência negativa sobre os menores, mas se exprime nitidamente também através dos adolescentes, pelo menos de uma parte mais esperta e consciente dentre eles».
Para tutelar melhor os direitos dos menores, desde 2002 foi instituído junto ao Ministério das Comunicações um código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual aderiram os produtores de televisão, seja no âmbito nacional como local. Baseando-se nos princípios sobre a matéria existentes na Constituição italiana e na Convenção dos direitos da criança, estabelecida em 1989 pela ONU, a comissão que controla sua aplicação avaliou em todos estes anos de atividade os milhares de casos em que foram violadas as normas de tutela, que prevêem a transmissão de programas e imagens adequadas a um público de menores de idade durante aquela que é chamada de «faixa protegida» da programação televisiva (das 7h30 às 22h30), intervindo com denúncias e sanções, que nos casos mais graves foram aplicadas pela Autoridade de garantia no setor das comunicações. Para o futuro, esta comissão deverá se transformar em um organismo mais amplo de controle, que se chamará «Mídia e menores», que além da televisão deverá monitorar também os setores dos vídeos-telefone e dos videogames, além da internet, que é o campo de maior risco.

REGRAS DE TUTELA EM OUTROS PAÍSES

É diversa a situação em outros países, como por exemplo na Grã Bretanha, onde o sistema de regulamentação da mídia é estruturado e complexo e foi atualizado nas últimas décadas, com uma particular atenção à tutela dos menores. As inovações tecnológicas neste setor levaram as normativas inglesas a uma série de novas disposições, como por exemplo, a visão em casa de vídeo exclusivamente para adultos, e que fora de casa seriam vetados aos menores, ou o combate à praga mundial dos sites internet para os pedófilos, que contenham material pornográfico ou com conteúdos que possam esconder o aliciamento de menores (ver a Protection Childres Act, de 1978).
A programação televisiva é regulamentada pelo Broadcasting Act (1996), de onde deriva a instituição da Broadcasting Standard Commission (BSC), um órgão independente de controle que estabelece as normas de avaliação e classificação dos programas, também no que se refere aos conteúdos violentos ou que possam ofender a decência pública (site oficial www.bsc.org.uk). Este organismo BSC funciona internamente à estrutura do Broadcasting, supervisionando e regulamentando todas as emissoras de televisão e de rádio, via cabo ou por satélite. Sua tarefa é a de elaborar os códigos de conduta e de aplicação de modelos que respeitem a justiça, além de monitorar os modelos, verificando que respeitem as leis. Com a transmissão de programas com conteúdos considerados inadequados aos menores de várias idades, há alguns anos a televisão inglesa adotou o sistema «watershed», um «separador de águas» entre um horário de programação familiar e outro para os adultos. Todo o sistema televisivo inglês se apóia sobre a responsabilização das famílias, pois sem a colaboração delas qualquer código de modelos para os programas é praticamente inútil.
Na França, está vigorando já há anos um código através de sinais televisivos, que entra em função para assinalar os programas inadequados aos menores. A avaliação do programa televisivo é feita pelo Conseil Supérieur de l’Audiovisuel (CSA), uma autoridade administrativa independente, que controla a difusão dos filmes e outras transmissões em vários canais privados, nacionais, regionais ou locais. A normativa francesa (lei 719/2002) veta a transmissão de programas que possam prejudicar gravemente a integridade física, mental e moral dos menores, porque divulgam conteúdos de pornografia ou de violência gratuita. As transmissões são classificadas por um código de sinais que, em conjunto com um sistema organizado de faixas horárias de programação, garante às famílias mais clareza sobre os programas destinados aos menores.
Na Alemanha, o tema da infância tem particular atenção da legislação, que considera desde o nascimento o início dos direitos fundamentais do cidadão. A tutela é disciplinada no âmbito público pela JSchG (desde o dia 26 de fevereiro de 1985), enquanto a lei GjSM se ocupa do controle sobre a difusão de publicações e conteúdos mediáticos considerados danosos para os menores. A regulamentação no setor televisivo é feita segundo as normas do acordo sobre a radiodifusão dos Lander federais, que as entidades para a mídia nesses Lander adotaram por base para o estabelecimento das diretivas que tutelam o interesse dos menores nas emissoras privadas. Não são admitidas transmissões que incitem o ódio racial, que exaltem a violência ou a guerra, que ofendam a dignidade do homem, que sejam de gênero pornográfico, que mostrem pessoas moribundas ou com sofrimentos que ofendam a dignidade humana. Os responsáveis pela programação, escolhendo os horários das transmissões, devem cuidar para que os menores não vejam programas que podem prejudicar o seu bem estar psíquico, físico ou mental. As transmissões inadequadas às crianças menores podem ser transmitidas somente depois da autorização da entidade competente do Land interessado.
Os responsáveis pela organização dos programas televisivos em âmbito nacional devem nomear encarregados pela tutela dos menores, que atuam no momento da aquisição, da projeção e da realização dos programas. As emissoras privadas fundaram em 1993 uma associação de autocontrole voluntário da televisão («Freiwillige Selbskontrolle Fernsehen», FSF), à qual devem ser apresentados programas particulares, antes da sua transmissão, e suas avaliações consideradas nas decisões das entidades de controle da mídia nos Lander federais. Existe ainda o órgão comum do cidadão para a tutela dos menores, dos programas, da competência mediática e controle da mídia (GSJP), do qual faz parte um integrante da entidade para a mídia nos Lander federais, que dá o seu parecer a respeito de algumas séries, filmes e espetáculos mais ou menos adequados aos menores. Este órgão, o GSJP, decide sobre pedidos de mudança de horários de transmissão de filmes proibidos para menores, controla a forma de novos programas e experimenta novas disposições para a tutela dos menores na televisão digital. A peculiaridade da jurisdição alemã, seja no setor televisivo como no cinematográfico e da mídia em geral, é a minuciosa atenção às exigências com o desenvolvimento do menor e aos riscos que este pode correr com a observância incorreta das leis.
Nos Estados Unidos, é possível consultar via internet um «guia televisivo para os pais» (ver o site www.mpaa.org), que prevê algumas categorias de audiência aplicadas aos programas televisivos transmitidos a todo o público. Este guia organiza várias siglas para identificar a categoria de audiência para cada transmissão: vai-se do TVY (para todas as crianças) ao TVG (para todos), através de várias faixas etárias, que correspondem à passagem da primeira à segunda infância e desta à adolescência. Depois tem o TVPG («parental guidance», visto na presença de um dos pais), o TV14 («parent strongly cautioned», séria advertência aos pais), para os programas que contêm cenas de sexo e de violência. Enfim, há o TVMA, que prevê um «mature audience only», ou seja, destinado a um público de idade superior a 17 anos, última fronteira para os conteúdos considerados «restricted».
Estas avaliações foram elaboradas baseando-se nas opiniões dos próprios pais e são fáceis de serem encontradas e compreendidas. Esta linha de «guia de televisão para os pais» pode ser usada juntamente ao «v-chip», que é um dispositivo de filtro instalado na maior parte dos mais recentes modelos de aparelhos de televisão, para permitir aos pais de bloquear os programas inadequados.

FICHA 1
Brasil: «O que eu penso da tv»
No Brasil, a audiência infantil é muito alta: aproximadamente 30 milhões de crianças vêem televisão pelo menos durante três horas por dia. Explica a profa. Rosália Duarte, do departamento de Ciência da Educação, da PUC do Rio de Janeiro, que «as crianças são muito perspicazes, mas nós podemos e devemos ajudá-las a ampliar o seu quadro de referências, para que possam discutir ainda melhor sobre o conteúdos daquilo que vêem. Para isso temos necessidade, antes de tudo, de ouvir aquilo que elas têm a dizer sobre o assunto e de dialogar com elas. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e muito mais freqüente, a outras atividades culturais». No âmbito de uma pesquisa feita através de um questionário distribuído nas escolas, intitulado «O que eu penso da tv», apareceu que «as crianças querem seriamente ser ouvidas sobre aquilo que pensam da tv, mas sentem que sua opinião é considerada pouco importante e não estão contentes com o excesso de imagens de violência exibidas na televisão, principalmente a violência “real”, definida como aquela transmitida nos telejornais. Eles adoram ver televisão e não importa o que os adultos pensam e dizem a respeito disso. A eles agradam quase todos os tipos de programas transmitidos: novelas, desenhos animados, programas de humor, filmes, seriados, mas isso não faz deles espectadores “idiotas”, pois fazem críticas muito interessantes, pertinentes e bem elaboradas sobre o que consideram feio ou inadequado na televisão. Para a maior parte deles, a televisão se oferece como principal opção de divertimento (em alguns casos, a única), o que significa um dado muito preocupante. Mas, o que chamou mais a nossa atenção é o grau de experiência com o qual essas crianças analisam a televisão: são expertos e demonstram conhecer a televisão também do lado de dentro, inclusive as linguagens que ela utiliza, a sua estrutura de produção, a sua lógica interna e as suas maneiras de intervenção».
As crianças aprendem os valores e os não-valores através da televisão, não resta dúvida, mas demonstram ter senso crítico a respeito deste assunto, quando afirmam nos textos que os programas transmitidos na tv podem lhes ensinar «a serem bons, a ter coragem e a fazer o bem, a cuidar da natureza e de si mesmos, a serem honestos e a lutar por aquilo que desejam», mas também «a serem cruéis e mentirosos, a roubar e matar, a não respeitar os pais e a comprar tudo aquilo que não têm necessidade». Falando sobre a validade do ensino através da mídia, a profa. Duarte salienta a necessidade de «ouvir aquilo que têm a dizer sobre o assunto e a dialogar com eles. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e mais freqüente, a outras atividades culturais».

FICHA 2
Observadores internacionais
Os dados examinados em janeiro de 2006 pelo OssCom, que é um centro de pesquisa da mídia, deixam evidente a tendência a realizar uma forma de co-regulamentação, onde a ação legislativa dos Estados membros se integra com medidas de auto-regulamentação por parte dos produtores, broadcasters e profissionais da comunicação sob o efeito de controles e sanções. São dois os instrumentos mais utilizados no âmbito europeu, observando-se as diretivas previstas no artigo 22 de «Televisão sem fronteiras»: a definição de faixas horárias protegidas (watershed) e os sinais mostrados na tela (determinados por um sistema de «rating»). Apesar disso, aos campos tradicionalmente problemáticos da violência e da pornografia se juntam novos campos de risco para os menores: a vulgaridade, abusos e dependências de substâncias, linguagem e comportamento vulgares, discriminações e abusos, violações e ofensas à dignidade humana. Os critérios de avaliação dos programas se constituem um problema que é partilhado por muitos países da União européia, ao mesmo tempo em que se prepara uma uniformização internacional dos sistemas de classificação (ver mais adiante, Nicam), baseados na visualização de cinco ícones que ilustram simbolicamente qual é a problemática do programa que está sendo analisado e para quais idades ele é desaconselhado.
Deve ser assinalada a atividade online da European Medi@culture. O projeto é promovido pela Comissão Européia, em Bruxelas, no quadro das iniciativas «e-Learning», administrado pelo centro mediático de Baden-Württemberg. O site apresenta informações sobre a educação à mídia na Europa, particularmente na França, Áustria, Finlândia e Alemanha. A seção de projetos de multimídia agrupa os projetos sobre a mídia desenvolvidos por escolas e associações de jovens ao longo do tempo (ver http://www.european-mediaculture.org).

FICHA 3
África do Sul: Encontro mundial sobre a mídia para a infância
Este encontro trienal se realizou no último mês de março em Johannesburg, na África do Sul, com a participação de expertos do setor representando diversos países. Em conjunto se discutiu sobre a necessidade de uma programação adequada às crianças, procurando entender de que modo a violência na mídia pode influir sobre a psíquico dos menores.
Mas, no 5º Encontro mundial sobre a mídia para a infância apresentaram-se também muitas crianças provenientes de todo o mundo e empenhadas em discutir sobre o difícil tema da «Mídia como instrumento de paz e de democracia global». Vieram guiados por grupos de adultos, dentre eles as diversas organizações católicas que há anos trabalham para promover regras para o bem da infância, a serem respeitadas nas transmissões de rádio e televisão através de códigos de regulamentação que devem ser redigidos ou, como em alguns casos, apenas atualizados. Em muitos países do sul do mundo as novas tecnologias de multimídia já estão muito disseminadas e seu uso merece uma atenção particular para tutelar o público mais jovem.
Especialmente na África, explicou o organizador do encontro, Firdoze Bulbulia, começa-se a examinar o projeto de um «Media center» para as crianças, que possa produzir e distribuir transmissões de rádio e de televisão destinadas ao público mais jovem, com o objetivo de realizar um canal televisivo pan-africano dedicado à infância. Os organizadores do encontro estão também trabalhando no projeto de uma aliança africana dos meios de informação e de comunicação, seguindo o modelo daquela já existente na América latina.

2) INTERNET

Na Itália, 47% das famílias italianas têm um computador em casa, um dado relevante mas sempre muito baixo em relação à média dos outros países europeus. O uso da internet por parte dos adolescentes e jovens, e a familiaridade que têm com tudo aquilo que pode ser digitado ou «descarregado» da internet, apresenta não poucos problemas. Pela sua própria natureza de rede de comunicação global, o problema se apresenta em ótica internacional, procurando garantir a tutela dos menores através de precisos acordos com os provedores para um efetivo controle de conteúdo. No campo italiano, até 2006, a tutela dos menores tinha sido deixada nas mãos dos próprios provedores, que em 19 de novembro de 2003 assinaram um acordo de auto-regulamentação: o Codice Internet e Minori. Embora o acordo tenha sido estipulado entre os representantes dos vários provedores diante do Ministério para a Inovação e a Tecnologia, no entanto ele permanece um acordo privado, com lacunas, principalmente no que se refere às sanções que muitas vezes devem ser aplicadas. Em 2006, na seqüência de numerosos casos de violência sobre menores, muitos dos quais realizados através da difusão de material pedo-pornográfico (quando não se tratava de verdadeiro e próprio aliciamento de menores via internet), foi promulgada a lei 38 de 6 de fevereiro de 2006: «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet».
Enfim, como aplicação da lei 38/2006, em fevereiro da 2007 foi publicado um decreto determinando os requisitos técnicos dos instrumentos de filtragem que os provedores da rede internet devem utilizar para impedir o acesso aos sites já assinalados pelo Centro nacional contra a pedo-pornografia. Mas, isso não basta para superar as dificuldades e impedir que os menores possam navegar de maneira arriscada na «rede das redes».
Atualmente foi reativada a comissão anti-pedofilia e desvios de menores através da internet, o «Ciclope», que tinha sido instituída junto ao Ministério para a Eqüidade, do governo italiano, e que ficou inativa por um ano, até a sua reestruturação junto ao Ministério da Família. Está também para entrar em função um site dedicado ao uso da internet, junto ao Ministério das Comunicações, e um número telefônico de emergência gratuito, organizado pelo mesmo ministério e por «Save the children», que poderá ser utilizado por qualquer cidadão que queira assinalar algum abuso, desvio ou pedo-pornografia. Dentre as iniciativas mais recentes, deve ser assinalado o site www.tiseiconnesso.it criado pelo Ministério das Comunicações italiano, sempre em colaboração com «Save the children», onde é colocada à disposição uma série de informações sobre o conteúdo de certos sites, seja para os pais como para as próprias crianças, em conjunto com a campanha televisiva que tem como slogan «A melhor maneira de ajudar o seu filho a não usar incorretamente as novas tecnologias é conhecê-las».
Deve ser salientado também o fato de como a rede se tornou um grande mercado online. Para alguns produtores, o «e-commerce» de brinquedos corresponde já a 4% das vendas, e apenas em 2005 as vendas online corresponderam a 37.600 ações de compra. As razões para investir no processo online são múltiplas: desde a possibilidade de evitar as dificuldades logísticas de distribuição dos produtos, à ampliação de ofertas diferentes de produtos e também a possibilidade de envolvimento do cliente através de campanhas de mala direta e a criação de comunidades virtuais em torno de alguns produtos.

FICHAS:
Pedo-pornografia e internet
Em março de 2006, entraram em vigor as novas medidas diretas de combate e repressão ao fenômeno de exploração sexual dos menores e a pedo-pornografia, estabelecidas pela lei 38/2006 – «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet» foi publicada no Diário oficial em 15 de fevereiro de 2006, nº.38 – com a qual foram substancialmente modificados e integrados os artigos 600bis e seguintes do Código Penal italiano.
A lei confirma os artigos 527, 528, 529 e 725 do Código Penal italiano, que punem os «atos obscenos em local público, publicações, espetáculos obscenos, desenhos ou figuras que ofendem a decência pública».
Porque em muitas publicações, transmissões televisivas e anúncios publicitários, mesmo que não tenham declaradamente um caráter pornográfico, imagens de crianças e adolescentes são apresentadas de maneira explícita ou mais ou menos sutilmente ilusória e de forma falsa, pede-se um novo empenho das instituições competentes para que sejam observadas as normas em vigor e, se preciso for, que façam apelo aos órgãos de Polícia, o Instituto de autodisciplina publicitária, o Ministério das Comunicações, a Polícia postal ou a «Comissão tv e menor».

3) CINEMA

Confirmando as disposições da Constituição italiana, no que se refere ao direito e ao dever das famílias de serem protagonistas na educação de seus filhos, para muitos é chegada à hora de reelaborar a legislação que define o conceito de «censura» (a lei 161/1962 prevê a possibilidade de negar a autorização de abertura às salas de cinema ou de fazer cortes nos filmes, mesmo em função de um público adulto), que hoje está superado. É preciso com urgência estabelecer um critério de tutela dos menores não apenas no que se refere aos filmes que vêem nos circuitos cinematográficos, mas também sucessivamente em casa, muitas vezes em horários acessíveis na programação da televisão.
Uma avaliação correta e preventiva de um filme permite à família ter à sua disposição os instrumentos para escolher se um espetáculo é mais ou menos oportuno, conhecendo a trama, os eventuais conteúdos mais sensíveis, a classificação que a obra recebeu em outros países, etc. Por isso, é justo que a legislação seja revista, uma operação que requer atenção e perspicácia da parte das instituições em um momento de transição da mídia, como este que estamos vivendo, quando esta se tornou realmente um importante componente na educação dos menores.
Não faltam filmes que atraem o público por causa de seu conteúdo de violência, e no entanto entram no circuito cinematográfico sem qualquer restrição de idade. Para um filme que é notícia nos jornais, existem muitos outros com conteúdos duvidosos ou até mesmo perigosos que conseguem passar através do filtro da comissão de revisão cinematográfica, que atualmente funciona junto ao departamento de cinema do Ministério dos Bens Culturais.
Ao mesmo tempo em que existe um projeto de lei do ministro dos Bens culturais, que deve ainda iniciar os trâmites parlamentares, novas situações se apresentam na Itália, com a autocensura de filmes, feita pelos produtores ou distribuidores cinematográficos, com a introdução de novas e mais específicas faixas etárias para as restrições visando os menores a partir dos 10 anos de idade. As restrições serão feitas baseando-se em uma avaliação classificatória dos conteúdos das obras e sucessivamente serão ainda analisadas por uma comissão de psicólogos, educadores e pais.
Este sistema se inspira no modelo americano da Motion Picture Association of America (MPAA), que há 40 anos representa os interesses da indústria do audiovisual americana no mundo. Funcionando a partir de regras bem precisas (estabelecidas ao longo dos anos, também segundo as sentenças dos tribunais federais nos vários Estados americanos e em base aos protestos dos cidadãos), a autocensura americana prevê a existência de uma única comissão competente para determinar as restrições do PG12 ao «restricted» 17 anos. Esta comissão é composta exclusivamente de pais, considerados os primeiros depositários da educação dos filhos, e representam transversalmente a audiência. Importantes sanções econômicas asseguram que o mecanismo de autocertificação corresponda efetivamente aos interesses dos cidadãos. No site da Motion Picture estão disponíveis aos pais os pontos de referência para a avaliação das obras de entretenimento e são publicadas as restrições aplicadas a cada filme que está em exibição nas salas de cinema. Geralmente as avaliações parecem muito mais severas em relação a outros países. Tudo isso, nos vários anos de sua aplicação, deu uma qualificação à indústria americana e seu correto serviço prestado aos ouvintes. Qualquer estrada que se pretenda seguir na Itália, é importante para as famílias que seja estimulado um mercado de produção adequado à infância: é justo que o mecanismo da indústria cinematográfica continue com o seu ritmo de produção, mas não é justo confundir as classificações de acesso ao produto, como qualquer indústria sabe muito bem.
No que se refere às normas européias de classificação dos filmes, e em geral de todo «entertainment» (neologismo anglo-saxão, que, no entanto encontra sua raiz etimológica na relação entre educação e jogo) acessível aos menores, deve ser citado o sistema NICAM, que funciona na Holanda há alguns anos. Fundado em 1999, o NICAM (Nederlands Instituut voor de Classificatie van Audiovisuele Media) se baseia na lei Media Act, onde os programas de grupos que tiveram a autorização para atividades de «broadcasting» não devem incluir obras audiovisuais que prejudiquem o desenvolvimento físico e psicológico de pessoas com menos de 16 anos de idade, seguindo as diretivas da União européia («Televisão sem fronteiras» IV).
O sistema de classificação preventiva funciona também na Grécia, com a lei 1.597, de maio de 1986, que prevê que antes da projeção nas salas de cinema, cada filme seja submetido pelo produtor ou pela sociedade de importação à Comissão para a juventude, que classifica o filme seja como adequado aos menores, ou proibido aos menores de 13 anos, ou de 17 anos ou ainda, nos casos mais graves, severamente inadequado aos menores. Esta comissão é um órgão do Ministério da Cultura e foi concebida procurando-se estabelecer certa proporcionalidade, sendo composta de representantes do Estado (Ministério da Cultura), das categorias ligadas ao cinema, de psicólogos especializados na educação, de sociólogos, dos jovens, dos educadores e dos pais.
Na Áustria, está em vigor um sistema de avaliação complexo, instituído em base a um princípio constitucional federal que confia a tutela dos menores, no que se refere ao cinema e em geral aos meios de comunicação de massa, à competência específica dos Lander. A lei nacional que engloba a regulamentação da mídia é a ORF-ACT, ou seja, a Austrian Broadcasting Corporation nº. 379/1984, que estabelece quais os critérios sobre os quais deve se basear a proteção aplicada a programas e filmes transmitidos na televisão ou através de outros canais mediáticos. No que se refere à exibição dos filmes, a avaliação preventiva das obras cinematográficas, para que sejam decididas as faixas etárias adequadas, é regulamentada pela lei austríaca para a tutela dos menores, a «Jugendschutzgesetz», aplicada através das leis dos Lander federais. Esta lei estabelece nove faixas de restrições de público a partir dos seis anos de idade, com uma sucessiva graduação que prevê restrições para 10, 12, 14 e 16 anos de idade. Para supervisionar o sistema de classificação cinematográfica, existe uma comissão junto ao Ministério da Educação, em Viena, que comunica seu parecer sobre a idoneidade dos filmes às autoridades locais. Geralmente e de maneira individual os Lander adotam as decisões da comissão, e é em âmbito local que se decide de sua aplicação.
Na Espanha, o artigo 20 da Constituição reconhece o direito do cidadão a exprimir e difundir livremente seu pensamento, suas idéias e suas opiniões através de qualquer meio de divulgação. Se por um lado o exercício de tais direitos «não pode ser restrito através de nenhum tipo de censura prévia», o mesmo artigo especifica que «estas liberdades têm o seu limite no respeito dos limites reconhecidos pelas normativas que exprimem este respeito, especialmente no direito à honra, à privacidade, à própria imagem e à proteção da juventude e da infância».
Baseando-se neste princípio, a qualificação dos filmes (Real decreto 81/1997) e das obras audiovisuais é feita antes de sua difusão, através do Instituto de cinematografia e das artes audiovisuais (ICAA), uma entidade autônoma, mas ao mesmo tempo ligada ao Ministério da Educação e Cultura através da secretaria de Estado para a cultura (ver site www.mcu.es).
A subdireção geral de fomento à indústria cinematográfica e do audiovisual, que faz parte do ICAA, se ocupa, dentre outras funções, da classificação em faixas etárias dos filmes e das outras obras audiovisuais em vista de sua exibição pública e para a sua distribuição. A comissão se encarrega de divulgar as informações sobre os filmes e programas audiovisuais, com classificação que vai desde as «salas X» até as restrições para cada faixa etária do público.
Os filmes de caráter pornográfico não podem receber subvenções do Estado e sua projeção nas salas prevê uma taxa suplementar, destinada em parte para estimular um fundo de proteção cinematográfica. A projeção destes filmes pode ser feita somente nas «salas X», onde não podem ser apresentados outros tipos de obras cinematográficas e onde é proibido o ingresso de menores de 18 anos.

CINEMA NA TV

Devido ao alto consumo de programas de televisão por parte dos menores e levando-se em conta as diretivas da União européia, que promovem a auto-regulamentação no âmbito nacional das emissoras de tv e a participação das famílias nesta obra educativa, há alguns anos estão em vigor na França, na Holanda, na Grã-Bretanha, na Grécia e na Itália os códigos de sinais, que servem para identificar tanto os filmes projetados na salas de cinema como aqueles transmitidos na televisão. A tutela dos menores no âmbito da televisão foi também feita adotando-se o chamado sistema «watershed» (separador das águas), que funciona segundo uma seleção de faixas horárias protegidas, algumas aconselhadas à visão dos menores, outras aconselhadas a todos e outras ainda, principalmente na programação noturna, indicadas somente a um público adulto.
A faixa de idade determinada pela classificação preventiva dos filmes tem obviamente uma repercussão na programação das chamadas faixas horárias protegidas ou distintas nas emissoras de televisão pública em todos os países europeus. A definição das linhas de conduta comuns está à base dos acordos de auto-regulamentação e de co-regulamentação dos programas de televisão, estabelecendo-se um código de procedimento comum para as emissoras tanto públicas como privadas. Criou-se assim uma base normativa, que é assumida pela autoridade do Estado e que recebe a confiança dos consumidores das emissoras públicas ou privadas que adotam este sistema de auto-regulamentação.
Para tornar visível aos adultos as classificações dos programas apropriados aos menores, muitas emissoras européias adotaram um sistema de sinais que através de símbolos, números, cores e sinais acústicos advertem ao público a respeito daquilo que está para ser transmitido.
Mas, apenas este sistema, assim como o de filtragem (tipo v-chip), não basta para garantir uma verdadeira tutela dos menores diante de um conjunto de imagens difíceis de serem decodificadas por um jovem. Deve-se pensar às imagens de guerra dos telejornais, dos filmes escabrosos ou às informações sobre os crimes hediondos, que muitas vezes têm como ambiente o próprio núcleo familiar.
É na colaboração entre Estado, produtores de programas audiovisuais e famílias que pode ser fundamentado um autêntico respeito dos menores que encoraje o crescimento positivo da criança em base aos valores fundamentais da pessoa humana.

4) CELULARES COM VÍDEO

Hoje a difusão dos celulares com vídeo chegou à Itália ao índice se 134%, o que significa que muitas pessoas possuem pelo menos dois celulares, inclusive os jovens e as crianças, que recebem este instrumento dos próprios pais. De fato, de duas crianças entre 8 e 13 anos de idade, uma delas tem um celular no bolso. Aquele que poderia ser um instrumento para controlar melhor os deslocamentos e as necessidades dos filhos, se revela no entanto um perigoso meio que pode expor a outro tipo de utilização por parte dos menores, que não se separam nunca do próprio celular, nem mesmo durante as aulas, como lamentam vários professores. Apesar do código de auto-regulamentação assinado pelas principais operadoras (Código de conduta para a oferta de serviços a pagamento em tutela dos menores), na realidade os novos serviços opcionais do celular o tornaram um «personal computer» capaz de permitir novos usos que antes não tinham.
Os desenvolvimentos tecnológicos que estão se verificando no campo da telefonia móvel – particularmente no que se refere à sinergia com a internet e a adoção dos sistemas DVB de vídeos-telefone – contribuem a aumentar a oportunidade de comunicação também para as novas gerações e, ao mesmo tempo, repropõem em novos termos a questão da tutela dos menores. As evoluções já previstas ulteriormente para os próximos anos e o número sempre crescente de pessoas envolvidas, pedem uma grande consciência social e uma constante atenção das pessoas e órgãos encarregados de garantir os direitos dos cidadãos.
Neste contexto devem ser reafirmados os direitos dos menores no campo da comunicação, dentre os quais certamente não está em último lugar aquele que se refere também à segurança diante dos riscos de indução a comportamentos ilícitos ou de acesso a conteúdos nocivos ou indesejados. Também neste campo é essencial o papel dos pais e, em geral, de todos aqueles que são chamados a ter uma função educativa. A maior segurança das crianças e dos jovens quanto ao acesso a conteúdos ilegais é um ponto que deve merecer atenção também através da maior conscientização dos pais e das mães, que devem se capacitar a conhecer e utilizar estes meios.
Para a «alfabetização» dos pais na utilização da mídia devem colaborar também as instituições públicas, promovendo um uso positivo das novas possibilidades tecnológicas. Às empresas cabe a responsabilidade de colocar no mercado um produto que dê garantias no que se refere à sua utilização pelos menores, superando os limites estabelecidos pelo código de auto-regulamentação assinado pelas operadoras de celulares. Devem também oferecer maiores informações aos adultos que assinam um contrato de utilização, como por exemplo a adoção de bloqueios automáticos de acesso a conteúdos nocivos, se o celular passa às mãos de um menor de idade.

5) VIDEOGAMES

Trata-se de uma indústria global, que conquistou os jovens e não apenas eles. Os números relativos à difusão repentina dos videogames indicam que existem 250 mil sites de videogames, cada um deles propõe uma série de títulos, muitos deles recheados de cenas de sexo e de violência. Uma pesquisa recente do Instituto italiano de medicina social (IIMS) coloca em evidência, entre outras coisas, a escassa informação por parte dos adultos a respeito dos videogames utilizados pelos filhos, o predomínio de temas violentas em mais de 30% de títulos não aconselhados aos menores, o predomínio de personagens virtuais normais que podem se tornar especiais, realizando ações extraordinárias.
Mas, o ponto de risco mais elevado se refere aos pequenos jogadores de videogames, crianças entre seis e nove anos de idade que se submetem a entrar tão intensamente no jogo virtual que chegam a formas de dissociação da realidade e solicitam um monitoramento muito atento da parte dos adultos. A mesma pesquisa indica a presença de videogames em 25% das famílias com crianças de três a cinco anos de idade e em 65,2% das famílias com crianças entre seis e 10 anos de idade. O que produz efeitos negativos no âmbito cognitivo das crianças não parece ser especificamente o meio, mas muito mais os elementos que criam a excitação, tais como a velocidade de produção do estímulo e da resposta, a velocidade das imagens, os efeitos especiais, os contrastes, a fragmentação da história, o binômio rumor-ação. O uso prolongado do jogo inibe, segundo alguns psicólogos, a área da capacidade crítica, provocando passividade e ao mesmo tempo agressividade na criança. Mas, não queremos demolir os videogames, porque existem aqueles que são muito adequados aos mais jovens, com valores de informação e de educação, seja também porque o uso deste meio é na realidade um passo na preparação da criança ao sucessivo e mais sofisticado, que é o uso da internet.
De qualquer maneira, os dados relativos à venda destes produtos de entretenimento mostram um crescimento em todos os lugares e a difusão deste meio é acompanhada de uma aceitação social (ou seria uma resignação?) sempre maior.
É urgente ampliar o percurso de conhecimento e das estratégias internacionais, para monitorar um mercado que está cada vez mais vasto. Parece urgente estabelecer modalidades operativas para o controle dos conteúdos e do sistema de sanções, seja para o produtor como para o vendedor dos serviços. O código de auto-regulamentação Pegi (derivado em 2003 do sistema de avaliação e classificação holandês, Nicam, que assinala os conteúdos inadequados aos menores), adotado pelos industriais de «entertainment» que produzem videogames, é a única forma de auto-regulamentação existente atualmente e que prevê sanções (raramente aplicadas, mesmo diante de casos graves evidentes) para os produtores que colocam no comércio os jogos com indicações de faixas etárias apenas aproximativas.
O código Pegi, ao qual a associação européia Isfe adere em 2002, é evidentemente insuficiente na sua função declarada de «fornecer aos consumidores as informações mais oportunas» e expostas no selo de produção. E, como o setor dos videogames tem hoje um volume de negócios que ultrapassa os 740 milhões de euros, envolvendo 24 milhões de jogadores (43% da população a partir dos quatro anos de idade), com uma venda dos produtos classificados para maiores de três anos de idade que chega aos quase 48% dos consumidores. É um dado que define o impacto deste gênero de meio sobre a infância e a adolescência, mostrando toda a sua periculosidade, seja pelo consumo de conteúdos inadequados, seja pelo excessivo número de horas dedicado neste passatempo, muitas vezes solitário e sem a presença de um adulto ao lado. Se for verdade, como sustenta a indústria, que a produção de videogames violentos é apenas uma mínima parte do mercado, é também verdade que esta representa a fatia mais importante do retorno econômico.
O interesse pelos videogames é alimentado pela sinergia com os filmes que inspiram o jogo homônimo e que torna sempre mais atrativo este gênero, principalmente para os adolescentes. Desta maneira é importante também neste campo o estabelecimento de regras precisas em defesa dos consumidores dentre o público jovem, mais exposto aos riscos destas novas formas de entretenimento cada vez mais sofisticadas e envolventes, por causa da combinação entre narrativa e efeitos gráficos.

6) PUBLICIDADE

O problema da tutela dos menores diante da publicidade se apresenta como um corolário, dentro do quadro mais amplo que regulamenta a difícil relação entre a mídia e as crianças. A televisão, e portanto também a publicidade, se constitui em uma fonte de perigo para os menores, isto é, para a maior parte das crianças, principalmente em idade pré-escolar, que devem saber fazer a diferença entre a publicidade e o resto da programação, e entre os programas de ficção e a realidade. Com essas considerações não significa que exista uma acrítica rejeição da publicidade em si mesma – à qual se reconhece, no entanto, onde proceda corretamente, uma função positiva no processo de formação, de crescimento crítico e de socialização do menor –, mas existe a necessidade de prever um sistema de regras destinado a garantir-lhe um uso adequado.
O efeito dos anúncios publicitários é tão grande que em alguns países estão sendo tomadas medidas drásticas a respeito. No Reino Unido, por exemplo, recentemente foram vetados os anúncios publicitários durante os programas destinados às crianças até nove anos de idade, a partir de 1º de janeiro de 2008 a medida se estenderá à programação para os jovens até 15 anos de idade e até o final de 2008 serão vetados em todos os canais dedicados aos menores. Apesar de se reconhecer que a publicidade serve para financiar os programas, aqueles dedicados às crianças terão que recorrer a outras fontes. Também na França começa a se impor uma «linha dura» a esse respeito: visto a alta incidência de publicidade de merendas, de sucos e doces em geral, a partir de agora os anúncios dedicados às crianças deverão ser precedidos de uma espécie de aviso, que orientará para uma alimentação adequada.
Mas, por que as crianças são tão frágeis diante dos apelos da publicidade? Na Itália, explica Paolo Landi, secretário geral da Adisconsum (Associação de defesa dos consumidores e do ambiente»), em um capítulo de seu estudo «Crianças da multimídia»: «Se consideramos que a publicidade não faz outra coisa que veicular um conhecimento imediatamente concretizável em um “ter”, ou em um “ser”, ou em um “fazer”, a criança absorve sem dificuldades os três componentes que são a obsessão dos expertos de marketing, isto é, o componente cognitivo (como fornecer informações indeléveis sobre um produto ou um serviço), o componente afetivo (como fazer o consumidor reagir de maneira emotiva) e o comportamental (como colocar o pequeno consumidor em movimento na direção da aquisição). A partir deste ponto de vista a criança é o público ideal, o consumidor a quem se pode vender qualquer coisa».
Na Itália está em vigor um código de autodisciplina publicitária que surgiu em 1966, em base a um acordo entre os profissionais do setor. Esta primeira forma de tutela, em grande parte com origem comunitária, tem como protagonistas entidades administrativas independentes: a Autoridade de controle da concorrência e do mercado de setor e a Autoridade de garantia para as comunicações e a editoria. Enquanto isso, para a auto-regulamentação, orientada pelas normas que constam do Código de autodisciplina publicitária, e agora também, embora com força jurídica diferente, pelo Código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual se reconhece um poder de decisão e de sanção, emanando uma ordem e intimando seu cumprimento.
Em todos os países onde a televisão serve de veículo às mensagens publicitárias, o mundo empresarial é plenamente consciente do enorme poder de influência que a publicidade tem sobre as crianças.



NORMATIVA INTERNACIONAL

O assunto relativo à tutela dos menores na mídia é um dos mais debatidos, seja no que se refere às normas nacionais, seja no âmbito internacional. Encontra-se diante da situação de precisar acertas as contas com toda a extensão da rede global da internet. O exemplo que, neste momento de transição, coloca mais em evidência a necessidade de estabelecer leis que estejam em condições de controlar o acesso e uso dos conteúdos nocivos para os menores, é exatamente o da internet. Qualquer pessoa no mundo pode abrir um site considerado «arriscado», contendo elementos ilegais e acessíveis a consumidores despreparados, disponibilizados por quem está do outro lado do mundo.
No que se refere aos princípios gerais no âmbito do direito internacional, é preciso recorrer principalmente à convenção da ONU sobre os direitos da criança, com sede em New York, ratificada pelo Parlamento italiano através da lei nº.176/1991. Esta garante à criança uma «consideração proeminente» também a respeito da liberdade, seja no se refere à expressão, seja quando tutela os conteúdos recebidos. Esta mesma convenção, em seu artigo 17, fala da relação entre menor e televisão, desejando «um sistema normativo que tutele o menor-consumidor, mesmo com todas as dificuldades que se apresentam», seja para individuar os fenômenos que devem ser monitorados, seja sobre as normativas possíveis.
No direito da União européia, tal tutela foi recentemente confirmada pela Carta dos direitos fundamentais da União, aprovada em Nice em 2000, cujo artigo 24 salienta que «os Estados membros reconhecem a importância da função exercida pelos meios de comunicação de massa e cuidam para que a criança possa ter acesso às informações e materiais... com a finalidade de promover o seu bem estar social, espiritual e moral, além de sua saúde física e mental». A normativa seguinte, 89/552/CEE, previu algumas restrições, seja no que se refere aos programas como para as mensagens publicitárias destinadas a este público». O artigo 22 desta normativa conduz a impedir a transmissão de programas que contenham cenas pornográficas ou de violência gratuita, ou outros programas inadequados a este público. Não podemos esquecer de mencionar a determinação expressa de «Televisão sem fronteiras», que está hoje em sua quinta versão atualizada, que o tema da tutela dos menores está relacionado com o estatuto geral dos direitos dos menores e corresponde ao disposto nos artigos 50 e 31 da Constituição italiana.
Se for claro que os princípios normativos são todos a favor da tutela dos menores, é também verdadeiro que uma tecnologia em contínua evolução colocou em crise as velhas regras do jogo. Mas também é claro que não se pode mais adiar a necessidade de estabelecer novos parâmetros normativos, para que as crianças possam utilizar os meios de comunicação próprios de seu tempo, com aproveitamento e serenidade também para as famílias.~

EDUCAÇÃO À MÍDIA NO MUNDO: PARA SABER MAIS

A difusão da educação à mídia é uma resposta à necessidade de se informar sobre as novidades no campo dos novos meios de comunicação. Em seguida citamos apenas alguns sites que em vários países oferecem maiores informações sobre como aprender a usar melhor a mídia, enfrentando a problemática da tutela dos menores e da alfabetização às novas tecnologias por parte dos adultos.
«The Media Awareness Nework-Réseau éducation médias» é uma organização canadense sem fins lucrativos, pioneira no desenvolvimento de programas sobre a educação à mídia. Com esta finalidade ela produz programas online em colaboração com organizações internacionais, convicta que, para interpretar as mensagens de informação, de entretenimento e comerciais, os jovens têm necessidade de instrumentos críticos válidos. Por isso é importante formar também os adultos (famílias e professores) sobre como funciona a mídia e como ela determina o estilo de vida.
A organização realiza uma ação contínua de monitoramento em relação à mídia (televisão, cinema, videogames, imprensa, publicidade, etc.), e sua seção dedicada aos pais oferece uma série de elementos para que estes reflitam com os filhos sobre esses meios, além da seção para os educadores, que inclui lições e materiais de apoio. Uma outra seção é dedicada à análise das questões ligadas à mídia, como a difusão de estereótipos, as representações de violência e da diversidade, a privacidade, a publicidade dirigida aos menores. Seu site é em inglês e francês (http://www.media-awareness.ca).
«Quai des images» é o site dedicado ao ensino de cinema e audiovisual organizado pelo Ministério da Educação francês. Ele propõe atividades ligadas à educação à imagem e de análise dos filmes em consonância com os programas escolares, agrupa os textos oficiais a respeito dos meios audiovisuais, oferece uma série de instrumentos de análise e de estudo completos sobre alguns filmes específicos e sobre certos autores em particular, informa sobre conferências, seminários, cursos e festivais sobre o mundo audiovisual e sua utilização em âmbito educativo e didático. Entre outras coisas, reúne também as propostas e as experiências feitas por professores e seus alunos nas escolas secundárias francesas no campo da educação à imagem, além de organizar um fórum de discussões aberto a todos sobre a educação à mídia (http://www.ac-nancy-metz.fr).
Sempre na França, está em funcionamento o blog «Zéro de conduite», organizado pelos professores e destinados a educadores, pais e estudantes. Promove o uso do cinema como instrumento pedagógico, dedicando-se especialmente à atualidade cinematográfica, mas sem esquecer os clássicos e os documentários. Com várias seções e espaços de aprofundamento, se propõe como um local de discussão de temas em um debate aberto (http://cinema-ducation.fluctuat.net).
A Universidade de Massachussetts organizou o Media Education Foundation – MEF, mídia de desafio, que produz e distribui documentários destinados a estimular o pensamento crítico e o debate sobre a relação entre aqueles que detêm o poder sobre a mídia, os conteúdos da mídia comercial, a exigência democrática de um livre fluxo de informações, as diversas representações de idéias e pensamentos e o direito dos cidadãos de informar e serem informados. Alguns destes temas são abordados criticamente, como a identidade do gênero na publicidade, a imagem de sexo nos videoclipes, o papel da mídia na construção da identidade cultural, mídia e saúde, etc. (http://www.mediaed.org/).

(a cura di M. F. D’A.)

 
At 9/17/2007 2:45 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

AS CRIANÇAS E A MÍDIA (II PARTE):
ACEITAR O DESAFIO EDUCATIVO


O tema da 41ª Jornada das Comunicações Sociais, «As crianças e os meios de comunicação: um desafio para a comunicação», nos convida a refletir a respeito de dois aspectos particularmente importantes. O primeiro é a formação das crianças, para que estejam em condições de receber de maneira crítica aquilo que vêem. O segundo é a formação à consciência e ao uso consciente da mídia, que está em contínua transformação tecnológica.
De fato, é o que especifica Bento XVI no início de sua mensagem, de 20 de maio de 2007, para a Jornada: «Os complexos desafios que a educação contemporânea deve enfrentar são muitas vezes ligados à grande influência dos meios de comunicação no nosso mundo. Como aspecto do fenômeno da globalização e estimulados pelo rápido desenvolvimento da tecnologia, os meios de comunicação delineiam fortemente o ambiente cultural (cf. João Paulo II, O rápido desenvolvimento, nº3). Na realidade, há quem afirma que a influência formativa da mídia está em competição com aquela da escola, da Igreja e, quem sabe, até com aquela da própria família».
De fato, como salienta o Pontifício conselho para as Comunicações Sociais, «para muitas pessoas, a realidade corresponde àquilo que os meios de comunicação definem como tal». Episódios recentes, como a utilização do celular na filmagem de violências nas salas de aula, abusos sofridos por pessoas deficientes, fenômenos de trote e de violência generalizada, demonstram como as crianças que crescem passando uma média de quatro horas por dia diante da televisão, sozinhos em casa, absorveram a lógica do «estou no vídeo, logo existo». Os psicólogos, os pedagogos e os estudiosos dos meios de comunicação estudam há tempos sobre as relações entre o consumo televisivo e o comportamento violento dos menores. Uma grande quantidade de pesquisas realizadas em muitos países ocidentais demonstra como esta correlação seja realmente inegável.


NOVAS LINGUAGENS

O fato que muitas crianças vivem completamente inseridas no mundo dos velhos e novos meios de comunicação, que estão cada vez mais frequentemente em correlação entre eles, é confirmado pela popularidade de alguns modelos televisivos, considerados tão efêmeros quanto penosos «momentos de glória», presentes nos programas com os maiores índices de audiência, dos «reality» aos «talk show», sem falar do «trash», que hoje se tornou um gênero de espetáculo.
Dentre as preferências demonstradas pelos adolescentes italianos que assistem televisão mais do que três horas por dia, encontramos, em primeiro lugar, a figura da «veline» (Ndt: misto de corista e coadjuvante na apresentação de programas populares da televisão italiana), enquanto outros da mesma idade se concentram no mais clássico exemplo, o do jogador de futebol. De toda maneira, a coisa mais importante é aparecer, pouco importa por qual motivo, de ser «alguém» ou «alguma coisa» no Olimpo mediático, mesmo que seja apenas por um instante.
Estes são os exemplos mais negativos dos condicionamentos derivados de um excessivo e acrítico uso dos meios de comunicação. Encontramo-nos diante de uma nova geração que cresceu na frente da televisão, capaz de usar as novas tecnologias que os próprios pais, que as adquiriram e as tornaram disponíveis, muitas vezes se encontram despreparados para utilizá-las.
Tanto é verdade que hoje em dia os filmes são vistos diretamente nos celulares e a televisão pode ser assistida na tela do computador. Hoje se telefona através da internet e graças ao download se descarrega os CDs e DVDs mais recentes, se filma e se faz foto com o celular, e assim por diante.
Nas casas, o vocabulário familiar se reduziu ao gênero dos sms e se fala tendo o som da televisão no fundo, se comunica através de e-mail, se faz «visita virtual» via computador, se percorre através de bibliotecas virtuais, tanto que as fichas e arquivos de papel evocam imagens do outro século, completamente em desuso.
A situação dos nossos filhos é diversa daquela da geração precedente, pois eles abriram seus olhos tendo diante de si estes cenários de profunda, contínua e envolvente transformação tecnológica. Eles se constituem aquela que os estudiosos chamam de geração nascida «com seis dedos»: além dos cinco dedos normais da mão, o sexto é o mouse do computador.
Com o aparecimento do mundo «virtual» da internet e dos videogames criou-se uma defasagem em relação à realidade verdadeira e própria. As duas dimensões parecem muitas vezes, e para muitos jovens, como universos paralelos, com conseqüências não indiferentes no plano do processo de amadurecimento. Têm grande sucesso os sites nos quais se prevê uma segunda vida (basta verificar os milhares de registros nos poucos meses de existência do site italiano de «Second Life», que em todo o mundo já tem sete milhões de inscritos), onde a simulação reproduz todas as situações da vida real. Apenas que tudo é falso, a começar da nova identidade, que pode ser escolhida e com ela se inicia a fazer parte deste mundo fora do mundo, onde se pode ser um «qualquer coisa». Isto é, ninguém.
Assim, o grande desafio cultural de hoje é propriamente a redefinição dos limites, que muitas vezes se apresentam demasiadamente instáveis. Isto é, redefinição dos limites entre o real e o virtual, superando a divisão digital que hoje separa as gerações adultas daqueles mais jovens.


OS JOVENS: PROTAGONISTAS OU VÍTIMAS DAS MUDANÇAS?

A linguagem deles é pobre, muitas vezes recheada de termos tirados do dicionário do internauta: clicar, chatar, messagiar, deletar, são alguns dos neologismos que fazem parte de seu vocabulário quotidiano. Falta uma dimensão humana da tecnologia que esteja em condições de traçar o perímetro cultural entre o real e o virtual. Assim a aldeia global difundiu uma quantidade de modelos comportamentais desviados, ou pelo menos discutíveis.
Desta maneira, os jovens que vivem a milhões de quilômetros de distância jogam o mesmo videogame, vêem o mesmo filme, assim como, de maneira transversal, absorvem modelos e comportamentos semelhantes. Muitas vezes os adultos têm menos domínio no uso das novas tecnologias e observam, com uma preocupação resignada diante de suas próprias limitações, as crianças que navegam facilmente na internet.
As raízes das dificuldades neste campo educativo são muito bem explicadas por Marina D’Amato, professora de sociologia da Universidade de Roma, que salienta: «Cada geração tem necessidade de se encontrar também em um mundo fantástico, que serve a interiorizar o paradigma do bom e do belo, do justo e do errado, do oportuno e do útil, também em relação aos exemplos que procedem da narrativa. Hoje nos encontramos em uma condição na qual os avós e os pais contam cada vez menos histórias aos filhos e aos netos, e este papel foi assumido pela televisão. Mas, na realidade, a televisão “exila” e “con-funde”, isto é, funde os modelos morais que são frutos de ânsias e problemas mal resolvidos, muito mais que de certezas. Embora estes se transformem com freqüência, a cada três ou quatro anos, o fato de serem repropostos continuamente faz com que se justaponham uns aos outros» (ver Come mediare i media, de Mario Russo).
Se for verdade que a televisão é o meio mais usado até a adolescência, imediatamente depois surge a grande atração pela internet. Esta passagem nasce de uma sintonia com a linguagem televisiva, que na idade infantil muitas vezes é ouvida durante muitas horas no dia. Esta linguagem se baseia em uma mediação da realidade e desta maneira ela ativa um processo de recepção que é de tipo emotivo.
Neste registro emocional é mais fácil acabar envolvido por situações e figuras capazes de se proporem como modelos identificadores, preservadores de sentido e de comportamentos a serem imitados.
O poder de concentrar uma vontade emulativa em alguns personagens, que correspondem particularmente às necessidades interiores do jovem (necessidades na maioria das vezes induzidas pela publicidade ou por modelos estimuladores), tem uma forte relação com a quantidade de horas que o jovem passa utilizando os novos ou os velhos meios de comunicação.


EDUCAÇÃO NECESSÁRIA

«A formação adequada a um uso correto dos meios de comunicação é essencial para o desenvolvimento cultural, moral e espiritual das crianças… Educar as crianças a serem seletivas no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja, da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos. Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia, com a certeza de que este difícil, embora gratificante, aspecto da condição de pais, é apoiado por toda a comunidade.»
As palavras do discurso de Bento XVI definem com grande clareza o paradigma de uma justa relação entre a mídia e os menores. Uma clareza que devemos agradecer ao magistério da Igreja, no momento em que o mundo da mídia parece ignorar a verdadeira problemática educativa das crianças e as expectativas de qualidade e de segurança exigidas pelas famílias no que se refere ao uso desses meios, seja do cinema aos videogames, da televisão à internet.
Diante da utilização destorcera do meio televisivo, o mais difundido dentre os meios de comunicação, a Igreja se interroga sobre o porquê da televisão não ter um papel educativo e por que os meios de comunicação não podem ser companheiros confiáveis para os jogos na fase de crescimento da criança. O anúncio de uma recente campanha sobre o uso da mídia, promovida pelo Ministério das Comunicações, mostra os vários membros da família que estão vendo a televisão ao lado de uma criança.
Que se trate do avô ou da mãe, a mensagem é a mesma: não deixar uma criança sozinha diante de um meio que, sem o apoio crítico educativo de um adulto, pode transmitir conteúdos inadequados à idade e à maturidade daquele que o vê. Sem esquecer as responsabilidades dos produtores televisivos, empenhados na organização dos programas, o papel da família é realmente insubstituível.
Se realmente o objetivo de quem administra a sociedade de produção televisiva, ou das multinacionais produtoras de videogames ou das operadoras de celulares, é o de promover e vender o produto, o bem estar psicofísico da criança está no centro do interesse dos educadores, sejam eles os professores ou, em primeiro lugar, os pais.
Isto explica bem a mensagem do Papa, que continua a sua análise, salientando que «educar as crianças a serem seletivos no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja e da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos (ver João Paulo II, «Familiaris Consortio», 76). Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia.»


CONTEÚDO DA MÍDIA

No panorama de uma revolução da multimídia, que está modificando transversalmente os hábitos, a mentalidade, os modelos e as linguagens, deve voltar ao centro do debate a tutela daquilo que é melhor para os menores. Sem acusar a «mídia», que enquanto tal não é nem boa nem má, o importante é partir de uma a análise do produto, para assim poder individuar conteúdos que sejam de melhor qualidade para as crianças e os adolescentes. Porque a televisão é um instrumento que abre janelas de conhecimento para o mundo e, se bem utilizada, de «má professora» pode se tornar uma preciosa fonte de estímulo para o crescimento humano e cultural.
A mesma coisa vale, e com mais razão, para a «rede» que engloba e compreende tudo, e para os videogames, onde, ao invés de violência e monstros, poderia se dedicar a produzir (e isso já ocorre em certos casos) histórias instrutivas e de conteúdo interessante.
Bento XVI coloca justamente em evidência as enormes possibilidades para que seja melhorado o conteúdo deste grande campo de produção multimídia: «A educação através da mídia deveria ser positiva. Colocando as crianças diante de um meio estética e moralmente excelente, estas recebem uma ajuda para que desenvolvam a própria opinião, a prudência e a capacidade de discernimento. É importante aqui reconhecer o valor fundamental do exemplo dos pais e as vantagens de introduzir os jovens aos clássicos da literatura infantil (…). A beleza, quase um espelho do divino, inspira e vivifica os corações e as mentes juvenis, enquanto a feiúra e a vulgaridade têm um impacto deprimente sobre os comportamentos». Diante de uma decadência geral do produto televisivo, a questão da qualidade aparece ainda mais forte e vibrante em grande parte de um público formado de famílias, que pede para não ser apenas um exército indistinto de ouvintes silenciosos, mas um público em condições de exprimir suas preferências por conteúdos formativos e informativos de bom nível.
A mensagem de Bento XVI continua, com algumas importantes indicações: «Como a educação em geral, aquela da mídia requer também uma formação ao exercício da liberdade. Trata-se de uma responsabilidade que compromete. Muitas vezes a liberdade é apresentada como uma incansável procura do prazer ou de novas experiências (…). Este desejo, sentido profundamente pelos pais e educadores, que é o de educar as crianças no caminho da beleza, da verdade e da bondade, pode ser apoiado pela indústria da mídia somente na medida em que se promove a dignidade fundamental do ser humano, o verdadeiro valor da vida familiar, as conquistas positivas e as metas da humanidade. A partir disso, a necessidade de que os meios de comunicação estejam empenhados na efetiva formação e no respeito da ética deve ser vista com interesse particular e com urgência não apenas pelos pais, mas também por aqueles que têm responsabilidade cívica».
Na realidade, nos encontramos na situação de ter que reconhecer que na Itália falta uma verdadeira «cultura da criança»: a situação é tão séria que no âmbito institucional procura-se dar uma nova organização geral para verificar e controlar os conteúdos dos setores de entretenimento, como os videogames, que até agora estão submetidos apenas a códigos de auto-regulamentação, feitos e codificados para uso e consumo pelas indústrias produtoras.
Uma vez mais, o primeiro e indispensável apoio à criança só pode vir da família e de uma relação mais estreita com os professores e educadores, exatamente como salienta Bento XVI, lembrando-nos que a preocupação educativa dos pais não deve se tornar uma preocupação genérica, mas uma atenção constante a tudo aquilo que diz respeito aos filhos.

A INDÚSTRIA DA MÍDIA

1) A TELEVISÃO

Se a televisão convencional se apresenta como um ramo de atividade já «maduro», no entanto se apresenta no horizonte a situação da mídia digital (satélite ou a cabo), também como uma plataforma que consente a ligação entre televisão, internet e outro tipo de mídia através do computador. No que se refere à qualidade da programação, apesar dos inúmeros bons propósitos anunciados no âmbito institucional, parece pequena a atenção às exigências dos menores em suas diversas faixas etárias. A programação para os menores, na realidade é confinada em redes e horários particulares, enquanto o resto da programação na faixa horária considerada «para todos» muitas vezes apresenta conteúdos inadequados aos jovens. Mas, quais são as expectativas das gerações de jovens no que se refere à televisão? É realmente verdade que preferem o «trash», os jogos com prêmios absurdos e as «velines»?
A partir de uma pesquisa recente feita pelo instituto Censis sobre «Comunicação, pluralismo social, sociedade aberta» (2005) surge que a relação entre os menores, e em particular dos adolescentes entre os 14 e 18 anos de idade, e a televisão é determinada por elementos de forte contradição e de passividade. Nessa faixa etária, 100% deles vêem televisão praticamente todos os dias, 86% acompanham um pouco de tudo, com uma relevante predileção pelos filmes (72%), por esporte (32%) e pelos «reality shows» (18%).
No entanto, a amostragem entrevistada não está realmente satisfeita com aquilo que vê. De fato, 36% dos adolescentes denunciam a vulgaridade difundida nos programas e 25% criticam a superficialidade. Dentre eles, 46% consideram a televisão como um meio que «invade», ao mesmo tempo em que é interessante notar que 25% consideram que em geral a programação televisiva alimenta nas crianças menores uma visão consumista da vida. Destes dados surge o contraste entre a procura de distração e a reprovação daquilo que lhes é proposto pela programação. Isto significa que o alto índice de procura não é um indicador de satisfação.
Considerando o axioma de que a televisão seja onipresente, fica claro que são os próprios jovens a pedirem uma maior atenção aos conteúdos: menos violência e menos vulgaridade. A exigência de uma regulamentação diversa, diz claramente o relatório do Censis, «não vem somente daqueles, pais e educadores, que estão preocupados pela possível influência negativa sobre os menores, mas se exprime nitidamente também através dos adolescentes, pelo menos de uma parte mais esperta e consciente dentre eles».
Para tutelar melhor os direitos dos menores, desde 2002 foi instituído junto ao Ministério das Comunicações um código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual aderiram os produtores de televisão, seja no âmbito nacional como local. Baseando-se nos princípios sobre a matéria existentes na Constituição italiana e na Convenção dos direitos da criança, estabelecida em 1989 pela ONU, a comissão que controla sua aplicação avaliou em todos estes anos de atividade os milhares de casos em que foram violadas as normas de tutela, que prevêem a transmissão de programas e imagens adequadas a um público de menores de idade durante aquela que é chamada de «faixa protegida» da programação televisiva (das 7h30 às 22h30), intervindo com denúncias e sanções, que nos casos mais graves foram aplicadas pela Autoridade de garantia no setor das comunicações. Para o futuro, esta comissão deverá se transformar em um organismo mais amplo de controle, que se chamará «Mídia e menores», que além da televisão deverá monitorar também os setores dos vídeos-telefone e dos videogames, além da internet, que é o campo de maior risco.

REGRAS DE TUTELA EM OUTROS PAÍSES

É diversa a situação em outros países, como por exemplo na Grã Bretanha, onde o sistema de regulamentação da mídia é estruturado e complexo e foi atualizado nas últimas décadas, com uma particular atenção à tutela dos menores. As inovações tecnológicas neste setor levaram as normativas inglesas a uma série de novas disposições, como por exemplo, a visão em casa de vídeo exclusivamente para adultos, e que fora de casa seriam vetados aos menores, ou o combate à praga mundial dos sites internet para os pedófilos, que contenham material pornográfico ou com conteúdos que possam esconder o aliciamento de menores (ver a Protection Childres Act, de 1978).
A programação televisiva é regulamentada pelo Broadcasting Act (1996), de onde deriva a instituição da Broadcasting Standard Commission (BSC), um órgão independente de controle que estabelece as normas de avaliação e classificação dos programas, também no que se refere aos conteúdos violentos ou que possam ofender a decência pública (site oficial www.bsc.org.uk). Este organismo BSC funciona internamente à estrutura do Broadcasting, supervisionando e regulamentando todas as emissoras de televisão e de rádio, via cabo ou por satélite. Sua tarefa é a de elaborar os códigos de conduta e de aplicação de modelos que respeitem a justiça, além de monitorar os modelos, verificando que respeitem as leis. Com a transmissão de programas com conteúdos considerados inadequados aos menores de várias idades, há alguns anos a televisão inglesa adotou o sistema «watershed», um «separador de águas» entre um horário de programação familiar e outro para os adultos. Todo o sistema televisivo inglês se apóia sobre a responsabilização das famílias, pois sem a colaboração delas qualquer código de modelos para os programas é praticamente inútil.
Na França, está vigorando já há anos um código através de sinais televisivos, que entra em função para assinalar os programas inadequados aos menores. A avaliação do programa televisivo é feita pelo Conseil Supérieur de l’Audiovisuel (CSA), uma autoridade administrativa independente, que controla a difusão dos filmes e outras transmissões em vários canais privados, nacionais, regionais ou locais. A normativa francesa (lei 719/2002) veta a transmissão de programas que possam prejudicar gravemente a integridade física, mental e moral dos menores, porque divulgam conteúdos de pornografia ou de violência gratuita. As transmissões são classificadas por um código de sinais que, em conjunto com um sistema organizado de faixas horárias de programação, garante às famílias mais clareza sobre os programas destinados aos menores.
Na Alemanha, o tema da infância tem particular atenção da legislação, que considera desde o nascimento o início dos direitos fundamentais do cidadão. A tutela é disciplinada no âmbito público pela JSchG (desde o dia 26 de fevereiro de 1985), enquanto a lei GjSM se ocupa do controle sobre a difusão de publicações e conteúdos mediáticos considerados danosos para os menores. A regulamentação no setor televisivo é feita segundo as normas do acordo sobre a radiodifusão dos Lander federais, que as entidades para a mídia nesses Lander adotaram por base para o estabelecimento das diretivas que tutelam o interesse dos menores nas emissoras privadas. Não são admitidas transmissões que incitem o ódio racial, que exaltem a violência ou a guerra, que ofendam a dignidade do homem, que sejam de gênero pornográfico, que mostrem pessoas moribundas ou com sofrimentos que ofendam a dignidade humana. Os responsáveis pela programação, escolhendo os horários das transmissões, devem cuidar para que os menores não vejam programas que podem prejudicar o seu bem estar psíquico, físico ou mental. As transmissões inadequadas às crianças menores podem ser transmitidas somente depois da autorização da entidade competente do Land interessado.
Os responsáveis pela organização dos programas televisivos em âmbito nacional devem nomear encarregados pela tutela dos menores, que atuam no momento da aquisição, da projeção e da realização dos programas. As emissoras privadas fundaram em 1993 uma associação de autocontrole voluntário da televisão («Freiwillige Selbskontrolle Fernsehen», FSF), à qual devem ser apresentados programas particulares, antes da sua transmissão, e suas avaliações consideradas nas decisões das entidades de controle da mídia nos Lander federais. Existe ainda o órgão comum do cidadão para a tutela dos menores, dos programas, da competência mediática e controle da mídia (GSJP), do qual faz parte um integrante da entidade para a mídia nos Lander federais, que dá o seu parecer a respeito de algumas séries, filmes e espetáculos mais ou menos adequados aos menores. Este órgão, o GSJP, decide sobre pedidos de mudança de horários de transmissão de filmes proibidos para menores, controla a forma de novos programas e experimenta novas disposições para a tutela dos menores na televisão digital. A peculiaridade da jurisdição alemã, seja no setor televisivo como no cinematográfico e da mídia em geral, é a minuciosa atenção às exigências com o desenvolvimento do menor e aos riscos que este pode correr com a observância incorreta das leis.
Nos Estados Unidos, é possível consultar via internet um «guia televisivo para os pais» (ver o site www.mpaa.org), que prevê algumas categorias de audiência aplicadas aos programas televisivos transmitidos a todo o público. Este guia organiza várias siglas para identificar a categoria de audiência para cada transmissão: vai-se do TVY (para todas as crianças) ao TVG (para todos), através de várias faixas etárias, que correspondem à passagem da primeira à segunda infância e desta à adolescência. Depois tem o TVPG («parental guidance», visto na presença de um dos pais), o TV14 («parent strongly cautioned», séria advertência aos pais), para os programas que contêm cenas de sexo e de violência. Enfim, há o TVMA, que prevê um «mature audience only», ou seja, destinado a um público de idade superior a 17 anos, última fronteira para os conteúdos considerados «restricted».
Estas avaliações foram elaboradas baseando-se nas opiniões dos próprios pais e são fáceis de serem encontradas e compreendidas. Esta linha de «guia de televisão para os pais» pode ser usada juntamente ao «v-chip», que é um dispositivo de filtro instalado na maior parte dos mais recentes modelos de aparelhos de televisão, para permitir aos pais de bloquear os programas inadequados.

FICHA 1
Brasil: «O que eu penso da tv»
No Brasil, a audiência infantil é muito alta: aproximadamente 30 milhões de crianças vêem televisão pelo menos durante três horas por dia. Explica a profa. Rosália Duarte, do departamento de Ciência da Educação, da PUC do Rio de Janeiro, que «as crianças são muito perspicazes, mas nós podemos e devemos ajudá-las a ampliar o seu quadro de referências, para que possam discutir ainda melhor sobre o conteúdos daquilo que vêem. Para isso temos necessidade, antes de tudo, de ouvir aquilo que elas têm a dizer sobre o assunto e de dialogar com elas. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e muito mais freqüente, a outras atividades culturais». No âmbito de uma pesquisa feita através de um questionário distribuído nas escolas, intitulado «O que eu penso da tv», apareceu que «as crianças querem seriamente ser ouvidas sobre aquilo que pensam da tv, mas sentem que sua opinião é considerada pouco importante e não estão contentes com o excesso de imagens de violência exibidas na televisão, principalmente a violência “real”, definida como aquela transmitida nos telejornais. Eles adoram ver televisão e não importa o que os adultos pensam e dizem a respeito disso. A eles agradam quase todos os tipos de programas transmitidos: novelas, desenhos animados, programas de humor, filmes, seriados, mas isso não faz deles espectadores “idiotas”, pois fazem críticas muito interessantes, pertinentes e bem elaboradas sobre o que consideram feio ou inadequado na televisão. Para a maior parte deles, a televisão se oferece como principal opção de divertimento (em alguns casos, a única), o que significa um dado muito preocupante. Mas, o que chamou mais a nossa atenção é o grau de experiência com o qual essas crianças analisam a televisão: são expertos e demonstram conhecer a televisão também do lado de dentro, inclusive as linguagens que ela utiliza, a sua estrutura de produção, a sua lógica interna e as suas maneiras de intervenção».
As crianças aprendem os valores e os não-valores através da televisão, não resta dúvida, mas demonstram ter senso crítico a respeito deste assunto, quando afirmam nos textos que os programas transmitidos na tv podem lhes ensinar «a serem bons, a ter coragem e a fazer o bem, a cuidar da natureza e de si mesmos, a serem honestos e a lutar por aquilo que desejam», mas também «a serem cruéis e mentirosos, a roubar e matar, a não respeitar os pais e a comprar tudo aquilo que não têm necessidade». Falando sobre a validade do ensino através da mídia, a profa. Duarte salienta a necessidade de «ouvir aquilo que têm a dizer sobre o assunto e a dialogar com eles. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e mais freqüente, a outras atividades culturais».

FICHA 2
Observadores internacionais
Os dados examinados em janeiro de 2006 pelo OssCom, que é um centro de pesquisa da mídia, deixam evidente a tendência a realizar uma forma de co-regulamentação, onde a ação legislativa dos Estados membros se integra com medidas de auto-regulamentação por parte dos produtores, broadcasters e profissionais da comunicação sob o efeito de controles e sanções. São dois os instrumentos mais utilizados no âmbito europeu, observando-se as diretivas previstas no artigo 22 de «Televisão sem fronteiras»: a definição de faixas horárias protegidas (watershed) e os sinais mostrados na tela (determinados por um sistema de «rating»). Apesar disso, aos campos tradicionalmente problemáticos da violência e da pornografia se juntam novos campos de risco para os menores: a vulgaridade, abusos e dependências de substâncias, linguagem e comportamento vulgares, discriminações e abusos, violações e ofensas à dignidade humana. Os critérios de avaliação dos programas se constituem um problema que é partilhado por muitos países da União européia, ao mesmo tempo em que se prepara uma uniformização internacional dos sistemas de classificação (ver mais adiante, Nicam), baseados na visualização de cinco ícones que ilustram simbolicamente qual é a problemática do programa que está sendo analisado e para quais idades ele é desaconselhado.
Deve ser assinalada a atividade online da European Medi@culture. O projeto é promovido pela Comissão Européia, em Bruxelas, no quadro das iniciativas «e-Learning», administrado pelo centro mediático de Baden-Württemberg. O site apresenta informações sobre a educação à mídia na Europa, particularmente na França, Áustria, Finlândia e Alemanha. A seção de projetos de multimídia agrupa os projetos sobre a mídia desenvolvidos por escolas e associações de jovens ao longo do tempo (ver http://www.european-mediaculture.org).

FICHA 3
África do Sul: Encontro mundial sobre a mídia para a infância
Este encontro trienal se realizou no último mês de março em Johannesburg, na África do Sul, com a participação de expertos do setor representando diversos países. Em conjunto se discutiu sobre a necessidade de uma programação adequada às crianças, procurando entender de que modo a violência na mídia pode influir sobre a psíquico dos menores.
Mas, no 5º Encontro mundial sobre a mídia para a infância apresentaram-se também muitas crianças provenientes de todo o mundo e empenhadas em discutir sobre o difícil tema da «Mídia como instrumento de paz e de democracia global». Vieram guiados por grupos de adultos, dentre eles as diversas organizações católicas que há anos trabalham para promover regras para o bem da infância, a serem respeitadas nas transmissões de rádio e televisão através de códigos de regulamentação que devem ser redigidos ou, como em alguns casos, apenas atualizados. Em muitos países do sul do mundo as novas tecnologias de multimídia já estão muito disseminadas e seu uso merece uma atenção particular para tutelar o público mais jovem.
Especialmente na África, explicou o organizador do encontro, Firdoze Bulbulia, começa-se a examinar o projeto de um «Media center» para as crianças, que possa produzir e distribuir transmissões de rádio e de televisão destinadas ao público mais jovem, com o objetivo de realizar um canal televisivo pan-africano dedicado à infância. Os organizadores do encontro estão também trabalhando no projeto de uma aliança africana dos meios de informação e de comunicação, seguindo o modelo daquela já existente na América latina.

2) INTERNET

Na Itália, 47% das famílias italianas têm um computador em casa, um dado relevante mas sempre muito baixo em relação à média dos outros países europeus. O uso da internet por parte dos adolescentes e jovens, e a familiaridade que têm com tudo aquilo que pode ser digitado ou «descarregado» da internet, apresenta não poucos problemas. Pela sua própria natureza de rede de comunicação global, o problema se apresenta em ótica internacional, procurando garantir a tutela dos menores através de precisos acordos com os provedores para um efetivo controle de conteúdo. No campo italiano, até 2006, a tutela dos menores tinha sido deixada nas mãos dos próprios provedores, que em 19 de novembro de 2003 assinaram um acordo de auto-regulamentação: o Codice Internet e Minori. Embora o acordo tenha sido estipulado entre os representantes dos vários provedores diante do Ministério para a Inovação e a Tecnologia, no entanto ele permanece um acordo privado, com lacunas, principalmente no que se refere às sanções que muitas vezes devem ser aplicadas. Em 2006, na seqüência de numerosos casos de violência sobre menores, muitos dos quais realizados através da difusão de material pedo-pornográfico (quando não se tratava de verdadeiro e próprio aliciamento de menores via internet), foi promulgada a lei 38 de 6 de fevereiro de 2006: «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet».
Enfim, como aplicação da lei 38/2006, em fevereiro da 2007 foi publicado um decreto determinando os requisitos técnicos dos instrumentos de filtragem que os provedores da rede internet devem utilizar para impedir o acesso aos sites já assinalados pelo Centro nacional contra a pedo-pornografia. Mas, isso não basta para superar as dificuldades e impedir que os menores possam navegar de maneira arriscada na «rede das redes».
Atualmente foi reativada a comissão anti-pedofilia e desvios de menores através da internet, o «Ciclope», que tinha sido instituída junto ao Ministério para a Eqüidade, do governo italiano, e que ficou inativa por um ano, até a sua reestruturação junto ao Ministério da Família. Está também para entrar em função um site dedicado ao uso da internet, junto ao Ministério das Comunicações, e um número telefônico de emergência gratuito, organizado pelo mesmo ministério e por «Save the children», que poderá ser utilizado por qualquer cidadão que queira assinalar algum abuso, desvio ou pedo-pornografia. Dentre as iniciativas mais recentes, deve ser assinalado o site www.tiseiconnesso.it criado pelo Ministério das Comunicações italiano, sempre em colaboração com «Save the children», onde é colocada à disposição uma série de informações sobre o conteúdo de certos sites, seja para os pais como para as próprias crianças, em conjunto com a campanha televisiva que tem como slogan «A melhor maneira de ajudar o seu filho a não usar incorretamente as novas tecnologias é conhecê-las».
Deve ser salientado também o fato de como a rede se tornou um grande mercado online. Para alguns produtores, o «e-commerce» de brinquedos corresponde já a 4% das vendas, e apenas em 2005 as vendas online corresponderam a 37.600 ações de compra. As razões para investir no processo online são múltiplas: desde a possibilidade de evitar as dificuldades logísticas de distribuição dos produtos, à ampliação de ofertas diferentes de produtos e também a possibilidade de envolvimento do cliente através de campanhas de mala direta e a criação de comunidades virtuais em torno de alguns produtos.

FICHAS:
Pedo-pornografia e internet
Em março de 2006, entraram em vigor as novas medidas diretas de combate e repressão ao fenômeno de exploração sexual dos menores e a pedo-pornografia, estabelecidas pela lei 38/2006 – «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet» foi publicada no Diário oficial em 15 de fevereiro de 2006, nº.38 – com a qual foram substancialmente modificados e integrados os artigos 600bis e seguintes do Código Penal italiano.
A lei confirma os artigos 527, 528, 529 e 725 do Código Penal italiano, que punem os «atos obscenos em local público, publicações, espetáculos obscenos, desenhos ou figuras que ofendem a decência pública».
Porque em muitas publicações, transmissões televisivas e anúncios publicitários, mesmo que não tenham declaradamente um caráter pornográfico, imagens de crianças e adolescentes são apresentadas de maneira explícita ou mais ou menos sutilmente ilusória e de forma falsa, pede-se um novo empenho das instituições competentes para que sejam observadas as normas em vigor e, se preciso for, que façam apelo aos órgãos de Polícia, o Instituto de autodisciplina publicitária, o Ministério das Comunicações, a Polícia postal ou a «Comissão tv e menor».

3) CINEMA

Confirmando as disposições da Constituição italiana, no que se refere ao direito e ao dever das famílias de serem protagonistas na educação de seus filhos, para muitos é chegada à hora de reelaborar a legislação que define o conceito de «censura» (a lei 161/1962 prevê a possibilidade de negar a autorização de abertura às salas de cinema ou de fazer cortes nos filmes, mesmo em função de um público adulto), que hoje está superado. É preciso com urgência estabelecer um critério de tutela dos menores não apenas no que se refere aos filmes que vêem nos circuitos cinematográficos, mas também sucessivamente em casa, muitas vezes em horários acessíveis na programação da televisão.
Uma avaliação correta e preventiva de um filme permite à família ter à sua disposição os instrumentos para escolher se um espetáculo é mais ou menos oportuno, conhecendo a trama, os eventuais conteúdos mais sensíveis, a classificação que a obra recebeu em outros países, etc. Por isso, é justo que a legislação seja revista, uma operação que requer atenção e perspicácia da parte das instituições em um momento de transição da mídia, como este que estamos vivendo, quando esta se tornou realmente um importante componente na educação dos menores.
Não faltam filmes que atraem o público por causa de seu conteúdo de violência, e no entanto entram no circuito cinematográfico sem qualquer restrição de idade. Para um filme que é notícia nos jornais, existem muitos outros com conteúdos duvidosos ou até mesmo perigosos que conseguem passar através do filtro da comissão de revisão cinematográfica, que atualmente funciona junto ao departamento de cinema do Ministério dos Bens Culturais.
Ao mesmo tempo em que existe um projeto de lei do ministro dos Bens culturais, que deve ainda iniciar os trâmites parlamentares, novas situações se apresentam na Itália, com a autocensura de filmes, feita pelos produtores ou distribuidores cinematográficos, com a introdução de novas e mais específicas faixas etárias para as restrições visando os menores a partir dos 10 anos de idade. As restrições serão feitas baseando-se em uma avaliação classificatória dos conteúdos das obras e sucessivamente serão ainda analisadas por uma comissão de psicólogos, educadores e pais.
Este sistema se inspira no modelo americano da Motion Picture Association of America (MPAA), que há 40 anos representa os interesses da indústria do audiovisual americana no mundo. Funcionando a partir de regras bem precisas (estabelecidas ao longo dos anos, também segundo as sentenças dos tribunais federais nos vários Estados americanos e em base aos protestos dos cidadãos), a autocensura americana prevê a existência de uma única comissão competente para determinar as restrições do PG12 ao «restricted» 17 anos. Esta comissão é composta exclusivamente de pais, considerados os primeiros depositários da educação dos filhos, e representam transversalmente a audiência. Importantes sanções econômicas asseguram que o mecanismo de autocertificação corresponda efetivamente aos interesses dos cidadãos. No site da Motion Picture estão disponíveis aos pais os pontos de referência para a avaliação das obras de entretenimento e são publicadas as restrições aplicadas a cada filme que está em exibição nas salas de cinema. Geralmente as avaliações parecem muito mais severas em relação a outros países. Tudo isso, nos vários anos de sua aplicação, deu uma qualificação à indústria americana e seu correto serviço prestado aos ouvintes. Qualquer estrada que se pretenda seguir na Itália, é importante para as famílias que seja estimulado um mercado de produção adequado à infância: é justo que o mecanismo da indústria cinematográfica continue com o seu ritmo de produção, mas não é justo confundir as classificações de acesso ao produto, como qualquer indústria sabe muito bem.
No que se refere às normas européias de classificação dos filmes, e em geral de todo «entertainment» (neologismo anglo-saxão, que, no entanto encontra sua raiz etimológica na relação entre educação e jogo) acessível aos menores, deve ser citado o sistema NICAM, que funciona na Holanda há alguns anos. Fundado em 1999, o NICAM (Nederlands Instituut voor de Classificatie van Audiovisuele Media) se baseia na lei Media Act, onde os programas de grupos que tiveram a autorização para atividades de «broadcasting» não devem incluir obras audiovisuais que prejudiquem o desenvolvimento físico e psicológico de pessoas com menos de 16 anos de idade, seguindo as diretivas da União européia («Televisão sem fronteiras» IV).
O sistema de classificação preventiva funciona também na Grécia, com a lei 1.597, de maio de 1986, que prevê que antes da projeção nas salas de cinema, cada filme seja submetido pelo produtor ou pela sociedade de importação à Comissão para a juventude, que classifica o filme seja como adequado aos menores, ou proibido aos menores de 13 anos, ou de 17 anos ou ainda, nos casos mais graves, severamente inadequado aos menores. Esta comissão é um órgão do Ministério da Cultura e foi concebida procurando-se estabelecer certa proporcionalidade, sendo composta de representantes do Estado (Ministério da Cultura), das categorias ligadas ao cinema, de psicólogos especializados na educação, de sociólogos, dos jovens, dos educadores e dos pais.
Na Áustria, está em vigor um sistema de avaliação complexo, instituído em base a um princípio constitucional federal que confia a tutela dos menores, no que se refere ao cinema e em geral aos meios de comunicação de massa, à competência específica dos Lander. A lei nacional que engloba a regulamentação da mídia é a ORF-ACT, ou seja, a Austrian Broadcasting Corporation nº. 379/1984, que estabelece quais os critérios sobre os quais deve se basear a proteção aplicada a programas e filmes transmitidos na televisão ou através de outros canais mediáticos. No que se refere à exibição dos filmes, a avaliação preventiva das obras cinematográficas, para que sejam decididas as faixas etárias adequadas, é regulamentada pela lei austríaca para a tutela dos menores, a «Jugendschutzgesetz», aplicada através das leis dos Lander federais. Esta lei estabelece nove faixas de restrições de público a partir dos seis anos de idade, com uma sucessiva graduação que prevê restrições para 10, 12, 14 e 16 anos de idade. Para supervisionar o sistema de classificação cinematográfica, existe uma comissão junto ao Ministério da Educação, em Viena, que comunica seu parecer sobre a idoneidade dos filmes às autoridades locais. Geralmente e de maneira individual os Lander adotam as decisões da comissão, e é em âmbito local que se decide de sua aplicação.
Na Espanha, o artigo 20 da Constituição reconhece o direito do cidadão a exprimir e difundir livremente seu pensamento, suas idéias e suas opiniões através de qualquer meio de divulgação. Se por um lado o exercício de tais direitos «não pode ser restrito através de nenhum tipo de censura prévia», o mesmo artigo especifica que «estas liberdades têm o seu limite no respeito dos limites reconhecidos pelas normativas que exprimem este respeito, especialmente no direito à honra, à privacidade, à própria imagem e à proteção da juventude e da infância».
Baseando-se neste princípio, a qualificação dos filmes (Real decreto 81/1997) e das obras audiovisuais é feita antes de sua difusão, através do Instituto de cinematografia e das artes audiovisuais (ICAA), uma entidade autônoma, mas ao mesmo tempo ligada ao Ministério da Educação e Cultura através da secretaria de Estado para a cultura (ver site www.mcu.es).
A subdireção geral de fomento à indústria cinematográfica e do audiovisual, que faz parte do ICAA, se ocupa, dentre outras funções, da classificação em faixas etárias dos filmes e das outras obras audiovisuais em vista de sua exibição pública e para a sua distribuição. A comissão se encarrega de divulgar as informações sobre os filmes e programas audiovisuais, com classificação que vai desde as «salas X» até as restrições para cada faixa etária do público.
Os filmes de caráter pornográfico não podem receber subvenções do Estado e sua projeção nas salas prevê uma taxa suplementar, destinada em parte para estimular um fundo de proteção cinematográfica. A projeção destes filmes pode ser feita somente nas «salas X», onde não podem ser apresentados outros tipos de obras cinematográficas e onde é proibido o ingresso de menores de 18 anos.

CINEMA NA TV

Devido ao alto consumo de programas de televisão por parte dos menores e levando-se em conta as diretivas da União européia, que promovem a auto-regulamentação no âmbito nacional das emissoras de tv e a participação das famílias nesta obra educativa, há alguns anos estão em vigor na França, na Holanda, na Grã-Bretanha, na Grécia e na Itália os códigos de sinais, que servem para identificar tanto os filmes projetados na salas de cinema como aqueles transmitidos na televisão. A tutela dos menores no âmbito da televisão foi também feita adotando-se o chamado sistema «watershed» (separador das águas), que funciona segundo uma seleção de faixas horárias protegidas, algumas aconselhadas à visão dos menores, outras aconselhadas a todos e outras ainda, principalmente na programação noturna, indicadas somente a um público adulto.
A faixa de idade determinada pela classificação preventiva dos filmes tem obviamente uma repercussão na programação das chamadas faixas horárias protegidas ou distintas nas emissoras de televisão pública em todos os países europeus. A definição das linhas de conduta comuns está à base dos acordos de auto-regulamentação e de co-regulamentação dos programas de televisão, estabelecendo-se um código de procedimento comum para as emissoras tanto públicas como privadas. Criou-se assim uma base normativa, que é assumida pela autoridade do Estado e que recebe a confiança dos consumidores das emissoras públicas ou privadas que adotam este sistema de auto-regulamentação.
Para tornar visível aos adultos as classificações dos programas apropriados aos menores, muitas emissoras européias adotaram um sistema de sinais que através de símbolos, números, cores e sinais acústicos advertem ao público a respeito daquilo que está para ser transmitido.
Mas, apenas este sistema, assim como o de filtragem (tipo v-chip), não basta para garantir uma verdadeira tutela dos menores diante de um conjunto de imagens difíceis de serem decodificadas por um jovem. Deve-se pensar às imagens de guerra dos telejornais, dos filmes escabrosos ou às informações sobre os crimes hediondos, que muitas vezes têm como ambiente o próprio núcleo familiar.
É na colaboração entre Estado, produtores de programas audiovisuais e famílias que pode ser fundamentado um autêntico respeito dos menores que encoraje o crescimento positivo da criança em base aos valores fundamentais da pessoa humana.

4) CELULARES COM VÍDEO

Hoje a difusão dos celulares com vídeo chegou à Itália ao índice se 134%, o que significa que muitas pessoas possuem pelo menos dois celulares, inclusive os jovens e as crianças, que recebem este instrumento dos próprios pais. De fato, de duas crianças entre 8 e 13 anos de idade, uma delas tem um celular no bolso. Aquele que poderia ser um instrumento para controlar melhor os deslocamentos e as necessidades dos filhos, se revela no entanto um perigoso meio que pode expor a outro tipo de utilização por parte dos menores, que não se separam nunca do próprio celular, nem mesmo durante as aulas, como lamentam vários professores. Apesar do código de auto-regulamentação assinado pelas principais operadoras (Código de conduta para a oferta de serviços a pagamento em tutela dos menores), na realidade os novos serviços opcionais do celular o tornaram um «personal computer» capaz de permitir novos usos que antes não tinham.
Os desenvolvimentos tecnológicos que estão se verificando no campo da telefonia móvel – particularmente no que se refere à sinergia com a internet e a adoção dos sistemas DVB de vídeos-telefone – contribuem a aumentar a oportunidade de comunicação também para as novas gerações e, ao mesmo tempo, repropõem em novos termos a questão da tutela dos menores. As evoluções já previstas ulteriormente para os próximos anos e o número sempre crescente de pessoas envolvidas, pedem uma grande consciência social e uma constante atenção das pessoas e órgãos encarregados de garantir os direitos dos cidadãos.
Neste contexto devem ser reafirmados os direitos dos menores no campo da comunicação, dentre os quais certamente não está em último lugar aquele que se refere também à segurança diante dos riscos de indução a comportamentos ilícitos ou de acesso a conteúdos nocivos ou indesejados. Também neste campo é essencial o papel dos pais e, em geral, de todos aqueles que são chamados a ter uma função educativa. A maior segurança das crianças e dos jovens quanto ao acesso a conteúdos ilegais é um ponto que deve merecer atenção também através da maior conscientização dos pais e das mães, que devem se capacitar a conhecer e utilizar estes meios.
Para a «alfabetização» dos pais na utilização da mídia devem colaborar também as instituições públicas, promovendo um uso positivo das novas possibilidades tecnológicas. Às empresas cabe a responsabilidade de colocar no mercado um produto que dê garantias no que se refere à sua utilização pelos menores, superando os limites estabelecidos pelo código de auto-regulamentação assinado pelas operadoras de celulares. Devem também oferecer maiores informações aos adultos que assinam um contrato de utilização, como por exemplo a adoção de bloqueios automáticos de acesso a conteúdos nocivos, se o celular passa às mãos de um menor de idade.

5) VIDEOGAMES

Trata-se de uma indústria global, que conquistou os jovens e não apenas eles. Os números relativos à difusão repentina dos videogames indicam que existem 250 mil sites de videogames, cada um deles propõe uma série de títulos, muitos deles recheados de cenas de sexo e de violência. Uma pesquisa recente do Instituto italiano de medicina social (IIMS) coloca em evidência, entre outras coisas, a escassa informação por parte dos adultos a respeito dos videogames utilizados pelos filhos, o predomínio de temas violentas em mais de 30% de títulos não aconselhados aos menores, o predomínio de personagens virtuais normais que podem se tornar especiais, realizando ações extraordinárias.
Mas, o ponto de risco mais elevado se refere aos pequenos jogadores de videogames, crianças entre seis e nove anos de idade que se submetem a entrar tão intensamente no jogo virtual que chegam a formas de dissociação da realidade e solicitam um monitoramento muito atento da parte dos adultos. A mesma pesquisa indica a presença de videogames em 25% das famílias com crianças de três a cinco anos de idade e em 65,2% das famílias com crianças entre seis e 10 anos de idade. O que produz efeitos negativos no âmbito cognitivo das crianças não parece ser especificamente o meio, mas muito mais os elementos que criam a excitação, tais como a velocidade de produção do estímulo e da resposta, a velocidade das imagens, os efeitos especiais, os contrastes, a fragmentação da história, o binômio rumor-ação. O uso prolongado do jogo inibe, segundo alguns psicólogos, a área da capacidade crítica, provocando passividade e ao mesmo tempo agressividade na criança. Mas, não queremos demolir os videogames, porque existem aqueles que são muito adequados aos mais jovens, com valores de informação e de educação, seja também porque o uso deste meio é na realidade um passo na preparação da criança ao sucessivo e mais sofisticado, que é o uso da internet.
De qualquer maneira, os dados relativos à venda destes produtos de entretenimento mostram um crescimento em todos os lugares e a difusão deste meio é acompanhada de uma aceitação social (ou seria uma resignação?) sempre maior.
É urgente ampliar o percurso de conhecimento e das estratégias internacionais, para monitorar um mercado que está cada vez mais vasto. Parece urgente estabelecer modalidades operativas para o controle dos conteúdos e do sistema de sanções, seja para o produtor como para o vendedor dos serviços. O código de auto-regulamentação Pegi (derivado em 2003 do sistema de avaliação e classificação holandês, Nicam, que assinala os conteúdos inadequados aos menores), adotado pelos industriais de «entertainment» que produzem videogames, é a única forma de auto-regulamentação existente atualmente e que prevê sanções (raramente aplicadas, mesmo diante de casos graves evidentes) para os produtores que colocam no comércio os jogos com indicações de faixas etárias apenas aproximativas.
O código Pegi, ao qual a associação européia Isfe adere em 2002, é evidentemente insuficiente na sua função declarada de «fornecer aos consumidores as informações mais oportunas» e expostas no selo de produção. E, como o setor dos videogames tem hoje um volume de negócios que ultrapassa os 740 milhões de euros, envolvendo 24 milhões de jogadores (43% da população a partir dos quatro anos de idade), com uma venda dos produtos classificados para maiores de três anos de idade que chega aos quase 48% dos consumidores. É um dado que define o impacto deste gênero de meio sobre a infância e a adolescência, mostrando toda a sua periculosidade, seja pelo consumo de conteúdos inadequados, seja pelo excessivo número de horas dedicado neste passatempo, muitas vezes solitário e sem a presença de um adulto ao lado. Se for verdade, como sustenta a indústria, que a produção de videogames violentos é apenas uma mínima parte do mercado, é também verdade que esta representa a fatia mais importante do retorno econômico.
O interesse pelos videogames é alimentado pela sinergia com os filmes que inspiram o jogo homônimo e que torna sempre mais atrativo este gênero, principalmente para os adolescentes. Desta maneira é importante também neste campo o estabelecimento de regras precisas em defesa dos consumidores dentre o público jovem, mais exposto aos riscos destas novas formas de entretenimento cada vez mais sofisticadas e envolventes, por causa da combinação entre narrativa e efeitos gráficos.

6) PUBLICIDADE

O problema da tutela dos menores diante da publicidade se apresenta como um corolário, dentro do quadro mais amplo que regulamenta a difícil relação entre a mídia e as crianças. A televisão, e portanto também a publicidade, se constitui em uma fonte de perigo para os menores, isto é, para a maior parte das crianças, principalmente em idade pré-escolar, que devem saber fazer a diferença entre a publicidade e o resto da programação, e entre os programas de ficção e a realidade. Com essas considerações não significa que exista uma acrítica rejeição da publicidade em si mesma – à qual se reconhece, no entanto, onde proceda corretamente, uma função positiva no processo de formação, de crescimento crítico e de socialização do menor –, mas existe a necessidade de prever um sistema de regras destinado a garantir-lhe um uso adequado.
O efeito dos anúncios publicitários é tão grande que em alguns países estão sendo tomadas medidas drásticas a respeito. No Reino Unido, por exemplo, recentemente foram vetados os anúncios publicitários durante os programas destinados às crianças até nove anos de idade, a partir de 1º de janeiro de 2008 a medida se estenderá à programação para os jovens até 15 anos de idade e até o final de 2008 serão vetados em todos os canais dedicados aos menores. Apesar de se reconhecer que a publicidade serve para financiar os programas, aqueles dedicados às crianças terão que recorrer a outras fontes. Também na França começa a se impor uma «linha dura» a esse respeito: visto a alta incidência de publicidade de merendas, de sucos e doces em geral, a partir de agora os anúncios dedicados às crianças deverão ser precedidos de uma espécie de aviso, que orientará para uma alimentação adequada.
Mas, por que as crianças são tão frágeis diante dos apelos da publicidade? Na Itália, explica Paolo Landi, secretário geral da Adisconsum (Associação de defesa dos consumidores e do ambiente»), em um capítulo de seu estudo «Crianças da multimídia»: «Se consideramos que a publicidade não faz outra coisa que veicular um conhecimento imediatamente concretizável em um “ter”, ou em um “ser”, ou em um “fazer”, a criança absorve sem dificuldades os três componentes que são a obsessão dos expertos de marketing, isto é, o componente cognitivo (como fornecer informações indeléveis sobre um produto ou um serviço), o componente afetivo (como fazer o consumidor reagir de maneira emotiva) e o comportamental (como colocar o pequeno consumidor em movimento na direção da aquisição). A partir deste ponto de vista a criança é o público ideal, o consumidor a quem se pode vender qualquer coisa».
Na Itália está em vigor um código de autodisciplina publicitária que surgiu em 1966, em base a um acordo entre os profissionais do setor. Esta primeira forma de tutela, em grande parte com origem comunitária, tem como protagonistas entidades administrativas independentes: a Autoridade de controle da concorrência e do mercado de setor e a Autoridade de garantia para as comunicações e a editoria. Enquanto isso, para a auto-regulamentação, orientada pelas normas que constam do Código de autodisciplina publicitária, e agora também, embora com força jurídica diferente, pelo Código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual se reconhece um poder de decisão e de sanção, emanando uma ordem e intimando seu cumprimento.
Em todos os países onde a televisão serve de veículo às mensagens publicitárias, o mundo empresarial é plenamente consciente do enorme poder de influência que a publicidade tem sobre as crianças.



NORMATIVA INTERNACIONAL

O assunto relativo à tutela dos menores na mídia é um dos mais debatidos, seja no que se refere às normas nacionais, seja no âmbito internacional. Encontra-se diante da situação de precisar acertas as contas com toda a extensão da rede global da internet. O exemplo que, neste momento de transição, coloca mais em evidência a necessidade de estabelecer leis que estejam em condições de controlar o acesso e uso dos conteúdos nocivos para os menores, é exatamente o da internet. Qualquer pessoa no mundo pode abrir um site considerado «arriscado», contendo elementos ilegais e acessíveis a consumidores despreparados, disponibilizados por quem está do outro lado do mundo.
No que se refere aos princípios gerais no âmbito do direito internacional, é preciso recorrer principalmente à convenção da ONU sobre os direitos da criança, com sede em New York, ratificada pelo Parlamento italiano através da lei nº.176/1991. Esta garante à criança uma «consideração proeminente» também a respeito da liberdade, seja no se refere à expressão, seja quando tutela os conteúdos recebidos. Esta mesma convenção, em seu artigo 17, fala da relação entre menor e televisão, desejando «um sistema normativo que tutele o menor-consumidor, mesmo com todas as dificuldades que se apresentam», seja para individuar os fenômenos que devem ser monitorados, seja sobre as normativas possíveis.
No direito da União européia, tal tutela foi recentemente confirmada pela Carta dos direitos fundamentais da União, aprovada em Nice em 2000, cujo artigo 24 salienta que «os Estados membros reconhecem a importância da função exercida pelos meios de comunicação de massa e cuidam para que a criança possa ter acesso às informações e materiais... com a finalidade de promover o seu bem estar social, espiritual e moral, além de sua saúde física e mental». A normativa seguinte, 89/552/CEE, previu algumas restrições, seja no que se refere aos programas como para as mensagens publicitárias destinadas a este público». O artigo 22 desta normativa conduz a impedir a transmissão de programas que contenham cenas pornográficas ou de violência gratuita, ou outros programas inadequados a este público. Não podemos esquecer de mencionar a determinação expressa de «Televisão sem fronteiras», que está hoje em sua quinta versão atualizada, que o tema da tutela dos menores está relacionado com o estatuto geral dos direitos dos menores e corresponde ao disposto nos artigos 50 e 31 da Constituição italiana.
Se for claro que os princípios normativos são todos a favor da tutela dos menores, é também verdadeiro que uma tecnologia em contínua evolução colocou em crise as velhas regras do jogo. Mas também é claro que não se pode mais adiar a necessidade de estabelecer novos parâmetros normativos, para que as crianças possam utilizar os meios de comunicação próprios de seu tempo, com aproveitamento e serenidade também para as famílias.~

EDUCAÇÃO À MÍDIA NO MUNDO: PARA SABER MAIS

A difusão da educação à mídia é uma resposta à necessidade de se informar sobre as novidades no campo dos novos meios de comunicação. Em seguida citamos apenas alguns sites que em vários países oferecem maiores informações sobre como aprender a usar melhor a mídia, enfrentando a problemática da tutela dos menores e da alfabetização às novas tecnologias por parte dos adultos.
«The Media Awareness Nework-Réseau éducation médias» é uma organização canadense sem fins lucrativos, pioneira no desenvolvimento de programas sobre a educação à mídia. Com esta finalidade ela produz programas online em colaboração com organizações internacionais, convicta que, para interpretar as mensagens de informação, de entretenimento e comerciais, os jovens têm necessidade de instrumentos críticos válidos. Por isso é importante formar também os adultos (famílias e professores) sobre como funciona a mídia e como ela determina o estilo de vida.
A organização realiza uma ação contínua de monitoramento em relação à mídia (televisão, cinema, videogames, imprensa, publicidade, etc.), e sua seção dedicada aos pais oferece uma série de elementos para que estes reflitam com os filhos sobre esses meios, além da seção para os educadores, que inclui lições e materiais de apoio. Uma outra seção é dedicada à análise das questões ligadas à mídia, como a difusão de estereótipos, as representações de violência e da diversidade, a privacidade, a publicidade dirigida aos menores. Seu site é em inglês e francês (http://www.media-awareness.ca).
«Quai des images» é o site dedicado ao ensino de cinema e audiovisual organizado pelo Ministério da Educação francês. Ele propõe atividades ligadas à educação à imagem e de análise dos filmes em consonância com os programas escolares, agrupa os textos oficiais a respeito dos meios audiovisuais, oferece uma série de instrumentos de análise e de estudo completos sobre alguns filmes específicos e sobre certos autores em particular, informa sobre conferências, seminários, cursos e festivais sobre o mundo audiovisual e sua utilização em âmbito educativo e didático. Entre outras coisas, reúne também as propostas e as experiências feitas por professores e seus alunos nas escolas secundárias francesas no campo da educação à imagem, além de organizar um fórum de discussões aberto a todos sobre a educação à mídia (http://www.ac-nancy-metz.fr).
Sempre na França, está em funcionamento o blog «Zéro de conduite», organizado pelos professores e destinados a educadores, pais e estudantes. Promove o uso do cinema como instrumento pedagógico, dedicando-se especialmente à atualidade cinematográfica, mas sem esquecer os clássicos e os documentários. Com várias seções e espaços de aprofundamento, se propõe como um local de discussão de temas em um debate aberto (http://cinema-ducation.fluctuat.net).
A Universidade de Massachussetts organizou o Media Education Foundation – MEF, mídia de desafio, que produz e distribui documentários destinados a estimular o pensamento crítico e o debate sobre a relação entre aqueles que detêm o poder sobre a mídia, os conteúdos da mídia comercial, a exigência democrática de um livre fluxo de informações, as diversas representações de idéias e pensamentos e o direito dos cidadãos de informar e serem informados. Alguns destes temas são abordados criticamente, como a identidade do gênero na publicidade, a imagem de sexo nos videoclipes, o papel da mídia na construção da identidade cultural, mídia e saúde, etc. (http://www.mediaed.org/).

(a cura di M. F. D’A.)

 
At 9/17/2007 2:45 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

AS CRIANÇAS E A MÍDIA (II PARTE):
ACEITAR O DESAFIO EDUCATIVO


O tema da 41ª Jornada das Comunicações Sociais, «As crianças e os meios de comunicação: um desafio para a comunicação», nos convida a refletir a respeito de dois aspectos particularmente importantes. O primeiro é a formação das crianças, para que estejam em condições de receber de maneira crítica aquilo que vêem. O segundo é a formação à consciência e ao uso consciente da mídia, que está em contínua transformação tecnológica.
De fato, é o que especifica Bento XVI no início de sua mensagem, de 20 de maio de 2007, para a Jornada: «Os complexos desafios que a educação contemporânea deve enfrentar são muitas vezes ligados à grande influência dos meios de comunicação no nosso mundo. Como aspecto do fenômeno da globalização e estimulados pelo rápido desenvolvimento da tecnologia, os meios de comunicação delineiam fortemente o ambiente cultural (cf. João Paulo II, O rápido desenvolvimento, nº3). Na realidade, há quem afirma que a influência formativa da mídia está em competição com aquela da escola, da Igreja e, quem sabe, até com aquela da própria família».
De fato, como salienta o Pontifício conselho para as Comunicações Sociais, «para muitas pessoas, a realidade corresponde àquilo que os meios de comunicação definem como tal». Episódios recentes, como a utilização do celular na filmagem de violências nas salas de aula, abusos sofridos por pessoas deficientes, fenômenos de trote e de violência generalizada, demonstram como as crianças que crescem passando uma média de quatro horas por dia diante da televisão, sozinhos em casa, absorveram a lógica do «estou no vídeo, logo existo». Os psicólogos, os pedagogos e os estudiosos dos meios de comunicação estudam há tempos sobre as relações entre o consumo televisivo e o comportamento violento dos menores. Uma grande quantidade de pesquisas realizadas em muitos países ocidentais demonstra como esta correlação seja realmente inegável.


NOVAS LINGUAGENS

O fato que muitas crianças vivem completamente inseridas no mundo dos velhos e novos meios de comunicação, que estão cada vez mais frequentemente em correlação entre eles, é confirmado pela popularidade de alguns modelos televisivos, considerados tão efêmeros quanto penosos «momentos de glória», presentes nos programas com os maiores índices de audiência, dos «reality» aos «talk show», sem falar do «trash», que hoje se tornou um gênero de espetáculo.
Dentre as preferências demonstradas pelos adolescentes italianos que assistem televisão mais do que três horas por dia, encontramos, em primeiro lugar, a figura da «veline» (Ndt: misto de corista e coadjuvante na apresentação de programas populares da televisão italiana), enquanto outros da mesma idade se concentram no mais clássico exemplo, o do jogador de futebol. De toda maneira, a coisa mais importante é aparecer, pouco importa por qual motivo, de ser «alguém» ou «alguma coisa» no Olimpo mediático, mesmo que seja apenas por um instante.
Estes são os exemplos mais negativos dos condicionamentos derivados de um excessivo e acrítico uso dos meios de comunicação. Encontramo-nos diante de uma nova geração que cresceu na frente da televisão, capaz de usar as novas tecnologias que os próprios pais, que as adquiriram e as tornaram disponíveis, muitas vezes se encontram despreparados para utilizá-las.
Tanto é verdade que hoje em dia os filmes são vistos diretamente nos celulares e a televisão pode ser assistida na tela do computador. Hoje se telefona através da internet e graças ao download se descarrega os CDs e DVDs mais recentes, se filma e se faz foto com o celular, e assim por diante.
Nas casas, o vocabulário familiar se reduziu ao gênero dos sms e se fala tendo o som da televisão no fundo, se comunica através de e-mail, se faz «visita virtual» via computador, se percorre através de bibliotecas virtuais, tanto que as fichas e arquivos de papel evocam imagens do outro século, completamente em desuso.
A situação dos nossos filhos é diversa daquela da geração precedente, pois eles abriram seus olhos tendo diante de si estes cenários de profunda, contínua e envolvente transformação tecnológica. Eles se constituem aquela que os estudiosos chamam de geração nascida «com seis dedos»: além dos cinco dedos normais da mão, o sexto é o mouse do computador.
Com o aparecimento do mundo «virtual» da internet e dos videogames criou-se uma defasagem em relação à realidade verdadeira e própria. As duas dimensões parecem muitas vezes, e para muitos jovens, como universos paralelos, com conseqüências não indiferentes no plano do processo de amadurecimento. Têm grande sucesso os sites nos quais se prevê uma segunda vida (basta verificar os milhares de registros nos poucos meses de existência do site italiano de «Second Life», que em todo o mundo já tem sete milhões de inscritos), onde a simulação reproduz todas as situações da vida real. Apenas que tudo é falso, a começar da nova identidade, que pode ser escolhida e com ela se inicia a fazer parte deste mundo fora do mundo, onde se pode ser um «qualquer coisa». Isto é, ninguém.
Assim, o grande desafio cultural de hoje é propriamente a redefinição dos limites, que muitas vezes se apresentam demasiadamente instáveis. Isto é, redefinição dos limites entre o real e o virtual, superando a divisão digital que hoje separa as gerações adultas daqueles mais jovens.


OS JOVENS: PROTAGONISTAS OU VÍTIMAS DAS MUDANÇAS?

A linguagem deles é pobre, muitas vezes recheada de termos tirados do dicionário do internauta: clicar, chatar, messagiar, deletar, são alguns dos neologismos que fazem parte de seu vocabulário quotidiano. Falta uma dimensão humana da tecnologia que esteja em condições de traçar o perímetro cultural entre o real e o virtual. Assim a aldeia global difundiu uma quantidade de modelos comportamentais desviados, ou pelo menos discutíveis.
Desta maneira, os jovens que vivem a milhões de quilômetros de distância jogam o mesmo videogame, vêem o mesmo filme, assim como, de maneira transversal, absorvem modelos e comportamentos semelhantes. Muitas vezes os adultos têm menos domínio no uso das novas tecnologias e observam, com uma preocupação resignada diante de suas próprias limitações, as crianças que navegam facilmente na internet.
As raízes das dificuldades neste campo educativo são muito bem explicadas por Marina D’Amato, professora de sociologia da Universidade de Roma, que salienta: «Cada geração tem necessidade de se encontrar também em um mundo fantástico, que serve a interiorizar o paradigma do bom e do belo, do justo e do errado, do oportuno e do útil, também em relação aos exemplos que procedem da narrativa. Hoje nos encontramos em uma condição na qual os avós e os pais contam cada vez menos histórias aos filhos e aos netos, e este papel foi assumido pela televisão. Mas, na realidade, a televisão “exila” e “con-funde”, isto é, funde os modelos morais que são frutos de ânsias e problemas mal resolvidos, muito mais que de certezas. Embora estes se transformem com freqüência, a cada três ou quatro anos, o fato de serem repropostos continuamente faz com que se justaponham uns aos outros» (ver Come mediare i media, de Mario Russo).
Se for verdade que a televisão é o meio mais usado até a adolescência, imediatamente depois surge a grande atração pela internet. Esta passagem nasce de uma sintonia com a linguagem televisiva, que na idade infantil muitas vezes é ouvida durante muitas horas no dia. Esta linguagem se baseia em uma mediação da realidade e desta maneira ela ativa um processo de recepção que é de tipo emotivo.
Neste registro emocional é mais fácil acabar envolvido por situações e figuras capazes de se proporem como modelos identificadores, preservadores de sentido e de comportamentos a serem imitados.
O poder de concentrar uma vontade emulativa em alguns personagens, que correspondem particularmente às necessidades interiores do jovem (necessidades na maioria das vezes induzidas pela publicidade ou por modelos estimuladores), tem uma forte relação com a quantidade de horas que o jovem passa utilizando os novos ou os velhos meios de comunicação.


EDUCAÇÃO NECESSÁRIA

«A formação adequada a um uso correto dos meios de comunicação é essencial para o desenvolvimento cultural, moral e espiritual das crianças… Educar as crianças a serem seletivas no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja, da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos. Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia, com a certeza de que este difícil, embora gratificante, aspecto da condição de pais, é apoiado por toda a comunidade.»
As palavras do discurso de Bento XVI definem com grande clareza o paradigma de uma justa relação entre a mídia e os menores. Uma clareza que devemos agradecer ao magistério da Igreja, no momento em que o mundo da mídia parece ignorar a verdadeira problemática educativa das crianças e as expectativas de qualidade e de segurança exigidas pelas famílias no que se refere ao uso desses meios, seja do cinema aos videogames, da televisão à internet.
Diante da utilização destorcera do meio televisivo, o mais difundido dentre os meios de comunicação, a Igreja se interroga sobre o porquê da televisão não ter um papel educativo e por que os meios de comunicação não podem ser companheiros confiáveis para os jogos na fase de crescimento da criança. O anúncio de uma recente campanha sobre o uso da mídia, promovida pelo Ministério das Comunicações, mostra os vários membros da família que estão vendo a televisão ao lado de uma criança.
Que se trate do avô ou da mãe, a mensagem é a mesma: não deixar uma criança sozinha diante de um meio que, sem o apoio crítico educativo de um adulto, pode transmitir conteúdos inadequados à idade e à maturidade daquele que o vê. Sem esquecer as responsabilidades dos produtores televisivos, empenhados na organização dos programas, o papel da família é realmente insubstituível.
Se realmente o objetivo de quem administra a sociedade de produção televisiva, ou das multinacionais produtoras de videogames ou das operadoras de celulares, é o de promover e vender o produto, o bem estar psicofísico da criança está no centro do interesse dos educadores, sejam eles os professores ou, em primeiro lugar, os pais.
Isto explica bem a mensagem do Papa, que continua a sua análise, salientando que «educar as crianças a serem seletivos no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja e da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos (ver João Paulo II, «Familiaris Consortio», 76). Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia.»


CONTEÚDO DA MÍDIA

No panorama de uma revolução da multimídia, que está modificando transversalmente os hábitos, a mentalidade, os modelos e as linguagens, deve voltar ao centro do debate a tutela daquilo que é melhor para os menores. Sem acusar a «mídia», que enquanto tal não é nem boa nem má, o importante é partir de uma a análise do produto, para assim poder individuar conteúdos que sejam de melhor qualidade para as crianças e os adolescentes. Porque a televisão é um instrumento que abre janelas de conhecimento para o mundo e, se bem utilizada, de «má professora» pode se tornar uma preciosa fonte de estímulo para o crescimento humano e cultural.
A mesma coisa vale, e com mais razão, para a «rede» que engloba e compreende tudo, e para os videogames, onde, ao invés de violência e monstros, poderia se dedicar a produzir (e isso já ocorre em certos casos) histórias instrutivas e de conteúdo interessante.
Bento XVI coloca justamente em evidência as enormes possibilidades para que seja melhorado o conteúdo deste grande campo de produção multimídia: «A educação através da mídia deveria ser positiva. Colocando as crianças diante de um meio estética e moralmente excelente, estas recebem uma ajuda para que desenvolvam a própria opinião, a prudência e a capacidade de discernimento. É importante aqui reconhecer o valor fundamental do exemplo dos pais e as vantagens de introduzir os jovens aos clássicos da literatura infantil (…). A beleza, quase um espelho do divino, inspira e vivifica os corações e as mentes juvenis, enquanto a feiúra e a vulgaridade têm um impacto deprimente sobre os comportamentos». Diante de uma decadência geral do produto televisivo, a questão da qualidade aparece ainda mais forte e vibrante em grande parte de um público formado de famílias, que pede para não ser apenas um exército indistinto de ouvintes silenciosos, mas um público em condições de exprimir suas preferências por conteúdos formativos e informativos de bom nível.
A mensagem de Bento XVI continua, com algumas importantes indicações: «Como a educação em geral, aquela da mídia requer também uma formação ao exercício da liberdade. Trata-se de uma responsabilidade que compromete. Muitas vezes a liberdade é apresentada como uma incansável procura do prazer ou de novas experiências (…). Este desejo, sentido profundamente pelos pais e educadores, que é o de educar as crianças no caminho da beleza, da verdade e da bondade, pode ser apoiado pela indústria da mídia somente na medida em que se promove a dignidade fundamental do ser humano, o verdadeiro valor da vida familiar, as conquistas positivas e as metas da humanidade. A partir disso, a necessidade de que os meios de comunicação estejam empenhados na efetiva formação e no respeito da ética deve ser vista com interesse particular e com urgência não apenas pelos pais, mas também por aqueles que têm responsabilidade cívica».
Na realidade, nos encontramos na situação de ter que reconhecer que na Itália falta uma verdadeira «cultura da criança»: a situação é tão séria que no âmbito institucional procura-se dar uma nova organização geral para verificar e controlar os conteúdos dos setores de entretenimento, como os videogames, que até agora estão submetidos apenas a códigos de auto-regulamentação, feitos e codificados para uso e consumo pelas indústrias produtoras.
Uma vez mais, o primeiro e indispensável apoio à criança só pode vir da família e de uma relação mais estreita com os professores e educadores, exatamente como salienta Bento XVI, lembrando-nos que a preocupação educativa dos pais não deve se tornar uma preocupação genérica, mas uma atenção constante a tudo aquilo que diz respeito aos filhos.

A INDÚSTRIA DA MÍDIA

1) A TELEVISÃO

Se a televisão convencional se apresenta como um ramo de atividade já «maduro», no entanto se apresenta no horizonte a situação da mídia digital (satélite ou a cabo), também como uma plataforma que consente a ligação entre televisão, internet e outro tipo de mídia através do computador. No que se refere à qualidade da programação, apesar dos inúmeros bons propósitos anunciados no âmbito institucional, parece pequena a atenção às exigências dos menores em suas diversas faixas etárias. A programação para os menores, na realidade é confinada em redes e horários particulares, enquanto o resto da programação na faixa horária considerada «para todos» muitas vezes apresenta conteúdos inadequados aos jovens. Mas, quais são as expectativas das gerações de jovens no que se refere à televisão? É realmente verdade que preferem o «trash», os jogos com prêmios absurdos e as «velines»?
A partir de uma pesquisa recente feita pelo instituto Censis sobre «Comunicação, pluralismo social, sociedade aberta» (2005) surge que a relação entre os menores, e em particular dos adolescentes entre os 14 e 18 anos de idade, e a televisão é determinada por elementos de forte contradição e de passividade. Nessa faixa etária, 100% deles vêem televisão praticamente todos os dias, 86% acompanham um pouco de tudo, com uma relevante predileção pelos filmes (72%), por esporte (32%) e pelos «reality shows» (18%).
No entanto, a amostragem entrevistada não está realmente satisfeita com aquilo que vê. De fato, 36% dos adolescentes denunciam a vulgaridade difundida nos programas e 25% criticam a superficialidade. Dentre eles, 46% consideram a televisão como um meio que «invade», ao mesmo tempo em que é interessante notar que 25% consideram que em geral a programação televisiva alimenta nas crianças menores uma visão consumista da vida. Destes dados surge o contraste entre a procura de distração e a reprovação daquilo que lhes é proposto pela programação. Isto significa que o alto índice de procura não é um indicador de satisfação.
Considerando o axioma de que a televisão seja onipresente, fica claro que são os próprios jovens a pedirem uma maior atenção aos conteúdos: menos violência e menos vulgaridade. A exigência de uma regulamentação diversa, diz claramente o relatório do Censis, «não vem somente daqueles, pais e educadores, que estão preocupados pela possível influência negativa sobre os menores, mas se exprime nitidamente também através dos adolescentes, pelo menos de uma parte mais esperta e consciente dentre eles».
Para tutelar melhor os direitos dos menores, desde 2002 foi instituído junto ao Ministério das Comunicações um código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual aderiram os produtores de televisão, seja no âmbito nacional como local. Baseando-se nos princípios sobre a matéria existentes na Constituição italiana e na Convenção dos direitos da criança, estabelecida em 1989 pela ONU, a comissão que controla sua aplicação avaliou em todos estes anos de atividade os milhares de casos em que foram violadas as normas de tutela, que prevêem a transmissão de programas e imagens adequadas a um público de menores de idade durante aquela que é chamada de «faixa protegida» da programação televisiva (das 7h30 às 22h30), intervindo com denúncias e sanções, que nos casos mais graves foram aplicadas pela Autoridade de garantia no setor das comunicações. Para o futuro, esta comissão deverá se transformar em um organismo mais amplo de controle, que se chamará «Mídia e menores», que além da televisão deverá monitorar também os setores dos vídeos-telefone e dos videogames, além da internet, que é o campo de maior risco.

REGRAS DE TUTELA EM OUTROS PAÍSES

É diversa a situação em outros países, como por exemplo na Grã Bretanha, onde o sistema de regulamentação da mídia é estruturado e complexo e foi atualizado nas últimas décadas, com uma particular atenção à tutela dos menores. As inovações tecnológicas neste setor levaram as normativas inglesas a uma série de novas disposições, como por exemplo, a visão em casa de vídeo exclusivamente para adultos, e que fora de casa seriam vetados aos menores, ou o combate à praga mundial dos sites internet para os pedófilos, que contenham material pornográfico ou com conteúdos que possam esconder o aliciamento de menores (ver a Protection Childres Act, de 1978).
A programação televisiva é regulamentada pelo Broadcasting Act (1996), de onde deriva a instituição da Broadcasting Standard Commission (BSC), um órgão independente de controle que estabelece as normas de avaliação e classificação dos programas, também no que se refere aos conteúdos violentos ou que possam ofender a decência pública (site oficial www.bsc.org.uk). Este organismo BSC funciona internamente à estrutura do Broadcasting, supervisionando e regulamentando todas as emissoras de televisão e de rádio, via cabo ou por satélite. Sua tarefa é a de elaborar os códigos de conduta e de aplicação de modelos que respeitem a justiça, além de monitorar os modelos, verificando que respeitem as leis. Com a transmissão de programas com conteúdos considerados inadequados aos menores de várias idades, há alguns anos a televisão inglesa adotou o sistema «watershed», um «separador de águas» entre um horário de programação familiar e outro para os adultos. Todo o sistema televisivo inglês se apóia sobre a responsabilização das famílias, pois sem a colaboração delas qualquer código de modelos para os programas é praticamente inútil.
Na França, está vigorando já há anos um código através de sinais televisivos, que entra em função para assinalar os programas inadequados aos menores. A avaliação do programa televisivo é feita pelo Conseil Supérieur de l’Audiovisuel (CSA), uma autoridade administrativa independente, que controla a difusão dos filmes e outras transmissões em vários canais privados, nacionais, regionais ou locais. A normativa francesa (lei 719/2002) veta a transmissão de programas que possam prejudicar gravemente a integridade física, mental e moral dos menores, porque divulgam conteúdos de pornografia ou de violência gratuita. As transmissões são classificadas por um código de sinais que, em conjunto com um sistema organizado de faixas horárias de programação, garante às famílias mais clareza sobre os programas destinados aos menores.
Na Alemanha, o tema da infância tem particular atenção da legislação, que considera desde o nascimento o início dos direitos fundamentais do cidadão. A tutela é disciplinada no âmbito público pela JSchG (desde o dia 26 de fevereiro de 1985), enquanto a lei GjSM se ocupa do controle sobre a difusão de publicações e conteúdos mediáticos considerados danosos para os menores. A regulamentação no setor televisivo é feita segundo as normas do acordo sobre a radiodifusão dos Lander federais, que as entidades para a mídia nesses Lander adotaram por base para o estabelecimento das diretivas que tutelam o interesse dos menores nas emissoras privadas. Não são admitidas transmissões que incitem o ódio racial, que exaltem a violência ou a guerra, que ofendam a dignidade do homem, que sejam de gênero pornográfico, que mostrem pessoas moribundas ou com sofrimentos que ofendam a dignidade humana. Os responsáveis pela programação, escolhendo os horários das transmissões, devem cuidar para que os menores não vejam programas que podem prejudicar o seu bem estar psíquico, físico ou mental. As transmissões inadequadas às crianças menores podem ser transmitidas somente depois da autorização da entidade competente do Land interessado.
Os responsáveis pela organização dos programas televisivos em âmbito nacional devem nomear encarregados pela tutela dos menores, que atuam no momento da aquisição, da projeção e da realização dos programas. As emissoras privadas fundaram em 1993 uma associação de autocontrole voluntário da televisão («Freiwillige Selbskontrolle Fernsehen», FSF), à qual devem ser apresentados programas particulares, antes da sua transmissão, e suas avaliações consideradas nas decisões das entidades de controle da mídia nos Lander federais. Existe ainda o órgão comum do cidadão para a tutela dos menores, dos programas, da competência mediática e controle da mídia (GSJP), do qual faz parte um integrante da entidade para a mídia nos Lander federais, que dá o seu parecer a respeito de algumas séries, filmes e espetáculos mais ou menos adequados aos menores. Este órgão, o GSJP, decide sobre pedidos de mudança de horários de transmissão de filmes proibidos para menores, controla a forma de novos programas e experimenta novas disposições para a tutela dos menores na televisão digital. A peculiaridade da jurisdição alemã, seja no setor televisivo como no cinematográfico e da mídia em geral, é a minuciosa atenção às exigências com o desenvolvimento do menor e aos riscos que este pode correr com a observância incorreta das leis.
Nos Estados Unidos, é possível consultar via internet um «guia televisivo para os pais» (ver o site www.mpaa.org), que prevê algumas categorias de audiência aplicadas aos programas televisivos transmitidos a todo o público. Este guia organiza várias siglas para identificar a categoria de audiência para cada transmissão: vai-se do TVY (para todas as crianças) ao TVG (para todos), através de várias faixas etárias, que correspondem à passagem da primeira à segunda infância e desta à adolescência. Depois tem o TVPG («parental guidance», visto na presença de um dos pais), o TV14 («parent strongly cautioned», séria advertência aos pais), para os programas que contêm cenas de sexo e de violência. Enfim, há o TVMA, que prevê um «mature audience only», ou seja, destinado a um público de idade superior a 17 anos, última fronteira para os conteúdos considerados «restricted».
Estas avaliações foram elaboradas baseando-se nas opiniões dos próprios pais e são fáceis de serem encontradas e compreendidas. Esta linha de «guia de televisão para os pais» pode ser usada juntamente ao «v-chip», que é um dispositivo de filtro instalado na maior parte dos mais recentes modelos de aparelhos de televisão, para permitir aos pais de bloquear os programas inadequados.

FICHA 1
Brasil: «O que eu penso da tv»
No Brasil, a audiência infantil é muito alta: aproximadamente 30 milhões de crianças vêem televisão pelo menos durante três horas por dia. Explica a profa. Rosália Duarte, do departamento de Ciência da Educação, da PUC do Rio de Janeiro, que «as crianças são muito perspicazes, mas nós podemos e devemos ajudá-las a ampliar o seu quadro de referências, para que possam discutir ainda melhor sobre o conteúdos daquilo que vêem. Para isso temos necessidade, antes de tudo, de ouvir aquilo que elas têm a dizer sobre o assunto e de dialogar com elas. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e muito mais freqüente, a outras atividades culturais». No âmbito de uma pesquisa feita através de um questionário distribuído nas escolas, intitulado «O que eu penso da tv», apareceu que «as crianças querem seriamente ser ouvidas sobre aquilo que pensam da tv, mas sentem que sua opinião é considerada pouco importante e não estão contentes com o excesso de imagens de violência exibidas na televisão, principalmente a violência “real”, definida como aquela transmitida nos telejornais. Eles adoram ver televisão e não importa o que os adultos pensam e dizem a respeito disso. A eles agradam quase todos os tipos de programas transmitidos: novelas, desenhos animados, programas de humor, filmes, seriados, mas isso não faz deles espectadores “idiotas”, pois fazem críticas muito interessantes, pertinentes e bem elaboradas sobre o que consideram feio ou inadequado na televisão. Para a maior parte deles, a televisão se oferece como principal opção de divertimento (em alguns casos, a única), o que significa um dado muito preocupante. Mas, o que chamou mais a nossa atenção é o grau de experiência com o qual essas crianças analisam a televisão: são expertos e demonstram conhecer a televisão também do lado de dentro, inclusive as linguagens que ela utiliza, a sua estrutura de produção, a sua lógica interna e as suas maneiras de intervenção».
As crianças aprendem os valores e os não-valores através da televisão, não resta dúvida, mas demonstram ter senso crítico a respeito deste assunto, quando afirmam nos textos que os programas transmitidos na tv podem lhes ensinar «a serem bons, a ter coragem e a fazer o bem, a cuidar da natureza e de si mesmos, a serem honestos e a lutar por aquilo que desejam», mas também «a serem cruéis e mentirosos, a roubar e matar, a não respeitar os pais e a comprar tudo aquilo que não têm necessidade». Falando sobre a validade do ensino através da mídia, a profa. Duarte salienta a necessidade de «ouvir aquilo que têm a dizer sobre o assunto e a dialogar com eles. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e mais freqüente, a outras atividades culturais».

FICHA 2
Observadores internacionais
Os dados examinados em janeiro de 2006 pelo OssCom, que é um centro de pesquisa da mídia, deixam evidente a tendência a realizar uma forma de co-regulamentação, onde a ação legislativa dos Estados membros se integra com medidas de auto-regulamentação por parte dos produtores, broadcasters e profissionais da comunicação sob o efeito de controles e sanções. São dois os instrumentos mais utilizados no âmbito europeu, observando-se as diretivas previstas no artigo 22 de «Televisão sem fronteiras»: a definição de faixas horárias protegidas (watershed) e os sinais mostrados na tela (determinados por um sistema de «rating»). Apesar disso, aos campos tradicionalmente problemáticos da violência e da pornografia se juntam novos campos de risco para os menores: a vulgaridade, abusos e dependências de substâncias, linguagem e comportamento vulgares, discriminações e abusos, violações e ofensas à dignidade humana. Os critérios de avaliação dos programas se constituem um problema que é partilhado por muitos países da União européia, ao mesmo tempo em que se prepara uma uniformização internacional dos sistemas de classificação (ver mais adiante, Nicam), baseados na visualização de cinco ícones que ilustram simbolicamente qual é a problemática do programa que está sendo analisado e para quais idades ele é desaconselhado.
Deve ser assinalada a atividade online da European Medi@culture. O projeto é promovido pela Comissão Européia, em Bruxelas, no quadro das iniciativas «e-Learning», administrado pelo centro mediático de Baden-Württemberg. O site apresenta informações sobre a educação à mídia na Europa, particularmente na França, Áustria, Finlândia e Alemanha. A seção de projetos de multimídia agrupa os projetos sobre a mídia desenvolvidos por escolas e associações de jovens ao longo do tempo (ver http://www.european-mediaculture.org).

FICHA 3
África do Sul: Encontro mundial sobre a mídia para a infância
Este encontro trienal se realizou no último mês de março em Johannesburg, na África do Sul, com a participação de expertos do setor representando diversos países. Em conjunto se discutiu sobre a necessidade de uma programação adequada às crianças, procurando entender de que modo a violência na mídia pode influir sobre a psíquico dos menores.
Mas, no 5º Encontro mundial sobre a mídia para a infância apresentaram-se também muitas crianças provenientes de todo o mundo e empenhadas em discutir sobre o difícil tema da «Mídia como instrumento de paz e de democracia global». Vieram guiados por grupos de adultos, dentre eles as diversas organizações católicas que há anos trabalham para promover regras para o bem da infância, a serem respeitadas nas transmissões de rádio e televisão através de códigos de regulamentação que devem ser redigidos ou, como em alguns casos, apenas atualizados. Em muitos países do sul do mundo as novas tecnologias de multimídia já estão muito disseminadas e seu uso merece uma atenção particular para tutelar o público mais jovem.
Especialmente na África, explicou o organizador do encontro, Firdoze Bulbulia, começa-se a examinar o projeto de um «Media center» para as crianças, que possa produzir e distribuir transmissões de rádio e de televisão destinadas ao público mais jovem, com o objetivo de realizar um canal televisivo pan-africano dedicado à infância. Os organizadores do encontro estão também trabalhando no projeto de uma aliança africana dos meios de informação e de comunicação, seguindo o modelo daquela já existente na América latina.

2) INTERNET

Na Itália, 47% das famílias italianas têm um computador em casa, um dado relevante mas sempre muito baixo em relação à média dos outros países europeus. O uso da internet por parte dos adolescentes e jovens, e a familiaridade que têm com tudo aquilo que pode ser digitado ou «descarregado» da internet, apresenta não poucos problemas. Pela sua própria natureza de rede de comunicação global, o problema se apresenta em ótica internacional, procurando garantir a tutela dos menores através de precisos acordos com os provedores para um efetivo controle de conteúdo. No campo italiano, até 2006, a tutela dos menores tinha sido deixada nas mãos dos próprios provedores, que em 19 de novembro de 2003 assinaram um acordo de auto-regulamentação: o Codice Internet e Minori. Embora o acordo tenha sido estipulado entre os representantes dos vários provedores diante do Ministério para a Inovação e a Tecnologia, no entanto ele permanece um acordo privado, com lacunas, principalmente no que se refere às sanções que muitas vezes devem ser aplicadas. Em 2006, na seqüência de numerosos casos de violência sobre menores, muitos dos quais realizados através da difusão de material pedo-pornográfico (quando não se tratava de verdadeiro e próprio aliciamento de menores via internet), foi promulgada a lei 38 de 6 de fevereiro de 2006: «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet».
Enfim, como aplicação da lei 38/2006, em fevereiro da 2007 foi publicado um decreto determinando os requisitos técnicos dos instrumentos de filtragem que os provedores da rede internet devem utilizar para impedir o acesso aos sites já assinalados pelo Centro nacional contra a pedo-pornografia. Mas, isso não basta para superar as dificuldades e impedir que os menores possam navegar de maneira arriscada na «rede das redes».
Atualmente foi reativada a comissão anti-pedofilia e desvios de menores através da internet, o «Ciclope», que tinha sido instituída junto ao Ministério para a Eqüidade, do governo italiano, e que ficou inativa por um ano, até a sua reestruturação junto ao Ministério da Família. Está também para entrar em função um site dedicado ao uso da internet, junto ao Ministério das Comunicações, e um número telefônico de emergência gratuito, organizado pelo mesmo ministério e por «Save the children», que poderá ser utilizado por qualquer cidadão que queira assinalar algum abuso, desvio ou pedo-pornografia. Dentre as iniciativas mais recentes, deve ser assinalado o site www.tiseiconnesso.it criado pelo Ministério das Comunicações italiano, sempre em colaboração com «Save the children», onde é colocada à disposição uma série de informações sobre o conteúdo de certos sites, seja para os pais como para as próprias crianças, em conjunto com a campanha televisiva que tem como slogan «A melhor maneira de ajudar o seu filho a não usar incorretamente as novas tecnologias é conhecê-las».
Deve ser salientado também o fato de como a rede se tornou um grande mercado online. Para alguns produtores, o «e-commerce» de brinquedos corresponde já a 4% das vendas, e apenas em 2005 as vendas online corresponderam a 37.600 ações de compra. As razões para investir no processo online são múltiplas: desde a possibilidade de evitar as dificuldades logísticas de distribuição dos produtos, à ampliação de ofertas diferentes de produtos e também a possibilidade de envolvimento do cliente através de campanhas de mala direta e a criação de comunidades virtuais em torno de alguns produtos.

FICHAS:
Pedo-pornografia e internet
Em março de 2006, entraram em vigor as novas medidas diretas de combate e repressão ao fenômeno de exploração sexual dos menores e a pedo-pornografia, estabelecidas pela lei 38/2006 – «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet» foi publicada no Diário oficial em 15 de fevereiro de 2006, nº.38 – com a qual foram substancialmente modificados e integrados os artigos 600bis e seguintes do Código Penal italiano.
A lei confirma os artigos 527, 528, 529 e 725 do Código Penal italiano, que punem os «atos obscenos em local público, publicações, espetáculos obscenos, desenhos ou figuras que ofendem a decência pública».
Porque em muitas publicações, transmissões televisivas e anúncios publicitários, mesmo que não tenham declaradamente um caráter pornográfico, imagens de crianças e adolescentes são apresentadas de maneira explícita ou mais ou menos sutilmente ilusória e de forma falsa, pede-se um novo empenho das instituições competentes para que sejam observadas as normas em vigor e, se preciso for, que façam apelo aos órgãos de Polícia, o Instituto de autodisciplina publicitária, o Ministério das Comunicações, a Polícia postal ou a «Comissão tv e menor».

3) CINEMA

Confirmando as disposições da Constituição italiana, no que se refere ao direito e ao dever das famílias de serem protagonistas na educação de seus filhos, para muitos é chegada à hora de reelaborar a legislação que define o conceito de «censura» (a lei 161/1962 prevê a possibilidade de negar a autorização de abertura às salas de cinema ou de fazer cortes nos filmes, mesmo em função de um público adulto), que hoje está superado. É preciso com urgência estabelecer um critério de tutela dos menores não apenas no que se refere aos filmes que vêem nos circuitos cinematográficos, mas também sucessivamente em casa, muitas vezes em horários acessíveis na programação da televisão.
Uma avaliação correta e preventiva de um filme permite à família ter à sua disposição os instrumentos para escolher se um espetáculo é mais ou menos oportuno, conhecendo a trama, os eventuais conteúdos mais sensíveis, a classificação que a obra recebeu em outros países, etc. Por isso, é justo que a legislação seja revista, uma operação que requer atenção e perspicácia da parte das instituições em um momento de transição da mídia, como este que estamos vivendo, quando esta se tornou realmente um importante componente na educação dos menores.
Não faltam filmes que atraem o público por causa de seu conteúdo de violência, e no entanto entram no circuito cinematográfico sem qualquer restrição de idade. Para um filme que é notícia nos jornais, existem muitos outros com conteúdos duvidosos ou até mesmo perigosos que conseguem passar através do filtro da comissão de revisão cinematográfica, que atualmente funciona junto ao departamento de cinema do Ministério dos Bens Culturais.
Ao mesmo tempo em que existe um projeto de lei do ministro dos Bens culturais, que deve ainda iniciar os trâmites parlamentares, novas situações se apresentam na Itália, com a autocensura de filmes, feita pelos produtores ou distribuidores cinematográficos, com a introdução de novas e mais específicas faixas etárias para as restrições visando os menores a partir dos 10 anos de idade. As restrições serão feitas baseando-se em uma avaliação classificatória dos conteúdos das obras e sucessivamente serão ainda analisadas por uma comissão de psicólogos, educadores e pais.
Este sistema se inspira no modelo americano da Motion Picture Association of America (MPAA), que há 40 anos representa os interesses da indústria do audiovisual americana no mundo. Funcionando a partir de regras bem precisas (estabelecidas ao longo dos anos, também segundo as sentenças dos tribunais federais nos vários Estados americanos e em base aos protestos dos cidadãos), a autocensura americana prevê a existência de uma única comissão competente para determinar as restrições do PG12 ao «restricted» 17 anos. Esta comissão é composta exclusivamente de pais, considerados os primeiros depositários da educação dos filhos, e representam transversalmente a audiência. Importantes sanções econômicas asseguram que o mecanismo de autocertificação corresponda efetivamente aos interesses dos cidadãos. No site da Motion Picture estão disponíveis aos pais os pontos de referência para a avaliação das obras de entretenimento e são publicadas as restrições aplicadas a cada filme que está em exibição nas salas de cinema. Geralmente as avaliações parecem muito mais severas em relação a outros países. Tudo isso, nos vários anos de sua aplicação, deu uma qualificação à indústria americana e seu correto serviço prestado aos ouvintes. Qualquer estrada que se pretenda seguir na Itália, é importante para as famílias que seja estimulado um mercado de produção adequado à infância: é justo que o mecanismo da indústria cinematográfica continue com o seu ritmo de produção, mas não é justo confundir as classificações de acesso ao produto, como qualquer indústria sabe muito bem.
No que se refere às normas européias de classificação dos filmes, e em geral de todo «entertainment» (neologismo anglo-saxão, que, no entanto encontra sua raiz etimológica na relação entre educação e jogo) acessível aos menores, deve ser citado o sistema NICAM, que funciona na Holanda há alguns anos. Fundado em 1999, o NICAM (Nederlands Instituut voor de Classificatie van Audiovisuele Media) se baseia na lei Media Act, onde os programas de grupos que tiveram a autorização para atividades de «broadcasting» não devem incluir obras audiovisuais que prejudiquem o desenvolvimento físico e psicológico de pessoas com menos de 16 anos de idade, seguindo as diretivas da União européia («Televisão sem fronteiras» IV).
O sistema de classificação preventiva funciona também na Grécia, com a lei 1.597, de maio de 1986, que prevê que antes da projeção nas salas de cinema, cada filme seja submetido pelo produtor ou pela sociedade de importação à Comissão para a juventude, que classifica o filme seja como adequado aos menores, ou proibido aos menores de 13 anos, ou de 17 anos ou ainda, nos casos mais graves, severamente inadequado aos menores. Esta comissão é um órgão do Ministério da Cultura e foi concebida procurando-se estabelecer certa proporcionalidade, sendo composta de representantes do Estado (Ministério da Cultura), das categorias ligadas ao cinema, de psicólogos especializados na educação, de sociólogos, dos jovens, dos educadores e dos pais.
Na Áustria, está em vigor um sistema de avaliação complexo, instituído em base a um princípio constitucional federal que confia a tutela dos menores, no que se refere ao cinema e em geral aos meios de comunicação de massa, à competência específica dos Lander. A lei nacional que engloba a regulamentação da mídia é a ORF-ACT, ou seja, a Austrian Broadcasting Corporation nº. 379/1984, que estabelece quais os critérios sobre os quais deve se basear a proteção aplicada a programas e filmes transmitidos na televisão ou através de outros canais mediáticos. No que se refere à exibição dos filmes, a avaliação preventiva das obras cinematográficas, para que sejam decididas as faixas etárias adequadas, é regulamentada pela lei austríaca para a tutela dos menores, a «Jugendschutzgesetz», aplicada através das leis dos Lander federais. Esta lei estabelece nove faixas de restrições de público a partir dos seis anos de idade, com uma sucessiva graduação que prevê restrições para 10, 12, 14 e 16 anos de idade. Para supervisionar o sistema de classificação cinematográfica, existe uma comissão junto ao Ministério da Educação, em Viena, que comunica seu parecer sobre a idoneidade dos filmes às autoridades locais. Geralmente e de maneira individual os Lander adotam as decisões da comissão, e é em âmbito local que se decide de sua aplicação.
Na Espanha, o artigo 20 da Constituição reconhece o direito do cidadão a exprimir e difundir livremente seu pensamento, suas idéias e suas opiniões através de qualquer meio de divulgação. Se por um lado o exercício de tais direitos «não pode ser restrito através de nenhum tipo de censura prévia», o mesmo artigo especifica que «estas liberdades têm o seu limite no respeito dos limites reconhecidos pelas normativas que exprimem este respeito, especialmente no direito à honra, à privacidade, à própria imagem e à proteção da juventude e da infância».
Baseando-se neste princípio, a qualificação dos filmes (Real decreto 81/1997) e das obras audiovisuais é feita antes de sua difusão, através do Instituto de cinematografia e das artes audiovisuais (ICAA), uma entidade autônoma, mas ao mesmo tempo ligada ao Ministério da Educação e Cultura através da secretaria de Estado para a cultura (ver site www.mcu.es).
A subdireção geral de fomento à indústria cinematográfica e do audiovisual, que faz parte do ICAA, se ocupa, dentre outras funções, da classificação em faixas etárias dos filmes e das outras obras audiovisuais em vista de sua exibição pública e para a sua distribuição. A comissão se encarrega de divulgar as informações sobre os filmes e programas audiovisuais, com classificação que vai desde as «salas X» até as restrições para cada faixa etária do público.
Os filmes de caráter pornográfico não podem receber subvenções do Estado e sua projeção nas salas prevê uma taxa suplementar, destinada em parte para estimular um fundo de proteção cinematográfica. A projeção destes filmes pode ser feita somente nas «salas X», onde não podem ser apresentados outros tipos de obras cinematográficas e onde é proibido o ingresso de menores de 18 anos.

CINEMA NA TV

Devido ao alto consumo de programas de televisão por parte dos menores e levando-se em conta as diretivas da União européia, que promovem a auto-regulamentação no âmbito nacional das emissoras de tv e a participação das famílias nesta obra educativa, há alguns anos estão em vigor na França, na Holanda, na Grã-Bretanha, na Grécia e na Itália os códigos de sinais, que servem para identificar tanto os filmes projetados na salas de cinema como aqueles transmitidos na televisão. A tutela dos menores no âmbito da televisão foi também feita adotando-se o chamado sistema «watershed» (separador das águas), que funciona segundo uma seleção de faixas horárias protegidas, algumas aconselhadas à visão dos menores, outras aconselhadas a todos e outras ainda, principalmente na programação noturna, indicadas somente a um público adulto.
A faixa de idade determinada pela classificação preventiva dos filmes tem obviamente uma repercussão na programação das chamadas faixas horárias protegidas ou distintas nas emissoras de televisão pública em todos os países europeus. A definição das linhas de conduta comuns está à base dos acordos de auto-regulamentação e de co-regulamentação dos programas de televisão, estabelecendo-se um código de procedimento comum para as emissoras tanto públicas como privadas. Criou-se assim uma base normativa, que é assumida pela autoridade do Estado e que recebe a confiança dos consumidores das emissoras públicas ou privadas que adotam este sistema de auto-regulamentação.
Para tornar visível aos adultos as classificações dos programas apropriados aos menores, muitas emissoras européias adotaram um sistema de sinais que através de símbolos, números, cores e sinais acústicos advertem ao público a respeito daquilo que está para ser transmitido.
Mas, apenas este sistema, assim como o de filtragem (tipo v-chip), não basta para garantir uma verdadeira tutela dos menores diante de um conjunto de imagens difíceis de serem decodificadas por um jovem. Deve-se pensar às imagens de guerra dos telejornais, dos filmes escabrosos ou às informações sobre os crimes hediondos, que muitas vezes têm como ambiente o próprio núcleo familiar.
É na colaboração entre Estado, produtores de programas audiovisuais e famílias que pode ser fundamentado um autêntico respeito dos menores que encoraje o crescimento positivo da criança em base aos valores fundamentais da pessoa humana.

4) CELULARES COM VÍDEO

Hoje a difusão dos celulares com vídeo chegou à Itália ao índice se 134%, o que significa que muitas pessoas possuem pelo menos dois celulares, inclusive os jovens e as crianças, que recebem este instrumento dos próprios pais. De fato, de duas crianças entre 8 e 13 anos de idade, uma delas tem um celular no bolso. Aquele que poderia ser um instrumento para controlar melhor os deslocamentos e as necessidades dos filhos, se revela no entanto um perigoso meio que pode expor a outro tipo de utilização por parte dos menores, que não se separam nunca do próprio celular, nem mesmo durante as aulas, como lamentam vários professores. Apesar do código de auto-regulamentação assinado pelas principais operadoras (Código de conduta para a oferta de serviços a pagamento em tutela dos menores), na realidade os novos serviços opcionais do celular o tornaram um «personal computer» capaz de permitir novos usos que antes não tinham.
Os desenvolvimentos tecnológicos que estão se verificando no campo da telefonia móvel – particularmente no que se refere à sinergia com a internet e a adoção dos sistemas DVB de vídeos-telefone – contribuem a aumentar a oportunidade de comunicação também para as novas gerações e, ao mesmo tempo, repropõem em novos termos a questão da tutela dos menores. As evoluções já previstas ulteriormente para os próximos anos e o número sempre crescente de pessoas envolvidas, pedem uma grande consciência social e uma constante atenção das pessoas e órgãos encarregados de garantir os direitos dos cidadãos.
Neste contexto devem ser reafirmados os direitos dos menores no campo da comunicação, dentre os quais certamente não está em último lugar aquele que se refere também à segurança diante dos riscos de indução a comportamentos ilícitos ou de acesso a conteúdos nocivos ou indesejados. Também neste campo é essencial o papel dos pais e, em geral, de todos aqueles que são chamados a ter uma função educativa. A maior segurança das crianças e dos jovens quanto ao acesso a conteúdos ilegais é um ponto que deve merecer atenção também através da maior conscientização dos pais e das mães, que devem se capacitar a conhecer e utilizar estes meios.
Para a «alfabetização» dos pais na utilização da mídia devem colaborar também as instituições públicas, promovendo um uso positivo das novas possibilidades tecnológicas. Às empresas cabe a responsabilidade de colocar no mercado um produto que dê garantias no que se refere à sua utilização pelos menores, superando os limites estabelecidos pelo código de auto-regulamentação assinado pelas operadoras de celulares. Devem também oferecer maiores informações aos adultos que assinam um contrato de utilização, como por exemplo a adoção de bloqueios automáticos de acesso a conteúdos nocivos, se o celular passa às mãos de um menor de idade.

5) VIDEOGAMES

Trata-se de uma indústria global, que conquistou os jovens e não apenas eles. Os números relativos à difusão repentina dos videogames indicam que existem 250 mil sites de videogames, cada um deles propõe uma série de títulos, muitos deles recheados de cenas de sexo e de violência. Uma pesquisa recente do Instituto italiano de medicina social (IIMS) coloca em evidência, entre outras coisas, a escassa informação por parte dos adultos a respeito dos videogames utilizados pelos filhos, o predomínio de temas violentas em mais de 30% de títulos não aconselhados aos menores, o predomínio de personagens virtuais normais que podem se tornar especiais, realizando ações extraordinárias.
Mas, o ponto de risco mais elevado se refere aos pequenos jogadores de videogames, crianças entre seis e nove anos de idade que se submetem a entrar tão intensamente no jogo virtual que chegam a formas de dissociação da realidade e solicitam um monitoramento muito atento da parte dos adultos. A mesma pesquisa indica a presença de videogames em 25% das famílias com crianças de três a cinco anos de idade e em 65,2% das famílias com crianças entre seis e 10 anos de idade. O que produz efeitos negativos no âmbito cognitivo das crianças não parece ser especificamente o meio, mas muito mais os elementos que criam a excitação, tais como a velocidade de produção do estímulo e da resposta, a velocidade das imagens, os efeitos especiais, os contrastes, a fragmentação da história, o binômio rumor-ação. O uso prolongado do jogo inibe, segundo alguns psicólogos, a área da capacidade crítica, provocando passividade e ao mesmo tempo agressividade na criança. Mas, não queremos demolir os videogames, porque existem aqueles que são muito adequados aos mais jovens, com valores de informação e de educação, seja também porque o uso deste meio é na realidade um passo na preparação da criança ao sucessivo e mais sofisticado, que é o uso da internet.
De qualquer maneira, os dados relativos à venda destes produtos de entretenimento mostram um crescimento em todos os lugares e a difusão deste meio é acompanhada de uma aceitação social (ou seria uma resignação?) sempre maior.
É urgente ampliar o percurso de conhecimento e das estratégias internacionais, para monitorar um mercado que está cada vez mais vasto. Parece urgente estabelecer modalidades operativas para o controle dos conteúdos e do sistema de sanções, seja para o produtor como para o vendedor dos serviços. O código de auto-regulamentação Pegi (derivado em 2003 do sistema de avaliação e classificação holandês, Nicam, que assinala os conteúdos inadequados aos menores), adotado pelos industriais de «entertainment» que produzem videogames, é a única forma de auto-regulamentação existente atualmente e que prevê sanções (raramente aplicadas, mesmo diante de casos graves evidentes) para os produtores que colocam no comércio os jogos com indicações de faixas etárias apenas aproximativas.
O código Pegi, ao qual a associação européia Isfe adere em 2002, é evidentemente insuficiente na sua função declarada de «fornecer aos consumidores as informações mais oportunas» e expostas no selo de produção. E, como o setor dos videogames tem hoje um volume de negócios que ultrapassa os 740 milhões de euros, envolvendo 24 milhões de jogadores (43% da população a partir dos quatro anos de idade), com uma venda dos produtos classificados para maiores de três anos de idade que chega aos quase 48% dos consumidores. É um dado que define o impacto deste gênero de meio sobre a infância e a adolescência, mostrando toda a sua periculosidade, seja pelo consumo de conteúdos inadequados, seja pelo excessivo número de horas dedicado neste passatempo, muitas vezes solitário e sem a presença de um adulto ao lado. Se for verdade, como sustenta a indústria, que a produção de videogames violentos é apenas uma mínima parte do mercado, é também verdade que esta representa a fatia mais importante do retorno econômico.
O interesse pelos videogames é alimentado pela sinergia com os filmes que inspiram o jogo homônimo e que torna sempre mais atrativo este gênero, principalmente para os adolescentes. Desta maneira é importante também neste campo o estabelecimento de regras precisas em defesa dos consumidores dentre o público jovem, mais exposto aos riscos destas novas formas de entretenimento cada vez mais sofisticadas e envolventes, por causa da combinação entre narrativa e efeitos gráficos.

6) PUBLICIDADE

O problema da tutela dos menores diante da publicidade se apresenta como um corolário, dentro do quadro mais amplo que regulamenta a difícil relação entre a mídia e as crianças. A televisão, e portanto também a publicidade, se constitui em uma fonte de perigo para os menores, isto é, para a maior parte das crianças, principalmente em idade pré-escolar, que devem saber fazer a diferença entre a publicidade e o resto da programação, e entre os programas de ficção e a realidade. Com essas considerações não significa que exista uma acrítica rejeição da publicidade em si mesma – à qual se reconhece, no entanto, onde proceda corretamente, uma função positiva no processo de formação, de crescimento crítico e de socialização do menor –, mas existe a necessidade de prever um sistema de regras destinado a garantir-lhe um uso adequado.
O efeito dos anúncios publicitários é tão grande que em alguns países estão sendo tomadas medidas drásticas a respeito. No Reino Unido, por exemplo, recentemente foram vetados os anúncios publicitários durante os programas destinados às crianças até nove anos de idade, a partir de 1º de janeiro de 2008 a medida se estenderá à programação para os jovens até 15 anos de idade e até o final de 2008 serão vetados em todos os canais dedicados aos menores. Apesar de se reconhecer que a publicidade serve para financiar os programas, aqueles dedicados às crianças terão que recorrer a outras fontes. Também na França começa a se impor uma «linha dura» a esse respeito: visto a alta incidência de publicidade de merendas, de sucos e doces em geral, a partir de agora os anúncios dedicados às crianças deverão ser precedidos de uma espécie de aviso, que orientará para uma alimentação adequada.
Mas, por que as crianças são tão frágeis diante dos apelos da publicidade? Na Itália, explica Paolo Landi, secretário geral da Adisconsum (Associação de defesa dos consumidores e do ambiente»), em um capítulo de seu estudo «Crianças da multimídia»: «Se consideramos que a publicidade não faz outra coisa que veicular um conhecimento imediatamente concretizável em um “ter”, ou em um “ser”, ou em um “fazer”, a criança absorve sem dificuldades os três componentes que são a obsessão dos expertos de marketing, isto é, o componente cognitivo (como fornecer informações indeléveis sobre um produto ou um serviço), o componente afetivo (como fazer o consumidor reagir de maneira emotiva) e o comportamental (como colocar o pequeno consumidor em movimento na direção da aquisição). A partir deste ponto de vista a criança é o público ideal, o consumidor a quem se pode vender qualquer coisa».
Na Itália está em vigor um código de autodisciplina publicitária que surgiu em 1966, em base a um acordo entre os profissionais do setor. Esta primeira forma de tutela, em grande parte com origem comunitária, tem como protagonistas entidades administrativas independentes: a Autoridade de controle da concorrência e do mercado de setor e a Autoridade de garantia para as comunicações e a editoria. Enquanto isso, para a auto-regulamentação, orientada pelas normas que constam do Código de autodisciplina publicitária, e agora também, embora com força jurídica diferente, pelo Código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual se reconhece um poder de decisão e de sanção, emanando uma ordem e intimando seu cumprimento.
Em todos os países onde a televisão serve de veículo às mensagens publicitárias, o mundo empresarial é plenamente consciente do enorme poder de influência que a publicidade tem sobre as crianças.



NORMATIVA INTERNACIONAL

O assunto relativo à tutela dos menores na mídia é um dos mais debatidos, seja no que se refere às normas nacionais, seja no âmbito internacional. Encontra-se diante da situação de precisar acertas as contas com toda a extensão da rede global da internet. O exemplo que, neste momento de transição, coloca mais em evidência a necessidade de estabelecer leis que estejam em condições de controlar o acesso e uso dos conteúdos nocivos para os menores, é exatamente o da internet. Qualquer pessoa no mundo pode abrir um site considerado «arriscado», contendo elementos ilegais e acessíveis a consumidores despreparados, disponibilizados por quem está do outro lado do mundo.
No que se refere aos princípios gerais no âmbito do direito internacional, é preciso recorrer principalmente à convenção da ONU sobre os direitos da criança, com sede em New York, ratificada pelo Parlamento italiano através da lei nº.176/1991. Esta garante à criança uma «consideração proeminente» também a respeito da liberdade, seja no se refere à expressão, seja quando tutela os conteúdos recebidos. Esta mesma convenção, em seu artigo 17, fala da relação entre menor e televisão, desejando «um sistema normativo que tutele o menor-consumidor, mesmo com todas as dificuldades que se apresentam», seja para individuar os fenômenos que devem ser monitorados, seja sobre as normativas possíveis.
No direito da União européia, tal tutela foi recentemente confirmada pela Carta dos direitos fundamentais da União, aprovada em Nice em 2000, cujo artigo 24 salienta que «os Estados membros reconhecem a importância da função exercida pelos meios de comunicação de massa e cuidam para que a criança possa ter acesso às informações e materiais... com a finalidade de promover o seu bem estar social, espiritual e moral, além de sua saúde física e mental». A normativa seguinte, 89/552/CEE, previu algumas restrições, seja no que se refere aos programas como para as mensagens publicitárias destinadas a este público». O artigo 22 desta normativa conduz a impedir a transmissão de programas que contenham cenas pornográficas ou de violência gratuita, ou outros programas inadequados a este público. Não podemos esquecer de mencionar a determinação expressa de «Televisão sem fronteiras», que está hoje em sua quinta versão atualizada, que o tema da tutela dos menores está relacionado com o estatuto geral dos direitos dos menores e corresponde ao disposto nos artigos 50 e 31 da Constituição italiana.
Se for claro que os princípios normativos são todos a favor da tutela dos menores, é também verdadeiro que uma tecnologia em contínua evolução colocou em crise as velhas regras do jogo. Mas também é claro que não se pode mais adiar a necessidade de estabelecer novos parâmetros normativos, para que as crianças possam utilizar os meios de comunicação próprios de seu tempo, com aproveitamento e serenidade também para as famílias.~

EDUCAÇÃO À MÍDIA NO MUNDO: PARA SABER MAIS

A difusão da educação à mídia é uma resposta à necessidade de se informar sobre as novidades no campo dos novos meios de comunicação. Em seguida citamos apenas alguns sites que em vários países oferecem maiores informações sobre como aprender a usar melhor a mídia, enfrentando a problemática da tutela dos menores e da alfabetização às novas tecnologias por parte dos adultos.
«The Media Awareness Nework-Réseau éducation médias» é uma organização canadense sem fins lucrativos, pioneira no desenvolvimento de programas sobre a educação à mídia. Com esta finalidade ela produz programas online em colaboração com organizações internacionais, convicta que, para interpretar as mensagens de informação, de entretenimento e comerciais, os jovens têm necessidade de instrumentos críticos válidos. Por isso é importante formar também os adultos (famílias e professores) sobre como funciona a mídia e como ela determina o estilo de vida.
A organização realiza uma ação contínua de monitoramento em relação à mídia (televisão, cinema, videogames, imprensa, publicidade, etc.), e sua seção dedicada aos pais oferece uma série de elementos para que estes reflitam com os filhos sobre esses meios, além da seção para os educadores, que inclui lições e materiais de apoio. Uma outra seção é dedicada à análise das questões ligadas à mídia, como a difusão de estereótipos, as representações de violência e da diversidade, a privacidade, a publicidade dirigida aos menores. Seu site é em inglês e francês (http://www.media-awareness.ca).
«Quai des images» é o site dedicado ao ensino de cinema e audiovisual organizado pelo Ministério da Educação francês. Ele propõe atividades ligadas à educação à imagem e de análise dos filmes em consonância com os programas escolares, agrupa os textos oficiais a respeito dos meios audiovisuais, oferece uma série de instrumentos de análise e de estudo completos sobre alguns filmes específicos e sobre certos autores em particular, informa sobre conferências, seminários, cursos e festivais sobre o mundo audiovisual e sua utilização em âmbito educativo e didático. Entre outras coisas, reúne também as propostas e as experiências feitas por professores e seus alunos nas escolas secundárias francesas no campo da educação à imagem, além de organizar um fórum de discussões aberto a todos sobre a educação à mídia (http://www.ac-nancy-metz.fr).
Sempre na França, está em funcionamento o blog «Zéro de conduite», organizado pelos professores e destinados a educadores, pais e estudantes. Promove o uso do cinema como instrumento pedagógico, dedicando-se especialmente à atualidade cinematográfica, mas sem esquecer os clássicos e os documentários. Com várias seções e espaços de aprofundamento, se propõe como um local de discussão de temas em um debate aberto (http://cinema-ducation.fluctuat.net).
A Universidade de Massachussetts organizou o Media Education Foundation – MEF, mídia de desafio, que produz e distribui documentários destinados a estimular o pensamento crítico e o debate sobre a relação entre aqueles que detêm o poder sobre a mídia, os conteúdos da mídia comercial, a exigência democrática de um livre fluxo de informações, as diversas representações de idéias e pensamentos e o direito dos cidadãos de informar e serem informados. Alguns destes temas são abordados criticamente, como a identidade do gênero na publicidade, a imagem de sexo nos videoclipes, o papel da mídia na construção da identidade cultural, mídia e saúde, etc. (http://www.mediaed.org/).

(a cura di M. F. D’A.)

 
At 9/17/2007 2:45 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

AS CRIANÇAS E A MÍDIA (II PARTE):
ACEITAR O DESAFIO EDUCATIVO


O tema da 41ª Jornada das Comunicações Sociais, «As crianças e os meios de comunicação: um desafio para a comunicação», nos convida a refletir a respeito de dois aspectos particularmente importantes. O primeiro é a formação das crianças, para que estejam em condições de receber de maneira crítica aquilo que vêem. O segundo é a formação à consciência e ao uso consciente da mídia, que está em contínua transformação tecnológica.
De fato, é o que especifica Bento XVI no início de sua mensagem, de 20 de maio de 2007, para a Jornada: «Os complexos desafios que a educação contemporânea deve enfrentar são muitas vezes ligados à grande influência dos meios de comunicação no nosso mundo. Como aspecto do fenômeno da globalização e estimulados pelo rápido desenvolvimento da tecnologia, os meios de comunicação delineiam fortemente o ambiente cultural (cf. João Paulo II, O rápido desenvolvimento, nº3). Na realidade, há quem afirma que a influência formativa da mídia está em competição com aquela da escola, da Igreja e, quem sabe, até com aquela da própria família».
De fato, como salienta o Pontifício conselho para as Comunicações Sociais, «para muitas pessoas, a realidade corresponde àquilo que os meios de comunicação definem como tal». Episódios recentes, como a utilização do celular na filmagem de violências nas salas de aula, abusos sofridos por pessoas deficientes, fenômenos de trote e de violência generalizada, demonstram como as crianças que crescem passando uma média de quatro horas por dia diante da televisão, sozinhos em casa, absorveram a lógica do «estou no vídeo, logo existo». Os psicólogos, os pedagogos e os estudiosos dos meios de comunicação estudam há tempos sobre as relações entre o consumo televisivo e o comportamento violento dos menores. Uma grande quantidade de pesquisas realizadas em muitos países ocidentais demonstra como esta correlação seja realmente inegável.


NOVAS LINGUAGENS

O fato que muitas crianças vivem completamente inseridas no mundo dos velhos e novos meios de comunicação, que estão cada vez mais frequentemente em correlação entre eles, é confirmado pela popularidade de alguns modelos televisivos, considerados tão efêmeros quanto penosos «momentos de glória», presentes nos programas com os maiores índices de audiência, dos «reality» aos «talk show», sem falar do «trash», que hoje se tornou um gênero de espetáculo.
Dentre as preferências demonstradas pelos adolescentes italianos que assistem televisão mais do que três horas por dia, encontramos, em primeiro lugar, a figura da «veline» (Ndt: misto de corista e coadjuvante na apresentação de programas populares da televisão italiana), enquanto outros da mesma idade se concentram no mais clássico exemplo, o do jogador de futebol. De toda maneira, a coisa mais importante é aparecer, pouco importa por qual motivo, de ser «alguém» ou «alguma coisa» no Olimpo mediático, mesmo que seja apenas por um instante.
Estes são os exemplos mais negativos dos condicionamentos derivados de um excessivo e acrítico uso dos meios de comunicação. Encontramo-nos diante de uma nova geração que cresceu na frente da televisão, capaz de usar as novas tecnologias que os próprios pais, que as adquiriram e as tornaram disponíveis, muitas vezes se encontram despreparados para utilizá-las.
Tanto é verdade que hoje em dia os filmes são vistos diretamente nos celulares e a televisão pode ser assistida na tela do computador. Hoje se telefona através da internet e graças ao download se descarrega os CDs e DVDs mais recentes, se filma e se faz foto com o celular, e assim por diante.
Nas casas, o vocabulário familiar se reduziu ao gênero dos sms e se fala tendo o som da televisão no fundo, se comunica através de e-mail, se faz «visita virtual» via computador, se percorre através de bibliotecas virtuais, tanto que as fichas e arquivos de papel evocam imagens do outro século, completamente em desuso.
A situação dos nossos filhos é diversa daquela da geração precedente, pois eles abriram seus olhos tendo diante de si estes cenários de profunda, contínua e envolvente transformação tecnológica. Eles se constituem aquela que os estudiosos chamam de geração nascida «com seis dedos»: além dos cinco dedos normais da mão, o sexto é o mouse do computador.
Com o aparecimento do mundo «virtual» da internet e dos videogames criou-se uma defasagem em relação à realidade verdadeira e própria. As duas dimensões parecem muitas vezes, e para muitos jovens, como universos paralelos, com conseqüências não indiferentes no plano do processo de amadurecimento. Têm grande sucesso os sites nos quais se prevê uma segunda vida (basta verificar os milhares de registros nos poucos meses de existência do site italiano de «Second Life», que em todo o mundo já tem sete milhões de inscritos), onde a simulação reproduz todas as situações da vida real. Apenas que tudo é falso, a começar da nova identidade, que pode ser escolhida e com ela se inicia a fazer parte deste mundo fora do mundo, onde se pode ser um «qualquer coisa». Isto é, ninguém.
Assim, o grande desafio cultural de hoje é propriamente a redefinição dos limites, que muitas vezes se apresentam demasiadamente instáveis. Isto é, redefinição dos limites entre o real e o virtual, superando a divisão digital que hoje separa as gerações adultas daqueles mais jovens.


OS JOVENS: PROTAGONISTAS OU VÍTIMAS DAS MUDANÇAS?

A linguagem deles é pobre, muitas vezes recheada de termos tirados do dicionário do internauta: clicar, chatar, messagiar, deletar, são alguns dos neologismos que fazem parte de seu vocabulário quotidiano. Falta uma dimensão humana da tecnologia que esteja em condições de traçar o perímetro cultural entre o real e o virtual. Assim a aldeia global difundiu uma quantidade de modelos comportamentais desviados, ou pelo menos discutíveis.
Desta maneira, os jovens que vivem a milhões de quilômetros de distância jogam o mesmo videogame, vêem o mesmo filme, assim como, de maneira transversal, absorvem modelos e comportamentos semelhantes. Muitas vezes os adultos têm menos domínio no uso das novas tecnologias e observam, com uma preocupação resignada diante de suas próprias limitações, as crianças que navegam facilmente na internet.
As raízes das dificuldades neste campo educativo são muito bem explicadas por Marina D’Amato, professora de sociologia da Universidade de Roma, que salienta: «Cada geração tem necessidade de se encontrar também em um mundo fantástico, que serve a interiorizar o paradigma do bom e do belo, do justo e do errado, do oportuno e do útil, também em relação aos exemplos que procedem da narrativa. Hoje nos encontramos em uma condição na qual os avós e os pais contam cada vez menos histórias aos filhos e aos netos, e este papel foi assumido pela televisão. Mas, na realidade, a televisão “exila” e “con-funde”, isto é, funde os modelos morais que são frutos de ânsias e problemas mal resolvidos, muito mais que de certezas. Embora estes se transformem com freqüência, a cada três ou quatro anos, o fato de serem repropostos continuamente faz com que se justaponham uns aos outros» (ver Come mediare i media, de Mario Russo).
Se for verdade que a televisão é o meio mais usado até a adolescência, imediatamente depois surge a grande atração pela internet. Esta passagem nasce de uma sintonia com a linguagem televisiva, que na idade infantil muitas vezes é ouvida durante muitas horas no dia. Esta linguagem se baseia em uma mediação da realidade e desta maneira ela ativa um processo de recepção que é de tipo emotivo.
Neste registro emocional é mais fácil acabar envolvido por situações e figuras capazes de se proporem como modelos identificadores, preservadores de sentido e de comportamentos a serem imitados.
O poder de concentrar uma vontade emulativa em alguns personagens, que correspondem particularmente às necessidades interiores do jovem (necessidades na maioria das vezes induzidas pela publicidade ou por modelos estimuladores), tem uma forte relação com a quantidade de horas que o jovem passa utilizando os novos ou os velhos meios de comunicação.


EDUCAÇÃO NECESSÁRIA

«A formação adequada a um uso correto dos meios de comunicação é essencial para o desenvolvimento cultural, moral e espiritual das crianças… Educar as crianças a serem seletivas no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja, da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos. Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia, com a certeza de que este difícil, embora gratificante, aspecto da condição de pais, é apoiado por toda a comunidade.»
As palavras do discurso de Bento XVI definem com grande clareza o paradigma de uma justa relação entre a mídia e os menores. Uma clareza que devemos agradecer ao magistério da Igreja, no momento em que o mundo da mídia parece ignorar a verdadeira problemática educativa das crianças e as expectativas de qualidade e de segurança exigidas pelas famílias no que se refere ao uso desses meios, seja do cinema aos videogames, da televisão à internet.
Diante da utilização destorcera do meio televisivo, o mais difundido dentre os meios de comunicação, a Igreja se interroga sobre o porquê da televisão não ter um papel educativo e por que os meios de comunicação não podem ser companheiros confiáveis para os jogos na fase de crescimento da criança. O anúncio de uma recente campanha sobre o uso da mídia, promovida pelo Ministério das Comunicações, mostra os vários membros da família que estão vendo a televisão ao lado de uma criança.
Que se trate do avô ou da mãe, a mensagem é a mesma: não deixar uma criança sozinha diante de um meio que, sem o apoio crítico educativo de um adulto, pode transmitir conteúdos inadequados à idade e à maturidade daquele que o vê. Sem esquecer as responsabilidades dos produtores televisivos, empenhados na organização dos programas, o papel da família é realmente insubstituível.
Se realmente o objetivo de quem administra a sociedade de produção televisiva, ou das multinacionais produtoras de videogames ou das operadoras de celulares, é o de promover e vender o produto, o bem estar psicofísico da criança está no centro do interesse dos educadores, sejam eles os professores ou, em primeiro lugar, os pais.
Isto explica bem a mensagem do Papa, que continua a sua análise, salientando que «educar as crianças a serem seletivos no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja e da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos (ver João Paulo II, «Familiaris Consortio», 76). Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia.»


CONTEÚDO DA MÍDIA

No panorama de uma revolução da multimídia, que está modificando transversalmente os hábitos, a mentalidade, os modelos e as linguagens, deve voltar ao centro do debate a tutela daquilo que é melhor para os menores. Sem acusar a «mídia», que enquanto tal não é nem boa nem má, o importante é partir de uma a análise do produto, para assim poder individuar conteúdos que sejam de melhor qualidade para as crianças e os adolescentes. Porque a televisão é um instrumento que abre janelas de conhecimento para o mundo e, se bem utilizada, de «má professora» pode se tornar uma preciosa fonte de estímulo para o crescimento humano e cultural.
A mesma coisa vale, e com mais razão, para a «rede» que engloba e compreende tudo, e para os videogames, onde, ao invés de violência e monstros, poderia se dedicar a produzir (e isso já ocorre em certos casos) histórias instrutivas e de conteúdo interessante.
Bento XVI coloca justamente em evidência as enormes possibilidades para que seja melhorado o conteúdo deste grande campo de produção multimídia: «A educação através da mídia deveria ser positiva. Colocando as crianças diante de um meio estética e moralmente excelente, estas recebem uma ajuda para que desenvolvam a própria opinião, a prudência e a capacidade de discernimento. É importante aqui reconhecer o valor fundamental do exemplo dos pais e as vantagens de introduzir os jovens aos clássicos da literatura infantil (…). A beleza, quase um espelho do divino, inspira e vivifica os corações e as mentes juvenis, enquanto a feiúra e a vulgaridade têm um impacto deprimente sobre os comportamentos». Diante de uma decadência geral do produto televisivo, a questão da qualidade aparece ainda mais forte e vibrante em grande parte de um público formado de famílias, que pede para não ser apenas um exército indistinto de ouvintes silenciosos, mas um público em condições de exprimir suas preferências por conteúdos formativos e informativos de bom nível.
A mensagem de Bento XVI continua, com algumas importantes indicações: «Como a educação em geral, aquela da mídia requer também uma formação ao exercício da liberdade. Trata-se de uma responsabilidade que compromete. Muitas vezes a liberdade é apresentada como uma incansável procura do prazer ou de novas experiências (…). Este desejo, sentido profundamente pelos pais e educadores, que é o de educar as crianças no caminho da beleza, da verdade e da bondade, pode ser apoiado pela indústria da mídia somente na medida em que se promove a dignidade fundamental do ser humano, o verdadeiro valor da vida familiar, as conquistas positivas e as metas da humanidade. A partir disso, a necessidade de que os meios de comunicação estejam empenhados na efetiva formação e no respeito da ética deve ser vista com interesse particular e com urgência não apenas pelos pais, mas também por aqueles que têm responsabilidade cívica».
Na realidade, nos encontramos na situação de ter que reconhecer que na Itália falta uma verdadeira «cultura da criança»: a situação é tão séria que no âmbito institucional procura-se dar uma nova organização geral para verificar e controlar os conteúdos dos setores de entretenimento, como os videogames, que até agora estão submetidos apenas a códigos de auto-regulamentação, feitos e codificados para uso e consumo pelas indústrias produtoras.
Uma vez mais, o primeiro e indispensável apoio à criança só pode vir da família e de uma relação mais estreita com os professores e educadores, exatamente como salienta Bento XVI, lembrando-nos que a preocupação educativa dos pais não deve se tornar uma preocupação genérica, mas uma atenção constante a tudo aquilo que diz respeito aos filhos.

A INDÚSTRIA DA MÍDIA

1) A TELEVISÃO

Se a televisão convencional se apresenta como um ramo de atividade já «maduro», no entanto se apresenta no horizonte a situação da mídia digital (satélite ou a cabo), também como uma plataforma que consente a ligação entre televisão, internet e outro tipo de mídia através do computador. No que se refere à qualidade da programação, apesar dos inúmeros bons propósitos anunciados no âmbito institucional, parece pequena a atenção às exigências dos menores em suas diversas faixas etárias. A programação para os menores, na realidade é confinada em redes e horários particulares, enquanto o resto da programação na faixa horária considerada «para todos» muitas vezes apresenta conteúdos inadequados aos jovens. Mas, quais são as expectativas das gerações de jovens no que se refere à televisão? É realmente verdade que preferem o «trash», os jogos com prêmios absurdos e as «velines»?
A partir de uma pesquisa recente feita pelo instituto Censis sobre «Comunicação, pluralismo social, sociedade aberta» (2005) surge que a relação entre os menores, e em particular dos adolescentes entre os 14 e 18 anos de idade, e a televisão é determinada por elementos de forte contradição e de passividade. Nessa faixa etária, 100% deles vêem televisão praticamente todos os dias, 86% acompanham um pouco de tudo, com uma relevante predileção pelos filmes (72%), por esporte (32%) e pelos «reality shows» (18%).
No entanto, a amostragem entrevistada não está realmente satisfeita com aquilo que vê. De fato, 36% dos adolescentes denunciam a vulgaridade difundida nos programas e 25% criticam a superficialidade. Dentre eles, 46% consideram a televisão como um meio que «invade», ao mesmo tempo em que é interessante notar que 25% consideram que em geral a programação televisiva alimenta nas crianças menores uma visão consumista da vida. Destes dados surge o contraste entre a procura de distração e a reprovação daquilo que lhes é proposto pela programação. Isto significa que o alto índice de procura não é um indicador de satisfação.
Considerando o axioma de que a televisão seja onipresente, fica claro que são os próprios jovens a pedirem uma maior atenção aos conteúdos: menos violência e menos vulgaridade. A exigência de uma regulamentação diversa, diz claramente o relatório do Censis, «não vem somente daqueles, pais e educadores, que estão preocupados pela possível influência negativa sobre os menores, mas se exprime nitidamente também através dos adolescentes, pelo menos de uma parte mais esperta e consciente dentre eles».
Para tutelar melhor os direitos dos menores, desde 2002 foi instituído junto ao Ministério das Comunicações um código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual aderiram os produtores de televisão, seja no âmbito nacional como local. Baseando-se nos princípios sobre a matéria existentes na Constituição italiana e na Convenção dos direitos da criança, estabelecida em 1989 pela ONU, a comissão que controla sua aplicação avaliou em todos estes anos de atividade os milhares de casos em que foram violadas as normas de tutela, que prevêem a transmissão de programas e imagens adequadas a um público de menores de idade durante aquela que é chamada de «faixa protegida» da programação televisiva (das 7h30 às 22h30), intervindo com denúncias e sanções, que nos casos mais graves foram aplicadas pela Autoridade de garantia no setor das comunicações. Para o futuro, esta comissão deverá se transformar em um organismo mais amplo de controle, que se chamará «Mídia e menores», que além da televisão deverá monitorar também os setores dos vídeos-telefone e dos videogames, além da internet, que é o campo de maior risco.

REGRAS DE TUTELA EM OUTROS PAÍSES

É diversa a situação em outros países, como por exemplo na Grã Bretanha, onde o sistema de regulamentação da mídia é estruturado e complexo e foi atualizado nas últimas décadas, com uma particular atenção à tutela dos menores. As inovações tecnológicas neste setor levaram as normativas inglesas a uma série de novas disposições, como por exemplo, a visão em casa de vídeo exclusivamente para adultos, e que fora de casa seriam vetados aos menores, ou o combate à praga mundial dos sites internet para os pedófilos, que contenham material pornográfico ou com conteúdos que possam esconder o aliciamento de menores (ver a Protection Childres Act, de 1978).
A programação televisiva é regulamentada pelo Broadcasting Act (1996), de onde deriva a instituição da Broadcasting Standard Commission (BSC), um órgão independente de controle que estabelece as normas de avaliação e classificação dos programas, também no que se refere aos conteúdos violentos ou que possam ofender a decência pública (site oficial www.bsc.org.uk). Este organismo BSC funciona internamente à estrutura do Broadcasting, supervisionando e regulamentando todas as emissoras de televisão e de rádio, via cabo ou por satélite. Sua tarefa é a de elaborar os códigos de conduta e de aplicação de modelos que respeitem a justiça, além de monitorar os modelos, verificando que respeitem as leis. Com a transmissão de programas com conteúdos considerados inadequados aos menores de várias idades, há alguns anos a televisão inglesa adotou o sistema «watershed», um «separador de águas» entre um horário de programação familiar e outro para os adultos. Todo o sistema televisivo inglês se apóia sobre a responsabilização das famílias, pois sem a colaboração delas qualquer código de modelos para os programas é praticamente inútil.
Na França, está vigorando já há anos um código através de sinais televisivos, que entra em função para assinalar os programas inadequados aos menores. A avaliação do programa televisivo é feita pelo Conseil Supérieur de l’Audiovisuel (CSA), uma autoridade administrativa independente, que controla a difusão dos filmes e outras transmissões em vários canais privados, nacionais, regionais ou locais. A normativa francesa (lei 719/2002) veta a transmissão de programas que possam prejudicar gravemente a integridade física, mental e moral dos menores, porque divulgam conteúdos de pornografia ou de violência gratuita. As transmissões são classificadas por um código de sinais que, em conjunto com um sistema organizado de faixas horárias de programação, garante às famílias mais clareza sobre os programas destinados aos menores.
Na Alemanha, o tema da infância tem particular atenção da legislação, que considera desde o nascimento o início dos direitos fundamentais do cidadão. A tutela é disciplinada no âmbito público pela JSchG (desde o dia 26 de fevereiro de 1985), enquanto a lei GjSM se ocupa do controle sobre a difusão de publicações e conteúdos mediáticos considerados danosos para os menores. A regulamentação no setor televisivo é feita segundo as normas do acordo sobre a radiodifusão dos Lander federais, que as entidades para a mídia nesses Lander adotaram por base para o estabelecimento das diretivas que tutelam o interesse dos menores nas emissoras privadas. Não são admitidas transmissões que incitem o ódio racial, que exaltem a violência ou a guerra, que ofendam a dignidade do homem, que sejam de gênero pornográfico, que mostrem pessoas moribundas ou com sofrimentos que ofendam a dignidade humana. Os responsáveis pela programação, escolhendo os horários das transmissões, devem cuidar para que os menores não vejam programas que podem prejudicar o seu bem estar psíquico, físico ou mental. As transmissões inadequadas às crianças menores podem ser transmitidas somente depois da autorização da entidade competente do Land interessado.
Os responsáveis pela organização dos programas televisivos em âmbito nacional devem nomear encarregados pela tutela dos menores, que atuam no momento da aquisição, da projeção e da realização dos programas. As emissoras privadas fundaram em 1993 uma associação de autocontrole voluntário da televisão («Freiwillige Selbskontrolle Fernsehen», FSF), à qual devem ser apresentados programas particulares, antes da sua transmissão, e suas avaliações consideradas nas decisões das entidades de controle da mídia nos Lander federais. Existe ainda o órgão comum do cidadão para a tutela dos menores, dos programas, da competência mediática e controle da mídia (GSJP), do qual faz parte um integrante da entidade para a mídia nos Lander federais, que dá o seu parecer a respeito de algumas séries, filmes e espetáculos mais ou menos adequados aos menores. Este órgão, o GSJP, decide sobre pedidos de mudança de horários de transmissão de filmes proibidos para menores, controla a forma de novos programas e experimenta novas disposições para a tutela dos menores na televisão digital. A peculiaridade da jurisdição alemã, seja no setor televisivo como no cinematográfico e da mídia em geral, é a minuciosa atenção às exigências com o desenvolvimento do menor e aos riscos que este pode correr com a observância incorreta das leis.
Nos Estados Unidos, é possível consultar via internet um «guia televisivo para os pais» (ver o site www.mpaa.org), que prevê algumas categorias de audiência aplicadas aos programas televisivos transmitidos a todo o público. Este guia organiza várias siglas para identificar a categoria de audiência para cada transmissão: vai-se do TVY (para todas as crianças) ao TVG (para todos), através de várias faixas etárias, que correspondem à passagem da primeira à segunda infância e desta à adolescência. Depois tem o TVPG («parental guidance», visto na presença de um dos pais), o TV14 («parent strongly cautioned», séria advertência aos pais), para os programas que contêm cenas de sexo e de violência. Enfim, há o TVMA, que prevê um «mature audience only», ou seja, destinado a um público de idade superior a 17 anos, última fronteira para os conteúdos considerados «restricted».
Estas avaliações foram elaboradas baseando-se nas opiniões dos próprios pais e são fáceis de serem encontradas e compreendidas. Esta linha de «guia de televisão para os pais» pode ser usada juntamente ao «v-chip», que é um dispositivo de filtro instalado na maior parte dos mais recentes modelos de aparelhos de televisão, para permitir aos pais de bloquear os programas inadequados.

FICHA 1
Brasil: «O que eu penso da tv»
No Brasil, a audiência infantil é muito alta: aproximadamente 30 milhões de crianças vêem televisão pelo menos durante três horas por dia. Explica a profa. Rosália Duarte, do departamento de Ciência da Educação, da PUC do Rio de Janeiro, que «as crianças são muito perspicazes, mas nós podemos e devemos ajudá-las a ampliar o seu quadro de referências, para que possam discutir ainda melhor sobre o conteúdos daquilo que vêem. Para isso temos necessidade, antes de tudo, de ouvir aquilo que elas têm a dizer sobre o assunto e de dialogar com elas. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e muito mais freqüente, a outras atividades culturais». No âmbito de uma pesquisa feita através de um questionário distribuído nas escolas, intitulado «O que eu penso da tv», apareceu que «as crianças querem seriamente ser ouvidas sobre aquilo que pensam da tv, mas sentem que sua opinião é considerada pouco importante e não estão contentes com o excesso de imagens de violência exibidas na televisão, principalmente a violência “real”, definida como aquela transmitida nos telejornais. Eles adoram ver televisão e não importa o que os adultos pensam e dizem a respeito disso. A eles agradam quase todos os tipos de programas transmitidos: novelas, desenhos animados, programas de humor, filmes, seriados, mas isso não faz deles espectadores “idiotas”, pois fazem críticas muito interessantes, pertinentes e bem elaboradas sobre o que consideram feio ou inadequado na televisão. Para a maior parte deles, a televisão se oferece como principal opção de divertimento (em alguns casos, a única), o que significa um dado muito preocupante. Mas, o que chamou mais a nossa atenção é o grau de experiência com o qual essas crianças analisam a televisão: são expertos e demonstram conhecer a televisão também do lado de dentro, inclusive as linguagens que ela utiliza, a sua estrutura de produção, a sua lógica interna e as suas maneiras de intervenção».
As crianças aprendem os valores e os não-valores através da televisão, não resta dúvida, mas demonstram ter senso crítico a respeito deste assunto, quando afirmam nos textos que os programas transmitidos na tv podem lhes ensinar «a serem bons, a ter coragem e a fazer o bem, a cuidar da natureza e de si mesmos, a serem honestos e a lutar por aquilo que desejam», mas também «a serem cruéis e mentirosos, a roubar e matar, a não respeitar os pais e a comprar tudo aquilo que não têm necessidade». Falando sobre a validade do ensino através da mídia, a profa. Duarte salienta a necessidade de «ouvir aquilo que têm a dizer sobre o assunto e a dialogar com eles. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e mais freqüente, a outras atividades culturais».

FICHA 2
Observadores internacionais
Os dados examinados em janeiro de 2006 pelo OssCom, que é um centro de pesquisa da mídia, deixam evidente a tendência a realizar uma forma de co-regulamentação, onde a ação legislativa dos Estados membros se integra com medidas de auto-regulamentação por parte dos produtores, broadcasters e profissionais da comunicação sob o efeito de controles e sanções. São dois os instrumentos mais utilizados no âmbito europeu, observando-se as diretivas previstas no artigo 22 de «Televisão sem fronteiras»: a definição de faixas horárias protegidas (watershed) e os sinais mostrados na tela (determinados por um sistema de «rating»). Apesar disso, aos campos tradicionalmente problemáticos da violência e da pornografia se juntam novos campos de risco para os menores: a vulgaridade, abusos e dependências de substâncias, linguagem e comportamento vulgares, discriminações e abusos, violações e ofensas à dignidade humana. Os critérios de avaliação dos programas se constituem um problema que é partilhado por muitos países da União européia, ao mesmo tempo em que se prepara uma uniformização internacional dos sistemas de classificação (ver mais adiante, Nicam), baseados na visualização de cinco ícones que ilustram simbolicamente qual é a problemática do programa que está sendo analisado e para quais idades ele é desaconselhado.
Deve ser assinalada a atividade online da European Medi@culture. O projeto é promovido pela Comissão Européia, em Bruxelas, no quadro das iniciativas «e-Learning», administrado pelo centro mediático de Baden-Württemberg. O site apresenta informações sobre a educação à mídia na Europa, particularmente na França, Áustria, Finlândia e Alemanha. A seção de projetos de multimídia agrupa os projetos sobre a mídia desenvolvidos por escolas e associações de jovens ao longo do tempo (ver http://www.european-mediaculture.org).

FICHA 3
África do Sul: Encontro mundial sobre a mídia para a infância
Este encontro trienal se realizou no último mês de março em Johannesburg, na África do Sul, com a participação de expertos do setor representando diversos países. Em conjunto se discutiu sobre a necessidade de uma programação adequada às crianças, procurando entender de que modo a violência na mídia pode influir sobre a psíquico dos menores.
Mas, no 5º Encontro mundial sobre a mídia para a infância apresentaram-se também muitas crianças provenientes de todo o mundo e empenhadas em discutir sobre o difícil tema da «Mídia como instrumento de paz e de democracia global». Vieram guiados por grupos de adultos, dentre eles as diversas organizações católicas que há anos trabalham para promover regras para o bem da infância, a serem respeitadas nas transmissões de rádio e televisão através de códigos de regulamentação que devem ser redigidos ou, como em alguns casos, apenas atualizados. Em muitos países do sul do mundo as novas tecnologias de multimídia já estão muito disseminadas e seu uso merece uma atenção particular para tutelar o público mais jovem.
Especialmente na África, explicou o organizador do encontro, Firdoze Bulbulia, começa-se a examinar o projeto de um «Media center» para as crianças, que possa produzir e distribuir transmissões de rádio e de televisão destinadas ao público mais jovem, com o objetivo de realizar um canal televisivo pan-africano dedicado à infância. Os organizadores do encontro estão também trabalhando no projeto de uma aliança africana dos meios de informação e de comunicação, seguindo o modelo daquela já existente na América latina.

2) INTERNET

Na Itália, 47% das famílias italianas têm um computador em casa, um dado relevante mas sempre muito baixo em relação à média dos outros países europeus. O uso da internet por parte dos adolescentes e jovens, e a familiaridade que têm com tudo aquilo que pode ser digitado ou «descarregado» da internet, apresenta não poucos problemas. Pela sua própria natureza de rede de comunicação global, o problema se apresenta em ótica internacional, procurando garantir a tutela dos menores através de precisos acordos com os provedores para um efetivo controle de conteúdo. No campo italiano, até 2006, a tutela dos menores tinha sido deixada nas mãos dos próprios provedores, que em 19 de novembro de 2003 assinaram um acordo de auto-regulamentação: o Codice Internet e Minori. Embora o acordo tenha sido estipulado entre os representantes dos vários provedores diante do Ministério para a Inovação e a Tecnologia, no entanto ele permanece um acordo privado, com lacunas, principalmente no que se refere às sanções que muitas vezes devem ser aplicadas. Em 2006, na seqüência de numerosos casos de violência sobre menores, muitos dos quais realizados através da difusão de material pedo-pornográfico (quando não se tratava de verdadeiro e próprio aliciamento de menores via internet), foi promulgada a lei 38 de 6 de fevereiro de 2006: «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet».
Enfim, como aplicação da lei 38/2006, em fevereiro da 2007 foi publicado um decreto determinando os requisitos técnicos dos instrumentos de filtragem que os provedores da rede internet devem utilizar para impedir o acesso aos sites já assinalados pelo Centro nacional contra a pedo-pornografia. Mas, isso não basta para superar as dificuldades e impedir que os menores possam navegar de maneira arriscada na «rede das redes».
Atualmente foi reativada a comissão anti-pedofilia e desvios de menores através da internet, o «Ciclope», que tinha sido instituída junto ao Ministério para a Eqüidade, do governo italiano, e que ficou inativa por um ano, até a sua reestruturação junto ao Ministério da Família. Está também para entrar em função um site dedicado ao uso da internet, junto ao Ministério das Comunicações, e um número telefônico de emergência gratuito, organizado pelo mesmo ministério e por «Save the children», que poderá ser utilizado por qualquer cidadão que queira assinalar algum abuso, desvio ou pedo-pornografia. Dentre as iniciativas mais recentes, deve ser assinalado o site www.tiseiconnesso.it criado pelo Ministério das Comunicações italiano, sempre em colaboração com «Save the children», onde é colocada à disposição uma série de informações sobre o conteúdo de certos sites, seja para os pais como para as próprias crianças, em conjunto com a campanha televisiva que tem como slogan «A melhor maneira de ajudar o seu filho a não usar incorretamente as novas tecnologias é conhecê-las».
Deve ser salientado também o fato de como a rede se tornou um grande mercado online. Para alguns produtores, o «e-commerce» de brinquedos corresponde já a 4% das vendas, e apenas em 2005 as vendas online corresponderam a 37.600 ações de compra. As razões para investir no processo online são múltiplas: desde a possibilidade de evitar as dificuldades logísticas de distribuição dos produtos, à ampliação de ofertas diferentes de produtos e também a possibilidade de envolvimento do cliente através de campanhas de mala direta e a criação de comunidades virtuais em torno de alguns produtos.

FICHAS:
Pedo-pornografia e internet
Em março de 2006, entraram em vigor as novas medidas diretas de combate e repressão ao fenômeno de exploração sexual dos menores e a pedo-pornografia, estabelecidas pela lei 38/2006 – «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet» foi publicada no Diário oficial em 15 de fevereiro de 2006, nº.38 – com a qual foram substancialmente modificados e integrados os artigos 600bis e seguintes do Código Penal italiano.
A lei confirma os artigos 527, 528, 529 e 725 do Código Penal italiano, que punem os «atos obscenos em local público, publicações, espetáculos obscenos, desenhos ou figuras que ofendem a decência pública».
Porque em muitas publicações, transmissões televisivas e anúncios publicitários, mesmo que não tenham declaradamente um caráter pornográfico, imagens de crianças e adolescentes são apresentadas de maneira explícita ou mais ou menos sutilmente ilusória e de forma falsa, pede-se um novo empenho das instituições competentes para que sejam observadas as normas em vigor e, se preciso for, que façam apelo aos órgãos de Polícia, o Instituto de autodisciplina publicitária, o Ministério das Comunicações, a Polícia postal ou a «Comissão tv e menor».

3) CINEMA

Confirmando as disposições da Constituição italiana, no que se refere ao direito e ao dever das famílias de serem protagonistas na educação de seus filhos, para muitos é chegada à hora de reelaborar a legislação que define o conceito de «censura» (a lei 161/1962 prevê a possibilidade de negar a autorização de abertura às salas de cinema ou de fazer cortes nos filmes, mesmo em função de um público adulto), que hoje está superado. É preciso com urgência estabelecer um critério de tutela dos menores não apenas no que se refere aos filmes que vêem nos circuitos cinematográficos, mas também sucessivamente em casa, muitas vezes em horários acessíveis na programação da televisão.
Uma avaliação correta e preventiva de um filme permite à família ter à sua disposição os instrumentos para escolher se um espetáculo é mais ou menos oportuno, conhecendo a trama, os eventuais conteúdos mais sensíveis, a classificação que a obra recebeu em outros países, etc. Por isso, é justo que a legislação seja revista, uma operação que requer atenção e perspicácia da parte das instituições em um momento de transição da mídia, como este que estamos vivendo, quando esta se tornou realmente um importante componente na educação dos menores.
Não faltam filmes que atraem o público por causa de seu conteúdo de violência, e no entanto entram no circuito cinematográfico sem qualquer restrição de idade. Para um filme que é notícia nos jornais, existem muitos outros com conteúdos duvidosos ou até mesmo perigosos que conseguem passar através do filtro da comissão de revisão cinematográfica, que atualmente funciona junto ao departamento de cinema do Ministério dos Bens Culturais.
Ao mesmo tempo em que existe um projeto de lei do ministro dos Bens culturais, que deve ainda iniciar os trâmites parlamentares, novas situações se apresentam na Itália, com a autocensura de filmes, feita pelos produtores ou distribuidores cinematográficos, com a introdução de novas e mais específicas faixas etárias para as restrições visando os menores a partir dos 10 anos de idade. As restrições serão feitas baseando-se em uma avaliação classificatória dos conteúdos das obras e sucessivamente serão ainda analisadas por uma comissão de psicólogos, educadores e pais.
Este sistema se inspira no modelo americano da Motion Picture Association of America (MPAA), que há 40 anos representa os interesses da indústria do audiovisual americana no mundo. Funcionando a partir de regras bem precisas (estabelecidas ao longo dos anos, também segundo as sentenças dos tribunais federais nos vários Estados americanos e em base aos protestos dos cidadãos), a autocensura americana prevê a existência de uma única comissão competente para determinar as restrições do PG12 ao «restricted» 17 anos. Esta comissão é composta exclusivamente de pais, considerados os primeiros depositários da educação dos filhos, e representam transversalmente a audiência. Importantes sanções econômicas asseguram que o mecanismo de autocertificação corresponda efetivamente aos interesses dos cidadãos. No site da Motion Picture estão disponíveis aos pais os pontos de referência para a avaliação das obras de entretenimento e são publicadas as restrições aplicadas a cada filme que está em exibição nas salas de cinema. Geralmente as avaliações parecem muito mais severas em relação a outros países. Tudo isso, nos vários anos de sua aplicação, deu uma qualificação à indústria americana e seu correto serviço prestado aos ouvintes. Qualquer estrada que se pretenda seguir na Itália, é importante para as famílias que seja estimulado um mercado de produção adequado à infância: é justo que o mecanismo da indústria cinematográfica continue com o seu ritmo de produção, mas não é justo confundir as classificações de acesso ao produto, como qualquer indústria sabe muito bem.
No que se refere às normas européias de classificação dos filmes, e em geral de todo «entertainment» (neologismo anglo-saxão, que, no entanto encontra sua raiz etimológica na relação entre educação e jogo) acessível aos menores, deve ser citado o sistema NICAM, que funciona na Holanda há alguns anos. Fundado em 1999, o NICAM (Nederlands Instituut voor de Classificatie van Audiovisuele Media) se baseia na lei Media Act, onde os programas de grupos que tiveram a autorização para atividades de «broadcasting» não devem incluir obras audiovisuais que prejudiquem o desenvolvimento físico e psicológico de pessoas com menos de 16 anos de idade, seguindo as diretivas da União européia («Televisão sem fronteiras» IV).
O sistema de classificação preventiva funciona também na Grécia, com a lei 1.597, de maio de 1986, que prevê que antes da projeção nas salas de cinema, cada filme seja submetido pelo produtor ou pela sociedade de importação à Comissão para a juventude, que classifica o filme seja como adequado aos menores, ou proibido aos menores de 13 anos, ou de 17 anos ou ainda, nos casos mais graves, severamente inadequado aos menores. Esta comissão é um órgão do Ministério da Cultura e foi concebida procurando-se estabelecer certa proporcionalidade, sendo composta de representantes do Estado (Ministério da Cultura), das categorias ligadas ao cinema, de psicólogos especializados na educação, de sociólogos, dos jovens, dos educadores e dos pais.
Na Áustria, está em vigor um sistema de avaliação complexo, instituído em base a um princípio constitucional federal que confia a tutela dos menores, no que se refere ao cinema e em geral aos meios de comunicação de massa, à competência específica dos Lander. A lei nacional que engloba a regulamentação da mídia é a ORF-ACT, ou seja, a Austrian Broadcasting Corporation nº. 379/1984, que estabelece quais os critérios sobre os quais deve se basear a proteção aplicada a programas e filmes transmitidos na televisão ou através de outros canais mediáticos. No que se refere à exibição dos filmes, a avaliação preventiva das obras cinematográficas, para que sejam decididas as faixas etárias adequadas, é regulamentada pela lei austríaca para a tutela dos menores, a «Jugendschutzgesetz», aplicada através das leis dos Lander federais. Esta lei estabelece nove faixas de restrições de público a partir dos seis anos de idade, com uma sucessiva graduação que prevê restrições para 10, 12, 14 e 16 anos de idade. Para supervisionar o sistema de classificação cinematográfica, existe uma comissão junto ao Ministério da Educação, em Viena, que comunica seu parecer sobre a idoneidade dos filmes às autoridades locais. Geralmente e de maneira individual os Lander adotam as decisões da comissão, e é em âmbito local que se decide de sua aplicação.
Na Espanha, o artigo 20 da Constituição reconhece o direito do cidadão a exprimir e difundir livremente seu pensamento, suas idéias e suas opiniões através de qualquer meio de divulgação. Se por um lado o exercício de tais direitos «não pode ser restrito através de nenhum tipo de censura prévia», o mesmo artigo especifica que «estas liberdades têm o seu limite no respeito dos limites reconhecidos pelas normativas que exprimem este respeito, especialmente no direito à honra, à privacidade, à própria imagem e à proteção da juventude e da infância».
Baseando-se neste princípio, a qualificação dos filmes (Real decreto 81/1997) e das obras audiovisuais é feita antes de sua difusão, através do Instituto de cinematografia e das artes audiovisuais (ICAA), uma entidade autônoma, mas ao mesmo tempo ligada ao Ministério da Educação e Cultura através da secretaria de Estado para a cultura (ver site www.mcu.es).
A subdireção geral de fomento à indústria cinematográfica e do audiovisual, que faz parte do ICAA, se ocupa, dentre outras funções, da classificação em faixas etárias dos filmes e das outras obras audiovisuais em vista de sua exibição pública e para a sua distribuição. A comissão se encarrega de divulgar as informações sobre os filmes e programas audiovisuais, com classificação que vai desde as «salas X» até as restrições para cada faixa etária do público.
Os filmes de caráter pornográfico não podem receber subvenções do Estado e sua projeção nas salas prevê uma taxa suplementar, destinada em parte para estimular um fundo de proteção cinematográfica. A projeção destes filmes pode ser feita somente nas «salas X», onde não podem ser apresentados outros tipos de obras cinematográficas e onde é proibido o ingresso de menores de 18 anos.

CINEMA NA TV

Devido ao alto consumo de programas de televisão por parte dos menores e levando-se em conta as diretivas da União européia, que promovem a auto-regulamentação no âmbito nacional das emissoras de tv e a participação das famílias nesta obra educativa, há alguns anos estão em vigor na França, na Holanda, na Grã-Bretanha, na Grécia e na Itália os códigos de sinais, que servem para identificar tanto os filmes projetados na salas de cinema como aqueles transmitidos na televisão. A tutela dos menores no âmbito da televisão foi também feita adotando-se o chamado sistema «watershed» (separador das águas), que funciona segundo uma seleção de faixas horárias protegidas, algumas aconselhadas à visão dos menores, outras aconselhadas a todos e outras ainda, principalmente na programação noturna, indicadas somente a um público adulto.
A faixa de idade determinada pela classificação preventiva dos filmes tem obviamente uma repercussão na programação das chamadas faixas horárias protegidas ou distintas nas emissoras de televisão pública em todos os países europeus. A definição das linhas de conduta comuns está à base dos acordos de auto-regulamentação e de co-regulamentação dos programas de televisão, estabelecendo-se um código de procedimento comum para as emissoras tanto públicas como privadas. Criou-se assim uma base normativa, que é assumida pela autoridade do Estado e que recebe a confiança dos consumidores das emissoras públicas ou privadas que adotam este sistema de auto-regulamentação.
Para tornar visível aos adultos as classificações dos programas apropriados aos menores, muitas emissoras européias adotaram um sistema de sinais que através de símbolos, números, cores e sinais acústicos advertem ao público a respeito daquilo que está para ser transmitido.
Mas, apenas este sistema, assim como o de filtragem (tipo v-chip), não basta para garantir uma verdadeira tutela dos menores diante de um conjunto de imagens difíceis de serem decodificadas por um jovem. Deve-se pensar às imagens de guerra dos telejornais, dos filmes escabrosos ou às informações sobre os crimes hediondos, que muitas vezes têm como ambiente o próprio núcleo familiar.
É na colaboração entre Estado, produtores de programas audiovisuais e famílias que pode ser fundamentado um autêntico respeito dos menores que encoraje o crescimento positivo da criança em base aos valores fundamentais da pessoa humana.

4) CELULARES COM VÍDEO

Hoje a difusão dos celulares com vídeo chegou à Itália ao índice se 134%, o que significa que muitas pessoas possuem pelo menos dois celulares, inclusive os jovens e as crianças, que recebem este instrumento dos próprios pais. De fato, de duas crianças entre 8 e 13 anos de idade, uma delas tem um celular no bolso. Aquele que poderia ser um instrumento para controlar melhor os deslocamentos e as necessidades dos filhos, se revela no entanto um perigoso meio que pode expor a outro tipo de utilização por parte dos menores, que não se separam nunca do próprio celular, nem mesmo durante as aulas, como lamentam vários professores. Apesar do código de auto-regulamentação assinado pelas principais operadoras (Código de conduta para a oferta de serviços a pagamento em tutela dos menores), na realidade os novos serviços opcionais do celular o tornaram um «personal computer» capaz de permitir novos usos que antes não tinham.
Os desenvolvimentos tecnológicos que estão se verificando no campo da telefonia móvel – particularmente no que se refere à sinergia com a internet e a adoção dos sistemas DVB de vídeos-telefone – contribuem a aumentar a oportunidade de comunicação também para as novas gerações e, ao mesmo tempo, repropõem em novos termos a questão da tutela dos menores. As evoluções já previstas ulteriormente para os próximos anos e o número sempre crescente de pessoas envolvidas, pedem uma grande consciência social e uma constante atenção das pessoas e órgãos encarregados de garantir os direitos dos cidadãos.
Neste contexto devem ser reafirmados os direitos dos menores no campo da comunicação, dentre os quais certamente não está em último lugar aquele que se refere também à segurança diante dos riscos de indução a comportamentos ilícitos ou de acesso a conteúdos nocivos ou indesejados. Também neste campo é essencial o papel dos pais e, em geral, de todos aqueles que são chamados a ter uma função educativa. A maior segurança das crianças e dos jovens quanto ao acesso a conteúdos ilegais é um ponto que deve merecer atenção também através da maior conscientização dos pais e das mães, que devem se capacitar a conhecer e utilizar estes meios.
Para a «alfabetização» dos pais na utilização da mídia devem colaborar também as instituições públicas, promovendo um uso positivo das novas possibilidades tecnológicas. Às empresas cabe a responsabilidade de colocar no mercado um produto que dê garantias no que se refere à sua utilização pelos menores, superando os limites estabelecidos pelo código de auto-regulamentação assinado pelas operadoras de celulares. Devem também oferecer maiores informações aos adultos que assinam um contrato de utilização, como por exemplo a adoção de bloqueios automáticos de acesso a conteúdos nocivos, se o celular passa às mãos de um menor de idade.

5) VIDEOGAMES

Trata-se de uma indústria global, que conquistou os jovens e não apenas eles. Os números relativos à difusão repentina dos videogames indicam que existem 250 mil sites de videogames, cada um deles propõe uma série de títulos, muitos deles recheados de cenas de sexo e de violência. Uma pesquisa recente do Instituto italiano de medicina social (IIMS) coloca em evidência, entre outras coisas, a escassa informação por parte dos adultos a respeito dos videogames utilizados pelos filhos, o predomínio de temas violentas em mais de 30% de títulos não aconselhados aos menores, o predomínio de personagens virtuais normais que podem se tornar especiais, realizando ações extraordinárias.
Mas, o ponto de risco mais elevado se refere aos pequenos jogadores de videogames, crianças entre seis e nove anos de idade que se submetem a entrar tão intensamente no jogo virtual que chegam a formas de dissociação da realidade e solicitam um monitoramento muito atento da parte dos adultos. A mesma pesquisa indica a presença de videogames em 25% das famílias com crianças de três a cinco anos de idade e em 65,2% das famílias com crianças entre seis e 10 anos de idade. O que produz efeitos negativos no âmbito cognitivo das crianças não parece ser especificamente o meio, mas muito mais os elementos que criam a excitação, tais como a velocidade de produção do estímulo e da resposta, a velocidade das imagens, os efeitos especiais, os contrastes, a fragmentação da história, o binômio rumor-ação. O uso prolongado do jogo inibe, segundo alguns psicólogos, a área da capacidade crítica, provocando passividade e ao mesmo tempo agressividade na criança. Mas, não queremos demolir os videogames, porque existem aqueles que são muito adequados aos mais jovens, com valores de informação e de educação, seja também porque o uso deste meio é na realidade um passo na preparação da criança ao sucessivo e mais sofisticado, que é o uso da internet.
De qualquer maneira, os dados relativos à venda destes produtos de entretenimento mostram um crescimento em todos os lugares e a difusão deste meio é acompanhada de uma aceitação social (ou seria uma resignação?) sempre maior.
É urgente ampliar o percurso de conhecimento e das estratégias internacionais, para monitorar um mercado que está cada vez mais vasto. Parece urgente estabelecer modalidades operativas para o controle dos conteúdos e do sistema de sanções, seja para o produtor como para o vendedor dos serviços. O código de auto-regulamentação Pegi (derivado em 2003 do sistema de avaliação e classificação holandês, Nicam, que assinala os conteúdos inadequados aos menores), adotado pelos industriais de «entertainment» que produzem videogames, é a única forma de auto-regulamentação existente atualmente e que prevê sanções (raramente aplicadas, mesmo diante de casos graves evidentes) para os produtores que colocam no comércio os jogos com indicações de faixas etárias apenas aproximativas.
O código Pegi, ao qual a associação européia Isfe adere em 2002, é evidentemente insuficiente na sua função declarada de «fornecer aos consumidores as informações mais oportunas» e expostas no selo de produção. E, como o setor dos videogames tem hoje um volume de negócios que ultrapassa os 740 milhões de euros, envolvendo 24 milhões de jogadores (43% da população a partir dos quatro anos de idade), com uma venda dos produtos classificados para maiores de três anos de idade que chega aos quase 48% dos consumidores. É um dado que define o impacto deste gênero de meio sobre a infância e a adolescência, mostrando toda a sua periculosidade, seja pelo consumo de conteúdos inadequados, seja pelo excessivo número de horas dedicado neste passatempo, muitas vezes solitário e sem a presença de um adulto ao lado. Se for verdade, como sustenta a indústria, que a produção de videogames violentos é apenas uma mínima parte do mercado, é também verdade que esta representa a fatia mais importante do retorno econômico.
O interesse pelos videogames é alimentado pela sinergia com os filmes que inspiram o jogo homônimo e que torna sempre mais atrativo este gênero, principalmente para os adolescentes. Desta maneira é importante também neste campo o estabelecimento de regras precisas em defesa dos consumidores dentre o público jovem, mais exposto aos riscos destas novas formas de entretenimento cada vez mais sofisticadas e envolventes, por causa da combinação entre narrativa e efeitos gráficos.

6) PUBLICIDADE

O problema da tutela dos menores diante da publicidade se apresenta como um corolário, dentro do quadro mais amplo que regulamenta a difícil relação entre a mídia e as crianças. A televisão, e portanto também a publicidade, se constitui em uma fonte de perigo para os menores, isto é, para a maior parte das crianças, principalmente em idade pré-escolar, que devem saber fazer a diferença entre a publicidade e o resto da programação, e entre os programas de ficção e a realidade. Com essas considerações não significa que exista uma acrítica rejeição da publicidade em si mesma – à qual se reconhece, no entanto, onde proceda corretamente, uma função positiva no processo de formação, de crescimento crítico e de socialização do menor –, mas existe a necessidade de prever um sistema de regras destinado a garantir-lhe um uso adequado.
O efeito dos anúncios publicitários é tão grande que em alguns países estão sendo tomadas medidas drásticas a respeito. No Reino Unido, por exemplo, recentemente foram vetados os anúncios publicitários durante os programas destinados às crianças até nove anos de idade, a partir de 1º de janeiro de 2008 a medida se estenderá à programação para os jovens até 15 anos de idade e até o final de 2008 serão vetados em todos os canais dedicados aos menores. Apesar de se reconhecer que a publicidade serve para financiar os programas, aqueles dedicados às crianças terão que recorrer a outras fontes. Também na França começa a se impor uma «linha dura» a esse respeito: visto a alta incidência de publicidade de merendas, de sucos e doces em geral, a partir de agora os anúncios dedicados às crianças deverão ser precedidos de uma espécie de aviso, que orientará para uma alimentação adequada.
Mas, por que as crianças são tão frágeis diante dos apelos da publicidade? Na Itália, explica Paolo Landi, secretário geral da Adisconsum (Associação de defesa dos consumidores e do ambiente»), em um capítulo de seu estudo «Crianças da multimídia»: «Se consideramos que a publicidade não faz outra coisa que veicular um conhecimento imediatamente concretizável em um “ter”, ou em um “ser”, ou em um “fazer”, a criança absorve sem dificuldades os três componentes que são a obsessão dos expertos de marketing, isto é, o componente cognitivo (como fornecer informações indeléveis sobre um produto ou um serviço), o componente afetivo (como fazer o consumidor reagir de maneira emotiva) e o comportamental (como colocar o pequeno consumidor em movimento na direção da aquisição). A partir deste ponto de vista a criança é o público ideal, o consumidor a quem se pode vender qualquer coisa».
Na Itália está em vigor um código de autodisciplina publicitária que surgiu em 1966, em base a um acordo entre os profissionais do setor. Esta primeira forma de tutela, em grande parte com origem comunitária, tem como protagonistas entidades administrativas independentes: a Autoridade de controle da concorrência e do mercado de setor e a Autoridade de garantia para as comunicações e a editoria. Enquanto isso, para a auto-regulamentação, orientada pelas normas que constam do Código de autodisciplina publicitária, e agora também, embora com força jurídica diferente, pelo Código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual se reconhece um poder de decisão e de sanção, emanando uma ordem e intimando seu cumprimento.
Em todos os países onde a televisão serve de veículo às mensagens publicitárias, o mundo empresarial é plenamente consciente do enorme poder de influência que a publicidade tem sobre as crianças.



NORMATIVA INTERNACIONAL

O assunto relativo à tutela dos menores na mídia é um dos mais debatidos, seja no que se refere às normas nacionais, seja no âmbito internacional. Encontra-se diante da situação de precisar acertas as contas com toda a extensão da rede global da internet. O exemplo que, neste momento de transição, coloca mais em evidência a necessidade de estabelecer leis que estejam em condições de controlar o acesso e uso dos conteúdos nocivos para os menores, é exatamente o da internet. Qualquer pessoa no mundo pode abrir um site considerado «arriscado», contendo elementos ilegais e acessíveis a consumidores despreparados, disponibilizados por quem está do outro lado do mundo.
No que se refere aos princípios gerais no âmbito do direito internacional, é preciso recorrer principalmente à convenção da ONU sobre os direitos da criança, com sede em New York, ratificada pelo Parlamento italiano através da lei nº.176/1991. Esta garante à criança uma «consideração proeminente» também a respeito da liberdade, seja no se refere à expressão, seja quando tutela os conteúdos recebidos. Esta mesma convenção, em seu artigo 17, fala da relação entre menor e televisão, desejando «um sistema normativo que tutele o menor-consumidor, mesmo com todas as dificuldades que se apresentam», seja para individuar os fenômenos que devem ser monitorados, seja sobre as normativas possíveis.
No direito da União européia, tal tutela foi recentemente confirmada pela Carta dos direitos fundamentais da União, aprovada em Nice em 2000, cujo artigo 24 salienta que «os Estados membros reconhecem a importância da função exercida pelos meios de comunicação de massa e cuidam para que a criança possa ter acesso às informações e materiais... com a finalidade de promover o seu bem estar social, espiritual e moral, além de sua saúde física e mental». A normativa seguinte, 89/552/CEE, previu algumas restrições, seja no que se refere aos programas como para as mensagens publicitárias destinadas a este público». O artigo 22 desta normativa conduz a impedir a transmissão de programas que contenham cenas pornográficas ou de violência gratuita, ou outros programas inadequados a este público. Não podemos esquecer de mencionar a determinação expressa de «Televisão sem fronteiras», que está hoje em sua quinta versão atualizada, que o tema da tutela dos menores está relacionado com o estatuto geral dos direitos dos menores e corresponde ao disposto nos artigos 50 e 31 da Constituição italiana.
Se for claro que os princípios normativos são todos a favor da tutela dos menores, é também verdadeiro que uma tecnologia em contínua evolução colocou em crise as velhas regras do jogo. Mas também é claro que não se pode mais adiar a necessidade de estabelecer novos parâmetros normativos, para que as crianças possam utilizar os meios de comunicação próprios de seu tempo, com aproveitamento e serenidade também para as famílias.~

EDUCAÇÃO À MÍDIA NO MUNDO: PARA SABER MAIS

A difusão da educação à mídia é uma resposta à necessidade de se informar sobre as novidades no campo dos novos meios de comunicação. Em seguida citamos apenas alguns sites que em vários países oferecem maiores informações sobre como aprender a usar melhor a mídia, enfrentando a problemática da tutela dos menores e da alfabetização às novas tecnologias por parte dos adultos.
«The Media Awareness Nework-Réseau éducation médias» é uma organização canadense sem fins lucrativos, pioneira no desenvolvimento de programas sobre a educação à mídia. Com esta finalidade ela produz programas online em colaboração com organizações internacionais, convicta que, para interpretar as mensagens de informação, de entretenimento e comerciais, os jovens têm necessidade de instrumentos críticos válidos. Por isso é importante formar também os adultos (famílias e professores) sobre como funciona a mídia e como ela determina o estilo de vida.
A organização realiza uma ação contínua de monitoramento em relação à mídia (televisão, cinema, videogames, imprensa, publicidade, etc.), e sua seção dedicada aos pais oferece uma série de elementos para que estes reflitam com os filhos sobre esses meios, além da seção para os educadores, que inclui lições e materiais de apoio. Uma outra seção é dedicada à análise das questões ligadas à mídia, como a difusão de estereótipos, as representações de violência e da diversidade, a privacidade, a publicidade dirigida aos menores. Seu site é em inglês e francês (http://www.media-awareness.ca).
«Quai des images» é o site dedicado ao ensino de cinema e audiovisual organizado pelo Ministério da Educação francês. Ele propõe atividades ligadas à educação à imagem e de análise dos filmes em consonância com os programas escolares, agrupa os textos oficiais a respeito dos meios audiovisuais, oferece uma série de instrumentos de análise e de estudo completos sobre alguns filmes específicos e sobre certos autores em particular, informa sobre conferências, seminários, cursos e festivais sobre o mundo audiovisual e sua utilização em âmbito educativo e didático. Entre outras coisas, reúne também as propostas e as experiências feitas por professores e seus alunos nas escolas secundárias francesas no campo da educação à imagem, além de organizar um fórum de discussões aberto a todos sobre a educação à mídia (http://www.ac-nancy-metz.fr).
Sempre na França, está em funcionamento o blog «Zéro de conduite», organizado pelos professores e destinados a educadores, pais e estudantes. Promove o uso do cinema como instrumento pedagógico, dedicando-se especialmente à atualidade cinematográfica, mas sem esquecer os clássicos e os documentários. Com várias seções e espaços de aprofundamento, se propõe como um local de discussão de temas em um debate aberto (http://cinema-ducation.fluctuat.net).
A Universidade de Massachussetts organizou o Media Education Foundation – MEF, mídia de desafio, que produz e distribui documentários destinados a estimular o pensamento crítico e o debate sobre a relação entre aqueles que detêm o poder sobre a mídia, os conteúdos da mídia comercial, a exigência democrática de um livre fluxo de informações, as diversas representações de idéias e pensamentos e o direito dos cidadãos de informar e serem informados. Alguns destes temas são abordados criticamente, como a identidade do gênero na publicidade, a imagem de sexo nos videoclipes, o papel da mídia na construção da identidade cultural, mídia e saúde, etc. (http://www.mediaed.org/).

(a cura di M. F. D’A.)

 
At 9/17/2007 2:45 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

AS CRIANÇAS E A MÍDIA (II PARTE):
ACEITAR O DESAFIO EDUCATIVO


O tema da 41ª Jornada das Comunicações Sociais, «As crianças e os meios de comunicação: um desafio para a comunicação», nos convida a refletir a respeito de dois aspectos particularmente importantes. O primeiro é a formação das crianças, para que estejam em condições de receber de maneira crítica aquilo que vêem. O segundo é a formação à consciência e ao uso consciente da mídia, que está em contínua transformação tecnológica.
De fato, é o que especifica Bento XVI no início de sua mensagem, de 20 de maio de 2007, para a Jornada: «Os complexos desafios que a educação contemporânea deve enfrentar são muitas vezes ligados à grande influência dos meios de comunicação no nosso mundo. Como aspecto do fenômeno da globalização e estimulados pelo rápido desenvolvimento da tecnologia, os meios de comunicação delineiam fortemente o ambiente cultural (cf. João Paulo II, O rápido desenvolvimento, nº3). Na realidade, há quem afirma que a influência formativa da mídia está em competição com aquela da escola, da Igreja e, quem sabe, até com aquela da própria família».
De fato, como salienta o Pontifício conselho para as Comunicações Sociais, «para muitas pessoas, a realidade corresponde àquilo que os meios de comunicação definem como tal». Episódios recentes, como a utilização do celular na filmagem de violências nas salas de aula, abusos sofridos por pessoas deficientes, fenômenos de trote e de violência generalizada, demonstram como as crianças que crescem passando uma média de quatro horas por dia diante da televisão, sozinhos em casa, absorveram a lógica do «estou no vídeo, logo existo». Os psicólogos, os pedagogos e os estudiosos dos meios de comunicação estudam há tempos sobre as relações entre o consumo televisivo e o comportamento violento dos menores. Uma grande quantidade de pesquisas realizadas em muitos países ocidentais demonstra como esta correlação seja realmente inegável.


NOVAS LINGUAGENS

O fato que muitas crianças vivem completamente inseridas no mundo dos velhos e novos meios de comunicação, que estão cada vez mais frequentemente em correlação entre eles, é confirmado pela popularidade de alguns modelos televisivos, considerados tão efêmeros quanto penosos «momentos de glória», presentes nos programas com os maiores índices de audiência, dos «reality» aos «talk show», sem falar do «trash», que hoje se tornou um gênero de espetáculo.
Dentre as preferências demonstradas pelos adolescentes italianos que assistem televisão mais do que três horas por dia, encontramos, em primeiro lugar, a figura da «veline» (Ndt: misto de corista e coadjuvante na apresentação de programas populares da televisão italiana), enquanto outros da mesma idade se concentram no mais clássico exemplo, o do jogador de futebol. De toda maneira, a coisa mais importante é aparecer, pouco importa por qual motivo, de ser «alguém» ou «alguma coisa» no Olimpo mediático, mesmo que seja apenas por um instante.
Estes são os exemplos mais negativos dos condicionamentos derivados de um excessivo e acrítico uso dos meios de comunicação. Encontramo-nos diante de uma nova geração que cresceu na frente da televisão, capaz de usar as novas tecnologias que os próprios pais, que as adquiriram e as tornaram disponíveis, muitas vezes se encontram despreparados para utilizá-las.
Tanto é verdade que hoje em dia os filmes são vistos diretamente nos celulares e a televisão pode ser assistida na tela do computador. Hoje se telefona através da internet e graças ao download se descarrega os CDs e DVDs mais recentes, se filma e se faz foto com o celular, e assim por diante.
Nas casas, o vocabulário familiar se reduziu ao gênero dos sms e se fala tendo o som da televisão no fundo, se comunica através de e-mail, se faz «visita virtual» via computador, se percorre através de bibliotecas virtuais, tanto que as fichas e arquivos de papel evocam imagens do outro século, completamente em desuso.
A situação dos nossos filhos é diversa daquela da geração precedente, pois eles abriram seus olhos tendo diante de si estes cenários de profunda, contínua e envolvente transformação tecnológica. Eles se constituem aquela que os estudiosos chamam de geração nascida «com seis dedos»: além dos cinco dedos normais da mão, o sexto é o mouse do computador.
Com o aparecimento do mundo «virtual» da internet e dos videogames criou-se uma defasagem em relação à realidade verdadeira e própria. As duas dimensões parecem muitas vezes, e para muitos jovens, como universos paralelos, com conseqüências não indiferentes no plano do processo de amadurecimento. Têm grande sucesso os sites nos quais se prevê uma segunda vida (basta verificar os milhares de registros nos poucos meses de existência do site italiano de «Second Life», que em todo o mundo já tem sete milhões de inscritos), onde a simulação reproduz todas as situações da vida real. Apenas que tudo é falso, a começar da nova identidade, que pode ser escolhida e com ela se inicia a fazer parte deste mundo fora do mundo, onde se pode ser um «qualquer coisa». Isto é, ninguém.
Assim, o grande desafio cultural de hoje é propriamente a redefinição dos limites, que muitas vezes se apresentam demasiadamente instáveis. Isto é, redefinição dos limites entre o real e o virtual, superando a divisão digital que hoje separa as gerações adultas daqueles mais jovens.


OS JOVENS: PROTAGONISTAS OU VÍTIMAS DAS MUDANÇAS?

A linguagem deles é pobre, muitas vezes recheada de termos tirados do dicionário do internauta: clicar, chatar, messagiar, deletar, são alguns dos neologismos que fazem parte de seu vocabulário quotidiano. Falta uma dimensão humana da tecnologia que esteja em condições de traçar o perímetro cultural entre o real e o virtual. Assim a aldeia global difundiu uma quantidade de modelos comportamentais desviados, ou pelo menos discutíveis.
Desta maneira, os jovens que vivem a milhões de quilômetros de distância jogam o mesmo videogame, vêem o mesmo filme, assim como, de maneira transversal, absorvem modelos e comportamentos semelhantes. Muitas vezes os adultos têm menos domínio no uso das novas tecnologias e observam, com uma preocupação resignada diante de suas próprias limitações, as crianças que navegam facilmente na internet.
As raízes das dificuldades neste campo educativo são muito bem explicadas por Marina D’Amato, professora de sociologia da Universidade de Roma, que salienta: «Cada geração tem necessidade de se encontrar também em um mundo fantástico, que serve a interiorizar o paradigma do bom e do belo, do justo e do errado, do oportuno e do útil, também em relação aos exemplos que procedem da narrativa. Hoje nos encontramos em uma condição na qual os avós e os pais contam cada vez menos histórias aos filhos e aos netos, e este papel foi assumido pela televisão. Mas, na realidade, a televisão “exila” e “con-funde”, isto é, funde os modelos morais que são frutos de ânsias e problemas mal resolvidos, muito mais que de certezas. Embora estes se transformem com freqüência, a cada três ou quatro anos, o fato de serem repropostos continuamente faz com que se justaponham uns aos outros» (ver Come mediare i media, de Mario Russo).
Se for verdade que a televisão é o meio mais usado até a adolescência, imediatamente depois surge a grande atração pela internet. Esta passagem nasce de uma sintonia com a linguagem televisiva, que na idade infantil muitas vezes é ouvida durante muitas horas no dia. Esta linguagem se baseia em uma mediação da realidade e desta maneira ela ativa um processo de recepção que é de tipo emotivo.
Neste registro emocional é mais fácil acabar envolvido por situações e figuras capazes de se proporem como modelos identificadores, preservadores de sentido e de comportamentos a serem imitados.
O poder de concentrar uma vontade emulativa em alguns personagens, que correspondem particularmente às necessidades interiores do jovem (necessidades na maioria das vezes induzidas pela publicidade ou por modelos estimuladores), tem uma forte relação com a quantidade de horas que o jovem passa utilizando os novos ou os velhos meios de comunicação.


EDUCAÇÃO NECESSÁRIA

«A formação adequada a um uso correto dos meios de comunicação é essencial para o desenvolvimento cultural, moral e espiritual das crianças… Educar as crianças a serem seletivas no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja, da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos. Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia, com a certeza de que este difícil, embora gratificante, aspecto da condição de pais, é apoiado por toda a comunidade.»
As palavras do discurso de Bento XVI definem com grande clareza o paradigma de uma justa relação entre a mídia e os menores. Uma clareza que devemos agradecer ao magistério da Igreja, no momento em que o mundo da mídia parece ignorar a verdadeira problemática educativa das crianças e as expectativas de qualidade e de segurança exigidas pelas famílias no que se refere ao uso desses meios, seja do cinema aos videogames, da televisão à internet.
Diante da utilização destorcera do meio televisivo, o mais difundido dentre os meios de comunicação, a Igreja se interroga sobre o porquê da televisão não ter um papel educativo e por que os meios de comunicação não podem ser companheiros confiáveis para os jogos na fase de crescimento da criança. O anúncio de uma recente campanha sobre o uso da mídia, promovida pelo Ministério das Comunicações, mostra os vários membros da família que estão vendo a televisão ao lado de uma criança.
Que se trate do avô ou da mãe, a mensagem é a mesma: não deixar uma criança sozinha diante de um meio que, sem o apoio crítico educativo de um adulto, pode transmitir conteúdos inadequados à idade e à maturidade daquele que o vê. Sem esquecer as responsabilidades dos produtores televisivos, empenhados na organização dos programas, o papel da família é realmente insubstituível.
Se realmente o objetivo de quem administra a sociedade de produção televisiva, ou das multinacionais produtoras de videogames ou das operadoras de celulares, é o de promover e vender o produto, o bem estar psicofísico da criança está no centro do interesse dos educadores, sejam eles os professores ou, em primeiro lugar, os pais.
Isto explica bem a mensagem do Papa, que continua a sua análise, salientando que «educar as crianças a serem seletivos no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja e da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos (ver João Paulo II, «Familiaris Consortio», 76). Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia.»


CONTEÚDO DA MÍDIA

No panorama de uma revolução da multimídia, que está modificando transversalmente os hábitos, a mentalidade, os modelos e as linguagens, deve voltar ao centro do debate a tutela daquilo que é melhor para os menores. Sem acusar a «mídia», que enquanto tal não é nem boa nem má, o importante é partir de uma a análise do produto, para assim poder individuar conteúdos que sejam de melhor qualidade para as crianças e os adolescentes. Porque a televisão é um instrumento que abre janelas de conhecimento para o mundo e, se bem utilizada, de «má professora» pode se tornar uma preciosa fonte de estímulo para o crescimento humano e cultural.
A mesma coisa vale, e com mais razão, para a «rede» que engloba e compreende tudo, e para os videogames, onde, ao invés de violência e monstros, poderia se dedicar a produzir (e isso já ocorre em certos casos) histórias instrutivas e de conteúdo interessante.
Bento XVI coloca justamente em evidência as enormes possibilidades para que seja melhorado o conteúdo deste grande campo de produção multimídia: «A educação através da mídia deveria ser positiva. Colocando as crianças diante de um meio estética e moralmente excelente, estas recebem uma ajuda para que desenvolvam a própria opinião, a prudência e a capacidade de discernimento. É importante aqui reconhecer o valor fundamental do exemplo dos pais e as vantagens de introduzir os jovens aos clássicos da literatura infantil (…). A beleza, quase um espelho do divino, inspira e vivifica os corações e as mentes juvenis, enquanto a feiúra e a vulgaridade têm um impacto deprimente sobre os comportamentos». Diante de uma decadência geral do produto televisivo, a questão da qualidade aparece ainda mais forte e vibrante em grande parte de um público formado de famílias, que pede para não ser apenas um exército indistinto de ouvintes silenciosos, mas um público em condições de exprimir suas preferências por conteúdos formativos e informativos de bom nível.
A mensagem de Bento XVI continua, com algumas importantes indicações: «Como a educação em geral, aquela da mídia requer também uma formação ao exercício da liberdade. Trata-se de uma responsabilidade que compromete. Muitas vezes a liberdade é apresentada como uma incansável procura do prazer ou de novas experiências (…). Este desejo, sentido profundamente pelos pais e educadores, que é o de educar as crianças no caminho da beleza, da verdade e da bondade, pode ser apoiado pela indústria da mídia somente na medida em que se promove a dignidade fundamental do ser humano, o verdadeiro valor da vida familiar, as conquistas positivas e as metas da humanidade. A partir disso, a necessidade de que os meios de comunicação estejam empenhados na efetiva formação e no respeito da ética deve ser vista com interesse particular e com urgência não apenas pelos pais, mas também por aqueles que têm responsabilidade cívica».
Na realidade, nos encontramos na situação de ter que reconhecer que na Itália falta uma verdadeira «cultura da criança»: a situação é tão séria que no âmbito institucional procura-se dar uma nova organização geral para verificar e controlar os conteúdos dos setores de entretenimento, como os videogames, que até agora estão submetidos apenas a códigos de auto-regulamentação, feitos e codificados para uso e consumo pelas indústrias produtoras.
Uma vez mais, o primeiro e indispensável apoio à criança só pode vir da família e de uma relação mais estreita com os professores e educadores, exatamente como salienta Bento XVI, lembrando-nos que a preocupação educativa dos pais não deve se tornar uma preocupação genérica, mas uma atenção constante a tudo aquilo que diz respeito aos filhos.

A INDÚSTRIA DA MÍDIA

1) A TELEVISÃO

Se a televisão convencional se apresenta como um ramo de atividade já «maduro», no entanto se apresenta no horizonte a situação da mídia digital (satélite ou a cabo), também como uma plataforma que consente a ligação entre televisão, internet e outro tipo de mídia através do computador. No que se refere à qualidade da programação, apesar dos inúmeros bons propósitos anunciados no âmbito institucional, parece pequena a atenção às exigências dos menores em suas diversas faixas etárias. A programação para os menores, na realidade é confinada em redes e horários particulares, enquanto o resto da programação na faixa horária considerada «para todos» muitas vezes apresenta conteúdos inadequados aos jovens. Mas, quais são as expectativas das gerações de jovens no que se refere à televisão? É realmente verdade que preferem o «trash», os jogos com prêmios absurdos e as «velines»?
A partir de uma pesquisa recente feita pelo instituto Censis sobre «Comunicação, pluralismo social, sociedade aberta» (2005) surge que a relação entre os menores, e em particular dos adolescentes entre os 14 e 18 anos de idade, e a televisão é determinada por elementos de forte contradição e de passividade. Nessa faixa etária, 100% deles vêem televisão praticamente todos os dias, 86% acompanham um pouco de tudo, com uma relevante predileção pelos filmes (72%), por esporte (32%) e pelos «reality shows» (18%).
No entanto, a amostragem entrevistada não está realmente satisfeita com aquilo que vê. De fato, 36% dos adolescentes denunciam a vulgaridade difundida nos programas e 25% criticam a superficialidade. Dentre eles, 46% consideram a televisão como um meio que «invade», ao mesmo tempo em que é interessante notar que 25% consideram que em geral a programação televisiva alimenta nas crianças menores uma visão consumista da vida. Destes dados surge o contraste entre a procura de distração e a reprovação daquilo que lhes é proposto pela programação. Isto significa que o alto índice de procura não é um indicador de satisfação.
Considerando o axioma de que a televisão seja onipresente, fica claro que são os próprios jovens a pedirem uma maior atenção aos conteúdos: menos violência e menos vulgaridade. A exigência de uma regulamentação diversa, diz claramente o relatório do Censis, «não vem somente daqueles, pais e educadores, que estão preocupados pela possível influência negativa sobre os menores, mas se exprime nitidamente também através dos adolescentes, pelo menos de uma parte mais esperta e consciente dentre eles».
Para tutelar melhor os direitos dos menores, desde 2002 foi instituído junto ao Ministério das Comunicações um código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual aderiram os produtores de televisão, seja no âmbito nacional como local. Baseando-se nos princípios sobre a matéria existentes na Constituição italiana e na Convenção dos direitos da criança, estabelecida em 1989 pela ONU, a comissão que controla sua aplicação avaliou em todos estes anos de atividade os milhares de casos em que foram violadas as normas de tutela, que prevêem a transmissão de programas e imagens adequadas a um público de menores de idade durante aquela que é chamada de «faixa protegida» da programação televisiva (das 7h30 às 22h30), intervindo com denúncias e sanções, que nos casos mais graves foram aplicadas pela Autoridade de garantia no setor das comunicações. Para o futuro, esta comissão deverá se transformar em um organismo mais amplo de controle, que se chamará «Mídia e menores», que além da televisão deverá monitorar também os setores dos vídeos-telefone e dos videogames, além da internet, que é o campo de maior risco.

REGRAS DE TUTELA EM OUTROS PAÍSES

É diversa a situação em outros países, como por exemplo na Grã Bretanha, onde o sistema de regulamentação da mídia é estruturado e complexo e foi atualizado nas últimas décadas, com uma particular atenção à tutela dos menores. As inovações tecnológicas neste setor levaram as normativas inglesas a uma série de novas disposições, como por exemplo, a visão em casa de vídeo exclusivamente para adultos, e que fora de casa seriam vetados aos menores, ou o combate à praga mundial dos sites internet para os pedófilos, que contenham material pornográfico ou com conteúdos que possam esconder o aliciamento de menores (ver a Protection Childres Act, de 1978).
A programação televisiva é regulamentada pelo Broadcasting Act (1996), de onde deriva a instituição da Broadcasting Standard Commission (BSC), um órgão independente de controle que estabelece as normas de avaliação e classificação dos programas, também no que se refere aos conteúdos violentos ou que possam ofender a decência pública (site oficial www.bsc.org.uk). Este organismo BSC funciona internamente à estrutura do Broadcasting, supervisionando e regulamentando todas as emissoras de televisão e de rádio, via cabo ou por satélite. Sua tarefa é a de elaborar os códigos de conduta e de aplicação de modelos que respeitem a justiça, além de monitorar os modelos, verificando que respeitem as leis. Com a transmissão de programas com conteúdos considerados inadequados aos menores de várias idades, há alguns anos a televisão inglesa adotou o sistema «watershed», um «separador de águas» entre um horário de programação familiar e outro para os adultos. Todo o sistema televisivo inglês se apóia sobre a responsabilização das famílias, pois sem a colaboração delas qualquer código de modelos para os programas é praticamente inútil.
Na França, está vigorando já há anos um código através de sinais televisivos, que entra em função para assinalar os programas inadequados aos menores. A avaliação do programa televisivo é feita pelo Conseil Supérieur de l’Audiovisuel (CSA), uma autoridade administrativa independente, que controla a difusão dos filmes e outras transmissões em vários canais privados, nacionais, regionais ou locais. A normativa francesa (lei 719/2002) veta a transmissão de programas que possam prejudicar gravemente a integridade física, mental e moral dos menores, porque divulgam conteúdos de pornografia ou de violência gratuita. As transmissões são classificadas por um código de sinais que, em conjunto com um sistema organizado de faixas horárias de programação, garante às famílias mais clareza sobre os programas destinados aos menores.
Na Alemanha, o tema da infância tem particular atenção da legislação, que considera desde o nascimento o início dos direitos fundamentais do cidadão. A tutela é disciplinada no âmbito público pela JSchG (desde o dia 26 de fevereiro de 1985), enquanto a lei GjSM se ocupa do controle sobre a difusão de publicações e conteúdos mediáticos considerados danosos para os menores. A regulamentação no setor televisivo é feita segundo as normas do acordo sobre a radiodifusão dos Lander federais, que as entidades para a mídia nesses Lander adotaram por base para o estabelecimento das diretivas que tutelam o interesse dos menores nas emissoras privadas. Não são admitidas transmissões que incitem o ódio racial, que exaltem a violência ou a guerra, que ofendam a dignidade do homem, que sejam de gênero pornográfico, que mostrem pessoas moribundas ou com sofrimentos que ofendam a dignidade humana. Os responsáveis pela programação, escolhendo os horários das transmissões, devem cuidar para que os menores não vejam programas que podem prejudicar o seu bem estar psíquico, físico ou mental. As transmissões inadequadas às crianças menores podem ser transmitidas somente depois da autorização da entidade competente do Land interessado.
Os responsáveis pela organização dos programas televisivos em âmbito nacional devem nomear encarregados pela tutela dos menores, que atuam no momento da aquisição, da projeção e da realização dos programas. As emissoras privadas fundaram em 1993 uma associação de autocontrole voluntário da televisão («Freiwillige Selbskontrolle Fernsehen», FSF), à qual devem ser apresentados programas particulares, antes da sua transmissão, e suas avaliações consideradas nas decisões das entidades de controle da mídia nos Lander federais. Existe ainda o órgão comum do cidadão para a tutela dos menores, dos programas, da competência mediática e controle da mídia (GSJP), do qual faz parte um integrante da entidade para a mídia nos Lander federais, que dá o seu parecer a respeito de algumas séries, filmes e espetáculos mais ou menos adequados aos menores. Este órgão, o GSJP, decide sobre pedidos de mudança de horários de transmissão de filmes proibidos para menores, controla a forma de novos programas e experimenta novas disposições para a tutela dos menores na televisão digital. A peculiaridade da jurisdição alemã, seja no setor televisivo como no cinematográfico e da mídia em geral, é a minuciosa atenção às exigências com o desenvolvimento do menor e aos riscos que este pode correr com a observância incorreta das leis.
Nos Estados Unidos, é possível consultar via internet um «guia televisivo para os pais» (ver o site www.mpaa.org), que prevê algumas categorias de audiência aplicadas aos programas televisivos transmitidos a todo o público. Este guia organiza várias siglas para identificar a categoria de audiência para cada transmissão: vai-se do TVY (para todas as crianças) ao TVG (para todos), através de várias faixas etárias, que correspondem à passagem da primeira à segunda infância e desta à adolescência. Depois tem o TVPG («parental guidance», visto na presença de um dos pais), o TV14 («parent strongly cautioned», séria advertência aos pais), para os programas que contêm cenas de sexo e de violência. Enfim, há o TVMA, que prevê um «mature audience only», ou seja, destinado a um público de idade superior a 17 anos, última fronteira para os conteúdos considerados «restricted».
Estas avaliações foram elaboradas baseando-se nas opiniões dos próprios pais e são fáceis de serem encontradas e compreendidas. Esta linha de «guia de televisão para os pais» pode ser usada juntamente ao «v-chip», que é um dispositivo de filtro instalado na maior parte dos mais recentes modelos de aparelhos de televisão, para permitir aos pais de bloquear os programas inadequados.

FICHA 1
Brasil: «O que eu penso da tv»
No Brasil, a audiência infantil é muito alta: aproximadamente 30 milhões de crianças vêem televisão pelo menos durante três horas por dia. Explica a profa. Rosália Duarte, do departamento de Ciência da Educação, da PUC do Rio de Janeiro, que «as crianças são muito perspicazes, mas nós podemos e devemos ajudá-las a ampliar o seu quadro de referências, para que possam discutir ainda melhor sobre o conteúdos daquilo que vêem. Para isso temos necessidade, antes de tudo, de ouvir aquilo que elas têm a dizer sobre o assunto e de dialogar com elas. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e muito mais freqüente, a outras atividades culturais». No âmbito de uma pesquisa feita através de um questionário distribuído nas escolas, intitulado «O que eu penso da tv», apareceu que «as crianças querem seriamente ser ouvidas sobre aquilo que pensam da tv, mas sentem que sua opinião é considerada pouco importante e não estão contentes com o excesso de imagens de violência exibidas na televisão, principalmente a violência “real”, definida como aquela transmitida nos telejornais. Eles adoram ver televisão e não importa o que os adultos pensam e dizem a respeito disso. A eles agradam quase todos os tipos de programas transmitidos: novelas, desenhos animados, programas de humor, filmes, seriados, mas isso não faz deles espectadores “idiotas”, pois fazem críticas muito interessantes, pertinentes e bem elaboradas sobre o que consideram feio ou inadequado na televisão. Para a maior parte deles, a televisão se oferece como principal opção de divertimento (em alguns casos, a única), o que significa um dado muito preocupante. Mas, o que chamou mais a nossa atenção é o grau de experiência com o qual essas crianças analisam a televisão: são expertos e demonstram conhecer a televisão também do lado de dentro, inclusive as linguagens que ela utiliza, a sua estrutura de produção, a sua lógica interna e as suas maneiras de intervenção».
As crianças aprendem os valores e os não-valores através da televisão, não resta dúvida, mas demonstram ter senso crítico a respeito deste assunto, quando afirmam nos textos que os programas transmitidos na tv podem lhes ensinar «a serem bons, a ter coragem e a fazer o bem, a cuidar da natureza e de si mesmos, a serem honestos e a lutar por aquilo que desejam», mas também «a serem cruéis e mentirosos, a roubar e matar, a não respeitar os pais e a comprar tudo aquilo que não têm necessidade». Falando sobre a validade do ensino através da mídia, a profa. Duarte salienta a necessidade de «ouvir aquilo que têm a dizer sobre o assunto e a dialogar com eles. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e mais freqüente, a outras atividades culturais».

FICHA 2
Observadores internacionais
Os dados examinados em janeiro de 2006 pelo OssCom, que é um centro de pesquisa da mídia, deixam evidente a tendência a realizar uma forma de co-regulamentação, onde a ação legislativa dos Estados membros se integra com medidas de auto-regulamentação por parte dos produtores, broadcasters e profissionais da comunicação sob o efeito de controles e sanções. São dois os instrumentos mais utilizados no âmbito europeu, observando-se as diretivas previstas no artigo 22 de «Televisão sem fronteiras»: a definição de faixas horárias protegidas (watershed) e os sinais mostrados na tela (determinados por um sistema de «rating»). Apesar disso, aos campos tradicionalmente problemáticos da violência e da pornografia se juntam novos campos de risco para os menores: a vulgaridade, abusos e dependências de substâncias, linguagem e comportamento vulgares, discriminações e abusos, violações e ofensas à dignidade humana. Os critérios de avaliação dos programas se constituem um problema que é partilhado por muitos países da União européia, ao mesmo tempo em que se prepara uma uniformização internacional dos sistemas de classificação (ver mais adiante, Nicam), baseados na visualização de cinco ícones que ilustram simbolicamente qual é a problemática do programa que está sendo analisado e para quais idades ele é desaconselhado.
Deve ser assinalada a atividade online da European Medi@culture. O projeto é promovido pela Comissão Européia, em Bruxelas, no quadro das iniciativas «e-Learning», administrado pelo centro mediático de Baden-Württemberg. O site apresenta informações sobre a educação à mídia na Europa, particularmente na França, Áustria, Finlândia e Alemanha. A seção de projetos de multimídia agrupa os projetos sobre a mídia desenvolvidos por escolas e associações de jovens ao longo do tempo (ver http://www.european-mediaculture.org).

FICHA 3
África do Sul: Encontro mundial sobre a mídia para a infância
Este encontro trienal se realizou no último mês de março em Johannesburg, na África do Sul, com a participação de expertos do setor representando diversos países. Em conjunto se discutiu sobre a necessidade de uma programação adequada às crianças, procurando entender de que modo a violência na mídia pode influir sobre a psíquico dos menores.
Mas, no 5º Encontro mundial sobre a mídia para a infância apresentaram-se também muitas crianças provenientes de todo o mundo e empenhadas em discutir sobre o difícil tema da «Mídia como instrumento de paz e de democracia global». Vieram guiados por grupos de adultos, dentre eles as diversas organizações católicas que há anos trabalham para promover regras para o bem da infância, a serem respeitadas nas transmissões de rádio e televisão através de códigos de regulamentação que devem ser redigidos ou, como em alguns casos, apenas atualizados. Em muitos países do sul do mundo as novas tecnologias de multimídia já estão muito disseminadas e seu uso merece uma atenção particular para tutelar o público mais jovem.
Especialmente na África, explicou o organizador do encontro, Firdoze Bulbulia, começa-se a examinar o projeto de um «Media center» para as crianças, que possa produzir e distribuir transmissões de rádio e de televisão destinadas ao público mais jovem, com o objetivo de realizar um canal televisivo pan-africano dedicado à infância. Os organizadores do encontro estão também trabalhando no projeto de uma aliança africana dos meios de informação e de comunicação, seguindo o modelo daquela já existente na América latina.

2) INTERNET

Na Itália, 47% das famílias italianas têm um computador em casa, um dado relevante mas sempre muito baixo em relação à média dos outros países europeus. O uso da internet por parte dos adolescentes e jovens, e a familiaridade que têm com tudo aquilo que pode ser digitado ou «descarregado» da internet, apresenta não poucos problemas. Pela sua própria natureza de rede de comunicação global, o problema se apresenta em ótica internacional, procurando garantir a tutela dos menores através de precisos acordos com os provedores para um efetivo controle de conteúdo. No campo italiano, até 2006, a tutela dos menores tinha sido deixada nas mãos dos próprios provedores, que em 19 de novembro de 2003 assinaram um acordo de auto-regulamentação: o Codice Internet e Minori. Embora o acordo tenha sido estipulado entre os representantes dos vários provedores diante do Ministério para a Inovação e a Tecnologia, no entanto ele permanece um acordo privado, com lacunas, principalmente no que se refere às sanções que muitas vezes devem ser aplicadas. Em 2006, na seqüência de numerosos casos de violência sobre menores, muitos dos quais realizados através da difusão de material pedo-pornográfico (quando não se tratava de verdadeiro e próprio aliciamento de menores via internet), foi promulgada a lei 38 de 6 de fevereiro de 2006: «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet».
Enfim, como aplicação da lei 38/2006, em fevereiro da 2007 foi publicado um decreto determinando os requisitos técnicos dos instrumentos de filtragem que os provedores da rede internet devem utilizar para impedir o acesso aos sites já assinalados pelo Centro nacional contra a pedo-pornografia. Mas, isso não basta para superar as dificuldades e impedir que os menores possam navegar de maneira arriscada na «rede das redes».
Atualmente foi reativada a comissão anti-pedofilia e desvios de menores através da internet, o «Ciclope», que tinha sido instituída junto ao Ministério para a Eqüidade, do governo italiano, e que ficou inativa por um ano, até a sua reestruturação junto ao Ministério da Família. Está também para entrar em função um site dedicado ao uso da internet, junto ao Ministério das Comunicações, e um número telefônico de emergência gratuito, organizado pelo mesmo ministério e por «Save the children», que poderá ser utilizado por qualquer cidadão que queira assinalar algum abuso, desvio ou pedo-pornografia. Dentre as iniciativas mais recentes, deve ser assinalado o site www.tiseiconnesso.it criado pelo Ministério das Comunicações italiano, sempre em colaboração com «Save the children», onde é colocada à disposição uma série de informações sobre o conteúdo de certos sites, seja para os pais como para as próprias crianças, em conjunto com a campanha televisiva que tem como slogan «A melhor maneira de ajudar o seu filho a não usar incorretamente as novas tecnologias é conhecê-las».
Deve ser salientado também o fato de como a rede se tornou um grande mercado online. Para alguns produtores, o «e-commerce» de brinquedos corresponde já a 4% das vendas, e apenas em 2005 as vendas online corresponderam a 37.600 ações de compra. As razões para investir no processo online são múltiplas: desde a possibilidade de evitar as dificuldades logísticas de distribuição dos produtos, à ampliação de ofertas diferentes de produtos e também a possibilidade de envolvimento do cliente através de campanhas de mala direta e a criação de comunidades virtuais em torno de alguns produtos.

FICHAS:
Pedo-pornografia e internet
Em março de 2006, entraram em vigor as novas medidas diretas de combate e repressão ao fenômeno de exploração sexual dos menores e a pedo-pornografia, estabelecidas pela lei 38/2006 – «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet» foi publicada no Diário oficial em 15 de fevereiro de 2006, nº.38 – com a qual foram substancialmente modificados e integrados os artigos 600bis e seguintes do Código Penal italiano.
A lei confirma os artigos 527, 528, 529 e 725 do Código Penal italiano, que punem os «atos obscenos em local público, publicações, espetáculos obscenos, desenhos ou figuras que ofendem a decência pública».
Porque em muitas publicações, transmissões televisivas e anúncios publicitários, mesmo que não tenham declaradamente um caráter pornográfico, imagens de crianças e adolescentes são apresentadas de maneira explícita ou mais ou menos sutilmente ilusória e de forma falsa, pede-se um novo empenho das instituições competentes para que sejam observadas as normas em vigor e, se preciso for, que façam apelo aos órgãos de Polícia, o Instituto de autodisciplina publicitária, o Ministério das Comunicações, a Polícia postal ou a «Comissão tv e menor».

3) CINEMA

Confirmando as disposições da Constituição italiana, no que se refere ao direito e ao dever das famílias de serem protagonistas na educação de seus filhos, para muitos é chegada à hora de reelaborar a legislação que define o conceito de «censura» (a lei 161/1962 prevê a possibilidade de negar a autorização de abertura às salas de cinema ou de fazer cortes nos filmes, mesmo em função de um público adulto), que hoje está superado. É preciso com urgência estabelecer um critério de tutela dos menores não apenas no que se refere aos filmes que vêem nos circuitos cinematográficos, mas também sucessivamente em casa, muitas vezes em horários acessíveis na programação da televisão.
Uma avaliação correta e preventiva de um filme permite à família ter à sua disposição os instrumentos para escolher se um espetáculo é mais ou menos oportuno, conhecendo a trama, os eventuais conteúdos mais sensíveis, a classificação que a obra recebeu em outros países, etc. Por isso, é justo que a legislação seja revista, uma operação que requer atenção e perspicácia da parte das instituições em um momento de transição da mídia, como este que estamos vivendo, quando esta se tornou realmente um importante componente na educação dos menores.
Não faltam filmes que atraem o público por causa de seu conteúdo de violência, e no entanto entram no circuito cinematográfico sem qualquer restrição de idade. Para um filme que é notícia nos jornais, existem muitos outros com conteúdos duvidosos ou até mesmo perigosos que conseguem passar através do filtro da comissão de revisão cinematográfica, que atualmente funciona junto ao departamento de cinema do Ministério dos Bens Culturais.
Ao mesmo tempo em que existe um projeto de lei do ministro dos Bens culturais, que deve ainda iniciar os trâmites parlamentares, novas situações se apresentam na Itália, com a autocensura de filmes, feita pelos produtores ou distribuidores cinematográficos, com a introdução de novas e mais específicas faixas etárias para as restrições visando os menores a partir dos 10 anos de idade. As restrições serão feitas baseando-se em uma avaliação classificatória dos conteúdos das obras e sucessivamente serão ainda analisadas por uma comissão de psicólogos, educadores e pais.
Este sistema se inspira no modelo americano da Motion Picture Association of America (MPAA), que há 40 anos representa os interesses da indústria do audiovisual americana no mundo. Funcionando a partir de regras bem precisas (estabelecidas ao longo dos anos, também segundo as sentenças dos tribunais federais nos vários Estados americanos e em base aos protestos dos cidadãos), a autocensura americana prevê a existência de uma única comissão competente para determinar as restrições do PG12 ao «restricted» 17 anos. Esta comissão é composta exclusivamente de pais, considerados os primeiros depositários da educação dos filhos, e representam transversalmente a audiência. Importantes sanções econômicas asseguram que o mecanismo de autocertificação corresponda efetivamente aos interesses dos cidadãos. No site da Motion Picture estão disponíveis aos pais os pontos de referência para a avaliação das obras de entretenimento e são publicadas as restrições aplicadas a cada filme que está em exibição nas salas de cinema. Geralmente as avaliações parecem muito mais severas em relação a outros países. Tudo isso, nos vários anos de sua aplicação, deu uma qualificação à indústria americana e seu correto serviço prestado aos ouvintes. Qualquer estrada que se pretenda seguir na Itália, é importante para as famílias que seja estimulado um mercado de produção adequado à infância: é justo que o mecanismo da indústria cinematográfica continue com o seu ritmo de produção, mas não é justo confundir as classificações de acesso ao produto, como qualquer indústria sabe muito bem.
No que se refere às normas européias de classificação dos filmes, e em geral de todo «entertainment» (neologismo anglo-saxão, que, no entanto encontra sua raiz etimológica na relação entre educação e jogo) acessível aos menores, deve ser citado o sistema NICAM, que funciona na Holanda há alguns anos. Fundado em 1999, o NICAM (Nederlands Instituut voor de Classificatie van Audiovisuele Media) se baseia na lei Media Act, onde os programas de grupos que tiveram a autorização para atividades de «broadcasting» não devem incluir obras audiovisuais que prejudiquem o desenvolvimento físico e psicológico de pessoas com menos de 16 anos de idade, seguindo as diretivas da União européia («Televisão sem fronteiras» IV).
O sistema de classificação preventiva funciona também na Grécia, com a lei 1.597, de maio de 1986, que prevê que antes da projeção nas salas de cinema, cada filme seja submetido pelo produtor ou pela sociedade de importação à Comissão para a juventude, que classifica o filme seja como adequado aos menores, ou proibido aos menores de 13 anos, ou de 17 anos ou ainda, nos casos mais graves, severamente inadequado aos menores. Esta comissão é um órgão do Ministério da Cultura e foi concebida procurando-se estabelecer certa proporcionalidade, sendo composta de representantes do Estado (Ministério da Cultura), das categorias ligadas ao cinema, de psicólogos especializados na educação, de sociólogos, dos jovens, dos educadores e dos pais.
Na Áustria, está em vigor um sistema de avaliação complexo, instituído em base a um princípio constitucional federal que confia a tutela dos menores, no que se refere ao cinema e em geral aos meios de comunicação de massa, à competência específica dos Lander. A lei nacional que engloba a regulamentação da mídia é a ORF-ACT, ou seja, a Austrian Broadcasting Corporation nº. 379/1984, que estabelece quais os critérios sobre os quais deve se basear a proteção aplicada a programas e filmes transmitidos na televisão ou através de outros canais mediáticos. No que se refere à exibição dos filmes, a avaliação preventiva das obras cinematográficas, para que sejam decididas as faixas etárias adequadas, é regulamentada pela lei austríaca para a tutela dos menores, a «Jugendschutzgesetz», aplicada através das leis dos Lander federais. Esta lei estabelece nove faixas de restrições de público a partir dos seis anos de idade, com uma sucessiva graduação que prevê restrições para 10, 12, 14 e 16 anos de idade. Para supervisionar o sistema de classificação cinematográfica, existe uma comissão junto ao Ministério da Educação, em Viena, que comunica seu parecer sobre a idoneidade dos filmes às autoridades locais. Geralmente e de maneira individual os Lander adotam as decisões da comissão, e é em âmbito local que se decide de sua aplicação.
Na Espanha, o artigo 20 da Constituição reconhece o direito do cidadão a exprimir e difundir livremente seu pensamento, suas idéias e suas opiniões através de qualquer meio de divulgação. Se por um lado o exercício de tais direitos «não pode ser restrito através de nenhum tipo de censura prévia», o mesmo artigo especifica que «estas liberdades têm o seu limite no respeito dos limites reconhecidos pelas normativas que exprimem este respeito, especialmente no direito à honra, à privacidade, à própria imagem e à proteção da juventude e da infância».
Baseando-se neste princípio, a qualificação dos filmes (Real decreto 81/1997) e das obras audiovisuais é feita antes de sua difusão, através do Instituto de cinematografia e das artes audiovisuais (ICAA), uma entidade autônoma, mas ao mesmo tempo ligada ao Ministério da Educação e Cultura através da secretaria de Estado para a cultura (ver site www.mcu.es).
A subdireção geral de fomento à indústria cinematográfica e do audiovisual, que faz parte do ICAA, se ocupa, dentre outras funções, da classificação em faixas etárias dos filmes e das outras obras audiovisuais em vista de sua exibição pública e para a sua distribuição. A comissão se encarrega de divulgar as informações sobre os filmes e programas audiovisuais, com classificação que vai desde as «salas X» até as restrições para cada faixa etária do público.
Os filmes de caráter pornográfico não podem receber subvenções do Estado e sua projeção nas salas prevê uma taxa suplementar, destinada em parte para estimular um fundo de proteção cinematográfica. A projeção destes filmes pode ser feita somente nas «salas X», onde não podem ser apresentados outros tipos de obras cinematográficas e onde é proibido o ingresso de menores de 18 anos.

CINEMA NA TV

Devido ao alto consumo de programas de televisão por parte dos menores e levando-se em conta as diretivas da União européia, que promovem a auto-regulamentação no âmbito nacional das emissoras de tv e a participação das famílias nesta obra educativa, há alguns anos estão em vigor na França, na Holanda, na Grã-Bretanha, na Grécia e na Itália os códigos de sinais, que servem para identificar tanto os filmes projetados na salas de cinema como aqueles transmitidos na televisão. A tutela dos menores no âmbito da televisão foi também feita adotando-se o chamado sistema «watershed» (separador das águas), que funciona segundo uma seleção de faixas horárias protegidas, algumas aconselhadas à visão dos menores, outras aconselhadas a todos e outras ainda, principalmente na programação noturna, indicadas somente a um público adulto.
A faixa de idade determinada pela classificação preventiva dos filmes tem obviamente uma repercussão na programação das chamadas faixas horárias protegidas ou distintas nas emissoras de televisão pública em todos os países europeus. A definição das linhas de conduta comuns está à base dos acordos de auto-regulamentação e de co-regulamentação dos programas de televisão, estabelecendo-se um código de procedimento comum para as emissoras tanto públicas como privadas. Criou-se assim uma base normativa, que é assumida pela autoridade do Estado e que recebe a confiança dos consumidores das emissoras públicas ou privadas que adotam este sistema de auto-regulamentação.
Para tornar visível aos adultos as classificações dos programas apropriados aos menores, muitas emissoras européias adotaram um sistema de sinais que através de símbolos, números, cores e sinais acústicos advertem ao público a respeito daquilo que está para ser transmitido.
Mas, apenas este sistema, assim como o de filtragem (tipo v-chip), não basta para garantir uma verdadeira tutela dos menores diante de um conjunto de imagens difíceis de serem decodificadas por um jovem. Deve-se pensar às imagens de guerra dos telejornais, dos filmes escabrosos ou às informações sobre os crimes hediondos, que muitas vezes têm como ambiente o próprio núcleo familiar.
É na colaboração entre Estado, produtores de programas audiovisuais e famílias que pode ser fundamentado um autêntico respeito dos menores que encoraje o crescimento positivo da criança em base aos valores fundamentais da pessoa humana.

4) CELULARES COM VÍDEO

Hoje a difusão dos celulares com vídeo chegou à Itália ao índice se 134%, o que significa que muitas pessoas possuem pelo menos dois celulares, inclusive os jovens e as crianças, que recebem este instrumento dos próprios pais. De fato, de duas crianças entre 8 e 13 anos de idade, uma delas tem um celular no bolso. Aquele que poderia ser um instrumento para controlar melhor os deslocamentos e as necessidades dos filhos, se revela no entanto um perigoso meio que pode expor a outro tipo de utilização por parte dos menores, que não se separam nunca do próprio celular, nem mesmo durante as aulas, como lamentam vários professores. Apesar do código de auto-regulamentação assinado pelas principais operadoras (Código de conduta para a oferta de serviços a pagamento em tutela dos menores), na realidade os novos serviços opcionais do celular o tornaram um «personal computer» capaz de permitir novos usos que antes não tinham.
Os desenvolvimentos tecnológicos que estão se verificando no campo da telefonia móvel – particularmente no que se refere à sinergia com a internet e a adoção dos sistemas DVB de vídeos-telefone – contribuem a aumentar a oportunidade de comunicação também para as novas gerações e, ao mesmo tempo, repropõem em novos termos a questão da tutela dos menores. As evoluções já previstas ulteriormente para os próximos anos e o número sempre crescente de pessoas envolvidas, pedem uma grande consciência social e uma constante atenção das pessoas e órgãos encarregados de garantir os direitos dos cidadãos.
Neste contexto devem ser reafirmados os direitos dos menores no campo da comunicação, dentre os quais certamente não está em último lugar aquele que se refere também à segurança diante dos riscos de indução a comportamentos ilícitos ou de acesso a conteúdos nocivos ou indesejados. Também neste campo é essencial o papel dos pais e, em geral, de todos aqueles que são chamados a ter uma função educativa. A maior segurança das crianças e dos jovens quanto ao acesso a conteúdos ilegais é um ponto que deve merecer atenção também através da maior conscientização dos pais e das mães, que devem se capacitar a conhecer e utilizar estes meios.
Para a «alfabetização» dos pais na utilização da mídia devem colaborar também as instituições públicas, promovendo um uso positivo das novas possibilidades tecnológicas. Às empresas cabe a responsabilidade de colocar no mercado um produto que dê garantias no que se refere à sua utilização pelos menores, superando os limites estabelecidos pelo código de auto-regulamentação assinado pelas operadoras de celulares. Devem também oferecer maiores informações aos adultos que assinam um contrato de utilização, como por exemplo a adoção de bloqueios automáticos de acesso a conteúdos nocivos, se o celular passa às mãos de um menor de idade.

5) VIDEOGAMES

Trata-se de uma indústria global, que conquistou os jovens e não apenas eles. Os números relativos à difusão repentina dos videogames indicam que existem 250 mil sites de videogames, cada um deles propõe uma série de títulos, muitos deles recheados de cenas de sexo e de violência. Uma pesquisa recente do Instituto italiano de medicina social (IIMS) coloca em evidência, entre outras coisas, a escassa informação por parte dos adultos a respeito dos videogames utilizados pelos filhos, o predomínio de temas violentas em mais de 30% de títulos não aconselhados aos menores, o predomínio de personagens virtuais normais que podem se tornar especiais, realizando ações extraordinárias.
Mas, o ponto de risco mais elevado se refere aos pequenos jogadores de videogames, crianças entre seis e nove anos de idade que se submetem a entrar tão intensamente no jogo virtual que chegam a formas de dissociação da realidade e solicitam um monitoramento muito atento da parte dos adultos. A mesma pesquisa indica a presença de videogames em 25% das famílias com crianças de três a cinco anos de idade e em 65,2% das famílias com crianças entre seis e 10 anos de idade. O que produz efeitos negativos no âmbito cognitivo das crianças não parece ser especificamente o meio, mas muito mais os elementos que criam a excitação, tais como a velocidade de produção do estímulo e da resposta, a velocidade das imagens, os efeitos especiais, os contrastes, a fragmentação da história, o binômio rumor-ação. O uso prolongado do jogo inibe, segundo alguns psicólogos, a área da capacidade crítica, provocando passividade e ao mesmo tempo agressividade na criança. Mas, não queremos demolir os videogames, porque existem aqueles que são muito adequados aos mais jovens, com valores de informação e de educação, seja também porque o uso deste meio é na realidade um passo na preparação da criança ao sucessivo e mais sofisticado, que é o uso da internet.
De qualquer maneira, os dados relativos à venda destes produtos de entretenimento mostram um crescimento em todos os lugares e a difusão deste meio é acompanhada de uma aceitação social (ou seria uma resignação?) sempre maior.
É urgente ampliar o percurso de conhecimento e das estratégias internacionais, para monitorar um mercado que está cada vez mais vasto. Parece urgente estabelecer modalidades operativas para o controle dos conteúdos e do sistema de sanções, seja para o produtor como para o vendedor dos serviços. O código de auto-regulamentação Pegi (derivado em 2003 do sistema de avaliação e classificação holandês, Nicam, que assinala os conteúdos inadequados aos menores), adotado pelos industriais de «entertainment» que produzem videogames, é a única forma de auto-regulamentação existente atualmente e que prevê sanções (raramente aplicadas, mesmo diante de casos graves evidentes) para os produtores que colocam no comércio os jogos com indicações de faixas etárias apenas aproximativas.
O código Pegi, ao qual a associação européia Isfe adere em 2002, é evidentemente insuficiente na sua função declarada de «fornecer aos consumidores as informações mais oportunas» e expostas no selo de produção. E, como o setor dos videogames tem hoje um volume de negócios que ultrapassa os 740 milhões de euros, envolvendo 24 milhões de jogadores (43% da população a partir dos quatro anos de idade), com uma venda dos produtos classificados para maiores de três anos de idade que chega aos quase 48% dos consumidores. É um dado que define o impacto deste gênero de meio sobre a infância e a adolescência, mostrando toda a sua periculosidade, seja pelo consumo de conteúdos inadequados, seja pelo excessivo número de horas dedicado neste passatempo, muitas vezes solitário e sem a presença de um adulto ao lado. Se for verdade, como sustenta a indústria, que a produção de videogames violentos é apenas uma mínima parte do mercado, é também verdade que esta representa a fatia mais importante do retorno econômico.
O interesse pelos videogames é alimentado pela sinergia com os filmes que inspiram o jogo homônimo e que torna sempre mais atrativo este gênero, principalmente para os adolescentes. Desta maneira é importante também neste campo o estabelecimento de regras precisas em defesa dos consumidores dentre o público jovem, mais exposto aos riscos destas novas formas de entretenimento cada vez mais sofisticadas e envolventes, por causa da combinação entre narrativa e efeitos gráficos.

6) PUBLICIDADE

O problema da tutela dos menores diante da publicidade se apresenta como um corolário, dentro do quadro mais amplo que regulamenta a difícil relação entre a mídia e as crianças. A televisão, e portanto também a publicidade, se constitui em uma fonte de perigo para os menores, isto é, para a maior parte das crianças, principalmente em idade pré-escolar, que devem saber fazer a diferença entre a publicidade e o resto da programação, e entre os programas de ficção e a realidade. Com essas considerações não significa que exista uma acrítica rejeição da publicidade em si mesma – à qual se reconhece, no entanto, onde proceda corretamente, uma função positiva no processo de formação, de crescimento crítico e de socialização do menor –, mas existe a necessidade de prever um sistema de regras destinado a garantir-lhe um uso adequado.
O efeito dos anúncios publicitários é tão grande que em alguns países estão sendo tomadas medidas drásticas a respeito. No Reino Unido, por exemplo, recentemente foram vetados os anúncios publicitários durante os programas destinados às crianças até nove anos de idade, a partir de 1º de janeiro de 2008 a medida se estenderá à programação para os jovens até 15 anos de idade e até o final de 2008 serão vetados em todos os canais dedicados aos menores. Apesar de se reconhecer que a publicidade serve para financiar os programas, aqueles dedicados às crianças terão que recorrer a outras fontes. Também na França começa a se impor uma «linha dura» a esse respeito: visto a alta incidência de publicidade de merendas, de sucos e doces em geral, a partir de agora os anúncios dedicados às crianças deverão ser precedidos de uma espécie de aviso, que orientará para uma alimentação adequada.
Mas, por que as crianças são tão frágeis diante dos apelos da publicidade? Na Itália, explica Paolo Landi, secretário geral da Adisconsum (Associação de defesa dos consumidores e do ambiente»), em um capítulo de seu estudo «Crianças da multimídia»: «Se consideramos que a publicidade não faz outra coisa que veicular um conhecimento imediatamente concretizável em um “ter”, ou em um “ser”, ou em um “fazer”, a criança absorve sem dificuldades os três componentes que são a obsessão dos expertos de marketing, isto é, o componente cognitivo (como fornecer informações indeléveis sobre um produto ou um serviço), o componente afetivo (como fazer o consumidor reagir de maneira emotiva) e o comportamental (como colocar o pequeno consumidor em movimento na direção da aquisição). A partir deste ponto de vista a criança é o público ideal, o consumidor a quem se pode vender qualquer coisa».
Na Itália está em vigor um código de autodisciplina publicitária que surgiu em 1966, em base a um acordo entre os profissionais do setor. Esta primeira forma de tutela, em grande parte com origem comunitária, tem como protagonistas entidades administrativas independentes: a Autoridade de controle da concorrência e do mercado de setor e a Autoridade de garantia para as comunicações e a editoria. Enquanto isso, para a auto-regulamentação, orientada pelas normas que constam do Código de autodisciplina publicitária, e agora também, embora com força jurídica diferente, pelo Código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual se reconhece um poder de decisão e de sanção, emanando uma ordem e intimando seu cumprimento.
Em todos os países onde a televisão serve de veículo às mensagens publicitárias, o mundo empresarial é plenamente consciente do enorme poder de influência que a publicidade tem sobre as crianças.



NORMATIVA INTERNACIONAL

O assunto relativo à tutela dos menores na mídia é um dos mais debatidos, seja no que se refere às normas nacionais, seja no âmbito internacional. Encontra-se diante da situação de precisar acertas as contas com toda a extensão da rede global da internet. O exemplo que, neste momento de transição, coloca mais em evidência a necessidade de estabelecer leis que estejam em condições de controlar o acesso e uso dos conteúdos nocivos para os menores, é exatamente o da internet. Qualquer pessoa no mundo pode abrir um site considerado «arriscado», contendo elementos ilegais e acessíveis a consumidores despreparados, disponibilizados por quem está do outro lado do mundo.
No que se refere aos princípios gerais no âmbito do direito internacional, é preciso recorrer principalmente à convenção da ONU sobre os direitos da criança, com sede em New York, ratificada pelo Parlamento italiano através da lei nº.176/1991. Esta garante à criança uma «consideração proeminente» também a respeito da liberdade, seja no se refere à expressão, seja quando tutela os conteúdos recebidos. Esta mesma convenção, em seu artigo 17, fala da relação entre menor e televisão, desejando «um sistema normativo que tutele o menor-consumidor, mesmo com todas as dificuldades que se apresentam», seja para individuar os fenômenos que devem ser monitorados, seja sobre as normativas possíveis.
No direito da União européia, tal tutela foi recentemente confirmada pela Carta dos direitos fundamentais da União, aprovada em Nice em 2000, cujo artigo 24 salienta que «os Estados membros reconhecem a importância da função exercida pelos meios de comunicação de massa e cuidam para que a criança possa ter acesso às informações e materiais... com a finalidade de promover o seu bem estar social, espiritual e moral, além de sua saúde física e mental». A normativa seguinte, 89/552/CEE, previu algumas restrições, seja no que se refere aos programas como para as mensagens publicitárias destinadas a este público». O artigo 22 desta normativa conduz a impedir a transmissão de programas que contenham cenas pornográficas ou de violência gratuita, ou outros programas inadequados a este público. Não podemos esquecer de mencionar a determinação expressa de «Televisão sem fronteiras», que está hoje em sua quinta versão atualizada, que o tema da tutela dos menores está relacionado com o estatuto geral dos direitos dos menores e corresponde ao disposto nos artigos 50 e 31 da Constituição italiana.
Se for claro que os princípios normativos são todos a favor da tutela dos menores, é também verdadeiro que uma tecnologia em contínua evolução colocou em crise as velhas regras do jogo. Mas também é claro que não se pode mais adiar a necessidade de estabelecer novos parâmetros normativos, para que as crianças possam utilizar os meios de comunicação próprios de seu tempo, com aproveitamento e serenidade também para as famílias.~

EDUCAÇÃO À MÍDIA NO MUNDO: PARA SABER MAIS

A difusão da educação à mídia é uma resposta à necessidade de se informar sobre as novidades no campo dos novos meios de comunicação. Em seguida citamos apenas alguns sites que em vários países oferecem maiores informações sobre como aprender a usar melhor a mídia, enfrentando a problemática da tutela dos menores e da alfabetização às novas tecnologias por parte dos adultos.
«The Media Awareness Nework-Réseau éducation médias» é uma organização canadense sem fins lucrativos, pioneira no desenvolvimento de programas sobre a educação à mídia. Com esta finalidade ela produz programas online em colaboração com organizações internacionais, convicta que, para interpretar as mensagens de informação, de entretenimento e comerciais, os jovens têm necessidade de instrumentos críticos válidos. Por isso é importante formar também os adultos (famílias e professores) sobre como funciona a mídia e como ela determina o estilo de vida.
A organização realiza uma ação contínua de monitoramento em relação à mídia (televisão, cinema, videogames, imprensa, publicidade, etc.), e sua seção dedicada aos pais oferece uma série de elementos para que estes reflitam com os filhos sobre esses meios, além da seção para os educadores, que inclui lições e materiais de apoio. Uma outra seção é dedicada à análise das questões ligadas à mídia, como a difusão de estereótipos, as representações de violência e da diversidade, a privacidade, a publicidade dirigida aos menores. Seu site é em inglês e francês (http://www.media-awareness.ca).
«Quai des images» é o site dedicado ao ensino de cinema e audiovisual organizado pelo Ministério da Educação francês. Ele propõe atividades ligadas à educação à imagem e de análise dos filmes em consonância com os programas escolares, agrupa os textos oficiais a respeito dos meios audiovisuais, oferece uma série de instrumentos de análise e de estudo completos sobre alguns filmes específicos e sobre certos autores em particular, informa sobre conferências, seminários, cursos e festivais sobre o mundo audiovisual e sua utilização em âmbito educativo e didático. Entre outras coisas, reúne também as propostas e as experiências feitas por professores e seus alunos nas escolas secundárias francesas no campo da educação à imagem, além de organizar um fórum de discussões aberto a todos sobre a educação à mídia (http://www.ac-nancy-metz.fr).
Sempre na França, está em funcionamento o blog «Zéro de conduite», organizado pelos professores e destinados a educadores, pais e estudantes. Promove o uso do cinema como instrumento pedagógico, dedicando-se especialmente à atualidade cinematográfica, mas sem esquecer os clássicos e os documentários. Com várias seções e espaços de aprofundamento, se propõe como um local de discussão de temas em um debate aberto (http://cinema-ducation.fluctuat.net).
A Universidade de Massachussetts organizou o Media Education Foundation – MEF, mídia de desafio, que produz e distribui documentários destinados a estimular o pensamento crítico e o debate sobre a relação entre aqueles que detêm o poder sobre a mídia, os conteúdos da mídia comercial, a exigência democrática de um livre fluxo de informações, as diversas representações de idéias e pensamentos e o direito dos cidadãos de informar e serem informados. Alguns destes temas são abordados criticamente, como a identidade do gênero na publicidade, a imagem de sexo nos videoclipes, o papel da mídia na construção da identidade cultural, mídia e saúde, etc. (http://www.mediaed.org/).

(a cura di M. F. D’A.)

 
At 9/17/2007 2:45 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

AS CRIANÇAS E A MÍDIA (II PARTE):
ACEITAR O DESAFIO EDUCATIVO


O tema da 41ª Jornada das Comunicações Sociais, «As crianças e os meios de comunicação: um desafio para a comunicação», nos convida a refletir a respeito de dois aspectos particularmente importantes. O primeiro é a formação das crianças, para que estejam em condições de receber de maneira crítica aquilo que vêem. O segundo é a formação à consciência e ao uso consciente da mídia, que está em contínua transformação tecnológica.
De fato, é o que especifica Bento XVI no início de sua mensagem, de 20 de maio de 2007, para a Jornada: «Os complexos desafios que a educação contemporânea deve enfrentar são muitas vezes ligados à grande influência dos meios de comunicação no nosso mundo. Como aspecto do fenômeno da globalização e estimulados pelo rápido desenvolvimento da tecnologia, os meios de comunicação delineiam fortemente o ambiente cultural (cf. João Paulo II, O rápido desenvolvimento, nº3). Na realidade, há quem afirma que a influência formativa da mídia está em competição com aquela da escola, da Igreja e, quem sabe, até com aquela da própria família».
De fato, como salienta o Pontifício conselho para as Comunicações Sociais, «para muitas pessoas, a realidade corresponde àquilo que os meios de comunicação definem como tal». Episódios recentes, como a utilização do celular na filmagem de violências nas salas de aula, abusos sofridos por pessoas deficientes, fenômenos de trote e de violência generalizada, demonstram como as crianças que crescem passando uma média de quatro horas por dia diante da televisão, sozinhos em casa, absorveram a lógica do «estou no vídeo, logo existo». Os psicólogos, os pedagogos e os estudiosos dos meios de comunicação estudam há tempos sobre as relações entre o consumo televisivo e o comportamento violento dos menores. Uma grande quantidade de pesquisas realizadas em muitos países ocidentais demonstra como esta correlação seja realmente inegável.


NOVAS LINGUAGENS

O fato que muitas crianças vivem completamente inseridas no mundo dos velhos e novos meios de comunicação, que estão cada vez mais frequentemente em correlação entre eles, é confirmado pela popularidade de alguns modelos televisivos, considerados tão efêmeros quanto penosos «momentos de glória», presentes nos programas com os maiores índices de audiência, dos «reality» aos «talk show», sem falar do «trash», que hoje se tornou um gênero de espetáculo.
Dentre as preferências demonstradas pelos adolescentes italianos que assistem televisão mais do que três horas por dia, encontramos, em primeiro lugar, a figura da «veline» (Ndt: misto de corista e coadjuvante na apresentação de programas populares da televisão italiana), enquanto outros da mesma idade se concentram no mais clássico exemplo, o do jogador de futebol. De toda maneira, a coisa mais importante é aparecer, pouco importa por qual motivo, de ser «alguém» ou «alguma coisa» no Olimpo mediático, mesmo que seja apenas por um instante.
Estes são os exemplos mais negativos dos condicionamentos derivados de um excessivo e acrítico uso dos meios de comunicação. Encontramo-nos diante de uma nova geração que cresceu na frente da televisão, capaz de usar as novas tecnologias que os próprios pais, que as adquiriram e as tornaram disponíveis, muitas vezes se encontram despreparados para utilizá-las.
Tanto é verdade que hoje em dia os filmes são vistos diretamente nos celulares e a televisão pode ser assistida na tela do computador. Hoje se telefona através da internet e graças ao download se descarrega os CDs e DVDs mais recentes, se filma e se faz foto com o celular, e assim por diante.
Nas casas, o vocabulário familiar se reduziu ao gênero dos sms e se fala tendo o som da televisão no fundo, se comunica através de e-mail, se faz «visita virtual» via computador, se percorre através de bibliotecas virtuais, tanto que as fichas e arquivos de papel evocam imagens do outro século, completamente em desuso.
A situação dos nossos filhos é diversa daquela da geração precedente, pois eles abriram seus olhos tendo diante de si estes cenários de profunda, contínua e envolvente transformação tecnológica. Eles se constituem aquela que os estudiosos chamam de geração nascida «com seis dedos»: além dos cinco dedos normais da mão, o sexto é o mouse do computador.
Com o aparecimento do mundo «virtual» da internet e dos videogames criou-se uma defasagem em relação à realidade verdadeira e própria. As duas dimensões parecem muitas vezes, e para muitos jovens, como universos paralelos, com conseqüências não indiferentes no plano do processo de amadurecimento. Têm grande sucesso os sites nos quais se prevê uma segunda vida (basta verificar os milhares de registros nos poucos meses de existência do site italiano de «Second Life», que em todo o mundo já tem sete milhões de inscritos), onde a simulação reproduz todas as situações da vida real. Apenas que tudo é falso, a começar da nova identidade, que pode ser escolhida e com ela se inicia a fazer parte deste mundo fora do mundo, onde se pode ser um «qualquer coisa». Isto é, ninguém.
Assim, o grande desafio cultural de hoje é propriamente a redefinição dos limites, que muitas vezes se apresentam demasiadamente instáveis. Isto é, redefinição dos limites entre o real e o virtual, superando a divisão digital que hoje separa as gerações adultas daqueles mais jovens.


OS JOVENS: PROTAGONISTAS OU VÍTIMAS DAS MUDANÇAS?

A linguagem deles é pobre, muitas vezes recheada de termos tirados do dicionário do internauta: clicar, chatar, messagiar, deletar, são alguns dos neologismos que fazem parte de seu vocabulário quotidiano. Falta uma dimensão humana da tecnologia que esteja em condições de traçar o perímetro cultural entre o real e o virtual. Assim a aldeia global difundiu uma quantidade de modelos comportamentais desviados, ou pelo menos discutíveis.
Desta maneira, os jovens que vivem a milhões de quilômetros de distância jogam o mesmo videogame, vêem o mesmo filme, assim como, de maneira transversal, absorvem modelos e comportamentos semelhantes. Muitas vezes os adultos têm menos domínio no uso das novas tecnologias e observam, com uma preocupação resignada diante de suas próprias limitações, as crianças que navegam facilmente na internet.
As raízes das dificuldades neste campo educativo são muito bem explicadas por Marina D’Amato, professora de sociologia da Universidade de Roma, que salienta: «Cada geração tem necessidade de se encontrar também em um mundo fantástico, que serve a interiorizar o paradigma do bom e do belo, do justo e do errado, do oportuno e do útil, também em relação aos exemplos que procedem da narrativa. Hoje nos encontramos em uma condição na qual os avós e os pais contam cada vez menos histórias aos filhos e aos netos, e este papel foi assumido pela televisão. Mas, na realidade, a televisão “exila” e “con-funde”, isto é, funde os modelos morais que são frutos de ânsias e problemas mal resolvidos, muito mais que de certezas. Embora estes se transformem com freqüência, a cada três ou quatro anos, o fato de serem repropostos continuamente faz com que se justaponham uns aos outros» (ver Come mediare i media, de Mario Russo).
Se for verdade que a televisão é o meio mais usado até a adolescência, imediatamente depois surge a grande atração pela internet. Esta passagem nasce de uma sintonia com a linguagem televisiva, que na idade infantil muitas vezes é ouvida durante muitas horas no dia. Esta linguagem se baseia em uma mediação da realidade e desta maneira ela ativa um processo de recepção que é de tipo emotivo.
Neste registro emocional é mais fácil acabar envolvido por situações e figuras capazes de se proporem como modelos identificadores, preservadores de sentido e de comportamentos a serem imitados.
O poder de concentrar uma vontade emulativa em alguns personagens, que correspondem particularmente às necessidades interiores do jovem (necessidades na maioria das vezes induzidas pela publicidade ou por modelos estimuladores), tem uma forte relação com a quantidade de horas que o jovem passa utilizando os novos ou os velhos meios de comunicação.


EDUCAÇÃO NECESSÁRIA

«A formação adequada a um uso correto dos meios de comunicação é essencial para o desenvolvimento cultural, moral e espiritual das crianças… Educar as crianças a serem seletivas no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja, da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos. Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia, com a certeza de que este difícil, embora gratificante, aspecto da condição de pais, é apoiado por toda a comunidade.»
As palavras do discurso de Bento XVI definem com grande clareza o paradigma de uma justa relação entre a mídia e os menores. Uma clareza que devemos agradecer ao magistério da Igreja, no momento em que o mundo da mídia parece ignorar a verdadeira problemática educativa das crianças e as expectativas de qualidade e de segurança exigidas pelas famílias no que se refere ao uso desses meios, seja do cinema aos videogames, da televisão à internet.
Diante da utilização destorcera do meio televisivo, o mais difundido dentre os meios de comunicação, a Igreja se interroga sobre o porquê da televisão não ter um papel educativo e por que os meios de comunicação não podem ser companheiros confiáveis para os jogos na fase de crescimento da criança. O anúncio de uma recente campanha sobre o uso da mídia, promovida pelo Ministério das Comunicações, mostra os vários membros da família que estão vendo a televisão ao lado de uma criança.
Que se trate do avô ou da mãe, a mensagem é a mesma: não deixar uma criança sozinha diante de um meio que, sem o apoio crítico educativo de um adulto, pode transmitir conteúdos inadequados à idade e à maturidade daquele que o vê. Sem esquecer as responsabilidades dos produtores televisivos, empenhados na organização dos programas, o papel da família é realmente insubstituível.
Se realmente o objetivo de quem administra a sociedade de produção televisiva, ou das multinacionais produtoras de videogames ou das operadoras de celulares, é o de promover e vender o produto, o bem estar psicofísico da criança está no centro do interesse dos educadores, sejam eles os professores ou, em primeiro lugar, os pais.
Isto explica bem a mensagem do Papa, que continua a sua análise, salientando que «educar as crianças a serem seletivos no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja e da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos (ver João Paulo II, «Familiaris Consortio», 76). Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia.»


CONTEÚDO DA MÍDIA

No panorama de uma revolução da multimídia, que está modificando transversalmente os hábitos, a mentalidade, os modelos e as linguagens, deve voltar ao centro do debate a tutela daquilo que é melhor para os menores. Sem acusar a «mídia», que enquanto tal não é nem boa nem má, o importante é partir de uma a análise do produto, para assim poder individuar conteúdos que sejam de melhor qualidade para as crianças e os adolescentes. Porque a televisão é um instrumento que abre janelas de conhecimento para o mundo e, se bem utilizada, de «má professora» pode se tornar uma preciosa fonte de estímulo para o crescimento humano e cultural.
A mesma coisa vale, e com mais razão, para a «rede» que engloba e compreende tudo, e para os videogames, onde, ao invés de violência e monstros, poderia se dedicar a produzir (e isso já ocorre em certos casos) histórias instrutivas e de conteúdo interessante.
Bento XVI coloca justamente em evidência as enormes possibilidades para que seja melhorado o conteúdo deste grande campo de produção multimídia: «A educação através da mídia deveria ser positiva. Colocando as crianças diante de um meio estética e moralmente excelente, estas recebem uma ajuda para que desenvolvam a própria opinião, a prudência e a capacidade de discernimento. É importante aqui reconhecer o valor fundamental do exemplo dos pais e as vantagens de introduzir os jovens aos clássicos da literatura infantil (…). A beleza, quase um espelho do divino, inspira e vivifica os corações e as mentes juvenis, enquanto a feiúra e a vulgaridade têm um impacto deprimente sobre os comportamentos». Diante de uma decadência geral do produto televisivo, a questão da qualidade aparece ainda mais forte e vibrante em grande parte de um público formado de famílias, que pede para não ser apenas um exército indistinto de ouvintes silenciosos, mas um público em condições de exprimir suas preferências por conteúdos formativos e informativos de bom nível.
A mensagem de Bento XVI continua, com algumas importantes indicações: «Como a educação em geral, aquela da mídia requer também uma formação ao exercício da liberdade. Trata-se de uma responsabilidade que compromete. Muitas vezes a liberdade é apresentada como uma incansável procura do prazer ou de novas experiências (…). Este desejo, sentido profundamente pelos pais e educadores, que é o de educar as crianças no caminho da beleza, da verdade e da bondade, pode ser apoiado pela indústria da mídia somente na medida em que se promove a dignidade fundamental do ser humano, o verdadeiro valor da vida familiar, as conquistas positivas e as metas da humanidade. A partir disso, a necessidade de que os meios de comunicação estejam empenhados na efetiva formação e no respeito da ética deve ser vista com interesse particular e com urgência não apenas pelos pais, mas também por aqueles que têm responsabilidade cívica».
Na realidade, nos encontramos na situação de ter que reconhecer que na Itália falta uma verdadeira «cultura da criança»: a situação é tão séria que no âmbito institucional procura-se dar uma nova organização geral para verificar e controlar os conteúdos dos setores de entretenimento, como os videogames, que até agora estão submetidos apenas a códigos de auto-regulamentação, feitos e codificados para uso e consumo pelas indústrias produtoras.
Uma vez mais, o primeiro e indispensável apoio à criança só pode vir da família e de uma relação mais estreita com os professores e educadores, exatamente como salienta Bento XVI, lembrando-nos que a preocupação educativa dos pais não deve se tornar uma preocupação genérica, mas uma atenção constante a tudo aquilo que diz respeito aos filhos.

A INDÚSTRIA DA MÍDIA

1) A TELEVISÃO

Se a televisão convencional se apresenta como um ramo de atividade já «maduro», no entanto se apresenta no horizonte a situação da mídia digital (satélite ou a cabo), também como uma plataforma que consente a ligação entre televisão, internet e outro tipo de mídia através do computador. No que se refere à qualidade da programação, apesar dos inúmeros bons propósitos anunciados no âmbito institucional, parece pequena a atenção às exigências dos menores em suas diversas faixas etárias. A programação para os menores, na realidade é confinada em redes e horários particulares, enquanto o resto da programação na faixa horária considerada «para todos» muitas vezes apresenta conteúdos inadequados aos jovens. Mas, quais são as expectativas das gerações de jovens no que se refere à televisão? É realmente verdade que preferem o «trash», os jogos com prêmios absurdos e as «velines»?
A partir de uma pesquisa recente feita pelo instituto Censis sobre «Comunicação, pluralismo social, sociedade aberta» (2005) surge que a relação entre os menores, e em particular dos adolescentes entre os 14 e 18 anos de idade, e a televisão é determinada por elementos de forte contradição e de passividade. Nessa faixa etária, 100% deles vêem televisão praticamente todos os dias, 86% acompanham um pouco de tudo, com uma relevante predileção pelos filmes (72%), por esporte (32%) e pelos «reality shows» (18%).
No entanto, a amostragem entrevistada não está realmente satisfeita com aquilo que vê. De fato, 36% dos adolescentes denunciam a vulgaridade difundida nos programas e 25% criticam a superficialidade. Dentre eles, 46% consideram a televisão como um meio que «invade», ao mesmo tempo em que é interessante notar que 25% consideram que em geral a programação televisiva alimenta nas crianças menores uma visão consumista da vida. Destes dados surge o contraste entre a procura de distração e a reprovação daquilo que lhes é proposto pela programação. Isto significa que o alto índice de procura não é um indicador de satisfação.
Considerando o axioma de que a televisão seja onipresente, fica claro que são os próprios jovens a pedirem uma maior atenção aos conteúdos: menos violência e menos vulgaridade. A exigência de uma regulamentação diversa, diz claramente o relatório do Censis, «não vem somente daqueles, pais e educadores, que estão preocupados pela possível influência negativa sobre os menores, mas se exprime nitidamente também através dos adolescentes, pelo menos de uma parte mais esperta e consciente dentre eles».
Para tutelar melhor os direitos dos menores, desde 2002 foi instituído junto ao Ministério das Comunicações um código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual aderiram os produtores de televisão, seja no âmbito nacional como local. Baseando-se nos princípios sobre a matéria existentes na Constituição italiana e na Convenção dos direitos da criança, estabelecida em 1989 pela ONU, a comissão que controla sua aplicação avaliou em todos estes anos de atividade os milhares de casos em que foram violadas as normas de tutela, que prevêem a transmissão de programas e imagens adequadas a um público de menores de idade durante aquela que é chamada de «faixa protegida» da programação televisiva (das 7h30 às 22h30), intervindo com denúncias e sanções, que nos casos mais graves foram aplicadas pela Autoridade de garantia no setor das comunicações. Para o futuro, esta comissão deverá se transformar em um organismo mais amplo de controle, que se chamará «Mídia e menores», que além da televisão deverá monitorar também os setores dos vídeos-telefone e dos videogames, além da internet, que é o campo de maior risco.

REGRAS DE TUTELA EM OUTROS PAÍSES

É diversa a situação em outros países, como por exemplo na Grã Bretanha, onde o sistema de regulamentação da mídia é estruturado e complexo e foi atualizado nas últimas décadas, com uma particular atenção à tutela dos menores. As inovações tecnológicas neste setor levaram as normativas inglesas a uma série de novas disposições, como por exemplo, a visão em casa de vídeo exclusivamente para adultos, e que fora de casa seriam vetados aos menores, ou o combate à praga mundial dos sites internet para os pedófilos, que contenham material pornográfico ou com conteúdos que possam esconder o aliciamento de menores (ver a Protection Childres Act, de 1978).
A programação televisiva é regulamentada pelo Broadcasting Act (1996), de onde deriva a instituição da Broadcasting Standard Commission (BSC), um órgão independente de controle que estabelece as normas de avaliação e classificação dos programas, também no que se refere aos conteúdos violentos ou que possam ofender a decência pública (site oficial www.bsc.org.uk). Este organismo BSC funciona internamente à estrutura do Broadcasting, supervisionando e regulamentando todas as emissoras de televisão e de rádio, via cabo ou por satélite. Sua tarefa é a de elaborar os códigos de conduta e de aplicação de modelos que respeitem a justiça, além de monitorar os modelos, verificando que respeitem as leis. Com a transmissão de programas com conteúdos considerados inadequados aos menores de várias idades, há alguns anos a televisão inglesa adotou o sistema «watershed», um «separador de águas» entre um horário de programação familiar e outro para os adultos. Todo o sistema televisivo inglês se apóia sobre a responsabilização das famílias, pois sem a colaboração delas qualquer código de modelos para os programas é praticamente inútil.
Na França, está vigorando já há anos um código através de sinais televisivos, que entra em função para assinalar os programas inadequados aos menores. A avaliação do programa televisivo é feita pelo Conseil Supérieur de l’Audiovisuel (CSA), uma autoridade administrativa independente, que controla a difusão dos filmes e outras transmissões em vários canais privados, nacionais, regionais ou locais. A normativa francesa (lei 719/2002) veta a transmissão de programas que possam prejudicar gravemente a integridade física, mental e moral dos menores, porque divulgam conteúdos de pornografia ou de violência gratuita. As transmissões são classificadas por um código de sinais que, em conjunto com um sistema organizado de faixas horárias de programação, garante às famílias mais clareza sobre os programas destinados aos menores.
Na Alemanha, o tema da infância tem particular atenção da legislação, que considera desde o nascimento o início dos direitos fundamentais do cidadão. A tutela é disciplinada no âmbito público pela JSchG (desde o dia 26 de fevereiro de 1985), enquanto a lei GjSM se ocupa do controle sobre a difusão de publicações e conteúdos mediáticos considerados danosos para os menores. A regulamentação no setor televisivo é feita segundo as normas do acordo sobre a radiodifusão dos Lander federais, que as entidades para a mídia nesses Lander adotaram por base para o estabelecimento das diretivas que tutelam o interesse dos menores nas emissoras privadas. Não são admitidas transmissões que incitem o ódio racial, que exaltem a violência ou a guerra, que ofendam a dignidade do homem, que sejam de gênero pornográfico, que mostrem pessoas moribundas ou com sofrimentos que ofendam a dignidade humana. Os responsáveis pela programação, escolhendo os horários das transmissões, devem cuidar para que os menores não vejam programas que podem prejudicar o seu bem estar psíquico, físico ou mental. As transmissões inadequadas às crianças menores podem ser transmitidas somente depois da autorização da entidade competente do Land interessado.
Os responsáveis pela organização dos programas televisivos em âmbito nacional devem nomear encarregados pela tutela dos menores, que atuam no momento da aquisição, da projeção e da realização dos programas. As emissoras privadas fundaram em 1993 uma associação de autocontrole voluntário da televisão («Freiwillige Selbskontrolle Fernsehen», FSF), à qual devem ser apresentados programas particulares, antes da sua transmissão, e suas avaliações consideradas nas decisões das entidades de controle da mídia nos Lander federais. Existe ainda o órgão comum do cidadão para a tutela dos menores, dos programas, da competência mediática e controle da mídia (GSJP), do qual faz parte um integrante da entidade para a mídia nos Lander federais, que dá o seu parecer a respeito de algumas séries, filmes e espetáculos mais ou menos adequados aos menores. Este órgão, o GSJP, decide sobre pedidos de mudança de horários de transmissão de filmes proibidos para menores, controla a forma de novos programas e experimenta novas disposições para a tutela dos menores na televisão digital. A peculiaridade da jurisdição alemã, seja no setor televisivo como no cinematográfico e da mídia em geral, é a minuciosa atenção às exigências com o desenvolvimento do menor e aos riscos que este pode correr com a observância incorreta das leis.
Nos Estados Unidos, é possível consultar via internet um «guia televisivo para os pais» (ver o site www.mpaa.org), que prevê algumas categorias de audiência aplicadas aos programas televisivos transmitidos a todo o público. Este guia organiza várias siglas para identificar a categoria de audiência para cada transmissão: vai-se do TVY (para todas as crianças) ao TVG (para todos), através de várias faixas etárias, que correspondem à passagem da primeira à segunda infância e desta à adolescência. Depois tem o TVPG («parental guidance», visto na presença de um dos pais), o TV14 («parent strongly cautioned», séria advertência aos pais), para os programas que contêm cenas de sexo e de violência. Enfim, há o TVMA, que prevê um «mature audience only», ou seja, destinado a um público de idade superior a 17 anos, última fronteira para os conteúdos considerados «restricted».
Estas avaliações foram elaboradas baseando-se nas opiniões dos próprios pais e são fáceis de serem encontradas e compreendidas. Esta linha de «guia de televisão para os pais» pode ser usada juntamente ao «v-chip», que é um dispositivo de filtro instalado na maior parte dos mais recentes modelos de aparelhos de televisão, para permitir aos pais de bloquear os programas inadequados.

FICHA 1
Brasil: «O que eu penso da tv»
No Brasil, a audiência infantil é muito alta: aproximadamente 30 milhões de crianças vêem televisão pelo menos durante três horas por dia. Explica a profa. Rosália Duarte, do departamento de Ciência da Educação, da PUC do Rio de Janeiro, que «as crianças são muito perspicazes, mas nós podemos e devemos ajudá-las a ampliar o seu quadro de referências, para que possam discutir ainda melhor sobre o conteúdos daquilo que vêem. Para isso temos necessidade, antes de tudo, de ouvir aquilo que elas têm a dizer sobre o assunto e de dialogar com elas. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e muito mais freqüente, a outras atividades culturais». No âmbito de uma pesquisa feita através de um questionário distribuído nas escolas, intitulado «O que eu penso da tv», apareceu que «as crianças querem seriamente ser ouvidas sobre aquilo que pensam da tv, mas sentem que sua opinião é considerada pouco importante e não estão contentes com o excesso de imagens de violência exibidas na televisão, principalmente a violência “real”, definida como aquela transmitida nos telejornais. Eles adoram ver televisão e não importa o que os adultos pensam e dizem a respeito disso. A eles agradam quase todos os tipos de programas transmitidos: novelas, desenhos animados, programas de humor, filmes, seriados, mas isso não faz deles espectadores “idiotas”, pois fazem críticas muito interessantes, pertinentes e bem elaboradas sobre o que consideram feio ou inadequado na televisão. Para a maior parte deles, a televisão se oferece como principal opção de divertimento (em alguns casos, a única), o que significa um dado muito preocupante. Mas, o que chamou mais a nossa atenção é o grau de experiência com o qual essas crianças analisam a televisão: são expertos e demonstram conhecer a televisão também do lado de dentro, inclusive as linguagens que ela utiliza, a sua estrutura de produção, a sua lógica interna e as suas maneiras de intervenção».
As crianças aprendem os valores e os não-valores através da televisão, não resta dúvida, mas demonstram ter senso crítico a respeito deste assunto, quando afirmam nos textos que os programas transmitidos na tv podem lhes ensinar «a serem bons, a ter coragem e a fazer o bem, a cuidar da natureza e de si mesmos, a serem honestos e a lutar por aquilo que desejam», mas também «a serem cruéis e mentirosos, a roubar e matar, a não respeitar os pais e a comprar tudo aquilo que não têm necessidade». Falando sobre a validade do ensino através da mídia, a profa. Duarte salienta a necessidade de «ouvir aquilo que têm a dizer sobre o assunto e a dialogar com eles. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e mais freqüente, a outras atividades culturais».

FICHA 2
Observadores internacionais
Os dados examinados em janeiro de 2006 pelo OssCom, que é um centro de pesquisa da mídia, deixam evidente a tendência a realizar uma forma de co-regulamentação, onde a ação legislativa dos Estados membros se integra com medidas de auto-regulamentação por parte dos produtores, broadcasters e profissionais da comunicação sob o efeito de controles e sanções. São dois os instrumentos mais utilizados no âmbito europeu, observando-se as diretivas previstas no artigo 22 de «Televisão sem fronteiras»: a definição de faixas horárias protegidas (watershed) e os sinais mostrados na tela (determinados por um sistema de «rating»). Apesar disso, aos campos tradicionalmente problemáticos da violência e da pornografia se juntam novos campos de risco para os menores: a vulgaridade, abusos e dependências de substâncias, linguagem e comportamento vulgares, discriminações e abusos, violações e ofensas à dignidade humana. Os critérios de avaliação dos programas se constituem um problema que é partilhado por muitos países da União européia, ao mesmo tempo em que se prepara uma uniformização internacional dos sistemas de classificação (ver mais adiante, Nicam), baseados na visualização de cinco ícones que ilustram simbolicamente qual é a problemática do programa que está sendo analisado e para quais idades ele é desaconselhado.
Deve ser assinalada a atividade online da European Medi@culture. O projeto é promovido pela Comissão Européia, em Bruxelas, no quadro das iniciativas «e-Learning», administrado pelo centro mediático de Baden-Württemberg. O site apresenta informações sobre a educação à mídia na Europa, particularmente na França, Áustria, Finlândia e Alemanha. A seção de projetos de multimídia agrupa os projetos sobre a mídia desenvolvidos por escolas e associações de jovens ao longo do tempo (ver http://www.european-mediaculture.org).

FICHA 3
África do Sul: Encontro mundial sobre a mídia para a infância
Este encontro trienal se realizou no último mês de março em Johannesburg, na África do Sul, com a participação de expertos do setor representando diversos países. Em conjunto se discutiu sobre a necessidade de uma programação adequada às crianças, procurando entender de que modo a violência na mídia pode influir sobre a psíquico dos menores.
Mas, no 5º Encontro mundial sobre a mídia para a infância apresentaram-se também muitas crianças provenientes de todo o mundo e empenhadas em discutir sobre o difícil tema da «Mídia como instrumento de paz e de democracia global». Vieram guiados por grupos de adultos, dentre eles as diversas organizações católicas que há anos trabalham para promover regras para o bem da infância, a serem respeitadas nas transmissões de rádio e televisão através de códigos de regulamentação que devem ser redigidos ou, como em alguns casos, apenas atualizados. Em muitos países do sul do mundo as novas tecnologias de multimídia já estão muito disseminadas e seu uso merece uma atenção particular para tutelar o público mais jovem.
Especialmente na África, explicou o organizador do encontro, Firdoze Bulbulia, começa-se a examinar o projeto de um «Media center» para as crianças, que possa produzir e distribuir transmissões de rádio e de televisão destinadas ao público mais jovem, com o objetivo de realizar um canal televisivo pan-africano dedicado à infância. Os organizadores do encontro estão também trabalhando no projeto de uma aliança africana dos meios de informação e de comunicação, seguindo o modelo daquela já existente na América latina.

2) INTERNET

Na Itália, 47% das famílias italianas têm um computador em casa, um dado relevante mas sempre muito baixo em relação à média dos outros países europeus. O uso da internet por parte dos adolescentes e jovens, e a familiaridade que têm com tudo aquilo que pode ser digitado ou «descarregado» da internet, apresenta não poucos problemas. Pela sua própria natureza de rede de comunicação global, o problema se apresenta em ótica internacional, procurando garantir a tutela dos menores através de precisos acordos com os provedores para um efetivo controle de conteúdo. No campo italiano, até 2006, a tutela dos menores tinha sido deixada nas mãos dos próprios provedores, que em 19 de novembro de 2003 assinaram um acordo de auto-regulamentação: o Codice Internet e Minori. Embora o acordo tenha sido estipulado entre os representantes dos vários provedores diante do Ministério para a Inovação e a Tecnologia, no entanto ele permanece um acordo privado, com lacunas, principalmente no que se refere às sanções que muitas vezes devem ser aplicadas. Em 2006, na seqüência de numerosos casos de violência sobre menores, muitos dos quais realizados através da difusão de material pedo-pornográfico (quando não se tratava de verdadeiro e próprio aliciamento de menores via internet), foi promulgada a lei 38 de 6 de fevereiro de 2006: «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet».
Enfim, como aplicação da lei 38/2006, em fevereiro da 2007 foi publicado um decreto determinando os requisitos técnicos dos instrumentos de filtragem que os provedores da rede internet devem utilizar para impedir o acesso aos sites já assinalados pelo Centro nacional contra a pedo-pornografia. Mas, isso não basta para superar as dificuldades e impedir que os menores possam navegar de maneira arriscada na «rede das redes».
Atualmente foi reativada a comissão anti-pedofilia e desvios de menores através da internet, o «Ciclope», que tinha sido instituída junto ao Ministério para a Eqüidade, do governo italiano, e que ficou inativa por um ano, até a sua reestruturação junto ao Ministério da Família. Está também para entrar em função um site dedicado ao uso da internet, junto ao Ministério das Comunicações, e um número telefônico de emergência gratuito, organizado pelo mesmo ministério e por «Save the children», que poderá ser utilizado por qualquer cidadão que queira assinalar algum abuso, desvio ou pedo-pornografia. Dentre as iniciativas mais recentes, deve ser assinalado o site www.tiseiconnesso.it criado pelo Ministério das Comunicações italiano, sempre em colaboração com «Save the children», onde é colocada à disposição uma série de informações sobre o conteúdo de certos sites, seja para os pais como para as próprias crianças, em conjunto com a campanha televisiva que tem como slogan «A melhor maneira de ajudar o seu filho a não usar incorretamente as novas tecnologias é conhecê-las».
Deve ser salientado também o fato de como a rede se tornou um grande mercado online. Para alguns produtores, o «e-commerce» de brinquedos corresponde já a 4% das vendas, e apenas em 2005 as vendas online corresponderam a 37.600 ações de compra. As razões para investir no processo online são múltiplas: desde a possibilidade de evitar as dificuldades logísticas de distribuição dos produtos, à ampliação de ofertas diferentes de produtos e também a possibilidade de envolvimento do cliente através de campanhas de mala direta e a criação de comunidades virtuais em torno de alguns produtos.

FICHAS:
Pedo-pornografia e internet
Em março de 2006, entraram em vigor as novas medidas diretas de combate e repressão ao fenômeno de exploração sexual dos menores e a pedo-pornografia, estabelecidas pela lei 38/2006 – «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet» foi publicada no Diário oficial em 15 de fevereiro de 2006, nº.38 – com a qual foram substancialmente modificados e integrados os artigos 600bis e seguintes do Código Penal italiano.
A lei confirma os artigos 527, 528, 529 e 725 do Código Penal italiano, que punem os «atos obscenos em local público, publicações, espetáculos obscenos, desenhos ou figuras que ofendem a decência pública».
Porque em muitas publicações, transmissões televisivas e anúncios publicitários, mesmo que não tenham declaradamente um caráter pornográfico, imagens de crianças e adolescentes são apresentadas de maneira explícita ou mais ou menos sutilmente ilusória e de forma falsa, pede-se um novo empenho das instituições competentes para que sejam observadas as normas em vigor e, se preciso for, que façam apelo aos órgãos de Polícia, o Instituto de autodisciplina publicitária, o Ministério das Comunicações, a Polícia postal ou a «Comissão tv e menor».

3) CINEMA

Confirmando as disposições da Constituição italiana, no que se refere ao direito e ao dever das famílias de serem protagonistas na educação de seus filhos, para muitos é chegada à hora de reelaborar a legislação que define o conceito de «censura» (a lei 161/1962 prevê a possibilidade de negar a autorização de abertura às salas de cinema ou de fazer cortes nos filmes, mesmo em função de um público adulto), que hoje está superado. É preciso com urgência estabelecer um critério de tutela dos menores não apenas no que se refere aos filmes que vêem nos circuitos cinematográficos, mas também sucessivamente em casa, muitas vezes em horários acessíveis na programação da televisão.
Uma avaliação correta e preventiva de um filme permite à família ter à sua disposição os instrumentos para escolher se um espetáculo é mais ou menos oportuno, conhecendo a trama, os eventuais conteúdos mais sensíveis, a classificação que a obra recebeu em outros países, etc. Por isso, é justo que a legislação seja revista, uma operação que requer atenção e perspicácia da parte das instituições em um momento de transição da mídia, como este que estamos vivendo, quando esta se tornou realmente um importante componente na educação dos menores.
Não faltam filmes que atraem o público por causa de seu conteúdo de violência, e no entanto entram no circuito cinematográfico sem qualquer restrição de idade. Para um filme que é notícia nos jornais, existem muitos outros com conteúdos duvidosos ou até mesmo perigosos que conseguem passar através do filtro da comissão de revisão cinematográfica, que atualmente funciona junto ao departamento de cinema do Ministério dos Bens Culturais.
Ao mesmo tempo em que existe um projeto de lei do ministro dos Bens culturais, que deve ainda iniciar os trâmites parlamentares, novas situações se apresentam na Itália, com a autocensura de filmes, feita pelos produtores ou distribuidores cinematográficos, com a introdução de novas e mais específicas faixas etárias para as restrições visando os menores a partir dos 10 anos de idade. As restrições serão feitas baseando-se em uma avaliação classificatória dos conteúdos das obras e sucessivamente serão ainda analisadas por uma comissão de psicólogos, educadores e pais.
Este sistema se inspira no modelo americano da Motion Picture Association of America (MPAA), que há 40 anos representa os interesses da indústria do audiovisual americana no mundo. Funcionando a partir de regras bem precisas (estabelecidas ao longo dos anos, também segundo as sentenças dos tribunais federais nos vários Estados americanos e em base aos protestos dos cidadãos), a autocensura americana prevê a existência de uma única comissão competente para determinar as restrições do PG12 ao «restricted» 17 anos. Esta comissão é composta exclusivamente de pais, considerados os primeiros depositários da educação dos filhos, e representam transversalmente a audiência. Importantes sanções econômicas asseguram que o mecanismo de autocertificação corresponda efetivamente aos interesses dos cidadãos. No site da Motion Picture estão disponíveis aos pais os pontos de referência para a avaliação das obras de entretenimento e são publicadas as restrições aplicadas a cada filme que está em exibição nas salas de cinema. Geralmente as avaliações parecem muito mais severas em relação a outros países. Tudo isso, nos vários anos de sua aplicação, deu uma qualificação à indústria americana e seu correto serviço prestado aos ouvintes. Qualquer estrada que se pretenda seguir na Itália, é importante para as famílias que seja estimulado um mercado de produção adequado à infância: é justo que o mecanismo da indústria cinematográfica continue com o seu ritmo de produção, mas não é justo confundir as classificações de acesso ao produto, como qualquer indústria sabe muito bem.
No que se refere às normas européias de classificação dos filmes, e em geral de todo «entertainment» (neologismo anglo-saxão, que, no entanto encontra sua raiz etimológica na relação entre educação e jogo) acessível aos menores, deve ser citado o sistema NICAM, que funciona na Holanda há alguns anos. Fundado em 1999, o NICAM (Nederlands Instituut voor de Classificatie van Audiovisuele Media) se baseia na lei Media Act, onde os programas de grupos que tiveram a autorização para atividades de «broadcasting» não devem incluir obras audiovisuais que prejudiquem o desenvolvimento físico e psicológico de pessoas com menos de 16 anos de idade, seguindo as diretivas da União européia («Televisão sem fronteiras» IV).
O sistema de classificação preventiva funciona também na Grécia, com a lei 1.597, de maio de 1986, que prevê que antes da projeção nas salas de cinema, cada filme seja submetido pelo produtor ou pela sociedade de importação à Comissão para a juventude, que classifica o filme seja como adequado aos menores, ou proibido aos menores de 13 anos, ou de 17 anos ou ainda, nos casos mais graves, severamente inadequado aos menores. Esta comissão é um órgão do Ministério da Cultura e foi concebida procurando-se estabelecer certa proporcionalidade, sendo composta de representantes do Estado (Ministério da Cultura), das categorias ligadas ao cinema, de psicólogos especializados na educação, de sociólogos, dos jovens, dos educadores e dos pais.
Na Áustria, está em vigor um sistema de avaliação complexo, instituído em base a um princípio constitucional federal que confia a tutela dos menores, no que se refere ao cinema e em geral aos meios de comunicação de massa, à competência específica dos Lander. A lei nacional que engloba a regulamentação da mídia é a ORF-ACT, ou seja, a Austrian Broadcasting Corporation nº. 379/1984, que estabelece quais os critérios sobre os quais deve se basear a proteção aplicada a programas e filmes transmitidos na televisão ou através de outros canais mediáticos. No que se refere à exibição dos filmes, a avaliação preventiva das obras cinematográficas, para que sejam decididas as faixas etárias adequadas, é regulamentada pela lei austríaca para a tutela dos menores, a «Jugendschutzgesetz», aplicada através das leis dos Lander federais. Esta lei estabelece nove faixas de restrições de público a partir dos seis anos de idade, com uma sucessiva graduação que prevê restrições para 10, 12, 14 e 16 anos de idade. Para supervisionar o sistema de classificação cinematográfica, existe uma comissão junto ao Ministério da Educação, em Viena, que comunica seu parecer sobre a idoneidade dos filmes às autoridades locais. Geralmente e de maneira individual os Lander adotam as decisões da comissão, e é em âmbito local que se decide de sua aplicação.
Na Espanha, o artigo 20 da Constituição reconhece o direito do cidadão a exprimir e difundir livremente seu pensamento, suas idéias e suas opiniões através de qualquer meio de divulgação. Se por um lado o exercício de tais direitos «não pode ser restrito através de nenhum tipo de censura prévia», o mesmo artigo especifica que «estas liberdades têm o seu limite no respeito dos limites reconhecidos pelas normativas que exprimem este respeito, especialmente no direito à honra, à privacidade, à própria imagem e à proteção da juventude e da infância».
Baseando-se neste princípio, a qualificação dos filmes (Real decreto 81/1997) e das obras audiovisuais é feita antes de sua difusão, através do Instituto de cinematografia e das artes audiovisuais (ICAA), uma entidade autônoma, mas ao mesmo tempo ligada ao Ministério da Educação e Cultura através da secretaria de Estado para a cultura (ver site www.mcu.es).
A subdireção geral de fomento à indústria cinematográfica e do audiovisual, que faz parte do ICAA, se ocupa, dentre outras funções, da classificação em faixas etárias dos filmes e das outras obras audiovisuais em vista de sua exibição pública e para a sua distribuição. A comissão se encarrega de divulgar as informações sobre os filmes e programas audiovisuais, com classificação que vai desde as «salas X» até as restrições para cada faixa etária do público.
Os filmes de caráter pornográfico não podem receber subvenções do Estado e sua projeção nas salas prevê uma taxa suplementar, destinada em parte para estimular um fundo de proteção cinematográfica. A projeção destes filmes pode ser feita somente nas «salas X», onde não podem ser apresentados outros tipos de obras cinematográficas e onde é proibido o ingresso de menores de 18 anos.

CINEMA NA TV

Devido ao alto consumo de programas de televisão por parte dos menores e levando-se em conta as diretivas da União européia, que promovem a auto-regulamentação no âmbito nacional das emissoras de tv e a participação das famílias nesta obra educativa, há alguns anos estão em vigor na França, na Holanda, na Grã-Bretanha, na Grécia e na Itália os códigos de sinais, que servem para identificar tanto os filmes projetados na salas de cinema como aqueles transmitidos na televisão. A tutela dos menores no âmbito da televisão foi também feita adotando-se o chamado sistema «watershed» (separador das águas), que funciona segundo uma seleção de faixas horárias protegidas, algumas aconselhadas à visão dos menores, outras aconselhadas a todos e outras ainda, principalmente na programação noturna, indicadas somente a um público adulto.
A faixa de idade determinada pela classificação preventiva dos filmes tem obviamente uma repercussão na programação das chamadas faixas horárias protegidas ou distintas nas emissoras de televisão pública em todos os países europeus. A definição das linhas de conduta comuns está à base dos acordos de auto-regulamentação e de co-regulamentação dos programas de televisão, estabelecendo-se um código de procedimento comum para as emissoras tanto públicas como privadas. Criou-se assim uma base normativa, que é assumida pela autoridade do Estado e que recebe a confiança dos consumidores das emissoras públicas ou privadas que adotam este sistema de auto-regulamentação.
Para tornar visível aos adultos as classificações dos programas apropriados aos menores, muitas emissoras européias adotaram um sistema de sinais que através de símbolos, números, cores e sinais acústicos advertem ao público a respeito daquilo que está para ser transmitido.
Mas, apenas este sistema, assim como o de filtragem (tipo v-chip), não basta para garantir uma verdadeira tutela dos menores diante de um conjunto de imagens difíceis de serem decodificadas por um jovem. Deve-se pensar às imagens de guerra dos telejornais, dos filmes escabrosos ou às informações sobre os crimes hediondos, que muitas vezes têm como ambiente o próprio núcleo familiar.
É na colaboração entre Estado, produtores de programas audiovisuais e famílias que pode ser fundamentado um autêntico respeito dos menores que encoraje o crescimento positivo da criança em base aos valores fundamentais da pessoa humana.

4) CELULARES COM VÍDEO

Hoje a difusão dos celulares com vídeo chegou à Itália ao índice se 134%, o que significa que muitas pessoas possuem pelo menos dois celulares, inclusive os jovens e as crianças, que recebem este instrumento dos próprios pais. De fato, de duas crianças entre 8 e 13 anos de idade, uma delas tem um celular no bolso. Aquele que poderia ser um instrumento para controlar melhor os deslocamentos e as necessidades dos filhos, se revela no entanto um perigoso meio que pode expor a outro tipo de utilização por parte dos menores, que não se separam nunca do próprio celular, nem mesmo durante as aulas, como lamentam vários professores. Apesar do código de auto-regulamentação assinado pelas principais operadoras (Código de conduta para a oferta de serviços a pagamento em tutela dos menores), na realidade os novos serviços opcionais do celular o tornaram um «personal computer» capaz de permitir novos usos que antes não tinham.
Os desenvolvimentos tecnológicos que estão se verificando no campo da telefonia móvel – particularmente no que se refere à sinergia com a internet e a adoção dos sistemas DVB de vídeos-telefone – contribuem a aumentar a oportunidade de comunicação também para as novas gerações e, ao mesmo tempo, repropõem em novos termos a questão da tutela dos menores. As evoluções já previstas ulteriormente para os próximos anos e o número sempre crescente de pessoas envolvidas, pedem uma grande consciência social e uma constante atenção das pessoas e órgãos encarregados de garantir os direitos dos cidadãos.
Neste contexto devem ser reafirmados os direitos dos menores no campo da comunicação, dentre os quais certamente não está em último lugar aquele que se refere também à segurança diante dos riscos de indução a comportamentos ilícitos ou de acesso a conteúdos nocivos ou indesejados. Também neste campo é essencial o papel dos pais e, em geral, de todos aqueles que são chamados a ter uma função educativa. A maior segurança das crianças e dos jovens quanto ao acesso a conteúdos ilegais é um ponto que deve merecer atenção também através da maior conscientização dos pais e das mães, que devem se capacitar a conhecer e utilizar estes meios.
Para a «alfabetização» dos pais na utilização da mídia devem colaborar também as instituições públicas, promovendo um uso positivo das novas possibilidades tecnológicas. Às empresas cabe a responsabilidade de colocar no mercado um produto que dê garantias no que se refere à sua utilização pelos menores, superando os limites estabelecidos pelo código de auto-regulamentação assinado pelas operadoras de celulares. Devem também oferecer maiores informações aos adultos que assinam um contrato de utilização, como por exemplo a adoção de bloqueios automáticos de acesso a conteúdos nocivos, se o celular passa às mãos de um menor de idade.

5) VIDEOGAMES

Trata-se de uma indústria global, que conquistou os jovens e não apenas eles. Os números relativos à difusão repentina dos videogames indicam que existem 250 mil sites de videogames, cada um deles propõe uma série de títulos, muitos deles recheados de cenas de sexo e de violência. Uma pesquisa recente do Instituto italiano de medicina social (IIMS) coloca em evidência, entre outras coisas, a escassa informação por parte dos adultos a respeito dos videogames utilizados pelos filhos, o predomínio de temas violentas em mais de 30% de títulos não aconselhados aos menores, o predomínio de personagens virtuais normais que podem se tornar especiais, realizando ações extraordinárias.
Mas, o ponto de risco mais elevado se refere aos pequenos jogadores de videogames, crianças entre seis e nove anos de idade que se submetem a entrar tão intensamente no jogo virtual que chegam a formas de dissociação da realidade e solicitam um monitoramento muito atento da parte dos adultos. A mesma pesquisa indica a presença de videogames em 25% das famílias com crianças de três a cinco anos de idade e em 65,2% das famílias com crianças entre seis e 10 anos de idade. O que produz efeitos negativos no âmbito cognitivo das crianças não parece ser especificamente o meio, mas muito mais os elementos que criam a excitação, tais como a velocidade de produção do estímulo e da resposta, a velocidade das imagens, os efeitos especiais, os contrastes, a fragmentação da história, o binômio rumor-ação. O uso prolongado do jogo inibe, segundo alguns psicólogos, a área da capacidade crítica, provocando passividade e ao mesmo tempo agressividade na criança. Mas, não queremos demolir os videogames, porque existem aqueles que são muito adequados aos mais jovens, com valores de informação e de educação, seja também porque o uso deste meio é na realidade um passo na preparação da criança ao sucessivo e mais sofisticado, que é o uso da internet.
De qualquer maneira, os dados relativos à venda destes produtos de entretenimento mostram um crescimento em todos os lugares e a difusão deste meio é acompanhada de uma aceitação social (ou seria uma resignação?) sempre maior.
É urgente ampliar o percurso de conhecimento e das estratégias internacionais, para monitorar um mercado que está cada vez mais vasto. Parece urgente estabelecer modalidades operativas para o controle dos conteúdos e do sistema de sanções, seja para o produtor como para o vendedor dos serviços. O código de auto-regulamentação Pegi (derivado em 2003 do sistema de avaliação e classificação holandês, Nicam, que assinala os conteúdos inadequados aos menores), adotado pelos industriais de «entertainment» que produzem videogames, é a única forma de auto-regulamentação existente atualmente e que prevê sanções (raramente aplicadas, mesmo diante de casos graves evidentes) para os produtores que colocam no comércio os jogos com indicações de faixas etárias apenas aproximativas.
O código Pegi, ao qual a associação européia Isfe adere em 2002, é evidentemente insuficiente na sua função declarada de «fornecer aos consumidores as informações mais oportunas» e expostas no selo de produção. E, como o setor dos videogames tem hoje um volume de negócios que ultrapassa os 740 milhões de euros, envolvendo 24 milhões de jogadores (43% da população a partir dos quatro anos de idade), com uma venda dos produtos classificados para maiores de três anos de idade que chega aos quase 48% dos consumidores. É um dado que define o impacto deste gênero de meio sobre a infância e a adolescência, mostrando toda a sua periculosidade, seja pelo consumo de conteúdos inadequados, seja pelo excessivo número de horas dedicado neste passatempo, muitas vezes solitário e sem a presença de um adulto ao lado. Se for verdade, como sustenta a indústria, que a produção de videogames violentos é apenas uma mínima parte do mercado, é também verdade que esta representa a fatia mais importante do retorno econômico.
O interesse pelos videogames é alimentado pela sinergia com os filmes que inspiram o jogo homônimo e que torna sempre mais atrativo este gênero, principalmente para os adolescentes. Desta maneira é importante também neste campo o estabelecimento de regras precisas em defesa dos consumidores dentre o público jovem, mais exposto aos riscos destas novas formas de entretenimento cada vez mais sofisticadas e envolventes, por causa da combinação entre narrativa e efeitos gráficos.

6) PUBLICIDADE

O problema da tutela dos menores diante da publicidade se apresenta como um corolário, dentro do quadro mais amplo que regulamenta a difícil relação entre a mídia e as crianças. A televisão, e portanto também a publicidade, se constitui em uma fonte de perigo para os menores, isto é, para a maior parte das crianças, principalmente em idade pré-escolar, que devem saber fazer a diferença entre a publicidade e o resto da programação, e entre os programas de ficção e a realidade. Com essas considerações não significa que exista uma acrítica rejeição da publicidade em si mesma – à qual se reconhece, no entanto, onde proceda corretamente, uma função positiva no processo de formação, de crescimento crítico e de socialização do menor –, mas existe a necessidade de prever um sistema de regras destinado a garantir-lhe um uso adequado.
O efeito dos anúncios publicitários é tão grande que em alguns países estão sendo tomadas medidas drásticas a respeito. No Reino Unido, por exemplo, recentemente foram vetados os anúncios publicitários durante os programas destinados às crianças até nove anos de idade, a partir de 1º de janeiro de 2008 a medida se estenderá à programação para os jovens até 15 anos de idade e até o final de 2008 serão vetados em todos os canais dedicados aos menores. Apesar de se reconhecer que a publicidade serve para financiar os programas, aqueles dedicados às crianças terão que recorrer a outras fontes. Também na França começa a se impor uma «linha dura» a esse respeito: visto a alta incidência de publicidade de merendas, de sucos e doces em geral, a partir de agora os anúncios dedicados às crianças deverão ser precedidos de uma espécie de aviso, que orientará para uma alimentação adequada.
Mas, por que as crianças são tão frágeis diante dos apelos da publicidade? Na Itália, explica Paolo Landi, secretário geral da Adisconsum (Associação de defesa dos consumidores e do ambiente»), em um capítulo de seu estudo «Crianças da multimídia»: «Se consideramos que a publicidade não faz outra coisa que veicular um conhecimento imediatamente concretizável em um “ter”, ou em um “ser”, ou em um “fazer”, a criança absorve sem dificuldades os três componentes que são a obsessão dos expertos de marketing, isto é, o componente cognitivo (como fornecer informações indeléveis sobre um produto ou um serviço), o componente afetivo (como fazer o consumidor reagir de maneira emotiva) e o comportamental (como colocar o pequeno consumidor em movimento na direção da aquisição). A partir deste ponto de vista a criança é o público ideal, o consumidor a quem se pode vender qualquer coisa».
Na Itália está em vigor um código de autodisciplina publicitária que surgiu em 1966, em base a um acordo entre os profissionais do setor. Esta primeira forma de tutela, em grande parte com origem comunitária, tem como protagonistas entidades administrativas independentes: a Autoridade de controle da concorrência e do mercado de setor e a Autoridade de garantia para as comunicações e a editoria. Enquanto isso, para a auto-regulamentação, orientada pelas normas que constam do Código de autodisciplina publicitária, e agora também, embora com força jurídica diferente, pelo Código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual se reconhece um poder de decisão e de sanção, emanando uma ordem e intimando seu cumprimento.
Em todos os países onde a televisão serve de veículo às mensagens publicitárias, o mundo empresarial é plenamente consciente do enorme poder de influência que a publicidade tem sobre as crianças.



NORMATIVA INTERNACIONAL

O assunto relativo à tutela dos menores na mídia é um dos mais debatidos, seja no que se refere às normas nacionais, seja no âmbito internacional. Encontra-se diante da situação de precisar acertas as contas com toda a extensão da rede global da internet. O exemplo que, neste momento de transição, coloca mais em evidência a necessidade de estabelecer leis que estejam em condições de controlar o acesso e uso dos conteúdos nocivos para os menores, é exatamente o da internet. Qualquer pessoa no mundo pode abrir um site considerado «arriscado», contendo elementos ilegais e acessíveis a consumidores despreparados, disponibilizados por quem está do outro lado do mundo.
No que se refere aos princípios gerais no âmbito do direito internacional, é preciso recorrer principalmente à convenção da ONU sobre os direitos da criança, com sede em New York, ratificada pelo Parlamento italiano através da lei nº.176/1991. Esta garante à criança uma «consideração proeminente» também a respeito da liberdade, seja no se refere à expressão, seja quando tutela os conteúdos recebidos. Esta mesma convenção, em seu artigo 17, fala da relação entre menor e televisão, desejando «um sistema normativo que tutele o menor-consumidor, mesmo com todas as dificuldades que se apresentam», seja para individuar os fenômenos que devem ser monitorados, seja sobre as normativas possíveis.
No direito da União européia, tal tutela foi recentemente confirmada pela Carta dos direitos fundamentais da União, aprovada em Nice em 2000, cujo artigo 24 salienta que «os Estados membros reconhecem a importância da função exercida pelos meios de comunicação de massa e cuidam para que a criança possa ter acesso às informações e materiais... com a finalidade de promover o seu bem estar social, espiritual e moral, além de sua saúde física e mental». A normativa seguinte, 89/552/CEE, previu algumas restrições, seja no que se refere aos programas como para as mensagens publicitárias destinadas a este público». O artigo 22 desta normativa conduz a impedir a transmissão de programas que contenham cenas pornográficas ou de violência gratuita, ou outros programas inadequados a este público. Não podemos esquecer de mencionar a determinação expressa de «Televisão sem fronteiras», que está hoje em sua quinta versão atualizada, que o tema da tutela dos menores está relacionado com o estatuto geral dos direitos dos menores e corresponde ao disposto nos artigos 50 e 31 da Constituição italiana.
Se for claro que os princípios normativos são todos a favor da tutela dos menores, é também verdadeiro que uma tecnologia em contínua evolução colocou em crise as velhas regras do jogo. Mas também é claro que não se pode mais adiar a necessidade de estabelecer novos parâmetros normativos, para que as crianças possam utilizar os meios de comunicação próprios de seu tempo, com aproveitamento e serenidade também para as famílias.~

EDUCAÇÃO À MÍDIA NO MUNDO: PARA SABER MAIS

A difusão da educação à mídia é uma resposta à necessidade de se informar sobre as novidades no campo dos novos meios de comunicação. Em seguida citamos apenas alguns sites que em vários países oferecem maiores informações sobre como aprender a usar melhor a mídia, enfrentando a problemática da tutela dos menores e da alfabetização às novas tecnologias por parte dos adultos.
«The Media Awareness Nework-Réseau éducation médias» é uma organização canadense sem fins lucrativos, pioneira no desenvolvimento de programas sobre a educação à mídia. Com esta finalidade ela produz programas online em colaboração com organizações internacionais, convicta que, para interpretar as mensagens de informação, de entretenimento e comerciais, os jovens têm necessidade de instrumentos críticos válidos. Por isso é importante formar também os adultos (famílias e professores) sobre como funciona a mídia e como ela determina o estilo de vida.
A organização realiza uma ação contínua de monitoramento em relação à mídia (televisão, cinema, videogames, imprensa, publicidade, etc.), e sua seção dedicada aos pais oferece uma série de elementos para que estes reflitam com os filhos sobre esses meios, além da seção para os educadores, que inclui lições e materiais de apoio. Uma outra seção é dedicada à análise das questões ligadas à mídia, como a difusão de estereótipos, as representações de violência e da diversidade, a privacidade, a publicidade dirigida aos menores. Seu site é em inglês e francês (http://www.media-awareness.ca).
«Quai des images» é o site dedicado ao ensino de cinema e audiovisual organizado pelo Ministério da Educação francês. Ele propõe atividades ligadas à educação à imagem e de análise dos filmes em consonância com os programas escolares, agrupa os textos oficiais a respeito dos meios audiovisuais, oferece uma série de instrumentos de análise e de estudo completos sobre alguns filmes específicos e sobre certos autores em particular, informa sobre conferências, seminários, cursos e festivais sobre o mundo audiovisual e sua utilização em âmbito educativo e didático. Entre outras coisas, reúne também as propostas e as experiências feitas por professores e seus alunos nas escolas secundárias francesas no campo da educação à imagem, além de organizar um fórum de discussões aberto a todos sobre a educação à mídia (http://www.ac-nancy-metz.fr).
Sempre na França, está em funcionamento o blog «Zéro de conduite», organizado pelos professores e destinados a educadores, pais e estudantes. Promove o uso do cinema como instrumento pedagógico, dedicando-se especialmente à atualidade cinematográfica, mas sem esquecer os clássicos e os documentários. Com várias seções e espaços de aprofundamento, se propõe como um local de discussão de temas em um debate aberto (http://cinema-ducation.fluctuat.net).
A Universidade de Massachussetts organizou o Media Education Foundation – MEF, mídia de desafio, que produz e distribui documentários destinados a estimular o pensamento crítico e o debate sobre a relação entre aqueles que detêm o poder sobre a mídia, os conteúdos da mídia comercial, a exigência democrática de um livre fluxo de informações, as diversas representações de idéias e pensamentos e o direito dos cidadãos de informar e serem informados. Alguns destes temas são abordados criticamente, como a identidade do gênero na publicidade, a imagem de sexo nos videoclipes, o papel da mídia na construção da identidade cultural, mídia e saúde, etc. (http://www.mediaed.org/).

(a cura di M. F. D’A.)

 
At 9/17/2007 2:46 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

AS CRIANÇAS E A MÍDIA (II PARTE):
ACEITAR O DESAFIO EDUCATIVO


O tema da 41ª Jornada das Comunicações Sociais, «As crianças e os meios de comunicação: um desafio para a comunicação», nos convida a refletir a respeito de dois aspectos particularmente importantes. O primeiro é a formação das crianças, para que estejam em condições de receber de maneira crítica aquilo que vêem. O segundo é a formação à consciência e ao uso consciente da mídia, que está em contínua transformação tecnológica.
De fato, é o que especifica Bento XVI no início de sua mensagem, de 20 de maio de 2007, para a Jornada: «Os complexos desafios que a educação contemporânea deve enfrentar são muitas vezes ligados à grande influência dos meios de comunicação no nosso mundo. Como aspecto do fenômeno da globalização e estimulados pelo rápido desenvolvimento da tecnologia, os meios de comunicação delineiam fortemente o ambiente cultural (cf. João Paulo II, O rápido desenvolvimento, nº3). Na realidade, há quem afirma que a influência formativa da mídia está em competição com aquela da escola, da Igreja e, quem sabe, até com aquela da própria família».
De fato, como salienta o Pontifício conselho para as Comunicações Sociais, «para muitas pessoas, a realidade corresponde àquilo que os meios de comunicação definem como tal». Episódios recentes, como a utilização do celular na filmagem de violências nas salas de aula, abusos sofridos por pessoas deficientes, fenômenos de trote e de violência generalizada, demonstram como as crianças que crescem passando uma média de quatro horas por dia diante da televisão, sozinhos em casa, absorveram a lógica do «estou no vídeo, logo existo». Os psicólogos, os pedagogos e os estudiosos dos meios de comunicação estudam há tempos sobre as relações entre o consumo televisivo e o comportamento violento dos menores. Uma grande quantidade de pesquisas realizadas em muitos países ocidentais demonstra como esta correlação seja realmente inegável.


NOVAS LINGUAGENS

O fato que muitas crianças vivem completamente inseridas no mundo dos velhos e novos meios de comunicação, que estão cada vez mais frequentemente em correlação entre eles, é confirmado pela popularidade de alguns modelos televisivos, considerados tão efêmeros quanto penosos «momentos de glória», presentes nos programas com os maiores índices de audiência, dos «reality» aos «talk show», sem falar do «trash», que hoje se tornou um gênero de espetáculo.
Dentre as preferências demonstradas pelos adolescentes italianos que assistem televisão mais do que três horas por dia, encontramos, em primeiro lugar, a figura da «veline» (Ndt: misto de corista e coadjuvante na apresentação de programas populares da televisão italiana), enquanto outros da mesma idade se concentram no mais clássico exemplo, o do jogador de futebol. De toda maneira, a coisa mais importante é aparecer, pouco importa por qual motivo, de ser «alguém» ou «alguma coisa» no Olimpo mediático, mesmo que seja apenas por um instante.
Estes são os exemplos mais negativos dos condicionamentos derivados de um excessivo e acrítico uso dos meios de comunicação. Encontramo-nos diante de uma nova geração que cresceu na frente da televisão, capaz de usar as novas tecnologias que os próprios pais, que as adquiriram e as tornaram disponíveis, muitas vezes se encontram despreparados para utilizá-las.
Tanto é verdade que hoje em dia os filmes são vistos diretamente nos celulares e a televisão pode ser assistida na tela do computador. Hoje se telefona através da internet e graças ao download se descarrega os CDs e DVDs mais recentes, se filma e se faz foto com o celular, e assim por diante.
Nas casas, o vocabulário familiar se reduziu ao gênero dos sms e se fala tendo o som da televisão no fundo, se comunica através de e-mail, se faz «visita virtual» via computador, se percorre através de bibliotecas virtuais, tanto que as fichas e arquivos de papel evocam imagens do outro século, completamente em desuso.
A situação dos nossos filhos é diversa daquela da geração precedente, pois eles abriram seus olhos tendo diante de si estes cenários de profunda, contínua e envolvente transformação tecnológica. Eles se constituem aquela que os estudiosos chamam de geração nascida «com seis dedos»: além dos cinco dedos normais da mão, o sexto é o mouse do computador.
Com o aparecimento do mundo «virtual» da internet e dos videogames criou-se uma defasagem em relação à realidade verdadeira e própria. As duas dimensões parecem muitas vezes, e para muitos jovens, como universos paralelos, com conseqüências não indiferentes no plano do processo de amadurecimento. Têm grande sucesso os sites nos quais se prevê uma segunda vida (basta verificar os milhares de registros nos poucos meses de existência do site italiano de «Second Life», que em todo o mundo já tem sete milhões de inscritos), onde a simulação reproduz todas as situações da vida real. Apenas que tudo é falso, a começar da nova identidade, que pode ser escolhida e com ela se inicia a fazer parte deste mundo fora do mundo, onde se pode ser um «qualquer coisa». Isto é, ninguém.
Assim, o grande desafio cultural de hoje é propriamente a redefinição dos limites, que muitas vezes se apresentam demasiadamente instáveis. Isto é, redefinição dos limites entre o real e o virtual, superando a divisão digital que hoje separa as gerações adultas daqueles mais jovens.


OS JOVENS: PROTAGONISTAS OU VÍTIMAS DAS MUDANÇAS?

A linguagem deles é pobre, muitas vezes recheada de termos tirados do dicionário do internauta: clicar, chatar, messagiar, deletar, são alguns dos neologismos que fazem parte de seu vocabulário quotidiano. Falta uma dimensão humana da tecnologia que esteja em condições de traçar o perímetro cultural entre o real e o virtual. Assim a aldeia global difundiu uma quantidade de modelos comportamentais desviados, ou pelo menos discutíveis.
Desta maneira, os jovens que vivem a milhões de quilômetros de distância jogam o mesmo videogame, vêem o mesmo filme, assim como, de maneira transversal, absorvem modelos e comportamentos semelhantes. Muitas vezes os adultos têm menos domínio no uso das novas tecnologias e observam, com uma preocupação resignada diante de suas próprias limitações, as crianças que navegam facilmente na internet.
As raízes das dificuldades neste campo educativo são muito bem explicadas por Marina D’Amato, professora de sociologia da Universidade de Roma, que salienta: «Cada geração tem necessidade de se encontrar também em um mundo fantástico, que serve a interiorizar o paradigma do bom e do belo, do justo e do errado, do oportuno e do útil, também em relação aos exemplos que procedem da narrativa. Hoje nos encontramos em uma condição na qual os avós e os pais contam cada vez menos histórias aos filhos e aos netos, e este papel foi assumido pela televisão. Mas, na realidade, a televisão “exila” e “con-funde”, isto é, funde os modelos morais que são frutos de ânsias e problemas mal resolvidos, muito mais que de certezas. Embora estes se transformem com freqüência, a cada três ou quatro anos, o fato de serem repropostos continuamente faz com que se justaponham uns aos outros» (ver Come mediare i media, de Mario Russo).
Se for verdade que a televisão é o meio mais usado até a adolescência, imediatamente depois surge a grande atração pela internet. Esta passagem nasce de uma sintonia com a linguagem televisiva, que na idade infantil muitas vezes é ouvida durante muitas horas no dia. Esta linguagem se baseia em uma mediação da realidade e desta maneira ela ativa um processo de recepção que é de tipo emotivo.
Neste registro emocional é mais fácil acabar envolvido por situações e figuras capazes de se proporem como modelos identificadores, preservadores de sentido e de comportamentos a serem imitados.
O poder de concentrar uma vontade emulativa em alguns personagens, que correspondem particularmente às necessidades interiores do jovem (necessidades na maioria das vezes induzidas pela publicidade ou por modelos estimuladores), tem uma forte relação com a quantidade de horas que o jovem passa utilizando os novos ou os velhos meios de comunicação.


EDUCAÇÃO NECESSÁRIA

«A formação adequada a um uso correto dos meios de comunicação é essencial para o desenvolvimento cultural, moral e espiritual das crianças… Educar as crianças a serem seletivas no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja, da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos. Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia, com a certeza de que este difícil, embora gratificante, aspecto da condição de pais, é apoiado por toda a comunidade.»
As palavras do discurso de Bento XVI definem com grande clareza o paradigma de uma justa relação entre a mídia e os menores. Uma clareza que devemos agradecer ao magistério da Igreja, no momento em que o mundo da mídia parece ignorar a verdadeira problemática educativa das crianças e as expectativas de qualidade e de segurança exigidas pelas famílias no que se refere ao uso desses meios, seja do cinema aos videogames, da televisão à internet.
Diante da utilização destorcera do meio televisivo, o mais difundido dentre os meios de comunicação, a Igreja se interroga sobre o porquê da televisão não ter um papel educativo e por que os meios de comunicação não podem ser companheiros confiáveis para os jogos na fase de crescimento da criança. O anúncio de uma recente campanha sobre o uso da mídia, promovida pelo Ministério das Comunicações, mostra os vários membros da família que estão vendo a televisão ao lado de uma criança.
Que se trate do avô ou da mãe, a mensagem é a mesma: não deixar uma criança sozinha diante de um meio que, sem o apoio crítico educativo de um adulto, pode transmitir conteúdos inadequados à idade e à maturidade daquele que o vê. Sem esquecer as responsabilidades dos produtores televisivos, empenhados na organização dos programas, o papel da família é realmente insubstituível.
Se realmente o objetivo de quem administra a sociedade de produção televisiva, ou das multinacionais produtoras de videogames ou das operadoras de celulares, é o de promover e vender o produto, o bem estar psicofísico da criança está no centro do interesse dos educadores, sejam eles os professores ou, em primeiro lugar, os pais.
Isto explica bem a mensagem do Papa, que continua a sua análise, salientando que «educar as crianças a serem seletivos no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja e da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos (ver João Paulo II, «Familiaris Consortio», 76). Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia.»


CONTEÚDO DA MÍDIA

No panorama de uma revolução da multimídia, que está modificando transversalmente os hábitos, a mentalidade, os modelos e as linguagens, deve voltar ao centro do debate a tutela daquilo que é melhor para os menores. Sem acusar a «mídia», que enquanto tal não é nem boa nem má, o importante é partir de uma a análise do produto, para assim poder individuar conteúdos que sejam de melhor qualidade para as crianças e os adolescentes. Porque a televisão é um instrumento que abre janelas de conhecimento para o mundo e, se bem utilizada, de «má professora» pode se tornar uma preciosa fonte de estímulo para o crescimento humano e cultural.
A mesma coisa vale, e com mais razão, para a «rede» que engloba e compreende tudo, e para os videogames, onde, ao invés de violência e monstros, poderia se dedicar a produzir (e isso já ocorre em certos casos) histórias instrutivas e de conteúdo interessante.
Bento XVI coloca justamente em evidência as enormes possibilidades para que seja melhorado o conteúdo deste grande campo de produção multimídia: «A educação através da mídia deveria ser positiva. Colocando as crianças diante de um meio estética e moralmente excelente, estas recebem uma ajuda para que desenvolvam a própria opinião, a prudência e a capacidade de discernimento. É importante aqui reconhecer o valor fundamental do exemplo dos pais e as vantagens de introduzir os jovens aos clássicos da literatura infantil (…). A beleza, quase um espelho do divino, inspira e vivifica os corações e as mentes juvenis, enquanto a feiúra e a vulgaridade têm um impacto deprimente sobre os comportamentos». Diante de uma decadência geral do produto televisivo, a questão da qualidade aparece ainda mais forte e vibrante em grande parte de um público formado de famílias, que pede para não ser apenas um exército indistinto de ouvintes silenciosos, mas um público em condições de exprimir suas preferências por conteúdos formativos e informativos de bom nível.
A mensagem de Bento XVI continua, com algumas importantes indicações: «Como a educação em geral, aquela da mídia requer também uma formação ao exercício da liberdade. Trata-se de uma responsabilidade que compromete. Muitas vezes a liberdade é apresentada como uma incansável procura do prazer ou de novas experiências (…). Este desejo, sentido profundamente pelos pais e educadores, que é o de educar as crianças no caminho da beleza, da verdade e da bondade, pode ser apoiado pela indústria da mídia somente na medida em que se promove a dignidade fundamental do ser humano, o verdadeiro valor da vida familiar, as conquistas positivas e as metas da humanidade. A partir disso, a necessidade de que os meios de comunicação estejam empenhados na efetiva formação e no respeito da ética deve ser vista com interesse particular e com urgência não apenas pelos pais, mas também por aqueles que têm responsabilidade cívica».
Na realidade, nos encontramos na situação de ter que reconhecer que na Itália falta uma verdadeira «cultura da criança»: a situação é tão séria que no âmbito institucional procura-se dar uma nova organização geral para verificar e controlar os conteúdos dos setores de entretenimento, como os videogames, que até agora estão submetidos apenas a códigos de auto-regulamentação, feitos e codificados para uso e consumo pelas indústrias produtoras.
Uma vez mais, o primeiro e indispensável apoio à criança só pode vir da família e de uma relação mais estreita com os professores e educadores, exatamente como salienta Bento XVI, lembrando-nos que a preocupação educativa dos pais não deve se tornar uma preocupação genérica, mas uma atenção constante a tudo aquilo que diz respeito aos filhos.

A INDÚSTRIA DA MÍDIA

1) A TELEVISÃO

Se a televisão convencional se apresenta como um ramo de atividade já «maduro», no entanto se apresenta no horizonte a situação da mídia digital (satélite ou a cabo), também como uma plataforma que consente a ligação entre televisão, internet e outro tipo de mídia através do computador. No que se refere à qualidade da programação, apesar dos inúmeros bons propósitos anunciados no âmbito institucional, parece pequena a atenção às exigências dos menores em suas diversas faixas etárias. A programação para os menores, na realidade é confinada em redes e horários particulares, enquanto o resto da programação na faixa horária considerada «para todos» muitas vezes apresenta conteúdos inadequados aos jovens. Mas, quais são as expectativas das gerações de jovens no que se refere à televisão? É realmente verdade que preferem o «trash», os jogos com prêmios absurdos e as «velines»?
A partir de uma pesquisa recente feita pelo instituto Censis sobre «Comunicação, pluralismo social, sociedade aberta» (2005) surge que a relação entre os menores, e em particular dos adolescentes entre os 14 e 18 anos de idade, e a televisão é determinada por elementos de forte contradição e de passividade. Nessa faixa etária, 100% deles vêem televisão praticamente todos os dias, 86% acompanham um pouco de tudo, com uma relevante predileção pelos filmes (72%), por esporte (32%) e pelos «reality shows» (18%).
No entanto, a amostragem entrevistada não está realmente satisfeita com aquilo que vê. De fato, 36% dos adolescentes denunciam a vulgaridade difundida nos programas e 25% criticam a superficialidade. Dentre eles, 46% consideram a televisão como um meio que «invade», ao mesmo tempo em que é interessante notar que 25% consideram que em geral a programação televisiva alimenta nas crianças menores uma visão consumista da vida. Destes dados surge o contraste entre a procura de distração e a reprovação daquilo que lhes é proposto pela programação. Isto significa que o alto índice de procura não é um indicador de satisfação.
Considerando o axioma de que a televisão seja onipresente, fica claro que são os próprios jovens a pedirem uma maior atenção aos conteúdos: menos violência e menos vulgaridade. A exigência de uma regulamentação diversa, diz claramente o relatório do Censis, «não vem somente daqueles, pais e educadores, que estão preocupados pela possível influência negativa sobre os menores, mas se exprime nitidamente também através dos adolescentes, pelo menos de uma parte mais esperta e consciente dentre eles».
Para tutelar melhor os direitos dos menores, desde 2002 foi instituído junto ao Ministério das Comunicações um código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual aderiram os produtores de televisão, seja no âmbito nacional como local. Baseando-se nos princípios sobre a matéria existentes na Constituição italiana e na Convenção dos direitos da criança, estabelecida em 1989 pela ONU, a comissão que controla sua aplicação avaliou em todos estes anos de atividade os milhares de casos em que foram violadas as normas de tutela, que prevêem a transmissão de programas e imagens adequadas a um público de menores de idade durante aquela que é chamada de «faixa protegida» da programação televisiva (das 7h30 às 22h30), intervindo com denúncias e sanções, que nos casos mais graves foram aplicadas pela Autoridade de garantia no setor das comunicações. Para o futuro, esta comissão deverá se transformar em um organismo mais amplo de controle, que se chamará «Mídia e menores», que além da televisão deverá monitorar também os setores dos vídeos-telefone e dos videogames, além da internet, que é o campo de maior risco.

REGRAS DE TUTELA EM OUTROS PAÍSES

É diversa a situação em outros países, como por exemplo na Grã Bretanha, onde o sistema de regulamentação da mídia é estruturado e complexo e foi atualizado nas últimas décadas, com uma particular atenção à tutela dos menores. As inovações tecnológicas neste setor levaram as normativas inglesas a uma série de novas disposições, como por exemplo, a visão em casa de vídeo exclusivamente para adultos, e que fora de casa seriam vetados aos menores, ou o combate à praga mundial dos sites internet para os pedófilos, que contenham material pornográfico ou com conteúdos que possam esconder o aliciamento de menores (ver a Protection Childres Act, de 1978).
A programação televisiva é regulamentada pelo Broadcasting Act (1996), de onde deriva a instituição da Broadcasting Standard Commission (BSC), um órgão independente de controle que estabelece as normas de avaliação e classificação dos programas, também no que se refere aos conteúdos violentos ou que possam ofender a decência pública (site oficial www.bsc.org.uk). Este organismo BSC funciona internamente à estrutura do Broadcasting, supervisionando e regulamentando todas as emissoras de televisão e de rádio, via cabo ou por satélite. Sua tarefa é a de elaborar os códigos de conduta e de aplicação de modelos que respeitem a justiça, além de monitorar os modelos, verificando que respeitem as leis. Com a transmissão de programas com conteúdos considerados inadequados aos menores de várias idades, há alguns anos a televisão inglesa adotou o sistema «watershed», um «separador de águas» entre um horário de programação familiar e outro para os adultos. Todo o sistema televisivo inglês se apóia sobre a responsabilização das famílias, pois sem a colaboração delas qualquer código de modelos para os programas é praticamente inútil.
Na França, está vigorando já há anos um código através de sinais televisivos, que entra em função para assinalar os programas inadequados aos menores. A avaliação do programa televisivo é feita pelo Conseil Supérieur de l’Audiovisuel (CSA), uma autoridade administrativa independente, que controla a difusão dos filmes e outras transmissões em vários canais privados, nacionais, regionais ou locais. A normativa francesa (lei 719/2002) veta a transmissão de programas que possam prejudicar gravemente a integridade física, mental e moral dos menores, porque divulgam conteúdos de pornografia ou de violência gratuita. As transmissões são classificadas por um código de sinais que, em conjunto com um sistema organizado de faixas horárias de programação, garante às famílias mais clareza sobre os programas destinados aos menores.
Na Alemanha, o tema da infância tem particular atenção da legislação, que considera desde o nascimento o início dos direitos fundamentais do cidadão. A tutela é disciplinada no âmbito público pela JSchG (desde o dia 26 de fevereiro de 1985), enquanto a lei GjSM se ocupa do controle sobre a difusão de publicações e conteúdos mediáticos considerados danosos para os menores. A regulamentação no setor televisivo é feita segundo as normas do acordo sobre a radiodifusão dos Lander federais, que as entidades para a mídia nesses Lander adotaram por base para o estabelecimento das diretivas que tutelam o interesse dos menores nas emissoras privadas. Não são admitidas transmissões que incitem o ódio racial, que exaltem a violência ou a guerra, que ofendam a dignidade do homem, que sejam de gênero pornográfico, que mostrem pessoas moribundas ou com sofrimentos que ofendam a dignidade humana. Os responsáveis pela programação, escolhendo os horários das transmissões, devem cuidar para que os menores não vejam programas que podem prejudicar o seu bem estar psíquico, físico ou mental. As transmissões inadequadas às crianças menores podem ser transmitidas somente depois da autorização da entidade competente do Land interessado.
Os responsáveis pela organização dos programas televisivos em âmbito nacional devem nomear encarregados pela tutela dos menores, que atuam no momento da aquisição, da projeção e da realização dos programas. As emissoras privadas fundaram em 1993 uma associação de autocontrole voluntário da televisão («Freiwillige Selbskontrolle Fernsehen», FSF), à qual devem ser apresentados programas particulares, antes da sua transmissão, e suas avaliações consideradas nas decisões das entidades de controle da mídia nos Lander federais. Existe ainda o órgão comum do cidadão para a tutela dos menores, dos programas, da competência mediática e controle da mídia (GSJP), do qual faz parte um integrante da entidade para a mídia nos Lander federais, que dá o seu parecer a respeito de algumas séries, filmes e espetáculos mais ou menos adequados aos menores. Este órgão, o GSJP, decide sobre pedidos de mudança de horários de transmissão de filmes proibidos para menores, controla a forma de novos programas e experimenta novas disposições para a tutela dos menores na televisão digital. A peculiaridade da jurisdição alemã, seja no setor televisivo como no cinematográfico e da mídia em geral, é a minuciosa atenção às exigências com o desenvolvimento do menor e aos riscos que este pode correr com a observância incorreta das leis.
Nos Estados Unidos, é possível consultar via internet um «guia televisivo para os pais» (ver o site www.mpaa.org), que prevê algumas categorias de audiência aplicadas aos programas televisivos transmitidos a todo o público. Este guia organiza várias siglas para identificar a categoria de audiência para cada transmissão: vai-se do TVY (para todas as crianças) ao TVG (para todos), através de várias faixas etárias, que correspondem à passagem da primeira à segunda infância e desta à adolescência. Depois tem o TVPG («parental guidance», visto na presença de um dos pais), o TV14 («parent strongly cautioned», séria advertência aos pais), para os programas que contêm cenas de sexo e de violência. Enfim, há o TVMA, que prevê um «mature audience only», ou seja, destinado a um público de idade superior a 17 anos, última fronteira para os conteúdos considerados «restricted».
Estas avaliações foram elaboradas baseando-se nas opiniões dos próprios pais e são fáceis de serem encontradas e compreendidas. Esta linha de «guia de televisão para os pais» pode ser usada juntamente ao «v-chip», que é um dispositivo de filtro instalado na maior parte dos mais recentes modelos de aparelhos de televisão, para permitir aos pais de bloquear os programas inadequados.

FICHA 1
Brasil: «O que eu penso da tv»
No Brasil, a audiência infantil é muito alta: aproximadamente 30 milhões de crianças vêem televisão pelo menos durante três horas por dia. Explica a profa. Rosália Duarte, do departamento de Ciência da Educação, da PUC do Rio de Janeiro, que «as crianças são muito perspicazes, mas nós podemos e devemos ajudá-las a ampliar o seu quadro de referências, para que possam discutir ainda melhor sobre o conteúdos daquilo que vêem. Para isso temos necessidade, antes de tudo, de ouvir aquilo que elas têm a dizer sobre o assunto e de dialogar com elas. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e muito mais freqüente, a outras atividades culturais». No âmbito de uma pesquisa feita através de um questionário distribuído nas escolas, intitulado «O que eu penso da tv», apareceu que «as crianças querem seriamente ser ouvidas sobre aquilo que pensam da tv, mas sentem que sua opinião é considerada pouco importante e não estão contentes com o excesso de imagens de violência exibidas na televisão, principalmente a violência “real”, definida como aquela transmitida nos telejornais. Eles adoram ver televisão e não importa o que os adultos pensam e dizem a respeito disso. A eles agradam quase todos os tipos de programas transmitidos: novelas, desenhos animados, programas de humor, filmes, seriados, mas isso não faz deles espectadores “idiotas”, pois fazem críticas muito interessantes, pertinentes e bem elaboradas sobre o que consideram feio ou inadequado na televisão. Para a maior parte deles, a televisão se oferece como principal opção de divertimento (em alguns casos, a única), o que significa um dado muito preocupante. Mas, o que chamou mais a nossa atenção é o grau de experiência com o qual essas crianças analisam a televisão: são expertos e demonstram conhecer a televisão também do lado de dentro, inclusive as linguagens que ela utiliza, a sua estrutura de produção, a sua lógica interna e as suas maneiras de intervenção».
As crianças aprendem os valores e os não-valores através da televisão, não resta dúvida, mas demonstram ter senso crítico a respeito deste assunto, quando afirmam nos textos que os programas transmitidos na tv podem lhes ensinar «a serem bons, a ter coragem e a fazer o bem, a cuidar da natureza e de si mesmos, a serem honestos e a lutar por aquilo que desejam», mas também «a serem cruéis e mentirosos, a roubar e matar, a não respeitar os pais e a comprar tudo aquilo que não têm necessidade». Falando sobre a validade do ensino através da mídia, a profa. Duarte salienta a necessidade de «ouvir aquilo que têm a dizer sobre o assunto e a dialogar com eles. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e mais freqüente, a outras atividades culturais».

FICHA 2
Observadores internacionais
Os dados examinados em janeiro de 2006 pelo OssCom, que é um centro de pesquisa da mídia, deixam evidente a tendência a realizar uma forma de co-regulamentação, onde a ação legislativa dos Estados membros se integra com medidas de auto-regulamentação por parte dos produtores, broadcasters e profissionais da comunicação sob o efeito de controles e sanções. São dois os instrumentos mais utilizados no âmbito europeu, observando-se as diretivas previstas no artigo 22 de «Televisão sem fronteiras»: a definição de faixas horárias protegidas (watershed) e os sinais mostrados na tela (determinados por um sistema de «rating»). Apesar disso, aos campos tradicionalmente problemáticos da violência e da pornografia se juntam novos campos de risco para os menores: a vulgaridade, abusos e dependências de substâncias, linguagem e comportamento vulgares, discriminações e abusos, violações e ofensas à dignidade humana. Os critérios de avaliação dos programas se constituem um problema que é partilhado por muitos países da União européia, ao mesmo tempo em que se prepara uma uniformização internacional dos sistemas de classificação (ver mais adiante, Nicam), baseados na visualização de cinco ícones que ilustram simbolicamente qual é a problemática do programa que está sendo analisado e para quais idades ele é desaconselhado.
Deve ser assinalada a atividade online da European Medi@culture. O projeto é promovido pela Comissão Européia, em Bruxelas, no quadro das iniciativas «e-Learning», administrado pelo centro mediático de Baden-Württemberg. O site apresenta informações sobre a educação à mídia na Europa, particularmente na França, Áustria, Finlândia e Alemanha. A seção de projetos de multimídia agrupa os projetos sobre a mídia desenvolvidos por escolas e associações de jovens ao longo do tempo (ver http://www.european-mediaculture.org).

FICHA 3
África do Sul: Encontro mundial sobre a mídia para a infância
Este encontro trienal se realizou no último mês de março em Johannesburg, na África do Sul, com a participação de expertos do setor representando diversos países. Em conjunto se discutiu sobre a necessidade de uma programação adequada às crianças, procurando entender de que modo a violência na mídia pode influir sobre a psíquico dos menores.
Mas, no 5º Encontro mundial sobre a mídia para a infância apresentaram-se também muitas crianças provenientes de todo o mundo e empenhadas em discutir sobre o difícil tema da «Mídia como instrumento de paz e de democracia global». Vieram guiados por grupos de adultos, dentre eles as diversas organizações católicas que há anos trabalham para promover regras para o bem da infância, a serem respeitadas nas transmissões de rádio e televisão através de códigos de regulamentação que devem ser redigidos ou, como em alguns casos, apenas atualizados. Em muitos países do sul do mundo as novas tecnologias de multimídia já estão muito disseminadas e seu uso merece uma atenção particular para tutelar o público mais jovem.
Especialmente na África, explicou o organizador do encontro, Firdoze Bulbulia, começa-se a examinar o projeto de um «Media center» para as crianças, que possa produzir e distribuir transmissões de rádio e de televisão destinadas ao público mais jovem, com o objetivo de realizar um canal televisivo pan-africano dedicado à infância. Os organizadores do encontro estão também trabalhando no projeto de uma aliança africana dos meios de informação e de comunicação, seguindo o modelo daquela já existente na América latina.

2) INTERNET

Na Itália, 47% das famílias italianas têm um computador em casa, um dado relevante mas sempre muito baixo em relação à média dos outros países europeus. O uso da internet por parte dos adolescentes e jovens, e a familiaridade que têm com tudo aquilo que pode ser digitado ou «descarregado» da internet, apresenta não poucos problemas. Pela sua própria natureza de rede de comunicação global, o problema se apresenta em ótica internacional, procurando garantir a tutela dos menores através de precisos acordos com os provedores para um efetivo controle de conteúdo. No campo italiano, até 2006, a tutela dos menores tinha sido deixada nas mãos dos próprios provedores, que em 19 de novembro de 2003 assinaram um acordo de auto-regulamentação: o Codice Internet e Minori. Embora o acordo tenha sido estipulado entre os representantes dos vários provedores diante do Ministério para a Inovação e a Tecnologia, no entanto ele permanece um acordo privado, com lacunas, principalmente no que se refere às sanções que muitas vezes devem ser aplicadas. Em 2006, na seqüência de numerosos casos de violência sobre menores, muitos dos quais realizados através da difusão de material pedo-pornográfico (quando não se tratava de verdadeiro e próprio aliciamento de menores via internet), foi promulgada a lei 38 de 6 de fevereiro de 2006: «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet».
Enfim, como aplicação da lei 38/2006, em fevereiro da 2007 foi publicado um decreto determinando os requisitos técnicos dos instrumentos de filtragem que os provedores da rede internet devem utilizar para impedir o acesso aos sites já assinalados pelo Centro nacional contra a pedo-pornografia. Mas, isso não basta para superar as dificuldades e impedir que os menores possam navegar de maneira arriscada na «rede das redes».
Atualmente foi reativada a comissão anti-pedofilia e desvios de menores através da internet, o «Ciclope», que tinha sido instituída junto ao Ministério para a Eqüidade, do governo italiano, e que ficou inativa por um ano, até a sua reestruturação junto ao Ministério da Família. Está também para entrar em função um site dedicado ao uso da internet, junto ao Ministério das Comunicações, e um número telefônico de emergência gratuito, organizado pelo mesmo ministério e por «Save the children», que poderá ser utilizado por qualquer cidadão que queira assinalar algum abuso, desvio ou pedo-pornografia. Dentre as iniciativas mais recentes, deve ser assinalado o site www.tiseiconnesso.it criado pelo Ministério das Comunicações italiano, sempre em colaboração com «Save the children», onde é colocada à disposição uma série de informações sobre o conteúdo de certos sites, seja para os pais como para as próprias crianças, em conjunto com a campanha televisiva que tem como slogan «A melhor maneira de ajudar o seu filho a não usar incorretamente as novas tecnologias é conhecê-las».
Deve ser salientado também o fato de como a rede se tornou um grande mercado online. Para alguns produtores, o «e-commerce» de brinquedos corresponde já a 4% das vendas, e apenas em 2005 as vendas online corresponderam a 37.600 ações de compra. As razões para investir no processo online são múltiplas: desde a possibilidade de evitar as dificuldades logísticas de distribuição dos produtos, à ampliação de ofertas diferentes de produtos e também a possibilidade de envolvimento do cliente através de campanhas de mala direta e a criação de comunidades virtuais em torno de alguns produtos.

FICHAS:
Pedo-pornografia e internet
Em março de 2006, entraram em vigor as novas medidas diretas de combate e repressão ao fenômeno de exploração sexual dos menores e a pedo-pornografia, estabelecidas pela lei 38/2006 – «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet» foi publicada no Diário oficial em 15 de fevereiro de 2006, nº.38 – com a qual foram substancialmente modificados e integrados os artigos 600bis e seguintes do Código Penal italiano.
A lei confirma os artigos 527, 528, 529 e 725 do Código Penal italiano, que punem os «atos obscenos em local público, publicações, espetáculos obscenos, desenhos ou figuras que ofendem a decência pública».
Porque em muitas publicações, transmissões televisivas e anúncios publicitários, mesmo que não tenham declaradamente um caráter pornográfico, imagens de crianças e adolescentes são apresentadas de maneira explícita ou mais ou menos sutilmente ilusória e de forma falsa, pede-se um novo empenho das instituições competentes para que sejam observadas as normas em vigor e, se preciso for, que façam apelo aos órgãos de Polícia, o Instituto de autodisciplina publicitária, o Ministério das Comunicações, a Polícia postal ou a «Comissão tv e menor».

3) CINEMA

Confirmando as disposições da Constituição italiana, no que se refere ao direito e ao dever das famílias de serem protagonistas na educação de seus filhos, para muitos é chegada à hora de reelaborar a legislação que define o conceito de «censura» (a lei 161/1962 prevê a possibilidade de negar a autorização de abertura às salas de cinema ou de fazer cortes nos filmes, mesmo em função de um público adulto), que hoje está superado. É preciso com urgência estabelecer um critério de tutela dos menores não apenas no que se refere aos filmes que vêem nos circuitos cinematográficos, mas também sucessivamente em casa, muitas vezes em horários acessíveis na programação da televisão.
Uma avaliação correta e preventiva de um filme permite à família ter à sua disposição os instrumentos para escolher se um espetáculo é mais ou menos oportuno, conhecendo a trama, os eventuais conteúdos mais sensíveis, a classificação que a obra recebeu em outros países, etc. Por isso, é justo que a legislação seja revista, uma operação que requer atenção e perspicácia da parte das instituições em um momento de transição da mídia, como este que estamos vivendo, quando esta se tornou realmente um importante componente na educação dos menores.
Não faltam filmes que atraem o público por causa de seu conteúdo de violência, e no entanto entram no circuito cinematográfico sem qualquer restrição de idade. Para um filme que é notícia nos jornais, existem muitos outros com conteúdos duvidosos ou até mesmo perigosos que conseguem passar através do filtro da comissão de revisão cinematográfica, que atualmente funciona junto ao departamento de cinema do Ministério dos Bens Culturais.
Ao mesmo tempo em que existe um projeto de lei do ministro dos Bens culturais, que deve ainda iniciar os trâmites parlamentares, novas situações se apresentam na Itália, com a autocensura de filmes, feita pelos produtores ou distribuidores cinematográficos, com a introdução de novas e mais específicas faixas etárias para as restrições visando os menores a partir dos 10 anos de idade. As restrições serão feitas baseando-se em uma avaliação classificatória dos conteúdos das obras e sucessivamente serão ainda analisadas por uma comissão de psicólogos, educadores e pais.
Este sistema se inspira no modelo americano da Motion Picture Association of America (MPAA), que há 40 anos representa os interesses da indústria do audiovisual americana no mundo. Funcionando a partir de regras bem precisas (estabelecidas ao longo dos anos, também segundo as sentenças dos tribunais federais nos vários Estados americanos e em base aos protestos dos cidadãos), a autocensura americana prevê a existência de uma única comissão competente para determinar as restrições do PG12 ao «restricted» 17 anos. Esta comissão é composta exclusivamente de pais, considerados os primeiros depositários da educação dos filhos, e representam transversalmente a audiência. Importantes sanções econômicas asseguram que o mecanismo de autocertificação corresponda efetivamente aos interesses dos cidadãos. No site da Motion Picture estão disponíveis aos pais os pontos de referência para a avaliação das obras de entretenimento e são publicadas as restrições aplicadas a cada filme que está em exibição nas salas de cinema. Geralmente as avaliações parecem muito mais severas em relação a outros países. Tudo isso, nos vários anos de sua aplicação, deu uma qualificação à indústria americana e seu correto serviço prestado aos ouvintes. Qualquer estrada que se pretenda seguir na Itália, é importante para as famílias que seja estimulado um mercado de produção adequado à infância: é justo que o mecanismo da indústria cinematográfica continue com o seu ritmo de produção, mas não é justo confundir as classificações de acesso ao produto, como qualquer indústria sabe muito bem.
No que se refere às normas européias de classificação dos filmes, e em geral de todo «entertainment» (neologismo anglo-saxão, que, no entanto encontra sua raiz etimológica na relação entre educação e jogo) acessível aos menores, deve ser citado o sistema NICAM, que funciona na Holanda há alguns anos. Fundado em 1999, o NICAM (Nederlands Instituut voor de Classificatie van Audiovisuele Media) se baseia na lei Media Act, onde os programas de grupos que tiveram a autorização para atividades de «broadcasting» não devem incluir obras audiovisuais que prejudiquem o desenvolvimento físico e psicológico de pessoas com menos de 16 anos de idade, seguindo as diretivas da União européia («Televisão sem fronteiras» IV).
O sistema de classificação preventiva funciona também na Grécia, com a lei 1.597, de maio de 1986, que prevê que antes da projeção nas salas de cinema, cada filme seja submetido pelo produtor ou pela sociedade de importação à Comissão para a juventude, que classifica o filme seja como adequado aos menores, ou proibido aos menores de 13 anos, ou de 17 anos ou ainda, nos casos mais graves, severamente inadequado aos menores. Esta comissão é um órgão do Ministério da Cultura e foi concebida procurando-se estabelecer certa proporcionalidade, sendo composta de representantes do Estado (Ministério da Cultura), das categorias ligadas ao cinema, de psicólogos especializados na educação, de sociólogos, dos jovens, dos educadores e dos pais.
Na Áustria, está em vigor um sistema de avaliação complexo, instituído em base a um princípio constitucional federal que confia a tutela dos menores, no que se refere ao cinema e em geral aos meios de comunicação de massa, à competência específica dos Lander. A lei nacional que engloba a regulamentação da mídia é a ORF-ACT, ou seja, a Austrian Broadcasting Corporation nº. 379/1984, que estabelece quais os critérios sobre os quais deve se basear a proteção aplicada a programas e filmes transmitidos na televisão ou através de outros canais mediáticos. No que se refere à exibição dos filmes, a avaliação preventiva das obras cinematográficas, para que sejam decididas as faixas etárias adequadas, é regulamentada pela lei austríaca para a tutela dos menores, a «Jugendschutzgesetz», aplicada através das leis dos Lander federais. Esta lei estabelece nove faixas de restrições de público a partir dos seis anos de idade, com uma sucessiva graduação que prevê restrições para 10, 12, 14 e 16 anos de idade. Para supervisionar o sistema de classificação cinematográfica, existe uma comissão junto ao Ministério da Educação, em Viena, que comunica seu parecer sobre a idoneidade dos filmes às autoridades locais. Geralmente e de maneira individual os Lander adotam as decisões da comissão, e é em âmbito local que se decide de sua aplicação.
Na Espanha, o artigo 20 da Constituição reconhece o direito do cidadão a exprimir e difundir livremente seu pensamento, suas idéias e suas opiniões através de qualquer meio de divulgação. Se por um lado o exercício de tais direitos «não pode ser restrito através de nenhum tipo de censura prévia», o mesmo artigo especifica que «estas liberdades têm o seu limite no respeito dos limites reconhecidos pelas normativas que exprimem este respeito, especialmente no direito à honra, à privacidade, à própria imagem e à proteção da juventude e da infância».
Baseando-se neste princípio, a qualificação dos filmes (Real decreto 81/1997) e das obras audiovisuais é feita antes de sua difusão, através do Instituto de cinematografia e das artes audiovisuais (ICAA), uma entidade autônoma, mas ao mesmo tempo ligada ao Ministério da Educação e Cultura através da secretaria de Estado para a cultura (ver site www.mcu.es).
A subdireção geral de fomento à indústria cinematográfica e do audiovisual, que faz parte do ICAA, se ocupa, dentre outras funções, da classificação em faixas etárias dos filmes e das outras obras audiovisuais em vista de sua exibição pública e para a sua distribuição. A comissão se encarrega de divulgar as informações sobre os filmes e programas audiovisuais, com classificação que vai desde as «salas X» até as restrições para cada faixa etária do público.
Os filmes de caráter pornográfico não podem receber subvenções do Estado e sua projeção nas salas prevê uma taxa suplementar, destinada em parte para estimular um fundo de proteção cinematográfica. A projeção destes filmes pode ser feita somente nas «salas X», onde não podem ser apresentados outros tipos de obras cinematográficas e onde é proibido o ingresso de menores de 18 anos.

CINEMA NA TV

Devido ao alto consumo de programas de televisão por parte dos menores e levando-se em conta as diretivas da União européia, que promovem a auto-regulamentação no âmbito nacional das emissoras de tv e a participação das famílias nesta obra educativa, há alguns anos estão em vigor na França, na Holanda, na Grã-Bretanha, na Grécia e na Itália os códigos de sinais, que servem para identificar tanto os filmes projetados na salas de cinema como aqueles transmitidos na televisão. A tutela dos menores no âmbito da televisão foi também feita adotando-se o chamado sistema «watershed» (separador das águas), que funciona segundo uma seleção de faixas horárias protegidas, algumas aconselhadas à visão dos menores, outras aconselhadas a todos e outras ainda, principalmente na programação noturna, indicadas somente a um público adulto.
A faixa de idade determinada pela classificação preventiva dos filmes tem obviamente uma repercussão na programação das chamadas faixas horárias protegidas ou distintas nas emissoras de televisão pública em todos os países europeus. A definição das linhas de conduta comuns está à base dos acordos de auto-regulamentação e de co-regulamentação dos programas de televisão, estabelecendo-se um código de procedimento comum para as emissoras tanto públicas como privadas. Criou-se assim uma base normativa, que é assumida pela autoridade do Estado e que recebe a confiança dos consumidores das emissoras públicas ou privadas que adotam este sistema de auto-regulamentação.
Para tornar visível aos adultos as classificações dos programas apropriados aos menores, muitas emissoras européias adotaram um sistema de sinais que através de símbolos, números, cores e sinais acústicos advertem ao público a respeito daquilo que está para ser transmitido.
Mas, apenas este sistema, assim como o de filtragem (tipo v-chip), não basta para garantir uma verdadeira tutela dos menores diante de um conjunto de imagens difíceis de serem decodificadas por um jovem. Deve-se pensar às imagens de guerra dos telejornais, dos filmes escabrosos ou às informações sobre os crimes hediondos, que muitas vezes têm como ambiente o próprio núcleo familiar.
É na colaboração entre Estado, produtores de programas audiovisuais e famílias que pode ser fundamentado um autêntico respeito dos menores que encoraje o crescimento positivo da criança em base aos valores fundamentais da pessoa humana.

4) CELULARES COM VÍDEO

Hoje a difusão dos celulares com vídeo chegou à Itália ao índice se 134%, o que significa que muitas pessoas possuem pelo menos dois celulares, inclusive os jovens e as crianças, que recebem este instrumento dos próprios pais. De fato, de duas crianças entre 8 e 13 anos de idade, uma delas tem um celular no bolso. Aquele que poderia ser um instrumento para controlar melhor os deslocamentos e as necessidades dos filhos, se revela no entanto um perigoso meio que pode expor a outro tipo de utilização por parte dos menores, que não se separam nunca do próprio celular, nem mesmo durante as aulas, como lamentam vários professores. Apesar do código de auto-regulamentação assinado pelas principais operadoras (Código de conduta para a oferta de serviços a pagamento em tutela dos menores), na realidade os novos serviços opcionais do celular o tornaram um «personal computer» capaz de permitir novos usos que antes não tinham.
Os desenvolvimentos tecnológicos que estão se verificando no campo da telefonia móvel – particularmente no que se refere à sinergia com a internet e a adoção dos sistemas DVB de vídeos-telefone – contribuem a aumentar a oportunidade de comunicação também para as novas gerações e, ao mesmo tempo, repropõem em novos termos a questão da tutela dos menores. As evoluções já previstas ulteriormente para os próximos anos e o número sempre crescente de pessoas envolvidas, pedem uma grande consciência social e uma constante atenção das pessoas e órgãos encarregados de garantir os direitos dos cidadãos.
Neste contexto devem ser reafirmados os direitos dos menores no campo da comunicação, dentre os quais certamente não está em último lugar aquele que se refere também à segurança diante dos riscos de indução a comportamentos ilícitos ou de acesso a conteúdos nocivos ou indesejados. Também neste campo é essencial o papel dos pais e, em geral, de todos aqueles que são chamados a ter uma função educativa. A maior segurança das crianças e dos jovens quanto ao acesso a conteúdos ilegais é um ponto que deve merecer atenção também através da maior conscientização dos pais e das mães, que devem se capacitar a conhecer e utilizar estes meios.
Para a «alfabetização» dos pais na utilização da mídia devem colaborar também as instituições públicas, promovendo um uso positivo das novas possibilidades tecnológicas. Às empresas cabe a responsabilidade de colocar no mercado um produto que dê garantias no que se refere à sua utilização pelos menores, superando os limites estabelecidos pelo código de auto-regulamentação assinado pelas operadoras de celulares. Devem também oferecer maiores informações aos adultos que assinam um contrato de utilização, como por exemplo a adoção de bloqueios automáticos de acesso a conteúdos nocivos, se o celular passa às mãos de um menor de idade.

5) VIDEOGAMES

Trata-se de uma indústria global, que conquistou os jovens e não apenas eles. Os números relativos à difusão repentina dos videogames indicam que existem 250 mil sites de videogames, cada um deles propõe uma série de títulos, muitos deles recheados de cenas de sexo e de violência. Uma pesquisa recente do Instituto italiano de medicina social (IIMS) coloca em evidência, entre outras coisas, a escassa informação por parte dos adultos a respeito dos videogames utilizados pelos filhos, o predomínio de temas violentas em mais de 30% de títulos não aconselhados aos menores, o predomínio de personagens virtuais normais que podem se tornar especiais, realizando ações extraordinárias.
Mas, o ponto de risco mais elevado se refere aos pequenos jogadores de videogames, crianças entre seis e nove anos de idade que se submetem a entrar tão intensamente no jogo virtual que chegam a formas de dissociação da realidade e solicitam um monitoramento muito atento da parte dos adultos. A mesma pesquisa indica a presença de videogames em 25% das famílias com crianças de três a cinco anos de idade e em 65,2% das famílias com crianças entre seis e 10 anos de idade. O que produz efeitos negativos no âmbito cognitivo das crianças não parece ser especificamente o meio, mas muito mais os elementos que criam a excitação, tais como a velocidade de produção do estímulo e da resposta, a velocidade das imagens, os efeitos especiais, os contrastes, a fragmentação da história, o binômio rumor-ação. O uso prolongado do jogo inibe, segundo alguns psicólogos, a área da capacidade crítica, provocando passividade e ao mesmo tempo agressividade na criança. Mas, não queremos demolir os videogames, porque existem aqueles que são muito adequados aos mais jovens, com valores de informação e de educação, seja também porque o uso deste meio é na realidade um passo na preparação da criança ao sucessivo e mais sofisticado, que é o uso da internet.
De qualquer maneira, os dados relativos à venda destes produtos de entretenimento mostram um crescimento em todos os lugares e a difusão deste meio é acompanhada de uma aceitação social (ou seria uma resignação?) sempre maior.
É urgente ampliar o percurso de conhecimento e das estratégias internacionais, para monitorar um mercado que está cada vez mais vasto. Parece urgente estabelecer modalidades operativas para o controle dos conteúdos e do sistema de sanções, seja para o produtor como para o vendedor dos serviços. O código de auto-regulamentação Pegi (derivado em 2003 do sistema de avaliação e classificação holandês, Nicam, que assinala os conteúdos inadequados aos menores), adotado pelos industriais de «entertainment» que produzem videogames, é a única forma de auto-regulamentação existente atualmente e que prevê sanções (raramente aplicadas, mesmo diante de casos graves evidentes) para os produtores que colocam no comércio os jogos com indicações de faixas etárias apenas aproximativas.
O código Pegi, ao qual a associação européia Isfe adere em 2002, é evidentemente insuficiente na sua função declarada de «fornecer aos consumidores as informações mais oportunas» e expostas no selo de produção. E, como o setor dos videogames tem hoje um volume de negócios que ultrapassa os 740 milhões de euros, envolvendo 24 milhões de jogadores (43% da população a partir dos quatro anos de idade), com uma venda dos produtos classificados para maiores de três anos de idade que chega aos quase 48% dos consumidores. É um dado que define o impacto deste gênero de meio sobre a infância e a adolescência, mostrando toda a sua periculosidade, seja pelo consumo de conteúdos inadequados, seja pelo excessivo número de horas dedicado neste passatempo, muitas vezes solitário e sem a presença de um adulto ao lado. Se for verdade, como sustenta a indústria, que a produção de videogames violentos é apenas uma mínima parte do mercado, é também verdade que esta representa a fatia mais importante do retorno econômico.
O interesse pelos videogames é alimentado pela sinergia com os filmes que inspiram o jogo homônimo e que torna sempre mais atrativo este gênero, principalmente para os adolescentes. Desta maneira é importante também neste campo o estabelecimento de regras precisas em defesa dos consumidores dentre o público jovem, mais exposto aos riscos destas novas formas de entretenimento cada vez mais sofisticadas e envolventes, por causa da combinação entre narrativa e efeitos gráficos.

6) PUBLICIDADE

O problema da tutela dos menores diante da publicidade se apresenta como um corolário, dentro do quadro mais amplo que regulamenta a difícil relação entre a mídia e as crianças. A televisão, e portanto também a publicidade, se constitui em uma fonte de perigo para os menores, isto é, para a maior parte das crianças, principalmente em idade pré-escolar, que devem saber fazer a diferença entre a publicidade e o resto da programação, e entre os programas de ficção e a realidade. Com essas considerações não significa que exista uma acrítica rejeição da publicidade em si mesma – à qual se reconhece, no entanto, onde proceda corretamente, uma função positiva no processo de formação, de crescimento crítico e de socialização do menor –, mas existe a necessidade de prever um sistema de regras destinado a garantir-lhe um uso adequado.
O efeito dos anúncios publicitários é tão grande que em alguns países estão sendo tomadas medidas drásticas a respeito. No Reino Unido, por exemplo, recentemente foram vetados os anúncios publicitários durante os programas destinados às crianças até nove anos de idade, a partir de 1º de janeiro de 2008 a medida se estenderá à programação para os jovens até 15 anos de idade e até o final de 2008 serão vetados em todos os canais dedicados aos menores. Apesar de se reconhecer que a publicidade serve para financiar os programas, aqueles dedicados às crianças terão que recorrer a outras fontes. Também na França começa a se impor uma «linha dura» a esse respeito: visto a alta incidência de publicidade de merendas, de sucos e doces em geral, a partir de agora os anúncios dedicados às crianças deverão ser precedidos de uma espécie de aviso, que orientará para uma alimentação adequada.
Mas, por que as crianças são tão frágeis diante dos apelos da publicidade? Na Itália, explica Paolo Landi, secretário geral da Adisconsum (Associação de defesa dos consumidores e do ambiente»), em um capítulo de seu estudo «Crianças da multimídia»: «Se consideramos que a publicidade não faz outra coisa que veicular um conhecimento imediatamente concretizável em um “ter”, ou em um “ser”, ou em um “fazer”, a criança absorve sem dificuldades os três componentes que são a obsessão dos expertos de marketing, isto é, o componente cognitivo (como fornecer informações indeléveis sobre um produto ou um serviço), o componente afetivo (como fazer o consumidor reagir de maneira emotiva) e o comportamental (como colocar o pequeno consumidor em movimento na direção da aquisição). A partir deste ponto de vista a criança é o público ideal, o consumidor a quem se pode vender qualquer coisa».
Na Itália está em vigor um código de autodisciplina publicitária que surgiu em 1966, em base a um acordo entre os profissionais do setor. Esta primeira forma de tutela, em grande parte com origem comunitária, tem como protagonistas entidades administrativas independentes: a Autoridade de controle da concorrência e do mercado de setor e a Autoridade de garantia para as comunicações e a editoria. Enquanto isso, para a auto-regulamentação, orientada pelas normas que constam do Código de autodisciplina publicitária, e agora também, embora com força jurídica diferente, pelo Código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual se reconhece um poder de decisão e de sanção, emanando uma ordem e intimando seu cumprimento.
Em todos os países onde a televisão serve de veículo às mensagens publicitárias, o mundo empresarial é plenamente consciente do enorme poder de influência que a publicidade tem sobre as crianças.



NORMATIVA INTERNACIONAL

O assunto relativo à tutela dos menores na mídia é um dos mais debatidos, seja no que se refere às normas nacionais, seja no âmbito internacional. Encontra-se diante da situação de precisar acertas as contas com toda a extensão da rede global da internet. O exemplo que, neste momento de transição, coloca mais em evidência a necessidade de estabelecer leis que estejam em condições de controlar o acesso e uso dos conteúdos nocivos para os menores, é exatamente o da internet. Qualquer pessoa no mundo pode abrir um site considerado «arriscado», contendo elementos ilegais e acessíveis a consumidores despreparados, disponibilizados por quem está do outro lado do mundo.
No que se refere aos princípios gerais no âmbito do direito internacional, é preciso recorrer principalmente à convenção da ONU sobre os direitos da criança, com sede em New York, ratificada pelo Parlamento italiano através da lei nº.176/1991. Esta garante à criança uma «consideração proeminente» também a respeito da liberdade, seja no se refere à expressão, seja quando tutela os conteúdos recebidos. Esta mesma convenção, em seu artigo 17, fala da relação entre menor e televisão, desejando «um sistema normativo que tutele o menor-consumidor, mesmo com todas as dificuldades que se apresentam», seja para individuar os fenômenos que devem ser monitorados, seja sobre as normativas possíveis.
No direito da União européia, tal tutela foi recentemente confirmada pela Carta dos direitos fundamentais da União, aprovada em Nice em 2000, cujo artigo 24 salienta que «os Estados membros reconhecem a importância da função exercida pelos meios de comunicação de massa e cuidam para que a criança possa ter acesso às informações e materiais... com a finalidade de promover o seu bem estar social, espiritual e moral, além de sua saúde física e mental». A normativa seguinte, 89/552/CEE, previu algumas restrições, seja no que se refere aos programas como para as mensagens publicitárias destinadas a este público». O artigo 22 desta normativa conduz a impedir a transmissão de programas que contenham cenas pornográficas ou de violência gratuita, ou outros programas inadequados a este público. Não podemos esquecer de mencionar a determinação expressa de «Televisão sem fronteiras», que está hoje em sua quinta versão atualizada, que o tema da tutela dos menores está relacionado com o estatuto geral dos direitos dos menores e corresponde ao disposto nos artigos 50 e 31 da Constituição italiana.
Se for claro que os princípios normativos são todos a favor da tutela dos menores, é também verdadeiro que uma tecnologia em contínua evolução colocou em crise as velhas regras do jogo. Mas também é claro que não se pode mais adiar a necessidade de estabelecer novos parâmetros normativos, para que as crianças possam utilizar os meios de comunicação próprios de seu tempo, com aproveitamento e serenidade também para as famílias.~

EDUCAÇÃO À MÍDIA NO MUNDO: PARA SABER MAIS

A difusão da educação à mídia é uma resposta à necessidade de se informar sobre as novidades no campo dos novos meios de comunicação. Em seguida citamos apenas alguns sites que em vários países oferecem maiores informações sobre como aprender a usar melhor a mídia, enfrentando a problemática da tutela dos menores e da alfabetização às novas tecnologias por parte dos adultos.
«The Media Awareness Nework-Réseau éducation médias» é uma organização canadense sem fins lucrativos, pioneira no desenvolvimento de programas sobre a educação à mídia. Com esta finalidade ela produz programas online em colaboração com organizações internacionais, convicta que, para interpretar as mensagens de informação, de entretenimento e comerciais, os jovens têm necessidade de instrumentos críticos válidos. Por isso é importante formar também os adultos (famílias e professores) sobre como funciona a mídia e como ela determina o estilo de vida.
A organização realiza uma ação contínua de monitoramento em relação à mídia (televisão, cinema, videogames, imprensa, publicidade, etc.), e sua seção dedicada aos pais oferece uma série de elementos para que estes reflitam com os filhos sobre esses meios, além da seção para os educadores, que inclui lições e materiais de apoio. Uma outra seção é dedicada à análise das questões ligadas à mídia, como a difusão de estereótipos, as representações de violência e da diversidade, a privacidade, a publicidade dirigida aos menores. Seu site é em inglês e francês (http://www.media-awareness.ca).
«Quai des images» é o site dedicado ao ensino de cinema e audiovisual organizado pelo Ministério da Educação francês. Ele propõe atividades ligadas à educação à imagem e de análise dos filmes em consonância com os programas escolares, agrupa os textos oficiais a respeito dos meios audiovisuais, oferece uma série de instrumentos de análise e de estudo completos sobre alguns filmes específicos e sobre certos autores em particular, informa sobre conferências, seminários, cursos e festivais sobre o mundo audiovisual e sua utilização em âmbito educativo e didático. Entre outras coisas, reúne também as propostas e as experiências feitas por professores e seus alunos nas escolas secundárias francesas no campo da educação à imagem, além de organizar um fórum de discussões aberto a todos sobre a educação à mídia (http://www.ac-nancy-metz.fr).
Sempre na França, está em funcionamento o blog «Zéro de conduite», organizado pelos professores e destinados a educadores, pais e estudantes. Promove o uso do cinema como instrumento pedagógico, dedicando-se especialmente à atualidade cinematográfica, mas sem esquecer os clássicos e os documentários. Com várias seções e espaços de aprofundamento, se propõe como um local de discussão de temas em um debate aberto (http://cinema-ducation.fluctuat.net).
A Universidade de Massachussetts organizou o Media Education Foundation – MEF, mídia de desafio, que produz e distribui documentários destinados a estimular o pensamento crítico e o debate sobre a relação entre aqueles que detêm o poder sobre a mídia, os conteúdos da mídia comercial, a exigência democrática de um livre fluxo de informações, as diversas representações de idéias e pensamentos e o direito dos cidadãos de informar e serem informados. Alguns destes temas são abordados criticamente, como a identidade do gênero na publicidade, a imagem de sexo nos videoclipes, o papel da mídia na construção da identidade cultural, mídia e saúde, etc. (http://www.mediaed.org/).

(a cura di M. F. D’A.)

 
At 9/17/2007 2:46 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

AS CRIANÇAS E A MÍDIA (II PARTE):
ACEITAR O DESAFIO EDUCATIVO


O tema da 41ª Jornada das Comunicações Sociais, «As crianças e os meios de comunicação: um desafio para a comunicação», nos convida a refletir a respeito de dois aspectos particularmente importantes. O primeiro é a formação das crianças, para que estejam em condições de receber de maneira crítica aquilo que vêem. O segundo é a formação à consciência e ao uso consciente da mídia, que está em contínua transformação tecnológica.
De fato, é o que especifica Bento XVI no início de sua mensagem, de 20 de maio de 2007, para a Jornada: «Os complexos desafios que a educação contemporânea deve enfrentar são muitas vezes ligados à grande influência dos meios de comunicação no nosso mundo. Como aspecto do fenômeno da globalização e estimulados pelo rápido desenvolvimento da tecnologia, os meios de comunicação delineiam fortemente o ambiente cultural (cf. João Paulo II, O rápido desenvolvimento, nº3). Na realidade, há quem afirma que a influência formativa da mídia está em competição com aquela da escola, da Igreja e, quem sabe, até com aquela da própria família».
De fato, como salienta o Pontifício conselho para as Comunicações Sociais, «para muitas pessoas, a realidade corresponde àquilo que os meios de comunicação definem como tal». Episódios recentes, como a utilização do celular na filmagem de violências nas salas de aula, abusos sofridos por pessoas deficientes, fenômenos de trote e de violência generalizada, demonstram como as crianças que crescem passando uma média de quatro horas por dia diante da televisão, sozinhos em casa, absorveram a lógica do «estou no vídeo, logo existo». Os psicólogos, os pedagogos e os estudiosos dos meios de comunicação estudam há tempos sobre as relações entre o consumo televisivo e o comportamento violento dos menores. Uma grande quantidade de pesquisas realizadas em muitos países ocidentais demonstra como esta correlação seja realmente inegável.


NOVAS LINGUAGENS

O fato que muitas crianças vivem completamente inseridas no mundo dos velhos e novos meios de comunicação, que estão cada vez mais frequentemente em correlação entre eles, é confirmado pela popularidade de alguns modelos televisivos, considerados tão efêmeros quanto penosos «momentos de glória», presentes nos programas com os maiores índices de audiência, dos «reality» aos «talk show», sem falar do «trash», que hoje se tornou um gênero de espetáculo.
Dentre as preferências demonstradas pelos adolescentes italianos que assistem televisão mais do que três horas por dia, encontramos, em primeiro lugar, a figura da «veline» (Ndt: misto de corista e coadjuvante na apresentação de programas populares da televisão italiana), enquanto outros da mesma idade se concentram no mais clássico exemplo, o do jogador de futebol. De toda maneira, a coisa mais importante é aparecer, pouco importa por qual motivo, de ser «alguém» ou «alguma coisa» no Olimpo mediático, mesmo que seja apenas por um instante.
Estes são os exemplos mais negativos dos condicionamentos derivados de um excessivo e acrítico uso dos meios de comunicação. Encontramo-nos diante de uma nova geração que cresceu na frente da televisão, capaz de usar as novas tecnologias que os próprios pais, que as adquiriram e as tornaram disponíveis, muitas vezes se encontram despreparados para utilizá-las.
Tanto é verdade que hoje em dia os filmes são vistos diretamente nos celulares e a televisão pode ser assistida na tela do computador. Hoje se telefona através da internet e graças ao download se descarrega os CDs e DVDs mais recentes, se filma e se faz foto com o celular, e assim por diante.
Nas casas, o vocabulário familiar se reduziu ao gênero dos sms e se fala tendo o som da televisão no fundo, se comunica através de e-mail, se faz «visita virtual» via computador, se percorre através de bibliotecas virtuais, tanto que as fichas e arquivos de papel evocam imagens do outro século, completamente em desuso.
A situação dos nossos filhos é diversa daquela da geração precedente, pois eles abriram seus olhos tendo diante de si estes cenários de profunda, contínua e envolvente transformação tecnológica. Eles se constituem aquela que os estudiosos chamam de geração nascida «com seis dedos»: além dos cinco dedos normais da mão, o sexto é o mouse do computador.
Com o aparecimento do mundo «virtual» da internet e dos videogames criou-se uma defasagem em relação à realidade verdadeira e própria. As duas dimensões parecem muitas vezes, e para muitos jovens, como universos paralelos, com conseqüências não indiferentes no plano do processo de amadurecimento. Têm grande sucesso os sites nos quais se prevê uma segunda vida (basta verificar os milhares de registros nos poucos meses de existência do site italiano de «Second Life», que em todo o mundo já tem sete milhões de inscritos), onde a simulação reproduz todas as situações da vida real. Apenas que tudo é falso, a começar da nova identidade, que pode ser escolhida e com ela se inicia a fazer parte deste mundo fora do mundo, onde se pode ser um «qualquer coisa». Isto é, ninguém.
Assim, o grande desafio cultural de hoje é propriamente a redefinição dos limites, que muitas vezes se apresentam demasiadamente instáveis. Isto é, redefinição dos limites entre o real e o virtual, superando a divisão digital que hoje separa as gerações adultas daqueles mais jovens.


OS JOVENS: PROTAGONISTAS OU VÍTIMAS DAS MUDANÇAS?

A linguagem deles é pobre, muitas vezes recheada de termos tirados do dicionário do internauta: clicar, chatar, messagiar, deletar, são alguns dos neologismos que fazem parte de seu vocabulário quotidiano. Falta uma dimensão humana da tecnologia que esteja em condições de traçar o perímetro cultural entre o real e o virtual. Assim a aldeia global difundiu uma quantidade de modelos comportamentais desviados, ou pelo menos discutíveis.
Desta maneira, os jovens que vivem a milhões de quilômetros de distância jogam o mesmo videogame, vêem o mesmo filme, assim como, de maneira transversal, absorvem modelos e comportamentos semelhantes. Muitas vezes os adultos têm menos domínio no uso das novas tecnologias e observam, com uma preocupação resignada diante de suas próprias limitações, as crianças que navegam facilmente na internet.
As raízes das dificuldades neste campo educativo são muito bem explicadas por Marina D’Amato, professora de sociologia da Universidade de Roma, que salienta: «Cada geração tem necessidade de se encontrar também em um mundo fantástico, que serve a interiorizar o paradigma do bom e do belo, do justo e do errado, do oportuno e do útil, também em relação aos exemplos que procedem da narrativa. Hoje nos encontramos em uma condição na qual os avós e os pais contam cada vez menos histórias aos filhos e aos netos, e este papel foi assumido pela televisão. Mas, na realidade, a televisão “exila” e “con-funde”, isto é, funde os modelos morais que são frutos de ânsias e problemas mal resolvidos, muito mais que de certezas. Embora estes se transformem com freqüência, a cada três ou quatro anos, o fato de serem repropostos continuamente faz com que se justaponham uns aos outros» (ver Come mediare i media, de Mario Russo).
Se for verdade que a televisão é o meio mais usado até a adolescência, imediatamente depois surge a grande atração pela internet. Esta passagem nasce de uma sintonia com a linguagem televisiva, que na idade infantil muitas vezes é ouvida durante muitas horas no dia. Esta linguagem se baseia em uma mediação da realidade e desta maneira ela ativa um processo de recepção que é de tipo emotivo.
Neste registro emocional é mais fácil acabar envolvido por situações e figuras capazes de se proporem como modelos identificadores, preservadores de sentido e de comportamentos a serem imitados.
O poder de concentrar uma vontade emulativa em alguns personagens, que correspondem particularmente às necessidades interiores do jovem (necessidades na maioria das vezes induzidas pela publicidade ou por modelos estimuladores), tem uma forte relação com a quantidade de horas que o jovem passa utilizando os novos ou os velhos meios de comunicação.


EDUCAÇÃO NECESSÁRIA

«A formação adequada a um uso correto dos meios de comunicação é essencial para o desenvolvimento cultural, moral e espiritual das crianças… Educar as crianças a serem seletivas no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja, da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos. Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia, com a certeza de que este difícil, embora gratificante, aspecto da condição de pais, é apoiado por toda a comunidade.»
As palavras do discurso de Bento XVI definem com grande clareza o paradigma de uma justa relação entre a mídia e os menores. Uma clareza que devemos agradecer ao magistério da Igreja, no momento em que o mundo da mídia parece ignorar a verdadeira problemática educativa das crianças e as expectativas de qualidade e de segurança exigidas pelas famílias no que se refere ao uso desses meios, seja do cinema aos videogames, da televisão à internet.
Diante da utilização destorcera do meio televisivo, o mais difundido dentre os meios de comunicação, a Igreja se interroga sobre o porquê da televisão não ter um papel educativo e por que os meios de comunicação não podem ser companheiros confiáveis para os jogos na fase de crescimento da criança. O anúncio de uma recente campanha sobre o uso da mídia, promovida pelo Ministério das Comunicações, mostra os vários membros da família que estão vendo a televisão ao lado de uma criança.
Que se trate do avô ou da mãe, a mensagem é a mesma: não deixar uma criança sozinha diante de um meio que, sem o apoio crítico educativo de um adulto, pode transmitir conteúdos inadequados à idade e à maturidade daquele que o vê. Sem esquecer as responsabilidades dos produtores televisivos, empenhados na organização dos programas, o papel da família é realmente insubstituível.
Se realmente o objetivo de quem administra a sociedade de produção televisiva, ou das multinacionais produtoras de videogames ou das operadoras de celulares, é o de promover e vender o produto, o bem estar psicofísico da criança está no centro do interesse dos educadores, sejam eles os professores ou, em primeiro lugar, os pais.
Isto explica bem a mensagem do Papa, que continua a sua análise, salientando que «educar as crianças a serem seletivos no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja e da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos (ver João Paulo II, «Familiaris Consortio», 76). Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia.»


CONTEÚDO DA MÍDIA

No panorama de uma revolução da multimídia, que está modificando transversalmente os hábitos, a mentalidade, os modelos e as linguagens, deve voltar ao centro do debate a tutela daquilo que é melhor para os menores. Sem acusar a «mídia», que enquanto tal não é nem boa nem má, o importante é partir de uma a análise do produto, para assim poder individuar conteúdos que sejam de melhor qualidade para as crianças e os adolescentes. Porque a televisão é um instrumento que abre janelas de conhecimento para o mundo e, se bem utilizada, de «má professora» pode se tornar uma preciosa fonte de estímulo para o crescimento humano e cultural.
A mesma coisa vale, e com mais razão, para a «rede» que engloba e compreende tudo, e para os videogames, onde, ao invés de violência e monstros, poderia se dedicar a produzir (e isso já ocorre em certos casos) histórias instrutivas e de conteúdo interessante.
Bento XVI coloca justamente em evidência as enormes possibilidades para que seja melhorado o conteúdo deste grande campo de produção multimídia: «A educação através da mídia deveria ser positiva. Colocando as crianças diante de um meio estética e moralmente excelente, estas recebem uma ajuda para que desenvolvam a própria opinião, a prudência e a capacidade de discernimento. É importante aqui reconhecer o valor fundamental do exemplo dos pais e as vantagens de introduzir os jovens aos clássicos da literatura infantil (…). A beleza, quase um espelho do divino, inspira e vivifica os corações e as mentes juvenis, enquanto a feiúra e a vulgaridade têm um impacto deprimente sobre os comportamentos». Diante de uma decadência geral do produto televisivo, a questão da qualidade aparece ainda mais forte e vibrante em grande parte de um público formado de famílias, que pede para não ser apenas um exército indistinto de ouvintes silenciosos, mas um público em condições de exprimir suas preferências por conteúdos formativos e informativos de bom nível.
A mensagem de Bento XVI continua, com algumas importantes indicações: «Como a educação em geral, aquela da mídia requer também uma formação ao exercício da liberdade. Trata-se de uma responsabilidade que compromete. Muitas vezes a liberdade é apresentada como uma incansável procura do prazer ou de novas experiências (…). Este desejo, sentido profundamente pelos pais e educadores, que é o de educar as crianças no caminho da beleza, da verdade e da bondade, pode ser apoiado pela indústria da mídia somente na medida em que se promove a dignidade fundamental do ser humano, o verdadeiro valor da vida familiar, as conquistas positivas e as metas da humanidade. A partir disso, a necessidade de que os meios de comunicação estejam empenhados na efetiva formação e no respeito da ética deve ser vista com interesse particular e com urgência não apenas pelos pais, mas também por aqueles que têm responsabilidade cívica».
Na realidade, nos encontramos na situação de ter que reconhecer que na Itália falta uma verdadeira «cultura da criança»: a situação é tão séria que no âmbito institucional procura-se dar uma nova organização geral para verificar e controlar os conteúdos dos setores de entretenimento, como os videogames, que até agora estão submetidos apenas a códigos de auto-regulamentação, feitos e codificados para uso e consumo pelas indústrias produtoras.
Uma vez mais, o primeiro e indispensável apoio à criança só pode vir da família e de uma relação mais estreita com os professores e educadores, exatamente como salienta Bento XVI, lembrando-nos que a preocupação educativa dos pais não deve se tornar uma preocupação genérica, mas uma atenção constante a tudo aquilo que diz respeito aos filhos.

A INDÚSTRIA DA MÍDIA

1) A TELEVISÃO

Se a televisão convencional se apresenta como um ramo de atividade já «maduro», no entanto se apresenta no horizonte a situação da mídia digital (satélite ou a cabo), também como uma plataforma que consente a ligação entre televisão, internet e outro tipo de mídia através do computador. No que se refere à qualidade da programação, apesar dos inúmeros bons propósitos anunciados no âmbito institucional, parece pequena a atenção às exigências dos menores em suas diversas faixas etárias. A programação para os menores, na realidade é confinada em redes e horários particulares, enquanto o resto da programação na faixa horária considerada «para todos» muitas vezes apresenta conteúdos inadequados aos jovens. Mas, quais são as expectativas das gerações de jovens no que se refere à televisão? É realmente verdade que preferem o «trash», os jogos com prêmios absurdos e as «velines»?
A partir de uma pesquisa recente feita pelo instituto Censis sobre «Comunicação, pluralismo social, sociedade aberta» (2005) surge que a relação entre os menores, e em particular dos adolescentes entre os 14 e 18 anos de idade, e a televisão é determinada por elementos de forte contradição e de passividade. Nessa faixa etária, 100% deles vêem televisão praticamente todos os dias, 86% acompanham um pouco de tudo, com uma relevante predileção pelos filmes (72%), por esporte (32%) e pelos «reality shows» (18%).
No entanto, a amostragem entrevistada não está realmente satisfeita com aquilo que vê. De fato, 36% dos adolescentes denunciam a vulgaridade difundida nos programas e 25% criticam a superficialidade. Dentre eles, 46% consideram a televisão como um meio que «invade», ao mesmo tempo em que é interessante notar que 25% consideram que em geral a programação televisiva alimenta nas crianças menores uma visão consumista da vida. Destes dados surge o contraste entre a procura de distração e a reprovação daquilo que lhes é proposto pela programação. Isto significa que o alto índice de procura não é um indicador de satisfação.
Considerando o axioma de que a televisão seja onipresente, fica claro que são os próprios jovens a pedirem uma maior atenção aos conteúdos: menos violência e menos vulgaridade. A exigência de uma regulamentação diversa, diz claramente o relatório do Censis, «não vem somente daqueles, pais e educadores, que estão preocupados pela possível influência negativa sobre os menores, mas se exprime nitidamente também através dos adolescentes, pelo menos de uma parte mais esperta e consciente dentre eles».
Para tutelar melhor os direitos dos menores, desde 2002 foi instituído junto ao Ministério das Comunicações um código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual aderiram os produtores de televisão, seja no âmbito nacional como local. Baseando-se nos princípios sobre a matéria existentes na Constituição italiana e na Convenção dos direitos da criança, estabelecida em 1989 pela ONU, a comissão que controla sua aplicação avaliou em todos estes anos de atividade os milhares de casos em que foram violadas as normas de tutela, que prevêem a transmissão de programas e imagens adequadas a um público de menores de idade durante aquela que é chamada de «faixa protegida» da programação televisiva (das 7h30 às 22h30), intervindo com denúncias e sanções, que nos casos mais graves foram aplicadas pela Autoridade de garantia no setor das comunicações. Para o futuro, esta comissão deverá se transformar em um organismo mais amplo de controle, que se chamará «Mídia e menores», que além da televisão deverá monitorar também os setores dos vídeos-telefone e dos videogames, além da internet, que é o campo de maior risco.

REGRAS DE TUTELA EM OUTROS PAÍSES

É diversa a situação em outros países, como por exemplo na Grã Bretanha, onde o sistema de regulamentação da mídia é estruturado e complexo e foi atualizado nas últimas décadas, com uma particular atenção à tutela dos menores. As inovações tecnológicas neste setor levaram as normativas inglesas a uma série de novas disposições, como por exemplo, a visão em casa de vídeo exclusivamente para adultos, e que fora de casa seriam vetados aos menores, ou o combate à praga mundial dos sites internet para os pedófilos, que contenham material pornográfico ou com conteúdos que possam esconder o aliciamento de menores (ver a Protection Childres Act, de 1978).
A programação televisiva é regulamentada pelo Broadcasting Act (1996), de onde deriva a instituição da Broadcasting Standard Commission (BSC), um órgão independente de controle que estabelece as normas de avaliação e classificação dos programas, também no que se refere aos conteúdos violentos ou que possam ofender a decência pública (site oficial www.bsc.org.uk). Este organismo BSC funciona internamente à estrutura do Broadcasting, supervisionando e regulamentando todas as emissoras de televisão e de rádio, via cabo ou por satélite. Sua tarefa é a de elaborar os códigos de conduta e de aplicação de modelos que respeitem a justiça, além de monitorar os modelos, verificando que respeitem as leis. Com a transmissão de programas com conteúdos considerados inadequados aos menores de várias idades, há alguns anos a televisão inglesa adotou o sistema «watershed», um «separador de águas» entre um horário de programação familiar e outro para os adultos. Todo o sistema televisivo inglês se apóia sobre a responsabilização das famílias, pois sem a colaboração delas qualquer código de modelos para os programas é praticamente inútil.
Na França, está vigorando já há anos um código através de sinais televisivos, que entra em função para assinalar os programas inadequados aos menores. A avaliação do programa televisivo é feita pelo Conseil Supérieur de l’Audiovisuel (CSA), uma autoridade administrativa independente, que controla a difusão dos filmes e outras transmissões em vários canais privados, nacionais, regionais ou locais. A normativa francesa (lei 719/2002) veta a transmissão de programas que possam prejudicar gravemente a integridade física, mental e moral dos menores, porque divulgam conteúdos de pornografia ou de violência gratuita. As transmissões são classificadas por um código de sinais que, em conjunto com um sistema organizado de faixas horárias de programação, garante às famílias mais clareza sobre os programas destinados aos menores.
Na Alemanha, o tema da infância tem particular atenção da legislação, que considera desde o nascimento o início dos direitos fundamentais do cidadão. A tutela é disciplinada no âmbito público pela JSchG (desde o dia 26 de fevereiro de 1985), enquanto a lei GjSM se ocupa do controle sobre a difusão de publicações e conteúdos mediáticos considerados danosos para os menores. A regulamentação no setor televisivo é feita segundo as normas do acordo sobre a radiodifusão dos Lander federais, que as entidades para a mídia nesses Lander adotaram por base para o estabelecimento das diretivas que tutelam o interesse dos menores nas emissoras privadas. Não são admitidas transmissões que incitem o ódio racial, que exaltem a violência ou a guerra, que ofendam a dignidade do homem, que sejam de gênero pornográfico, que mostrem pessoas moribundas ou com sofrimentos que ofendam a dignidade humana. Os responsáveis pela programação, escolhendo os horários das transmissões, devem cuidar para que os menores não vejam programas que podem prejudicar o seu bem estar psíquico, físico ou mental. As transmissões inadequadas às crianças menores podem ser transmitidas somente depois da autorização da entidade competente do Land interessado.
Os responsáveis pela organização dos programas televisivos em âmbito nacional devem nomear encarregados pela tutela dos menores, que atuam no momento da aquisição, da projeção e da realização dos programas. As emissoras privadas fundaram em 1993 uma associação de autocontrole voluntário da televisão («Freiwillige Selbskontrolle Fernsehen», FSF), à qual devem ser apresentados programas particulares, antes da sua transmissão, e suas avaliações consideradas nas decisões das entidades de controle da mídia nos Lander federais. Existe ainda o órgão comum do cidadão para a tutela dos menores, dos programas, da competência mediática e controle da mídia (GSJP), do qual faz parte um integrante da entidade para a mídia nos Lander federais, que dá o seu parecer a respeito de algumas séries, filmes e espetáculos mais ou menos adequados aos menores. Este órgão, o GSJP, decide sobre pedidos de mudança de horários de transmissão de filmes proibidos para menores, controla a forma de novos programas e experimenta novas disposições para a tutela dos menores na televisão digital. A peculiaridade da jurisdição alemã, seja no setor televisivo como no cinematográfico e da mídia em geral, é a minuciosa atenção às exigências com o desenvolvimento do menor e aos riscos que este pode correr com a observância incorreta das leis.
Nos Estados Unidos, é possível consultar via internet um «guia televisivo para os pais» (ver o site www.mpaa.org), que prevê algumas categorias de audiência aplicadas aos programas televisivos transmitidos a todo o público. Este guia organiza várias siglas para identificar a categoria de audiência para cada transmissão: vai-se do TVY (para todas as crianças) ao TVG (para todos), através de várias faixas etárias, que correspondem à passagem da primeira à segunda infância e desta à adolescência. Depois tem o TVPG («parental guidance», visto na presença de um dos pais), o TV14 («parent strongly cautioned», séria advertência aos pais), para os programas que contêm cenas de sexo e de violência. Enfim, há o TVMA, que prevê um «mature audience only», ou seja, destinado a um público de idade superior a 17 anos, última fronteira para os conteúdos considerados «restricted».
Estas avaliações foram elaboradas baseando-se nas opiniões dos próprios pais e são fáceis de serem encontradas e compreendidas. Esta linha de «guia de televisão para os pais» pode ser usada juntamente ao «v-chip», que é um dispositivo de filtro instalado na maior parte dos mais recentes modelos de aparelhos de televisão, para permitir aos pais de bloquear os programas inadequados.

FICHA 1
Brasil: «O que eu penso da tv»
No Brasil, a audiência infantil é muito alta: aproximadamente 30 milhões de crianças vêem televisão pelo menos durante três horas por dia. Explica a profa. Rosália Duarte, do departamento de Ciência da Educação, da PUC do Rio de Janeiro, que «as crianças são muito perspicazes, mas nós podemos e devemos ajudá-las a ampliar o seu quadro de referências, para que possam discutir ainda melhor sobre o conteúdos daquilo que vêem. Para isso temos necessidade, antes de tudo, de ouvir aquilo que elas têm a dizer sobre o assunto e de dialogar com elas. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e muito mais freqüente, a outras atividades culturais». No âmbito de uma pesquisa feita através de um questionário distribuído nas escolas, intitulado «O que eu penso da tv», apareceu que «as crianças querem seriamente ser ouvidas sobre aquilo que pensam da tv, mas sentem que sua opinião é considerada pouco importante e não estão contentes com o excesso de imagens de violência exibidas na televisão, principalmente a violência “real”, definida como aquela transmitida nos telejornais. Eles adoram ver televisão e não importa o que os adultos pensam e dizem a respeito disso. A eles agradam quase todos os tipos de programas transmitidos: novelas, desenhos animados, programas de humor, filmes, seriados, mas isso não faz deles espectadores “idiotas”, pois fazem críticas muito interessantes, pertinentes e bem elaboradas sobre o que consideram feio ou inadequado na televisão. Para a maior parte deles, a televisão se oferece como principal opção de divertimento (em alguns casos, a única), o que significa um dado muito preocupante. Mas, o que chamou mais a nossa atenção é o grau de experiência com o qual essas crianças analisam a televisão: são expertos e demonstram conhecer a televisão também do lado de dentro, inclusive as linguagens que ela utiliza, a sua estrutura de produção, a sua lógica interna e as suas maneiras de intervenção».
As crianças aprendem os valores e os não-valores através da televisão, não resta dúvida, mas demonstram ter senso crítico a respeito deste assunto, quando afirmam nos textos que os programas transmitidos na tv podem lhes ensinar «a serem bons, a ter coragem e a fazer o bem, a cuidar da natureza e de si mesmos, a serem honestos e a lutar por aquilo que desejam», mas também «a serem cruéis e mentirosos, a roubar e matar, a não respeitar os pais e a comprar tudo aquilo que não têm necessidade». Falando sobre a validade do ensino através da mídia, a profa. Duarte salienta a necessidade de «ouvir aquilo que têm a dizer sobre o assunto e a dialogar com eles. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e mais freqüente, a outras atividades culturais».

FICHA 2
Observadores internacionais
Os dados examinados em janeiro de 2006 pelo OssCom, que é um centro de pesquisa da mídia, deixam evidente a tendência a realizar uma forma de co-regulamentação, onde a ação legislativa dos Estados membros se integra com medidas de auto-regulamentação por parte dos produtores, broadcasters e profissionais da comunicação sob o efeito de controles e sanções. São dois os instrumentos mais utilizados no âmbito europeu, observando-se as diretivas previstas no artigo 22 de «Televisão sem fronteiras»: a definição de faixas horárias protegidas (watershed) e os sinais mostrados na tela (determinados por um sistema de «rating»). Apesar disso, aos campos tradicionalmente problemáticos da violência e da pornografia se juntam novos campos de risco para os menores: a vulgaridade, abusos e dependências de substâncias, linguagem e comportamento vulgares, discriminações e abusos, violações e ofensas à dignidade humana. Os critérios de avaliação dos programas se constituem um problema que é partilhado por muitos países da União européia, ao mesmo tempo em que se prepara uma uniformização internacional dos sistemas de classificação (ver mais adiante, Nicam), baseados na visualização de cinco ícones que ilustram simbolicamente qual é a problemática do programa que está sendo analisado e para quais idades ele é desaconselhado.
Deve ser assinalada a atividade online da European Medi@culture. O projeto é promovido pela Comissão Européia, em Bruxelas, no quadro das iniciativas «e-Learning», administrado pelo centro mediático de Baden-Württemberg. O site apresenta informações sobre a educação à mídia na Europa, particularmente na França, Áustria, Finlândia e Alemanha. A seção de projetos de multimídia agrupa os projetos sobre a mídia desenvolvidos por escolas e associações de jovens ao longo do tempo (ver http://www.european-mediaculture.org).

FICHA 3
África do Sul: Encontro mundial sobre a mídia para a infância
Este encontro trienal se realizou no último mês de março em Johannesburg, na África do Sul, com a participação de expertos do setor representando diversos países. Em conjunto se discutiu sobre a necessidade de uma programação adequada às crianças, procurando entender de que modo a violência na mídia pode influir sobre a psíquico dos menores.
Mas, no 5º Encontro mundial sobre a mídia para a infância apresentaram-se também muitas crianças provenientes de todo o mundo e empenhadas em discutir sobre o difícil tema da «Mídia como instrumento de paz e de democracia global». Vieram guiados por grupos de adultos, dentre eles as diversas organizações católicas que há anos trabalham para promover regras para o bem da infância, a serem respeitadas nas transmissões de rádio e televisão através de códigos de regulamentação que devem ser redigidos ou, como em alguns casos, apenas atualizados. Em muitos países do sul do mundo as novas tecnologias de multimídia já estão muito disseminadas e seu uso merece uma atenção particular para tutelar o público mais jovem.
Especialmente na África, explicou o organizador do encontro, Firdoze Bulbulia, começa-se a examinar o projeto de um «Media center» para as crianças, que possa produzir e distribuir transmissões de rádio e de televisão destinadas ao público mais jovem, com o objetivo de realizar um canal televisivo pan-africano dedicado à infância. Os organizadores do encontro estão também trabalhando no projeto de uma aliança africana dos meios de informação e de comunicação, seguindo o modelo daquela já existente na América latina.

2) INTERNET

Na Itália, 47% das famílias italianas têm um computador em casa, um dado relevante mas sempre muito baixo em relação à média dos outros países europeus. O uso da internet por parte dos adolescentes e jovens, e a familiaridade que têm com tudo aquilo que pode ser digitado ou «descarregado» da internet, apresenta não poucos problemas. Pela sua própria natureza de rede de comunicação global, o problema se apresenta em ótica internacional, procurando garantir a tutela dos menores através de precisos acordos com os provedores para um efetivo controle de conteúdo. No campo italiano, até 2006, a tutela dos menores tinha sido deixada nas mãos dos próprios provedores, que em 19 de novembro de 2003 assinaram um acordo de auto-regulamentação: o Codice Internet e Minori. Embora o acordo tenha sido estipulado entre os representantes dos vários provedores diante do Ministério para a Inovação e a Tecnologia, no entanto ele permanece um acordo privado, com lacunas, principalmente no que se refere às sanções que muitas vezes devem ser aplicadas. Em 2006, na seqüência de numerosos casos de violência sobre menores, muitos dos quais realizados através da difusão de material pedo-pornográfico (quando não se tratava de verdadeiro e próprio aliciamento de menores via internet), foi promulgada a lei 38 de 6 de fevereiro de 2006: «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet».
Enfim, como aplicação da lei 38/2006, em fevereiro da 2007 foi publicado um decreto determinando os requisitos técnicos dos instrumentos de filtragem que os provedores da rede internet devem utilizar para impedir o acesso aos sites já assinalados pelo Centro nacional contra a pedo-pornografia. Mas, isso não basta para superar as dificuldades e impedir que os menores possam navegar de maneira arriscada na «rede das redes».
Atualmente foi reativada a comissão anti-pedofilia e desvios de menores através da internet, o «Ciclope», que tinha sido instituída junto ao Ministério para a Eqüidade, do governo italiano, e que ficou inativa por um ano, até a sua reestruturação junto ao Ministério da Família. Está também para entrar em função um site dedicado ao uso da internet, junto ao Ministério das Comunicações, e um número telefônico de emergência gratuito, organizado pelo mesmo ministério e por «Save the children», que poderá ser utilizado por qualquer cidadão que queira assinalar algum abuso, desvio ou pedo-pornografia. Dentre as iniciativas mais recentes, deve ser assinalado o site www.tiseiconnesso.it criado pelo Ministério das Comunicações italiano, sempre em colaboração com «Save the children», onde é colocada à disposição uma série de informações sobre o conteúdo de certos sites, seja para os pais como para as próprias crianças, em conjunto com a campanha televisiva que tem como slogan «A melhor maneira de ajudar o seu filho a não usar incorretamente as novas tecnologias é conhecê-las».
Deve ser salientado também o fato de como a rede se tornou um grande mercado online. Para alguns produtores, o «e-commerce» de brinquedos corresponde já a 4% das vendas, e apenas em 2005 as vendas online corresponderam a 37.600 ações de compra. As razões para investir no processo online são múltiplas: desde a possibilidade de evitar as dificuldades logísticas de distribuição dos produtos, à ampliação de ofertas diferentes de produtos e também a possibilidade de envolvimento do cliente através de campanhas de mala direta e a criação de comunidades virtuais em torno de alguns produtos.

FICHAS:
Pedo-pornografia e internet
Em março de 2006, entraram em vigor as novas medidas diretas de combate e repressão ao fenômeno de exploração sexual dos menores e a pedo-pornografia, estabelecidas pela lei 38/2006 – «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet» foi publicada no Diário oficial em 15 de fevereiro de 2006, nº.38 – com a qual foram substancialmente modificados e integrados os artigos 600bis e seguintes do Código Penal italiano.
A lei confirma os artigos 527, 528, 529 e 725 do Código Penal italiano, que punem os «atos obscenos em local público, publicações, espetáculos obscenos, desenhos ou figuras que ofendem a decência pública».
Porque em muitas publicações, transmissões televisivas e anúncios publicitários, mesmo que não tenham declaradamente um caráter pornográfico, imagens de crianças e adolescentes são apresentadas de maneira explícita ou mais ou menos sutilmente ilusória e de forma falsa, pede-se um novo empenho das instituições competentes para que sejam observadas as normas em vigor e, se preciso for, que façam apelo aos órgãos de Polícia, o Instituto de autodisciplina publicitária, o Ministério das Comunicações, a Polícia postal ou a «Comissão tv e menor».

3) CINEMA

Confirmando as disposições da Constituição italiana, no que se refere ao direito e ao dever das famílias de serem protagonistas na educação de seus filhos, para muitos é chegada à hora de reelaborar a legislação que define o conceito de «censura» (a lei 161/1962 prevê a possibilidade de negar a autorização de abertura às salas de cinema ou de fazer cortes nos filmes, mesmo em função de um público adulto), que hoje está superado. É preciso com urgência estabelecer um critério de tutela dos menores não apenas no que se refere aos filmes que vêem nos circuitos cinematográficos, mas também sucessivamente em casa, muitas vezes em horários acessíveis na programação da televisão.
Uma avaliação correta e preventiva de um filme permite à família ter à sua disposição os instrumentos para escolher se um espetáculo é mais ou menos oportuno, conhecendo a trama, os eventuais conteúdos mais sensíveis, a classificação que a obra recebeu em outros países, etc. Por isso, é justo que a legislação seja revista, uma operação que requer atenção e perspicácia da parte das instituições em um momento de transição da mídia, como este que estamos vivendo, quando esta se tornou realmente um importante componente na educação dos menores.
Não faltam filmes que atraem o público por causa de seu conteúdo de violência, e no entanto entram no circuito cinematográfico sem qualquer restrição de idade. Para um filme que é notícia nos jornais, existem muitos outros com conteúdos duvidosos ou até mesmo perigosos que conseguem passar através do filtro da comissão de revisão cinematográfica, que atualmente funciona junto ao departamento de cinema do Ministério dos Bens Culturais.
Ao mesmo tempo em que existe um projeto de lei do ministro dos Bens culturais, que deve ainda iniciar os trâmites parlamentares, novas situações se apresentam na Itália, com a autocensura de filmes, feita pelos produtores ou distribuidores cinematográficos, com a introdução de novas e mais específicas faixas etárias para as restrições visando os menores a partir dos 10 anos de idade. As restrições serão feitas baseando-se em uma avaliação classificatória dos conteúdos das obras e sucessivamente serão ainda analisadas por uma comissão de psicólogos, educadores e pais.
Este sistema se inspira no modelo americano da Motion Picture Association of America (MPAA), que há 40 anos representa os interesses da indústria do audiovisual americana no mundo. Funcionando a partir de regras bem precisas (estabelecidas ao longo dos anos, também segundo as sentenças dos tribunais federais nos vários Estados americanos e em base aos protestos dos cidadãos), a autocensura americana prevê a existência de uma única comissão competente para determinar as restrições do PG12 ao «restricted» 17 anos. Esta comissão é composta exclusivamente de pais, considerados os primeiros depositários da educação dos filhos, e representam transversalmente a audiência. Importantes sanções econômicas asseguram que o mecanismo de autocertificação corresponda efetivamente aos interesses dos cidadãos. No site da Motion Picture estão disponíveis aos pais os pontos de referência para a avaliação das obras de entretenimento e são publicadas as restrições aplicadas a cada filme que está em exibição nas salas de cinema. Geralmente as avaliações parecem muito mais severas em relação a outros países. Tudo isso, nos vários anos de sua aplicação, deu uma qualificação à indústria americana e seu correto serviço prestado aos ouvintes. Qualquer estrada que se pretenda seguir na Itália, é importante para as famílias que seja estimulado um mercado de produção adequado à infância: é justo que o mecanismo da indústria cinematográfica continue com o seu ritmo de produção, mas não é justo confundir as classificações de acesso ao produto, como qualquer indústria sabe muito bem.
No que se refere às normas européias de classificação dos filmes, e em geral de todo «entertainment» (neologismo anglo-saxão, que, no entanto encontra sua raiz etimológica na relação entre educação e jogo) acessível aos menores, deve ser citado o sistema NICAM, que funciona na Holanda há alguns anos. Fundado em 1999, o NICAM (Nederlands Instituut voor de Classificatie van Audiovisuele Media) se baseia na lei Media Act, onde os programas de grupos que tiveram a autorização para atividades de «broadcasting» não devem incluir obras audiovisuais que prejudiquem o desenvolvimento físico e psicológico de pessoas com menos de 16 anos de idade, seguindo as diretivas da União européia («Televisão sem fronteiras» IV).
O sistema de classificação preventiva funciona também na Grécia, com a lei 1.597, de maio de 1986, que prevê que antes da projeção nas salas de cinema, cada filme seja submetido pelo produtor ou pela sociedade de importação à Comissão para a juventude, que classifica o filme seja como adequado aos menores, ou proibido aos menores de 13 anos, ou de 17 anos ou ainda, nos casos mais graves, severamente inadequado aos menores. Esta comissão é um órgão do Ministério da Cultura e foi concebida procurando-se estabelecer certa proporcionalidade, sendo composta de representantes do Estado (Ministério da Cultura), das categorias ligadas ao cinema, de psicólogos especializados na educação, de sociólogos, dos jovens, dos educadores e dos pais.
Na Áustria, está em vigor um sistema de avaliação complexo, instituído em base a um princípio constitucional federal que confia a tutela dos menores, no que se refere ao cinema e em geral aos meios de comunicação de massa, à competência específica dos Lander. A lei nacional que engloba a regulamentação da mídia é a ORF-ACT, ou seja, a Austrian Broadcasting Corporation nº. 379/1984, que estabelece quais os critérios sobre os quais deve se basear a proteção aplicada a programas e filmes transmitidos na televisão ou através de outros canais mediáticos. No que se refere à exibição dos filmes, a avaliação preventiva das obras cinematográficas, para que sejam decididas as faixas etárias adequadas, é regulamentada pela lei austríaca para a tutela dos menores, a «Jugendschutzgesetz», aplicada através das leis dos Lander federais. Esta lei estabelece nove faixas de restrições de público a partir dos seis anos de idade, com uma sucessiva graduação que prevê restrições para 10, 12, 14 e 16 anos de idade. Para supervisionar o sistema de classificação cinematográfica, existe uma comissão junto ao Ministério da Educação, em Viena, que comunica seu parecer sobre a idoneidade dos filmes às autoridades locais. Geralmente e de maneira individual os Lander adotam as decisões da comissão, e é em âmbito local que se decide de sua aplicação.
Na Espanha, o artigo 20 da Constituição reconhece o direito do cidadão a exprimir e difundir livremente seu pensamento, suas idéias e suas opiniões através de qualquer meio de divulgação. Se por um lado o exercício de tais direitos «não pode ser restrito através de nenhum tipo de censura prévia», o mesmo artigo especifica que «estas liberdades têm o seu limite no respeito dos limites reconhecidos pelas normativas que exprimem este respeito, especialmente no direito à honra, à privacidade, à própria imagem e à proteção da juventude e da infância».
Baseando-se neste princípio, a qualificação dos filmes (Real decreto 81/1997) e das obras audiovisuais é feita antes de sua difusão, através do Instituto de cinematografia e das artes audiovisuais (ICAA), uma entidade autônoma, mas ao mesmo tempo ligada ao Ministério da Educação e Cultura através da secretaria de Estado para a cultura (ver site www.mcu.es).
A subdireção geral de fomento à indústria cinematográfica e do audiovisual, que faz parte do ICAA, se ocupa, dentre outras funções, da classificação em faixas etárias dos filmes e das outras obras audiovisuais em vista de sua exibição pública e para a sua distribuição. A comissão se encarrega de divulgar as informações sobre os filmes e programas audiovisuais, com classificação que vai desde as «salas X» até as restrições para cada faixa etária do público.
Os filmes de caráter pornográfico não podem receber subvenções do Estado e sua projeção nas salas prevê uma taxa suplementar, destinada em parte para estimular um fundo de proteção cinematográfica. A projeção destes filmes pode ser feita somente nas «salas X», onde não podem ser apresentados outros tipos de obras cinematográficas e onde é proibido o ingresso de menores de 18 anos.

CINEMA NA TV

Devido ao alto consumo de programas de televisão por parte dos menores e levando-se em conta as diretivas da União européia, que promovem a auto-regulamentação no âmbito nacional das emissoras de tv e a participação das famílias nesta obra educativa, há alguns anos estão em vigor na França, na Holanda, na Grã-Bretanha, na Grécia e na Itália os códigos de sinais, que servem para identificar tanto os filmes projetados na salas de cinema como aqueles transmitidos na televisão. A tutela dos menores no âmbito da televisão foi também feita adotando-se o chamado sistema «watershed» (separador das águas), que funciona segundo uma seleção de faixas horárias protegidas, algumas aconselhadas à visão dos menores, outras aconselhadas a todos e outras ainda, principalmente na programação noturna, indicadas somente a um público adulto.
A faixa de idade determinada pela classificação preventiva dos filmes tem obviamente uma repercussão na programação das chamadas faixas horárias protegidas ou distintas nas emissoras de televisão pública em todos os países europeus. A definição das linhas de conduta comuns está à base dos acordos de auto-regulamentação e de co-regulamentação dos programas de televisão, estabelecendo-se um código de procedimento comum para as emissoras tanto públicas como privadas. Criou-se assim uma base normativa, que é assumida pela autoridade do Estado e que recebe a confiança dos consumidores das emissoras públicas ou privadas que adotam este sistema de auto-regulamentação.
Para tornar visível aos adultos as classificações dos programas apropriados aos menores, muitas emissoras européias adotaram um sistema de sinais que através de símbolos, números, cores e sinais acústicos advertem ao público a respeito daquilo que está para ser transmitido.
Mas, apenas este sistema, assim como o de filtragem (tipo v-chip), não basta para garantir uma verdadeira tutela dos menores diante de um conjunto de imagens difíceis de serem decodificadas por um jovem. Deve-se pensar às imagens de guerra dos telejornais, dos filmes escabrosos ou às informações sobre os crimes hediondos, que muitas vezes têm como ambiente o próprio núcleo familiar.
É na colaboração entre Estado, produtores de programas audiovisuais e famílias que pode ser fundamentado um autêntico respeito dos menores que encoraje o crescimento positivo da criança em base aos valores fundamentais da pessoa humana.

4) CELULARES COM VÍDEO

Hoje a difusão dos celulares com vídeo chegou à Itália ao índice se 134%, o que significa que muitas pessoas possuem pelo menos dois celulares, inclusive os jovens e as crianças, que recebem este instrumento dos próprios pais. De fato, de duas crianças entre 8 e 13 anos de idade, uma delas tem um celular no bolso. Aquele que poderia ser um instrumento para controlar melhor os deslocamentos e as necessidades dos filhos, se revela no entanto um perigoso meio que pode expor a outro tipo de utilização por parte dos menores, que não se separam nunca do próprio celular, nem mesmo durante as aulas, como lamentam vários professores. Apesar do código de auto-regulamentação assinado pelas principais operadoras (Código de conduta para a oferta de serviços a pagamento em tutela dos menores), na realidade os novos serviços opcionais do celular o tornaram um «personal computer» capaz de permitir novos usos que antes não tinham.
Os desenvolvimentos tecnológicos que estão se verificando no campo da telefonia móvel – particularmente no que se refere à sinergia com a internet e a adoção dos sistemas DVB de vídeos-telefone – contribuem a aumentar a oportunidade de comunicação também para as novas gerações e, ao mesmo tempo, repropõem em novos termos a questão da tutela dos menores. As evoluções já previstas ulteriormente para os próximos anos e o número sempre crescente de pessoas envolvidas, pedem uma grande consciência social e uma constante atenção das pessoas e órgãos encarregados de garantir os direitos dos cidadãos.
Neste contexto devem ser reafirmados os direitos dos menores no campo da comunicação, dentre os quais certamente não está em último lugar aquele que se refere também à segurança diante dos riscos de indução a comportamentos ilícitos ou de acesso a conteúdos nocivos ou indesejados. Também neste campo é essencial o papel dos pais e, em geral, de todos aqueles que são chamados a ter uma função educativa. A maior segurança das crianças e dos jovens quanto ao acesso a conteúdos ilegais é um ponto que deve merecer atenção também através da maior conscientização dos pais e das mães, que devem se capacitar a conhecer e utilizar estes meios.
Para a «alfabetização» dos pais na utilização da mídia devem colaborar também as instituições públicas, promovendo um uso positivo das novas possibilidades tecnológicas. Às empresas cabe a responsabilidade de colocar no mercado um produto que dê garantias no que se refere à sua utilização pelos menores, superando os limites estabelecidos pelo código de auto-regulamentação assinado pelas operadoras de celulares. Devem também oferecer maiores informações aos adultos que assinam um contrato de utilização, como por exemplo a adoção de bloqueios automáticos de acesso a conteúdos nocivos, se o celular passa às mãos de um menor de idade.

5) VIDEOGAMES

Trata-se de uma indústria global, que conquistou os jovens e não apenas eles. Os números relativos à difusão repentina dos videogames indicam que existem 250 mil sites de videogames, cada um deles propõe uma série de títulos, muitos deles recheados de cenas de sexo e de violência. Uma pesquisa recente do Instituto italiano de medicina social (IIMS) coloca em evidência, entre outras coisas, a escassa informação por parte dos adultos a respeito dos videogames utilizados pelos filhos, o predomínio de temas violentas em mais de 30% de títulos não aconselhados aos menores, o predomínio de personagens virtuais normais que podem se tornar especiais, realizando ações extraordinárias.
Mas, o ponto de risco mais elevado se refere aos pequenos jogadores de videogames, crianças entre seis e nove anos de idade que se submetem a entrar tão intensamente no jogo virtual que chegam a formas de dissociação da realidade e solicitam um monitoramento muito atento da parte dos adultos. A mesma pesquisa indica a presença de videogames em 25% das famílias com crianças de três a cinco anos de idade e em 65,2% das famílias com crianças entre seis e 10 anos de idade. O que produz efeitos negativos no âmbito cognitivo das crianças não parece ser especificamente o meio, mas muito mais os elementos que criam a excitação, tais como a velocidade de produção do estímulo e da resposta, a velocidade das imagens, os efeitos especiais, os contrastes, a fragmentação da história, o binômio rumor-ação. O uso prolongado do jogo inibe, segundo alguns psicólogos, a área da capacidade crítica, provocando passividade e ao mesmo tempo agressividade na criança. Mas, não queremos demolir os videogames, porque existem aqueles que são muito adequados aos mais jovens, com valores de informação e de educação, seja também porque o uso deste meio é na realidade um passo na preparação da criança ao sucessivo e mais sofisticado, que é o uso da internet.
De qualquer maneira, os dados relativos à venda destes produtos de entretenimento mostram um crescimento em todos os lugares e a difusão deste meio é acompanhada de uma aceitação social (ou seria uma resignação?) sempre maior.
É urgente ampliar o percurso de conhecimento e das estratégias internacionais, para monitorar um mercado que está cada vez mais vasto. Parece urgente estabelecer modalidades operativas para o controle dos conteúdos e do sistema de sanções, seja para o produtor como para o vendedor dos serviços. O código de auto-regulamentação Pegi (derivado em 2003 do sistema de avaliação e classificação holandês, Nicam, que assinala os conteúdos inadequados aos menores), adotado pelos industriais de «entertainment» que produzem videogames, é a única forma de auto-regulamentação existente atualmente e que prevê sanções (raramente aplicadas, mesmo diante de casos graves evidentes) para os produtores que colocam no comércio os jogos com indicações de faixas etárias apenas aproximativas.
O código Pegi, ao qual a associação européia Isfe adere em 2002, é evidentemente insuficiente na sua função declarada de «fornecer aos consumidores as informações mais oportunas» e expostas no selo de produção. E, como o setor dos videogames tem hoje um volume de negócios que ultrapassa os 740 milhões de euros, envolvendo 24 milhões de jogadores (43% da população a partir dos quatro anos de idade), com uma venda dos produtos classificados para maiores de três anos de idade que chega aos quase 48% dos consumidores. É um dado que define o impacto deste gênero de meio sobre a infância e a adolescência, mostrando toda a sua periculosidade, seja pelo consumo de conteúdos inadequados, seja pelo excessivo número de horas dedicado neste passatempo, muitas vezes solitário e sem a presença de um adulto ao lado. Se for verdade, como sustenta a indústria, que a produção de videogames violentos é apenas uma mínima parte do mercado, é também verdade que esta representa a fatia mais importante do retorno econômico.
O interesse pelos videogames é alimentado pela sinergia com os filmes que inspiram o jogo homônimo e que torna sempre mais atrativo este gênero, principalmente para os adolescentes. Desta maneira é importante também neste campo o estabelecimento de regras precisas em defesa dos consumidores dentre o público jovem, mais exposto aos riscos destas novas formas de entretenimento cada vez mais sofisticadas e envolventes, por causa da combinação entre narrativa e efeitos gráficos.

6) PUBLICIDADE

O problema da tutela dos menores diante da publicidade se apresenta como um corolário, dentro do quadro mais amplo que regulamenta a difícil relação entre a mídia e as crianças. A televisão, e portanto também a publicidade, se constitui em uma fonte de perigo para os menores, isto é, para a maior parte das crianças, principalmente em idade pré-escolar, que devem saber fazer a diferença entre a publicidade e o resto da programação, e entre os programas de ficção e a realidade. Com essas considerações não significa que exista uma acrítica rejeição da publicidade em si mesma – à qual se reconhece, no entanto, onde proceda corretamente, uma função positiva no processo de formação, de crescimento crítico e de socialização do menor –, mas existe a necessidade de prever um sistema de regras destinado a garantir-lhe um uso adequado.
O efeito dos anúncios publicitários é tão grande que em alguns países estão sendo tomadas medidas drásticas a respeito. No Reino Unido, por exemplo, recentemente foram vetados os anúncios publicitários durante os programas destinados às crianças até nove anos de idade, a partir de 1º de janeiro de 2008 a medida se estenderá à programação para os jovens até 15 anos de idade e até o final de 2008 serão vetados em todos os canais dedicados aos menores. Apesar de se reconhecer que a publicidade serve para financiar os programas, aqueles dedicados às crianças terão que recorrer a outras fontes. Também na França começa a se impor uma «linha dura» a esse respeito: visto a alta incidência de publicidade de merendas, de sucos e doces em geral, a partir de agora os anúncios dedicados às crianças deverão ser precedidos de uma espécie de aviso, que orientará para uma alimentação adequada.
Mas, por que as crianças são tão frágeis diante dos apelos da publicidade? Na Itália, explica Paolo Landi, secretário geral da Adisconsum (Associação de defesa dos consumidores e do ambiente»), em um capítulo de seu estudo «Crianças da multimídia»: «Se consideramos que a publicidade não faz outra coisa que veicular um conhecimento imediatamente concretizável em um “ter”, ou em um “ser”, ou em um “fazer”, a criança absorve sem dificuldades os três componentes que são a obsessão dos expertos de marketing, isto é, o componente cognitivo (como fornecer informações indeléveis sobre um produto ou um serviço), o componente afetivo (como fazer o consumidor reagir de maneira emotiva) e o comportamental (como colocar o pequeno consumidor em movimento na direção da aquisição). A partir deste ponto de vista a criança é o público ideal, o consumidor a quem se pode vender qualquer coisa».
Na Itália está em vigor um código de autodisciplina publicitária que surgiu em 1966, em base a um acordo entre os profissionais do setor. Esta primeira forma de tutela, em grande parte com origem comunitária, tem como protagonistas entidades administrativas independentes: a Autoridade de controle da concorrência e do mercado de setor e a Autoridade de garantia para as comunicações e a editoria. Enquanto isso, para a auto-regulamentação, orientada pelas normas que constam do Código de autodisciplina publicitária, e agora também, embora com força jurídica diferente, pelo Código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual se reconhece um poder de decisão e de sanção, emanando uma ordem e intimando seu cumprimento.
Em todos os países onde a televisão serve de veículo às mensagens publicitárias, o mundo empresarial é plenamente consciente do enorme poder de influência que a publicidade tem sobre as crianças.



NORMATIVA INTERNACIONAL

O assunto relativo à tutela dos menores na mídia é um dos mais debatidos, seja no que se refere às normas nacionais, seja no âmbito internacional. Encontra-se diante da situação de precisar acertas as contas com toda a extensão da rede global da internet. O exemplo que, neste momento de transição, coloca mais em evidência a necessidade de estabelecer leis que estejam em condições de controlar o acesso e uso dos conteúdos nocivos para os menores, é exatamente o da internet. Qualquer pessoa no mundo pode abrir um site considerado «arriscado», contendo elementos ilegais e acessíveis a consumidores despreparados, disponibilizados por quem está do outro lado do mundo.
No que se refere aos princípios gerais no âmbito do direito internacional, é preciso recorrer principalmente à convenção da ONU sobre os direitos da criança, com sede em New York, ratificada pelo Parlamento italiano através da lei nº.176/1991. Esta garante à criança uma «consideração proeminente» também a respeito da liberdade, seja no se refere à expressão, seja quando tutela os conteúdos recebidos. Esta mesma convenção, em seu artigo 17, fala da relação entre menor e televisão, desejando «um sistema normativo que tutele o menor-consumidor, mesmo com todas as dificuldades que se apresentam», seja para individuar os fenômenos que devem ser monitorados, seja sobre as normativas possíveis.
No direito da União européia, tal tutela foi recentemente confirmada pela Carta dos direitos fundamentais da União, aprovada em Nice em 2000, cujo artigo 24 salienta que «os Estados membros reconhecem a importância da função exercida pelos meios de comunicação de massa e cuidam para que a criança possa ter acesso às informações e materiais... com a finalidade de promover o seu bem estar social, espiritual e moral, além de sua saúde física e mental». A normativa seguinte, 89/552/CEE, previu algumas restrições, seja no que se refere aos programas como para as mensagens publicitárias destinadas a este público». O artigo 22 desta normativa conduz a impedir a transmissão de programas que contenham cenas pornográficas ou de violência gratuita, ou outros programas inadequados a este público. Não podemos esquecer de mencionar a determinação expressa de «Televisão sem fronteiras», que está hoje em sua quinta versão atualizada, que o tema da tutela dos menores está relacionado com o estatuto geral dos direitos dos menores e corresponde ao disposto nos artigos 50 e 31 da Constituição italiana.
Se for claro que os princípios normativos são todos a favor da tutela dos menores, é também verdadeiro que uma tecnologia em contínua evolução colocou em crise as velhas regras do jogo. Mas também é claro que não se pode mais adiar a necessidade de estabelecer novos parâmetros normativos, para que as crianças possam utilizar os meios de comunicação próprios de seu tempo, com aproveitamento e serenidade também para as famílias.~

EDUCAÇÃO À MÍDIA NO MUNDO: PARA SABER MAIS

A difusão da educação à mídia é uma resposta à necessidade de se informar sobre as novidades no campo dos novos meios de comunicação. Em seguida citamos apenas alguns sites que em vários países oferecem maiores informações sobre como aprender a usar melhor a mídia, enfrentando a problemática da tutela dos menores e da alfabetização às novas tecnologias por parte dos adultos.
«The Media Awareness Nework-Réseau éducation médias» é uma organização canadense sem fins lucrativos, pioneira no desenvolvimento de programas sobre a educação à mídia. Com esta finalidade ela produz programas online em colaboração com organizações internacionais, convicta que, para interpretar as mensagens de informação, de entretenimento e comerciais, os jovens têm necessidade de instrumentos críticos válidos. Por isso é importante formar também os adultos (famílias e professores) sobre como funciona a mídia e como ela determina o estilo de vida.
A organização realiza uma ação contínua de monitoramento em relação à mídia (televisão, cinema, videogames, imprensa, publicidade, etc.), e sua seção dedicada aos pais oferece uma série de elementos para que estes reflitam com os filhos sobre esses meios, além da seção para os educadores, que inclui lições e materiais de apoio. Uma outra seção é dedicada à análise das questões ligadas à mídia, como a difusão de estereótipos, as representações de violência e da diversidade, a privacidade, a publicidade dirigida aos menores. Seu site é em inglês e francês (http://www.media-awareness.ca).
«Quai des images» é o site dedicado ao ensino de cinema e audiovisual organizado pelo Ministério da Educação francês. Ele propõe atividades ligadas à educação à imagem e de análise dos filmes em consonância com os programas escolares, agrupa os textos oficiais a respeito dos meios audiovisuais, oferece uma série de instrumentos de análise e de estudo completos sobre alguns filmes específicos e sobre certos autores em particular, informa sobre conferências, seminários, cursos e festivais sobre o mundo audiovisual e sua utilização em âmbito educativo e didático. Entre outras coisas, reúne também as propostas e as experiências feitas por professores e seus alunos nas escolas secundárias francesas no campo da educação à imagem, além de organizar um fórum de discussões aberto a todos sobre a educação à mídia (http://www.ac-nancy-metz.fr).
Sempre na França, está em funcionamento o blog «Zéro de conduite», organizado pelos professores e destinados a educadores, pais e estudantes. Promove o uso do cinema como instrumento pedagógico, dedicando-se especialmente à atualidade cinematográfica, mas sem esquecer os clássicos e os documentários. Com várias seções e espaços de aprofundamento, se propõe como um local de discussão de temas em um debate aberto (http://cinema-ducation.fluctuat.net).
A Universidade de Massachussetts organizou o Media Education Foundation – MEF, mídia de desafio, que produz e distribui documentários destinados a estimular o pensamento crítico e o debate sobre a relação entre aqueles que detêm o poder sobre a mídia, os conteúdos da mídia comercial, a exigência democrática de um livre fluxo de informações, as diversas representações de idéias e pensamentos e o direito dos cidadãos de informar e serem informados. Alguns destes temas são abordados criticamente, como a identidade do gênero na publicidade, a imagem de sexo nos videoclipes, o papel da mídia na construção da identidade cultural, mídia e saúde, etc. (http://www.mediaed.org/).

(a cura di M. F. D’A.)

 
At 9/17/2007 2:46 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

AS CRIANÇAS E A MÍDIA (II PARTE):
ACEITAR O DESAFIO EDUCATIVO


O tema da 41ª Jornada das Comunicações Sociais, «As crianças e os meios de comunicação: um desafio para a comunicação», nos convida a refletir a respeito de dois aspectos particularmente importantes. O primeiro é a formação das crianças, para que estejam em condições de receber de maneira crítica aquilo que vêem. O segundo é a formação à consciência e ao uso consciente da mídia, que está em contínua transformação tecnológica.
De fato, é o que especifica Bento XVI no início de sua mensagem, de 20 de maio de 2007, para a Jornada: «Os complexos desafios que a educação contemporânea deve enfrentar são muitas vezes ligados à grande influência dos meios de comunicação no nosso mundo. Como aspecto do fenômeno da globalização e estimulados pelo rápido desenvolvimento da tecnologia, os meios de comunicação delineiam fortemente o ambiente cultural (cf. João Paulo II, O rápido desenvolvimento, nº3). Na realidade, há quem afirma que a influência formativa da mídia está em competição com aquela da escola, da Igreja e, quem sabe, até com aquela da própria família».
De fato, como salienta o Pontifício conselho para as Comunicações Sociais, «para muitas pessoas, a realidade corresponde àquilo que os meios de comunicação definem como tal». Episódios recentes, como a utilização do celular na filmagem de violências nas salas de aula, abusos sofridos por pessoas deficientes, fenômenos de trote e de violência generalizada, demonstram como as crianças que crescem passando uma média de quatro horas por dia diante da televisão, sozinhos em casa, absorveram a lógica do «estou no vídeo, logo existo». Os psicólogos, os pedagogos e os estudiosos dos meios de comunicação estudam há tempos sobre as relações entre o consumo televisivo e o comportamento violento dos menores. Uma grande quantidade de pesquisas realizadas em muitos países ocidentais demonstra como esta correlação seja realmente inegável.


NOVAS LINGUAGENS

O fato que muitas crianças vivem completamente inseridas no mundo dos velhos e novos meios de comunicação, que estão cada vez mais frequentemente em correlação entre eles, é confirmado pela popularidade de alguns modelos televisivos, considerados tão efêmeros quanto penosos «momentos de glória», presentes nos programas com os maiores índices de audiência, dos «reality» aos «talk show», sem falar do «trash», que hoje se tornou um gênero de espetáculo.
Dentre as preferências demonstradas pelos adolescentes italianos que assistem televisão mais do que três horas por dia, encontramos, em primeiro lugar, a figura da «veline» (Ndt: misto de corista e coadjuvante na apresentação de programas populares da televisão italiana), enquanto outros da mesma idade se concentram no mais clássico exemplo, o do jogador de futebol. De toda maneira, a coisa mais importante é aparecer, pouco importa por qual motivo, de ser «alguém» ou «alguma coisa» no Olimpo mediático, mesmo que seja apenas por um instante.
Estes são os exemplos mais negativos dos condicionamentos derivados de um excessivo e acrítico uso dos meios de comunicação. Encontramo-nos diante de uma nova geração que cresceu na frente da televisão, capaz de usar as novas tecnologias que os próprios pais, que as adquiriram e as tornaram disponíveis, muitas vezes se encontram despreparados para utilizá-las.
Tanto é verdade que hoje em dia os filmes são vistos diretamente nos celulares e a televisão pode ser assistida na tela do computador. Hoje se telefona através da internet e graças ao download se descarrega os CDs e DVDs mais recentes, se filma e se faz foto com o celular, e assim por diante.
Nas casas, o vocabulário familiar se reduziu ao gênero dos sms e se fala tendo o som da televisão no fundo, se comunica através de e-mail, se faz «visita virtual» via computador, se percorre através de bibliotecas virtuais, tanto que as fichas e arquivos de papel evocam imagens do outro século, completamente em desuso.
A situação dos nossos filhos é diversa daquela da geração precedente, pois eles abriram seus olhos tendo diante de si estes cenários de profunda, contínua e envolvente transformação tecnológica. Eles se constituem aquela que os estudiosos chamam de geração nascida «com seis dedos»: além dos cinco dedos normais da mão, o sexto é o mouse do computador.
Com o aparecimento do mundo «virtual» da internet e dos videogames criou-se uma defasagem em relação à realidade verdadeira e própria. As duas dimensões parecem muitas vezes, e para muitos jovens, como universos paralelos, com conseqüências não indiferentes no plano do processo de amadurecimento. Têm grande sucesso os sites nos quais se prevê uma segunda vida (basta verificar os milhares de registros nos poucos meses de existência do site italiano de «Second Life», que em todo o mundo já tem sete milhões de inscritos), onde a simulação reproduz todas as situações da vida real. Apenas que tudo é falso, a começar da nova identidade, que pode ser escolhida e com ela se inicia a fazer parte deste mundo fora do mundo, onde se pode ser um «qualquer coisa». Isto é, ninguém.
Assim, o grande desafio cultural de hoje é propriamente a redefinição dos limites, que muitas vezes se apresentam demasiadamente instáveis. Isto é, redefinição dos limites entre o real e o virtual, superando a divisão digital que hoje separa as gerações adultas daqueles mais jovens.


OS JOVENS: PROTAGONISTAS OU VÍTIMAS DAS MUDANÇAS?

A linguagem deles é pobre, muitas vezes recheada de termos tirados do dicionário do internauta: clicar, chatar, messagiar, deletar, são alguns dos neologismos que fazem parte de seu vocabulário quotidiano. Falta uma dimensão humana da tecnologia que esteja em condições de traçar o perímetro cultural entre o real e o virtual. Assim a aldeia global difundiu uma quantidade de modelos comportamentais desviados, ou pelo menos discutíveis.
Desta maneira, os jovens que vivem a milhões de quilômetros de distância jogam o mesmo videogame, vêem o mesmo filme, assim como, de maneira transversal, absorvem modelos e comportamentos semelhantes. Muitas vezes os adultos têm menos domínio no uso das novas tecnologias e observam, com uma preocupação resignada diante de suas próprias limitações, as crianças que navegam facilmente na internet.
As raízes das dificuldades neste campo educativo são muito bem explicadas por Marina D’Amato, professora de sociologia da Universidade de Roma, que salienta: «Cada geração tem necessidade de se encontrar também em um mundo fantástico, que serve a interiorizar o paradigma do bom e do belo, do justo e do errado, do oportuno e do útil, também em relação aos exemplos que procedem da narrativa. Hoje nos encontramos em uma condição na qual os avós e os pais contam cada vez menos histórias aos filhos e aos netos, e este papel foi assumido pela televisão. Mas, na realidade, a televisão “exila” e “con-funde”, isto é, funde os modelos morais que são frutos de ânsias e problemas mal resolvidos, muito mais que de certezas. Embora estes se transformem com freqüência, a cada três ou quatro anos, o fato de serem repropostos continuamente faz com que se justaponham uns aos outros» (ver Come mediare i media, de Mario Russo).
Se for verdade que a televisão é o meio mais usado até a adolescência, imediatamente depois surge a grande atração pela internet. Esta passagem nasce de uma sintonia com a linguagem televisiva, que na idade infantil muitas vezes é ouvida durante muitas horas no dia. Esta linguagem se baseia em uma mediação da realidade e desta maneira ela ativa um processo de recepção que é de tipo emotivo.
Neste registro emocional é mais fácil acabar envolvido por situações e figuras capazes de se proporem como modelos identificadores, preservadores de sentido e de comportamentos a serem imitados.
O poder de concentrar uma vontade emulativa em alguns personagens, que correspondem particularmente às necessidades interiores do jovem (necessidades na maioria das vezes induzidas pela publicidade ou por modelos estimuladores), tem uma forte relação com a quantidade de horas que o jovem passa utilizando os novos ou os velhos meios de comunicação.


EDUCAÇÃO NECESSÁRIA

«A formação adequada a um uso correto dos meios de comunicação é essencial para o desenvolvimento cultural, moral e espiritual das crianças… Educar as crianças a serem seletivas no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja, da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos. Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia, com a certeza de que este difícil, embora gratificante, aspecto da condição de pais, é apoiado por toda a comunidade.»
As palavras do discurso de Bento XVI definem com grande clareza o paradigma de uma justa relação entre a mídia e os menores. Uma clareza que devemos agradecer ao magistério da Igreja, no momento em que o mundo da mídia parece ignorar a verdadeira problemática educativa das crianças e as expectativas de qualidade e de segurança exigidas pelas famílias no que se refere ao uso desses meios, seja do cinema aos videogames, da televisão à internet.
Diante da utilização destorcera do meio televisivo, o mais difundido dentre os meios de comunicação, a Igreja se interroga sobre o porquê da televisão não ter um papel educativo e por que os meios de comunicação não podem ser companheiros confiáveis para os jogos na fase de crescimento da criança. O anúncio de uma recente campanha sobre o uso da mídia, promovida pelo Ministério das Comunicações, mostra os vários membros da família que estão vendo a televisão ao lado de uma criança.
Que se trate do avô ou da mãe, a mensagem é a mesma: não deixar uma criança sozinha diante de um meio que, sem o apoio crítico educativo de um adulto, pode transmitir conteúdos inadequados à idade e à maturidade daquele que o vê. Sem esquecer as responsabilidades dos produtores televisivos, empenhados na organização dos programas, o papel da família é realmente insubstituível.
Se realmente o objetivo de quem administra a sociedade de produção televisiva, ou das multinacionais produtoras de videogames ou das operadoras de celulares, é o de promover e vender o produto, o bem estar psicofísico da criança está no centro do interesse dos educadores, sejam eles os professores ou, em primeiro lugar, os pais.
Isto explica bem a mensagem do Papa, que continua a sua análise, salientando que «educar as crianças a serem seletivos no uso dos meios é responsabilidade dos pais, da Igreja e da escola. O papel dos pais é de primária importância. Estes têm o direito e o dever de garantir um uso prudente dos meios de comunicação, formando a consciência de seus filhos, a fim que estes sejam capazes de exprimir juízos válidos e objetivos que os guiarão na escolha ou na rejeição dos programas propostos (ver João Paulo II, «Familiaris Consortio», 76). Ao fazerem isso, os pais deveriam ser encorajados e apoiados pela escola e pela paróquia.»


CONTEÚDO DA MÍDIA

No panorama de uma revolução da multimídia, que está modificando transversalmente os hábitos, a mentalidade, os modelos e as linguagens, deve voltar ao centro do debate a tutela daquilo que é melhor para os menores. Sem acusar a «mídia», que enquanto tal não é nem boa nem má, o importante é partir de uma a análise do produto, para assim poder individuar conteúdos que sejam de melhor qualidade para as crianças e os adolescentes. Porque a televisão é um instrumento que abre janelas de conhecimento para o mundo e, se bem utilizada, de «má professora» pode se tornar uma preciosa fonte de estímulo para o crescimento humano e cultural.
A mesma coisa vale, e com mais razão, para a «rede» que engloba e compreende tudo, e para os videogames, onde, ao invés de violência e monstros, poderia se dedicar a produzir (e isso já ocorre em certos casos) histórias instrutivas e de conteúdo interessante.
Bento XVI coloca justamente em evidência as enormes possibilidades para que seja melhorado o conteúdo deste grande campo de produção multimídia: «A educação através da mídia deveria ser positiva. Colocando as crianças diante de um meio estética e moralmente excelente, estas recebem uma ajuda para que desenvolvam a própria opinião, a prudência e a capacidade de discernimento. É importante aqui reconhecer o valor fundamental do exemplo dos pais e as vantagens de introduzir os jovens aos clássicos da literatura infantil (…). A beleza, quase um espelho do divino, inspira e vivifica os corações e as mentes juvenis, enquanto a feiúra e a vulgaridade têm um impacto deprimente sobre os comportamentos». Diante de uma decadência geral do produto televisivo, a questão da qualidade aparece ainda mais forte e vibrante em grande parte de um público formado de famílias, que pede para não ser apenas um exército indistinto de ouvintes silenciosos, mas um público em condições de exprimir suas preferências por conteúdos formativos e informativos de bom nível.
A mensagem de Bento XVI continua, com algumas importantes indicações: «Como a educação em geral, aquela da mídia requer também uma formação ao exercício da liberdade. Trata-se de uma responsabilidade que compromete. Muitas vezes a liberdade é apresentada como uma incansável procura do prazer ou de novas experiências (…). Este desejo, sentido profundamente pelos pais e educadores, que é o de educar as crianças no caminho da beleza, da verdade e da bondade, pode ser apoiado pela indústria da mídia somente na medida em que se promove a dignidade fundamental do ser humano, o verdadeiro valor da vida familiar, as conquistas positivas e as metas da humanidade. A partir disso, a necessidade de que os meios de comunicação estejam empenhados na efetiva formação e no respeito da ética deve ser vista com interesse particular e com urgência não apenas pelos pais, mas também por aqueles que têm responsabilidade cívica».
Na realidade, nos encontramos na situação de ter que reconhecer que na Itália falta uma verdadeira «cultura da criança»: a situação é tão séria que no âmbito institucional procura-se dar uma nova organização geral para verificar e controlar os conteúdos dos setores de entretenimento, como os videogames, que até agora estão submetidos apenas a códigos de auto-regulamentação, feitos e codificados para uso e consumo pelas indústrias produtoras.
Uma vez mais, o primeiro e indispensável apoio à criança só pode vir da família e de uma relação mais estreita com os professores e educadores, exatamente como salienta Bento XVI, lembrando-nos que a preocupação educativa dos pais não deve se tornar uma preocupação genérica, mas uma atenção constante a tudo aquilo que diz respeito aos filhos.

A INDÚSTRIA DA MÍDIA

1) A TELEVISÃO

Se a televisão convencional se apresenta como um ramo de atividade já «maduro», no entanto se apresenta no horizonte a situação da mídia digital (satélite ou a cabo), também como uma plataforma que consente a ligação entre televisão, internet e outro tipo de mídia através do computador. No que se refere à qualidade da programação, apesar dos inúmeros bons propósitos anunciados no âmbito institucional, parece pequena a atenção às exigências dos menores em suas diversas faixas etárias. A programação para os menores, na realidade é confinada em redes e horários particulares, enquanto o resto da programação na faixa horária considerada «para todos» muitas vezes apresenta conteúdos inadequados aos jovens. Mas, quais são as expectativas das gerações de jovens no que se refere à televisão? É realmente verdade que preferem o «trash», os jogos com prêmios absurdos e as «velines»?
A partir de uma pesquisa recente feita pelo instituto Censis sobre «Comunicação, pluralismo social, sociedade aberta» (2005) surge que a relação entre os menores, e em particular dos adolescentes entre os 14 e 18 anos de idade, e a televisão é determinada por elementos de forte contradição e de passividade. Nessa faixa etária, 100% deles vêem televisão praticamente todos os dias, 86% acompanham um pouco de tudo, com uma relevante predileção pelos filmes (72%), por esporte (32%) e pelos «reality shows» (18%).
No entanto, a amostragem entrevistada não está realmente satisfeita com aquilo que vê. De fato, 36% dos adolescentes denunciam a vulgaridade difundida nos programas e 25% criticam a superficialidade. Dentre eles, 46% consideram a televisão como um meio que «invade», ao mesmo tempo em que é interessante notar que 25% consideram que em geral a programação televisiva alimenta nas crianças menores uma visão consumista da vida. Destes dados surge o contraste entre a procura de distração e a reprovação daquilo que lhes é proposto pela programação. Isto significa que o alto índice de procura não é um indicador de satisfação.
Considerando o axioma de que a televisão seja onipresente, fica claro que são os próprios jovens a pedirem uma maior atenção aos conteúdos: menos violência e menos vulgaridade. A exigência de uma regulamentação diversa, diz claramente o relatório do Censis, «não vem somente daqueles, pais e educadores, que estão preocupados pela possível influência negativa sobre os menores, mas se exprime nitidamente também através dos adolescentes, pelo menos de uma parte mais esperta e consciente dentre eles».
Para tutelar melhor os direitos dos menores, desde 2002 foi instituído junto ao Ministério das Comunicações um código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual aderiram os produtores de televisão, seja no âmbito nacional como local. Baseando-se nos princípios sobre a matéria existentes na Constituição italiana e na Convenção dos direitos da criança, estabelecida em 1989 pela ONU, a comissão que controla sua aplicação avaliou em todos estes anos de atividade os milhares de casos em que foram violadas as normas de tutela, que prevêem a transmissão de programas e imagens adequadas a um público de menores de idade durante aquela que é chamada de «faixa protegida» da programação televisiva (das 7h30 às 22h30), intervindo com denúncias e sanções, que nos casos mais graves foram aplicadas pela Autoridade de garantia no setor das comunicações. Para o futuro, esta comissão deverá se transformar em um organismo mais amplo de controle, que se chamará «Mídia e menores», que além da televisão deverá monitorar também os setores dos vídeos-telefone e dos videogames, além da internet, que é o campo de maior risco.

REGRAS DE TUTELA EM OUTROS PAÍSES

É diversa a situação em outros países, como por exemplo na Grã Bretanha, onde o sistema de regulamentação da mídia é estruturado e complexo e foi atualizado nas últimas décadas, com uma particular atenção à tutela dos menores. As inovações tecnológicas neste setor levaram as normativas inglesas a uma série de novas disposições, como por exemplo, a visão em casa de vídeo exclusivamente para adultos, e que fora de casa seriam vetados aos menores, ou o combate à praga mundial dos sites internet para os pedófilos, que contenham material pornográfico ou com conteúdos que possam esconder o aliciamento de menores (ver a Protection Childres Act, de 1978).
A programação televisiva é regulamentada pelo Broadcasting Act (1996), de onde deriva a instituição da Broadcasting Standard Commission (BSC), um órgão independente de controle que estabelece as normas de avaliação e classificação dos programas, também no que se refere aos conteúdos violentos ou que possam ofender a decência pública (site oficial www.bsc.org.uk). Este organismo BSC funciona internamente à estrutura do Broadcasting, supervisionando e regulamentando todas as emissoras de televisão e de rádio, via cabo ou por satélite. Sua tarefa é a de elaborar os códigos de conduta e de aplicação de modelos que respeitem a justiça, além de monitorar os modelos, verificando que respeitem as leis. Com a transmissão de programas com conteúdos considerados inadequados aos menores de várias idades, há alguns anos a televisão inglesa adotou o sistema «watershed», um «separador de águas» entre um horário de programação familiar e outro para os adultos. Todo o sistema televisivo inglês se apóia sobre a responsabilização das famílias, pois sem a colaboração delas qualquer código de modelos para os programas é praticamente inútil.
Na França, está vigorando já há anos um código através de sinais televisivos, que entra em função para assinalar os programas inadequados aos menores. A avaliação do programa televisivo é feita pelo Conseil Supérieur de l’Audiovisuel (CSA), uma autoridade administrativa independente, que controla a difusão dos filmes e outras transmissões em vários canais privados, nacionais, regionais ou locais. A normativa francesa (lei 719/2002) veta a transmissão de programas que possam prejudicar gravemente a integridade física, mental e moral dos menores, porque divulgam conteúdos de pornografia ou de violência gratuita. As transmissões são classificadas por um código de sinais que, em conjunto com um sistema organizado de faixas horárias de programação, garante às famílias mais clareza sobre os programas destinados aos menores.
Na Alemanha, o tema da infância tem particular atenção da legislação, que considera desde o nascimento o início dos direitos fundamentais do cidadão. A tutela é disciplinada no âmbito público pela JSchG (desde o dia 26 de fevereiro de 1985), enquanto a lei GjSM se ocupa do controle sobre a difusão de publicações e conteúdos mediáticos considerados danosos para os menores. A regulamentação no setor televisivo é feita segundo as normas do acordo sobre a radiodifusão dos Lander federais, que as entidades para a mídia nesses Lander adotaram por base para o estabelecimento das diretivas que tutelam o interesse dos menores nas emissoras privadas. Não são admitidas transmissões que incitem o ódio racial, que exaltem a violência ou a guerra, que ofendam a dignidade do homem, que sejam de gênero pornográfico, que mostrem pessoas moribundas ou com sofrimentos que ofendam a dignidade humana. Os responsáveis pela programação, escolhendo os horários das transmissões, devem cuidar para que os menores não vejam programas que podem prejudicar o seu bem estar psíquico, físico ou mental. As transmissões inadequadas às crianças menores podem ser transmitidas somente depois da autorização da entidade competente do Land interessado.
Os responsáveis pela organização dos programas televisivos em âmbito nacional devem nomear encarregados pela tutela dos menores, que atuam no momento da aquisição, da projeção e da realização dos programas. As emissoras privadas fundaram em 1993 uma associação de autocontrole voluntário da televisão («Freiwillige Selbskontrolle Fernsehen», FSF), à qual devem ser apresentados programas particulares, antes da sua transmissão, e suas avaliações consideradas nas decisões das entidades de controle da mídia nos Lander federais. Existe ainda o órgão comum do cidadão para a tutela dos menores, dos programas, da competência mediática e controle da mídia (GSJP), do qual faz parte um integrante da entidade para a mídia nos Lander federais, que dá o seu parecer a respeito de algumas séries, filmes e espetáculos mais ou menos adequados aos menores. Este órgão, o GSJP, decide sobre pedidos de mudança de horários de transmissão de filmes proibidos para menores, controla a forma de novos programas e experimenta novas disposições para a tutela dos menores na televisão digital. A peculiaridade da jurisdição alemã, seja no setor televisivo como no cinematográfico e da mídia em geral, é a minuciosa atenção às exigências com o desenvolvimento do menor e aos riscos que este pode correr com a observância incorreta das leis.
Nos Estados Unidos, é possível consultar via internet um «guia televisivo para os pais» (ver o site www.mpaa.org), que prevê algumas categorias de audiência aplicadas aos programas televisivos transmitidos a todo o público. Este guia organiza várias siglas para identificar a categoria de audiência para cada transmissão: vai-se do TVY (para todas as crianças) ao TVG (para todos), através de várias faixas etárias, que correspondem à passagem da primeira à segunda infância e desta à adolescência. Depois tem o TVPG («parental guidance», visto na presença de um dos pais), o TV14 («parent strongly cautioned», séria advertência aos pais), para os programas que contêm cenas de sexo e de violência. Enfim, há o TVMA, que prevê um «mature audience only», ou seja, destinado a um público de idade superior a 17 anos, última fronteira para os conteúdos considerados «restricted».
Estas avaliações foram elaboradas baseando-se nas opiniões dos próprios pais e são fáceis de serem encontradas e compreendidas. Esta linha de «guia de televisão para os pais» pode ser usada juntamente ao «v-chip», que é um dispositivo de filtro instalado na maior parte dos mais recentes modelos de aparelhos de televisão, para permitir aos pais de bloquear os programas inadequados.

FICHA 1
Brasil: «O que eu penso da tv»
No Brasil, a audiência infantil é muito alta: aproximadamente 30 milhões de crianças vêem televisão pelo menos durante três horas por dia. Explica a profa. Rosália Duarte, do departamento de Ciência da Educação, da PUC do Rio de Janeiro, que «as crianças são muito perspicazes, mas nós podemos e devemos ajudá-las a ampliar o seu quadro de referências, para que possam discutir ainda melhor sobre o conteúdos daquilo que vêem. Para isso temos necessidade, antes de tudo, de ouvir aquilo que elas têm a dizer sobre o assunto e de dialogar com elas. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e muito mais freqüente, a outras atividades culturais». No âmbito de uma pesquisa feita através de um questionário distribuído nas escolas, intitulado «O que eu penso da tv», apareceu que «as crianças querem seriamente ser ouvidas sobre aquilo que pensam da tv, mas sentem que sua opinião é considerada pouco importante e não estão contentes com o excesso de imagens de violência exibidas na televisão, principalmente a violência “real”, definida como aquela transmitida nos telejornais. Eles adoram ver televisão e não importa o que os adultos pensam e dizem a respeito disso. A eles agradam quase todos os tipos de programas transmitidos: novelas, desenhos animados, programas de humor, filmes, seriados, mas isso não faz deles espectadores “idiotas”, pois fazem críticas muito interessantes, pertinentes e bem elaboradas sobre o que consideram feio ou inadequado na televisão. Para a maior parte deles, a televisão se oferece como principal opção de divertimento (em alguns casos, a única), o que significa um dado muito preocupante. Mas, o que chamou mais a nossa atenção é o grau de experiência com o qual essas crianças analisam a televisão: são expertos e demonstram conhecer a televisão também do lado de dentro, inclusive as linguagens que ela utiliza, a sua estrutura de produção, a sua lógica interna e as suas maneiras de intervenção».
As crianças aprendem os valores e os não-valores através da televisão, não resta dúvida, mas demonstram ter senso crítico a respeito deste assunto, quando afirmam nos textos que os programas transmitidos na tv podem lhes ensinar «a serem bons, a ter coragem e a fazer o bem, a cuidar da natureza e de si mesmos, a serem honestos e a lutar por aquilo que desejam», mas também «a serem cruéis e mentirosos, a roubar e matar, a não respeitar os pais e a comprar tudo aquilo que não têm necessidade». Falando sobre a validade do ensino através da mídia, a profa. Duarte salienta a necessidade de «ouvir aquilo que têm a dizer sobre o assunto e a dialogar com eles. Além disso, especialmente no Brasil, temos necessidade de lhes oferecer outras opções de divertimento e um maior acesso, mais amplo e mais freqüente, a outras atividades culturais».

FICHA 2
Observadores internacionais
Os dados examinados em janeiro de 2006 pelo OssCom, que é um centro de pesquisa da mídia, deixam evidente a tendência a realizar uma forma de co-regulamentação, onde a ação legislativa dos Estados membros se integra com medidas de auto-regulamentação por parte dos produtores, broadcasters e profissionais da comunicação sob o efeito de controles e sanções. São dois os instrumentos mais utilizados no âmbito europeu, observando-se as diretivas previstas no artigo 22 de «Televisão sem fronteiras»: a definição de faixas horárias protegidas (watershed) e os sinais mostrados na tela (determinados por um sistema de «rating»). Apesar disso, aos campos tradicionalmente problemáticos da violência e da pornografia se juntam novos campos de risco para os menores: a vulgaridade, abusos e dependências de substâncias, linguagem e comportamento vulgares, discriminações e abusos, violações e ofensas à dignidade humana. Os critérios de avaliação dos programas se constituem um problema que é partilhado por muitos países da União européia, ao mesmo tempo em que se prepara uma uniformização internacional dos sistemas de classificação (ver mais adiante, Nicam), baseados na visualização de cinco ícones que ilustram simbolicamente qual é a problemática do programa que está sendo analisado e para quais idades ele é desaconselhado.
Deve ser assinalada a atividade online da European Medi@culture. O projeto é promovido pela Comissão Européia, em Bruxelas, no quadro das iniciativas «e-Learning», administrado pelo centro mediático de Baden-Württemberg. O site apresenta informações sobre a educação à mídia na Europa, particularmente na França, Áustria, Finlândia e Alemanha. A seção de projetos de multimídia agrupa os projetos sobre a mídia desenvolvidos por escolas e associações de jovens ao longo do tempo (ver http://www.european-mediaculture.org).

FICHA 3
África do Sul: Encontro mundial sobre a mídia para a infância
Este encontro trienal se realizou no último mês de março em Johannesburg, na África do Sul, com a participação de expertos do setor representando diversos países. Em conjunto se discutiu sobre a necessidade de uma programação adequada às crianças, procurando entender de que modo a violência na mídia pode influir sobre a psíquico dos menores.
Mas, no 5º Encontro mundial sobre a mídia para a infância apresentaram-se também muitas crianças provenientes de todo o mundo e empenhadas em discutir sobre o difícil tema da «Mídia como instrumento de paz e de democracia global». Vieram guiados por grupos de adultos, dentre eles as diversas organizações católicas que há anos trabalham para promover regras para o bem da infância, a serem respeitadas nas transmissões de rádio e televisão através de códigos de regulamentação que devem ser redigidos ou, como em alguns casos, apenas atualizados. Em muitos países do sul do mundo as novas tecnologias de multimídia já estão muito disseminadas e seu uso merece uma atenção particular para tutelar o público mais jovem.
Especialmente na África, explicou o organizador do encontro, Firdoze Bulbulia, começa-se a examinar o projeto de um «Media center» para as crianças, que possa produzir e distribuir transmissões de rádio e de televisão destinadas ao público mais jovem, com o objetivo de realizar um canal televisivo pan-africano dedicado à infância. Os organizadores do encontro estão também trabalhando no projeto de uma aliança africana dos meios de informação e de comunicação, seguindo o modelo daquela já existente na América latina.

2) INTERNET

Na Itália, 47% das famílias italianas têm um computador em casa, um dado relevante mas sempre muito baixo em relação à média dos outros países europeus. O uso da internet por parte dos adolescentes e jovens, e a familiaridade que têm com tudo aquilo que pode ser digitado ou «descarregado» da internet, apresenta não poucos problemas. Pela sua própria natureza de rede de comunicação global, o problema se apresenta em ótica internacional, procurando garantir a tutela dos menores através de precisos acordos com os provedores para um efetivo controle de conteúdo. No campo italiano, até 2006, a tutela dos menores tinha sido deixada nas mãos dos próprios provedores, que em 19 de novembro de 2003 assinaram um acordo de auto-regulamentação: o Codice Internet e Minori. Embora o acordo tenha sido estipulado entre os representantes dos vários provedores diante do Ministério para a Inovação e a Tecnologia, no entanto ele permanece um acordo privado, com lacunas, principalmente no que se refere às sanções que muitas vezes devem ser aplicadas. Em 2006, na seqüência de numerosos casos de violência sobre menores, muitos dos quais realizados através da difusão de material pedo-pornográfico (quando não se tratava de verdadeiro e próprio aliciamento de menores via internet), foi promulgada a lei 38 de 6 de fevereiro de 2006: «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet».
Enfim, como aplicação da lei 38/2006, em fevereiro da 2007 foi publicado um decreto determinando os requisitos técnicos dos instrumentos de filtragem que os provedores da rede internet devem utilizar para impedir o acesso aos sites já assinalados pelo Centro nacional contra a pedo-pornografia. Mas, isso não basta para superar as dificuldades e impedir que os menores possam navegar de maneira arriscada na «rede das redes».
Atualmente foi reativada a comissão anti-pedofilia e desvios de menores através da internet, o «Ciclope», que tinha sido instituída junto ao Ministério para a Eqüidade, do governo italiano, e que ficou inativa por um ano, até a sua reestruturação junto ao Ministério da Família. Está também para entrar em função um site dedicado ao uso da internet, junto ao Ministério das Comunicações, e um número telefônico de emergência gratuito, organizado pelo mesmo ministério e por «Save the children», que poderá ser utilizado por qualquer cidadão que queira assinalar algum abuso, desvio ou pedo-pornografia. Dentre as iniciativas mais recentes, deve ser assinalado o site www.tiseiconnesso.it criado pelo Ministério das Comunicações italiano, sempre em colaboração com «Save the children», onde é colocada à disposição uma série de informações sobre o conteúdo de certos sites, seja para os pais como para as próprias crianças, em conjunto com a campanha televisiva que tem como slogan «A melhor maneira de ajudar o seu filho a não usar incorretamente as novas tecnologias é conhecê-las».
Deve ser salientado também o fato de como a rede se tornou um grande mercado online. Para alguns produtores, o «e-commerce» de brinquedos corresponde já a 4% das vendas, e apenas em 2005 as vendas online corresponderam a 37.600 ações de compra. As razões para investir no processo online são múltiplas: desde a possibilidade de evitar as dificuldades logísticas de distribuição dos produtos, à ampliação de ofertas diferentes de produtos e também a possibilidade de envolvimento do cliente através de campanhas de mala direta e a criação de comunidades virtuais em torno de alguns produtos.

FICHAS:
Pedo-pornografia e internet
Em março de 2006, entraram em vigor as novas medidas diretas de combate e repressão ao fenômeno de exploração sexual dos menores e a pedo-pornografia, estabelecidas pela lei 38/2006 – «Disposições em matéria de luta contra a exploração sexual das crianças e da pedo-pornografia também através da internet» foi publicada no Diário oficial em 15 de fevereiro de 2006, nº.38 – com a qual foram substancialmente modificados e integrados os artigos 600bis e seguintes do Código Penal italiano.
A lei confirma os artigos 527, 528, 529 e 725 do Código Penal italiano, que punem os «atos obscenos em local público, publicações, espetáculos obscenos, desenhos ou figuras que ofendem a decência pública».
Porque em muitas publicações, transmissões televisivas e anúncios publicitários, mesmo que não tenham declaradamente um caráter pornográfico, imagens de crianças e adolescentes são apresentadas de maneira explícita ou mais ou menos sutilmente ilusória e de forma falsa, pede-se um novo empenho das instituições competentes para que sejam observadas as normas em vigor e, se preciso for, que façam apelo aos órgãos de Polícia, o Instituto de autodisciplina publicitária, o Ministério das Comunicações, a Polícia postal ou a «Comissão tv e menor».

3) CINEMA

Confirmando as disposições da Constituição italiana, no que se refere ao direito e ao dever das famílias de serem protagonistas na educação de seus filhos, para muitos é chegada à hora de reelaborar a legislação que define o conceito de «censura» (a lei 161/1962 prevê a possibilidade de negar a autorização de abertura às salas de cinema ou de fazer cortes nos filmes, mesmo em função de um público adulto), que hoje está superado. É preciso com urgência estabelecer um critério de tutela dos menores não apenas no que se refere aos filmes que vêem nos circuitos cinematográficos, mas também sucessivamente em casa, muitas vezes em horários acessíveis na programação da televisão.
Uma avaliação correta e preventiva de um filme permite à família ter à sua disposição os instrumentos para escolher se um espetáculo é mais ou menos oportuno, conhecendo a trama, os eventuais conteúdos mais sensíveis, a classificação que a obra recebeu em outros países, etc. Por isso, é justo que a legislação seja revista, uma operação que requer atenção e perspicácia da parte das instituições em um momento de transição da mídia, como este que estamos vivendo, quando esta se tornou realmente um importante componente na educação dos menores.
Não faltam filmes que atraem o público por causa de seu conteúdo de violência, e no entanto entram no circuito cinematográfico sem qualquer restrição de idade. Para um filme que é notícia nos jornais, existem muitos outros com conteúdos duvidosos ou até mesmo perigosos que conseguem passar através do filtro da comissão de revisão cinematográfica, que atualmente funciona junto ao departamento de cinema do Ministério dos Bens Culturais.
Ao mesmo tempo em que existe um projeto de lei do ministro dos Bens culturais, que deve ainda iniciar os trâmites parlamentares, novas situações se apresentam na Itália, com a autocensura de filmes, feita pelos produtores ou distribuidores cinematográficos, com a introdução de novas e mais específicas faixas etárias para as restrições visando os menores a partir dos 10 anos de idade. As restrições serão feitas baseando-se em uma avaliação classificatória dos conteúdos das obras e sucessivamente serão ainda analisadas por uma comissão de psicólogos, educadores e pais.
Este sistema se inspira no modelo americano da Motion Picture Association of America (MPAA), que há 40 anos representa os interesses da indústria do audiovisual americana no mundo. Funcionando a partir de regras bem precisas (estabelecidas ao longo dos anos, também segundo as sentenças dos tribunais federais nos vários Estados americanos e em base aos protestos dos cidadãos), a autocensura americana prevê a existência de uma única comissão competente para determinar as restrições do PG12 ao «restricted» 17 anos. Esta comissão é composta exclusivamente de pais, considerados os primeiros depositários da educação dos filhos, e representam transversalmente a audiência. Importantes sanções econômicas asseguram que o mecanismo de autocertificação corresponda efetivamente aos interesses dos cidadãos. No site da Motion Picture estão disponíveis aos pais os pontos de referência para a avaliação das obras de entretenimento e são publicadas as restrições aplicadas a cada filme que está em exibição nas salas de cinema. Geralmente as avaliações parecem muito mais severas em relação a outros países. Tudo isso, nos vários anos de sua aplicação, deu uma qualificação à indústria americana e seu correto serviço prestado aos ouvintes. Qualquer estrada que se pretenda seguir na Itália, é importante para as famílias que seja estimulado um mercado de produção adequado à infância: é justo que o mecanismo da indústria cinematográfica continue com o seu ritmo de produção, mas não é justo confundir as classificações de acesso ao produto, como qualquer indústria sabe muito bem.
No que se refere às normas européias de classificação dos filmes, e em geral de todo «entertainment» (neologismo anglo-saxão, que, no entanto encontra sua raiz etimológica na relação entre educação e jogo) acessível aos menores, deve ser citado o sistema NICAM, que funciona na Holanda há alguns anos. Fundado em 1999, o NICAM (Nederlands Instituut voor de Classificatie van Audiovisuele Media) se baseia na lei Media Act, onde os programas de grupos que tiveram a autorização para atividades de «broadcasting» não devem incluir obras audiovisuais que prejudiquem o desenvolvimento físico e psicológico de pessoas com menos de 16 anos de idade, seguindo as diretivas da União européia («Televisão sem fronteiras» IV).
O sistema de classificação preventiva funciona também na Grécia, com a lei 1.597, de maio de 1986, que prevê que antes da projeção nas salas de cinema, cada filme seja submetido pelo produtor ou pela sociedade de importação à Comissão para a juventude, que classifica o filme seja como adequado aos menores, ou proibido aos menores de 13 anos, ou de 17 anos ou ainda, nos casos mais graves, severamente inadequado aos menores. Esta comissão é um órgão do Ministério da Cultura e foi concebida procurando-se estabelecer certa proporcionalidade, sendo composta de representantes do Estado (Ministério da Cultura), das categorias ligadas ao cinema, de psicólogos especializados na educação, de sociólogos, dos jovens, dos educadores e dos pais.
Na Áustria, está em vigor um sistema de avaliação complexo, instituído em base a um princípio constitucional federal que confia a tutela dos menores, no que se refere ao cinema e em geral aos meios de comunicação de massa, à competência específica dos Lander. A lei nacional que engloba a regulamentação da mídia é a ORF-ACT, ou seja, a Austrian Broadcasting Corporation nº. 379/1984, que estabelece quais os critérios sobre os quais deve se basear a proteção aplicada a programas e filmes transmitidos na televisão ou através de outros canais mediáticos. No que se refere à exibição dos filmes, a avaliação preventiva das obras cinematográficas, para que sejam decididas as faixas etárias adequadas, é regulamentada pela lei austríaca para a tutela dos menores, a «Jugendschutzgesetz», aplicada através das leis dos Lander federais. Esta lei estabelece nove faixas de restrições de público a partir dos seis anos de idade, com uma sucessiva graduação que prevê restrições para 10, 12, 14 e 16 anos de idade. Para supervisionar o sistema de classificação cinematográfica, existe uma comissão junto ao Ministério da Educação, em Viena, que comunica seu parecer sobre a idoneidade dos filmes às autoridades locais. Geralmente e de maneira individual os Lander adotam as decisões da comissão, e é em âmbito local que se decide de sua aplicação.
Na Espanha, o artigo 20 da Constituição reconhece o direito do cidadão a exprimir e difundir livremente seu pensamento, suas idéias e suas opiniões através de qualquer meio de divulgação. Se por um lado o exercício de tais direitos «não pode ser restrito através de nenhum tipo de censura prévia», o mesmo artigo especifica que «estas liberdades têm o seu limite no respeito dos limites reconhecidos pelas normativas que exprimem este respeito, especialmente no direito à honra, à privacidade, à própria imagem e à proteção da juventude e da infância».
Baseando-se neste princípio, a qualificação dos filmes (Real decreto 81/1997) e das obras audiovisuais é feita antes de sua difusão, através do Instituto de cinematografia e das artes audiovisuais (ICAA), uma entidade autônoma, mas ao mesmo tempo ligada ao Ministério da Educação e Cultura através da secretaria de Estado para a cultura (ver site www.mcu.es).
A subdireção geral de fomento à indústria cinematográfica e do audiovisual, que faz parte do ICAA, se ocupa, dentre outras funções, da classificação em faixas etárias dos filmes e das outras obras audiovisuais em vista de sua exibição pública e para a sua distribuição. A comissão se encarrega de divulgar as informações sobre os filmes e programas audiovisuais, com classificação que vai desde as «salas X» até as restrições para cada faixa etária do público.
Os filmes de caráter pornográfico não podem receber subvenções do Estado e sua projeção nas salas prevê uma taxa suplementar, destinada em parte para estimular um fundo de proteção cinematográfica. A projeção destes filmes pode ser feita somente nas «salas X», onde não podem ser apresentados outros tipos de obras cinematográficas e onde é proibido o ingresso de menores de 18 anos.

CINEMA NA TV

Devido ao alto consumo de programas de televisão por parte dos menores e levando-se em conta as diretivas da União européia, que promovem a auto-regulamentação no âmbito nacional das emissoras de tv e a participação das famílias nesta obra educativa, há alguns anos estão em vigor na França, na Holanda, na Grã-Bretanha, na Grécia e na Itália os códigos de sinais, que servem para identificar tanto os filmes projetados na salas de cinema como aqueles transmitidos na televisão. A tutela dos menores no âmbito da televisão foi também feita adotando-se o chamado sistema «watershed» (separador das águas), que funciona segundo uma seleção de faixas horárias protegidas, algumas aconselhadas à visão dos menores, outras aconselhadas a todos e outras ainda, principalmente na programação noturna, indicadas somente a um público adulto.
A faixa de idade determinada pela classificação preventiva dos filmes tem obviamente uma repercussão na programação das chamadas faixas horárias protegidas ou distintas nas emissoras de televisão pública em todos os países europeus. A definição das linhas de conduta comuns está à base dos acordos de auto-regulamentação e de co-regulamentação dos programas de televisão, estabelecendo-se um código de procedimento comum para as emissoras tanto públicas como privadas. Criou-se assim uma base normativa, que é assumida pela autoridade do Estado e que recebe a confiança dos consumidores das emissoras públicas ou privadas que adotam este sistema de auto-regulamentação.
Para tornar visível aos adultos as classificações dos programas apropriados aos menores, muitas emissoras européias adotaram um sistema de sinais que através de símbolos, números, cores e sinais acústicos advertem ao público a respeito daquilo que está para ser transmitido.
Mas, apenas este sistema, assim como o de filtragem (tipo v-chip), não basta para garantir uma verdadeira tutela dos menores diante de um conjunto de imagens difíceis de serem decodificadas por um jovem. Deve-se pensar às imagens de guerra dos telejornais, dos filmes escabrosos ou às informações sobre os crimes hediondos, que muitas vezes têm como ambiente o próprio núcleo familiar.
É na colaboração entre Estado, produtores de programas audiovisuais e famílias que pode ser fundamentado um autêntico respeito dos menores que encoraje o crescimento positivo da criança em base aos valores fundamentais da pessoa humana.

4) CELULARES COM VÍDEO

Hoje a difusão dos celulares com vídeo chegou à Itália ao índice se 134%, o que significa que muitas pessoas possuem pelo menos dois celulares, inclusive os jovens e as crianças, que recebem este instrumento dos próprios pais. De fato, de duas crianças entre 8 e 13 anos de idade, uma delas tem um celular no bolso. Aquele que poderia ser um instrumento para controlar melhor os deslocamentos e as necessidades dos filhos, se revela no entanto um perigoso meio que pode expor a outro tipo de utilização por parte dos menores, que não se separam nunca do próprio celular, nem mesmo durante as aulas, como lamentam vários professores. Apesar do código de auto-regulamentação assinado pelas principais operadoras (Código de conduta para a oferta de serviços a pagamento em tutela dos menores), na realidade os novos serviços opcionais do celular o tornaram um «personal computer» capaz de permitir novos usos que antes não tinham.
Os desenvolvimentos tecnológicos que estão se verificando no campo da telefonia móvel – particularmente no que se refere à sinergia com a internet e a adoção dos sistemas DVB de vídeos-telefone – contribuem a aumentar a oportunidade de comunicação também para as novas gerações e, ao mesmo tempo, repropõem em novos termos a questão da tutela dos menores. As evoluções já previstas ulteriormente para os próximos anos e o número sempre crescente de pessoas envolvidas, pedem uma grande consciência social e uma constante atenção das pessoas e órgãos encarregados de garantir os direitos dos cidadãos.
Neste contexto devem ser reafirmados os direitos dos menores no campo da comunicação, dentre os quais certamente não está em último lugar aquele que se refere também à segurança diante dos riscos de indução a comportamentos ilícitos ou de acesso a conteúdos nocivos ou indesejados. Também neste campo é essencial o papel dos pais e, em geral, de todos aqueles que são chamados a ter uma função educativa. A maior segurança das crianças e dos jovens quanto ao acesso a conteúdos ilegais é um ponto que deve merecer atenção também através da maior conscientização dos pais e das mães, que devem se capacitar a conhecer e utilizar estes meios.
Para a «alfabetização» dos pais na utilização da mídia devem colaborar também as instituições públicas, promovendo um uso positivo das novas possibilidades tecnológicas. Às empresas cabe a responsabilidade de colocar no mercado um produto que dê garantias no que se refere à sua utilização pelos menores, superando os limites estabelecidos pelo código de auto-regulamentação assinado pelas operadoras de celulares. Devem também oferecer maiores informações aos adultos que assinam um contrato de utilização, como por exemplo a adoção de bloqueios automáticos de acesso a conteúdos nocivos, se o celular passa às mãos de um menor de idade.

5) VIDEOGAMES

Trata-se de uma indústria global, que conquistou os jovens e não apenas eles. Os números relativos à difusão repentina dos videogames indicam que existem 250 mil sites de videogames, cada um deles propõe uma série de títulos, muitos deles recheados de cenas de sexo e de violência. Uma pesquisa recente do Instituto italiano de medicina social (IIMS) coloca em evidência, entre outras coisas, a escassa informação por parte dos adultos a respeito dos videogames utilizados pelos filhos, o predomínio de temas violentas em mais de 30% de títulos não aconselhados aos menores, o predomínio de personagens virtuais normais que podem se tornar especiais, realizando ações extraordinárias.
Mas, o ponto de risco mais elevado se refere aos pequenos jogadores de videogames, crianças entre seis e nove anos de idade que se submetem a entrar tão intensamente no jogo virtual que chegam a formas de dissociação da realidade e solicitam um monitoramento muito atento da parte dos adultos. A mesma pesquisa indica a presença de videogames em 25% das famílias com crianças de três a cinco anos de idade e em 65,2% das famílias com crianças entre seis e 10 anos de idade. O que produz efeitos negativos no âmbito cognitivo das crianças não parece ser especificamente o meio, mas muito mais os elementos que criam a excitação, tais como a velocidade de produção do estímulo e da resposta, a velocidade das imagens, os efeitos especiais, os contrastes, a fragmentação da história, o binômio rumor-ação. O uso prolongado do jogo inibe, segundo alguns psicólogos, a área da capacidade crítica, provocando passividade e ao mesmo tempo agressividade na criança. Mas, não queremos demolir os videogames, porque existem aqueles que são muito adequados aos mais jovens, com valores de informação e de educação, seja também porque o uso deste meio é na realidade um passo na preparação da criança ao sucessivo e mais sofisticado, que é o uso da internet.
De qualquer maneira, os dados relativos à venda destes produtos de entretenimento mostram um crescimento em todos os lugares e a difusão deste meio é acompanhada de uma aceitação social (ou seria uma resignação?) sempre maior.
É urgente ampliar o percurso de conhecimento e das estratégias internacionais, para monitorar um mercado que está cada vez mais vasto. Parece urgente estabelecer modalidades operativas para o controle dos conteúdos e do sistema de sanções, seja para o produtor como para o vendedor dos serviços. O código de auto-regulamentação Pegi (derivado em 2003 do sistema de avaliação e classificação holandês, Nicam, que assinala os conteúdos inadequados aos menores), adotado pelos industriais de «entertainment» que produzem videogames, é a única forma de auto-regulamentação existente atualmente e que prevê sanções (raramente aplicadas, mesmo diante de casos graves evidentes) para os produtores que colocam no comércio os jogos com indicações de faixas etárias apenas aproximativas.
O código Pegi, ao qual a associação européia Isfe adere em 2002, é evidentemente insuficiente na sua função declarada de «fornecer aos consumidores as informações mais oportunas» e expostas no selo de produção. E, como o setor dos videogames tem hoje um volume de negócios que ultrapassa os 740 milhões de euros, envolvendo 24 milhões de jogadores (43% da população a partir dos quatro anos de idade), com uma venda dos produtos classificados para maiores de três anos de idade que chega aos quase 48% dos consumidores. É um dado que define o impacto deste gênero de meio sobre a infância e a adolescência, mostrando toda a sua periculosidade, seja pelo consumo de conteúdos inadequados, seja pelo excessivo número de horas dedicado neste passatempo, muitas vezes solitário e sem a presença de um adulto ao lado. Se for verdade, como sustenta a indústria, que a produção de videogames violentos é apenas uma mínima parte do mercado, é também verdade que esta representa a fatia mais importante do retorno econômico.
O interesse pelos videogames é alimentado pela sinergia com os filmes que inspiram o jogo homônimo e que torna sempre mais atrativo este gênero, principalmente para os adolescentes. Desta maneira é importante também neste campo o estabelecimento de regras precisas em defesa dos consumidores dentre o público jovem, mais exposto aos riscos destas novas formas de entretenimento cada vez mais sofisticadas e envolventes, por causa da combinação entre narrativa e efeitos gráficos.

6) PUBLICIDADE

O problema da tutela dos menores diante da publicidade se apresenta como um corolário, dentro do quadro mais amplo que regulamenta a difícil relação entre a mídia e as crianças. A televisão, e portanto também a publicidade, se constitui em uma fonte de perigo para os menores, isto é, para a maior parte das crianças, principalmente em idade pré-escolar, que devem saber fazer a diferença entre a publicidade e o resto da programação, e entre os programas de ficção e a realidade. Com essas considerações não significa que exista uma acrítica rejeição da publicidade em si mesma – à qual se reconhece, no entanto, onde proceda corretamente, uma função positiva no processo de formação, de crescimento crítico e de socialização do menor –, mas existe a necessidade de prever um sistema de regras destinado a garantir-lhe um uso adequado.
O efeito dos anúncios publicitários é tão grande que em alguns países estão sendo tomadas medidas drásticas a respeito. No Reino Unido, por exemplo, recentemente foram vetados os anúncios publicitários durante os programas destinados às crianças até nove anos de idade, a partir de 1º de janeiro de 2008 a medida se estenderá à programação para os jovens até 15 anos de idade e até o final de 2008 serão vetados em todos os canais dedicados aos menores. Apesar de se reconhecer que a publicidade serve para financiar os programas, aqueles dedicados às crianças terão que recorrer a outras fontes. Também na França começa a se impor uma «linha dura» a esse respeito: visto a alta incidência de publicidade de merendas, de sucos e doces em geral, a partir de agora os anúncios dedicados às crianças deverão ser precedidos de uma espécie de aviso, que orientará para uma alimentação adequada.
Mas, por que as crianças são tão frágeis diante dos apelos da publicidade? Na Itália, explica Paolo Landi, secretário geral da Adisconsum (Associação de defesa dos consumidores e do ambiente»), em um capítulo de seu estudo «Crianças da multimídia»: «Se consideramos que a publicidade não faz outra coisa que veicular um conhecimento imediatamente concretizável em um “ter”, ou em um “ser”, ou em um “fazer”, a criança absorve sem dificuldades os três componentes que são a obsessão dos expertos de marketing, isto é, o componente cognitivo (como fornecer informações indeléveis sobre um produto ou um serviço), o componente afetivo (como fazer o consumidor reagir de maneira emotiva) e o comportamental (como colocar o pequeno consumidor em movimento na direção da aquisição). A partir deste ponto de vista a criança é o público ideal, o consumidor a quem se pode vender qualquer coisa».
Na Itália está em vigor um código de autodisciplina publicitária que surgiu em 1966, em base a um acordo entre os profissionais do setor. Esta primeira forma de tutela, em grande parte com origem comunitária, tem como protagonistas entidades administrativas independentes: a Autoridade de controle da concorrência e do mercado de setor e a Autoridade de garantia para as comunicações e a editoria. Enquanto isso, para a auto-regulamentação, orientada pelas normas que constam do Código de autodisciplina publicitária, e agora também, embora com força jurídica diferente, pelo Código de auto-regulamentação da relação tv-jovens menores de idade, ao qual se reconhece um poder de decisão e de sanção, emanando uma ordem e intimando seu cumprimento.
Em todos os países onde a televisão serve de veículo às mensagens publicitárias, o mundo empresarial é plenamente consciente do enorme poder de influência que a publicidade tem sobre as crianças.



NORMATIVA INTERNACIONAL

O assunto relativo à tutela dos menores na mídia é um dos mais debatidos, seja no que se refere às normas nacionais, seja no âmbito internacional. Encontra-se diante da situação de precisar acertas as contas com toda a extensão da rede global da internet. O exemplo que, neste momento de transição, coloca mais em evidência a necessidade de estabelecer leis que estejam em condições de controlar o acesso e uso dos conteúdos nocivos para os menores, é exatamente o da internet. Qualquer pessoa no mundo pode abrir um site considerado «arriscado», contendo elementos ilegais e acessíveis a consumidores despreparados, disponibilizados por quem está do outro lado do mundo.
No que se refere aos princípios gerais no âmbito do direito internacional, é preciso recorrer principalmente à convenção da ONU sobre os direitos da criança, com sede em New York, ratificada pelo Parlamento italiano através da lei nº.176/1991. Esta garante à criança uma «consideração proeminente» também a respeito da liberdade, seja no se refere à expressão, seja quando tutela os conteúdos recebidos. Esta mesma convenção, em seu artigo 17, fala da relação entre menor e televisão, desejando «um sistema normativo que tutele o menor-consumidor, mesmo com todas as dificuldades que se apresentam», seja para individuar os fenômenos que devem ser monitorados, seja sobre as normativas possíveis.
No direito da União européia, tal tutela foi recentemente confirmada pela Carta dos direitos fundamentais da União, aprovada em Nice em 2000, cujo artigo 24 salienta que «os Estados membros reconhecem a importância da função exercida pelos meios de comunicação de massa e cuidam para que a criança possa ter acesso às informações e materiais... com a finalidade de promover o seu bem estar social, espiritual e moral, além de sua saúde física e mental». A normativa seguinte, 89/552/CEE, previu algumas restrições, seja no que se refere aos programas como para as mensagens publicitárias destinadas a este público». O artigo 22 desta normativa conduz a impedir a transmissão de programas que contenham cenas pornográficas ou de violência gratuita, ou outros programas inadequados a este público. Não podemos esquecer de mencionar a determinação expressa de «Televisão sem fronteiras», que está hoje em sua quinta versão atualizada, que o tema da tutela dos menores está relacionado com o estatuto geral dos direitos dos menores e corresponde ao disposto nos artigos 50 e 31 da Constituição italiana.
Se for claro que os princípios normativos são todos a favor da tutela dos menores, é também verdadeiro que uma tecnologia em contínua evolução colocou em crise as velhas regras do jogo. Mas também é claro que não se pode mais adiar a necessidade de estabelecer novos parâmetros normativos, para que as crianças possam utilizar os meios de comunicação próprios de seu tempo, com aproveitamento e serenidade também para as famílias.~

EDUCAÇÃO À MÍDIA NO MUNDO: PARA SABER MAIS

A difusão da educação à mídia é uma resposta à necessidade de se informar sobre as novidades no campo dos novos meios de comunicação. Em seguida citamos apenas alguns sites que em vários países oferecem maiores informações sobre como aprender a usar melhor a mídia, enfrentando a problemática da tutela dos menores e da alfabetização às novas tecnologias por parte dos adultos.
«The Media Awareness Nework-Réseau éducation médias» é uma organização canadense sem fins lucrativos, pioneira no desenvolvimento de programas sobre a educação à mídia. Com esta finalidade ela produz programas online em colaboração com organizações internacionais, convicta que, para interpretar as mensagens de informação, de entretenimento e comerciais, os jovens têm necessidade de instrumentos críticos válidos. Por isso é importante formar também os adultos (famílias e professores) sobre como funciona a mídia e como ela determina o estilo de vida.
A organização realiza uma ação contínua de monitoramento em relação à mídia (televisão, cinema, videogames, imprensa, publicidade, etc.), e sua seção dedicada aos pais oferece uma série de elementos para que estes reflitam com os filhos sobre esses meios, além da seção para os educadores, que inclui lições e materiais de apoio. Uma outra seção é dedicada à análise das questões ligadas à mídia, como a difusão de estereótipos, as representações de violência e da diversidade, a privacidade, a publicidade dirigida aos menores. Seu site é em inglês e francês (http://www.media-awareness.ca).
«Quai des images» é o site dedicado ao ensino de cinema e audiovisual organizado pelo Ministério da Educação francês. Ele propõe atividades ligadas à educação à imagem e de análise dos filmes em consonância com os programas escolares, agrupa os textos oficiais a respeito dos meios audiovisuais, oferece uma série de instrumentos de análise e de estudo completos sobre alguns filmes específicos e sobre certos autores em particular, informa sobre conferências, seminários, cursos e festivais sobre o mundo audiovisual e sua utilização em âmbito educativo e didático. Entre outras coisas, reúne também as propostas e as experiências feitas por professores e seus alunos nas escolas secundárias francesas no campo da educação à imagem, além de organizar um fórum de discussões aberto a todos sobre a educação à mídia (http://www.ac-nancy-metz.fr).
Sempre na França, está em funcionamento o blog «Zéro de conduite», organizado pelos professores e destinados a educadores, pais e estudantes. Promove o uso do cinema como instrumento pedagógico, dedicando-se especialmente à atualidade cinematográfica, mas sem esquecer os clássicos e os documentários. Com várias seções e espaços de aprofundamento, se propõe como um local de discussão de temas em um debate aberto (http://cinema-ducation.fluctuat.net).
A Universidade de Massachussetts organizou o Media Education Foundation – MEF, mídia de desafio, que produz e distribui documentários destinados a estimular o pensamento crítico e o debate sobre a relação entre aqueles que detêm o poder sobre a mídia, os conteúdos da mídia comercial, a exigência democrática de um livre fluxo de informações, as diversas representações de idéias e pensamentos e o direito dos cidadãos de informar e serem informados. Alguns destes temas são abordados criticamente, como a identidade do gênero na publicidade, a imagem de sexo nos videoclipes, o papel da mídia na construção da identidade cultural, mídia e saúde, etc. (http://www.mediaed.org/).

(a cura di M. F. D’A.)

 
At 9/17/2007 3:06 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

A DROGA NA ÁFRICA: UM PROBLEMA MUNDIAL

A droga já é um problema na África e representa um ulterior obstáculo ao desenvolvimento do continente. É o que afirmam diversos organismos internacionais encarregados da luta ao tráfico de entorpecentes. Já em 2001, um relatório do Órgão Internacional de Controle das Drogas afirmava que “graças à sua experiência no campo do contrabando de haxixe e de heroína, os cartéis da droga da África ocidental buscam novos contatos na América Latina para estender o tráfico de cocaína a toda a região da África subsaariana”.
Trata-se de uma reviravolta fundamental na estratégia do narcotráfico mundial, que vê a África se tornar uma das áreas “fulcro” para a distribuição de drogas em todo o mundo. Até os primeiros anos da década de 90 do século passado, a África era mantida às margens das rotas da droga. A mudança ocorreu em 1993, quando foram apreendidos na Nigéria 300 quilos de heroína provenientes da Tailândia. É o sinal de uma mudança que vê a transformação de tantos pequenos contrabandistas africanos (a maioria nigerianos) de simples transportadores por conta de terceiros a membros de gangues guiadas por africanos, capazes de tratar no mesmo nível com análogas organizações de outros continentes.
A presença dessas organizações criminais, a forte urbanização, a perda dos valores tradicionais africanos e a difusão de uma cultura hedonista são todos fatores que criaram as premissas para um mercado africano da droga. A África, portanto, não é somente um local de trânsito dos entorpecentes, mas terreno “virgem” para o tráfico de droga.

PREMESSA METODOLÓGICA
Os dados apresentados são úteis para analisar a tendência (incremento ou decremento) do tráfico de entorpecentes, apesar de serem muito provavelmente aproximativos.
Segundo um estudo crítico efetuado pela associação ‘Libera’ do pe. Ciotti, com efeito os dados apresentados pelos entes antidrogas internacionais e de alguns Estados não relatam fielmente toda a produção mundial de cocaína. Segundo este estudo (referido somente à cocaína e não a outras drogas), existe uma discrepância entre a estimativa sobre a produção mundial de cocaína efetuada pela ONU e os dados relativos às apreensões e ao consumo de cocaína somente na América.
Segundo os elaboradores do relatório, com efeito, subtraindo das 937 toneladas de produção, indicada pelas Nações Unidas em 2004, as cerca de 450 consumadas nos Estados Unidos, Canadá, México e em toda a América do Sul e as cerca de 490 toneladas apreendidas em todas as Américas, se chegaria a um saldo negativo de 3 toneladas.
“A este ponto, não se saberia mais de onde subtrair as cerca de 99 toneladas de cocaína apreendidas no “resto do mundo”, afirma o relatório. Fazendo-o, se chegaria ao paradoxal saldo negativo de 102 toneladas de cocaína “não resultantes”, não tendo feito frente ainda à demanda de cocaína no “resto do mundo”, estimada em ao menos 300 toneladas, se chega a calcular uma espécie de buraco negro de aproximadamente 400 toneladas de cocaína não resultantes.
Este buraco negro assume proporções ainda mais macroscópicas, cerca de 700 toneladas, se calculado com base nos dados da Agência antidroga norte-americana.
Apesar dos seus limites, os relatórios dos organismos internacionais de luta contra a droga permanecem frequentemente os únicos instrumentos para analisar o fenômeno do narcotráfico.

A HEROÍNA NA ÁFRICA
A apreensão de opiáceos na África registrou um forte incremento nos últimos anos. Segundo dados da ONU, por exemplo, em 2004 ocorreu um incremento da apreensão de heroína de 60% em relação ao ano precedente.
A maior parte deste incremento é devido à apreensão ocorrida na África central e ocidental, que quase triplicou de 2003 a 2004. A heroína que passa pela África é destinada em primeiro lugar aos mercados europeus e, em segundo lugar, aos da América do Norte. A heroína provém dos países do sudoeste e sudeste da Ásia.
A quantia total dos opiáceos apreendida na África permanece ainda modesto (0,3% do total de apreensões em nível mundial). Porém, deve-se levar em consideração que não existem estatísticas confiáveis e que o nível das apreensões não reflete o verdadeiro fluxo de narcóticos que passa pela África por causa da debilidade da polícia local, que tem dificuldade em interceptar as cargas ilícitas.
No que concerne ao uso de opiáceos na África, segundo os dados do Departamento das Nações Unidas para a luta à criminalidade (UNODC), nota-se um aumento de seu consumo no continente africano, em particular na África oriental e naquela austral e em alguns países da África ocidental. Segundo os especialistas das Nações Unidas, o crescimento do consumo de heroína nessas áreas deriva do fato de que são utilizadas como locais de trânsito dos narcotraficantes, os quais, porém, não desdenham em criar um mercado local.
Na África do Sul, um dos poucos países africanos que dispõe de dados confiáveis, até os primeiros anos do novo milênio, o pedido de tratamentos por abuso de heroína representava somente 1% do total dos pedidos de cura por dependência de substâncias entorpecentes (incluído o álcool). Em 2005, esta porcentagem subiu para 7%.
Segundo o relatório do UNODC sobre o tráfico de entorpecentes de 2007, o mercado da heroína está dividido deste modo: a heroína afegã é destinada aos mercados da Ásia central, da Europa, do Oriente Médio e da África; aquela produzida no chamado “triângulo de ouro” alimenta o mercado chinês e o dos outros países asiáticos e da Oceania; aquela proveniente da América Latina serve o mercado norte-americano.
O relatório nota, porém, que “uma parte pequena, mas em crescimento, da produção de opiáceos afegãos é enviada à América setentrional, seja por meio da África oriental e ocidental, seja por meio da Europa”.
O relatório afirma que a demanda global de heroína permaneceu estável, “apesar de importantes incrementos nos países que se encontram no caminho das principais rotas do narcotráfico”.
Entre esses estão também diversos países africanos, afirma o documento, que destaca os efeitos prejudiciais da difusão da heroína e de outras substâncias entorpecentes nas populações já duramente provadas pela pobreza e pela difusão da AIDS.
Os últimos dados do UNODC mostram um forte incremento do uso de heroína em alguns países africanos como Moçambique, Zâmbia, Quênia, Tanzânia e Costa do Marfim, enquanto outros países tiveram um aumento mais contido. Entre esses, África do Sul, Madagascar, Gana, Libéria e Senegal.

DOS ANDES AO KILIMANJARO: UM FLUXO DE COCAÍNA INVADE A ÁFRICA
O dado mais preocupante, porém, é o da cocaína que transita da África em direção principalmente à Europa e, secundariamente, à América setentrional.
A importância da África, e em particular da África ocidental, como ponto de trânsito da cocaína em direção aos ricos mercados ocidentais é demonstrada pelo nível das apreensões registradas nos últimos anos. As apreensões de cocaína em toda a África aumentaram três vezes entre 2003 e 2004, enquanto no mesmo período as apreensões na África ocidental e central aumentaram seis vezes. As apreensões mais importantes no período 2000-2004 se registraram em Cabo Verde, seguido por África do Sul, Quênia, Gana e Nigéria. Mas as apreensões de cocaína na África representam somente 1% do total mundial das apreensões desta substância entorpecente. Também neste caso, porém, o dado é prejudicado devido à debilidade das polícias locais, incapazes de interceptar a maior parte dos fluxos de cocaína proveniente da América do Sul.
Em 2004, 50% das apreensões de cocaína no continente ocorreram na África ocidental e central. A zona de passagem mais utilizada pelos traficantes de cocaína é o Golfo da Guiné, de onde a substância entorpecente é transportada para a Europa em pequenas quantidades, através dos chamados “mulas”, pessoas que assumem o risco de ingerir óvulos de cocaína com a esperança de superar as alfândegas nos aeroportos de destinação. Nos últimos anos, também na África oriental aumentou a quantia de cocaína apreendida, indicando uma tendência a utilizar em medida crescente esta área como ponto de trânsito para a cocaína destinada à Europa e à Ásia.
Um dos países mais atingidos pelo fenômeno é o Quênia, onde em 2004 foi apreendida uma tonelada de cocaína. Em termos gerais, o crescimento da difusão da cocaína na África é demonstrada pelo fato que dos 32 países africanos que fornecem estatísticas sobre as apreensões de entorpecentes na UNODC, 23 (72%) relataram apreensões de cocaína, contra 34% em 1990.
Os traficantes de cocaína tendem a servir-se da África cada vez mais como ponto de trânsito por dois motivos. O primeiro deriva do melhoramento dos sistemas de inspeção utilizados pelas autoridades locais e por aquelas norte-americanas na área caribenha e centro-americana, tradicional rota utilizada pelos traficantes. Nos últimos anos, por exemplo, surgiram bases de inspeção norte-americanas dos Andes às ilhas caribenhas. Também as autoridades holandesas intensificaram a inspeção com patrulhas aéreas baseadas nas ilhas de Curaçao e Saint Martin.
O segundo fator está ligado à diminuição do consumo de cocaína, que se registrou nos Estados Unidos diante de um aumento da demanda na Europa. Se na América do Norte há o mais alto número de consumidores mundiais (6 milhões e meio, correspondente a cerca da metade do consumo mundial), a tendência é diminuir a demanda.
De 1998 a 2004, de fato, se registrou uma queda de 20% da difusão desta substância. No mesmo período, na Europa ocidental, onde os consumidores de cocaína são 3 milhões e meio (26% do total mundial), se notou um aumento do consumo e da difusão do “pó branco”. Na Espanha e no Reino Unido, este dado é de 2%.
A África, portanto, é uma cômoda e segura rota para alcançar um mercado em crescimento.
Além disso, como efeito colateral criou-se um mercado africano que está registrando nos últimos anos preocupantes aumentos.
A crescente disponibilidade de cocaína se traduz, com efeito, em um aumento do consumo desta substância na África. Segundo os dados do UNODC, no período 1992-2004 o abuso da cocaína na África cresceu em um ritmo mais sustentado do que no restante do mundo. Este incremento é mais remarcado nos países da África meridional e nos da África ocidental.
Se forem analisados os dados das pessoas que recorrem aos tratamentos de desintoxicação, o aumento do consumo de cocaína emerge com evidência. No início dos anos 90, as pessoas em tratamento por abuso de cocaína eram pouquíssimas, no final de 1996 constituíam 1.5% dos casos tratados pelas estruturas de recuperação dos toxicômanos, no biênio 1999-2000 eram 6%. No período 2001-2004, notou-se uma inflexão na porcentagem de pessoas que pediam para ser tratadas da dependência de cocaína (menos de 5%).
A partir do final de 2004, este dado está em crescimento: de 7,5% em 2004 passou-se a 8,5% nos primeiros meses de 2005.

A COCAÍNA NA ÁFRICA OCIDENTAL
O país tradicionalmente mais envolvido no narcotráfico é a Nigéria. Lá, com efeito, em 1993 houve a primeira grande apreensão de cocaína na África e as organizações criminais nigerianas estão perfeitamente inseridas no sistema criminal global e transnacional. A afirmação das máfias nigerianas deriva também da pertença da Nigéria ao Commonwealth, que permitiu abrir estreitas relações comerciais com o subcontinente indiano, produtor de ópio e de heroína, e com o mundo anglo-saxão consumidor.
No final dos anos 80, registrou-se um incremento importante no papel de centro estratégico e, em 1992, as apreensões de cocaína no aeroporto de Lagos foram tão relevantes que as autoridades nigerianas suspenderam os vôos diretos para o Rio de Janeiro. Desde então, os traficantes nigerianos são considerados os principais transportadores da droga, uma verdadeira indústria a serviço do comércio de heroína e da coca. Eles estão presentes em todos os pontos-chaves da produção e do tráfico de drogas. Graças aos compatriotas residentes no exterior, formaram clãs criminais comparáveis aos colombianos, turcos e chineses.
As organizações mafiosas nigerianas, como as outras, se baseiam na solidariedade étnica, de clã e de famílias. Já em 1995 as autoridades norte-americanas estimavam que 50% da heroína circulante em seu país era introduzida pelos nigerianos, os quais usam a Polônia e a Hungria como pontos de trânsito para a cocaína destinada à Europa ocidental.
Um dos países da África ocidental dos quais se têm estatísticas confiáveis sobre o incremento do tráfico de cocaína é Gana. Segundo os dados divulgados pelas autoridades locais, em um único ano as apreensões de cocaína aumentaram 40 vezes, passando dos 15 quilogramas de 2003 aos 617 quilos de 2004. A maior parte da cocaína é destinada ao mercado britânico.
Trata-se de um dado significativo, levando-se em consideração que, em termos porcentuais, as apreensões de cocaína aumentaram 18% em nível mundial e 4.000% em Gana de 2003 a 2004. No mesmo período, na África, as apreensões de cocaína aumentaram 3 vezes, passando das 1,1 tonelada para 3,6 toneladas.
Nos anos sucessivos, emergiram outros fatos que demonstram que Gana se tornou um importante ponto de passagem da cocaína na África ocidental. Em novembro de 2005, a polícia ganense apreendeu 588 quilos no decorrer de uma perquirição em uma habitação em East Lagon. Em abril de 2006, foram descobertos a bordo do navio MV Benjamin, atracado no porto de Tema, 2.310 quilos de cocaína.
Segundo um responsável do UNODC, as organizações de narcotraficantes tendem a fazer transitar a droga por meio da África ocidental porque, até agora, as autoridades alfandegárias européias e norte-americanas controlam com menos atenção as mercadorias e as bagagens provenientes da África em relação àquelas provenientes da América Latina. No caso de Gana, como de outros países da região, o fato de não estar inserido na lista dos países produtores de cocaína significa que as suas mercadorias não são sujeitas a inspeções detalhadas. Mas nos últimos anos, as coisas mudaram e Gana foi inserida na lista dos países “de alta prioridade” de inspeção.
Os traficantes buscam corromper os policiais e a polícia para permitir o trânsito das cargas de entorpecentes. Para investigar casos de corrupção de policiais, o Ministério da Fazenda de Gana criou uma Comissão de investigação, que recebeu o nome da sua Presidenta, Georgina Wood, que desempenhou importantes cargos na polícia e na magistratura local. O “Georgina Wood Committee” nasceu após duas importantes apreensões de cocaína citadas precedentemente, nas quais resultaram envolvidos alguns policiais. Entre as recomendações apresentadas pelo Comitê, está reforçar o patrulhamento das costas do país por meio seja da potenciação dos meios da marinha e da aeronáutica, seja com a criação de um serviço de guarda-costas independente.
A Guiné-Bissau é um outro país que se tornou ponto de trânsito da cocaína da América Latina à Europa, como demonstrado numa recente operação que levou à captura de 674 quilos de cocaína e à detenção de alguns narcotraficantes sul-americanos. Na África ocidental, os países mais envolvidos pelos fluxos de droga, além de Gana, são Costa do Marfim, Senegal e Nigéria.
Os traficantes de cocaína na Guiné-Bissau estão ligados aos que passam através do vizinho Senegal, como emergiu da operação efetuada no final de junho de 2007 pela polícia de Dakar, que levou à apreensão de mais de duas toneladas de cocaína. Parte da droga se encontrava em um veleiro que estava à deriva diante das costas senegalesas, e uma outra em uma habitação na área balneária de Mbour, a sul de Dakar.
No veleiro os investigadores encontraram uma documentação que comprova que os narcotraficantes utilizam a Guiné-Bissau como depósito de trânsito da cocaína proveniente da América Latina e destinada à Europa. Também a nacionalidade dos detidos demonstra o grau de internacionalização das organizações criminais dedicadas ao narcotráfico. Além de três cidadãos sul-americanos (um colombiano, um venezuelano e um equatoriano) e de uma cidadã francesa, a polícia deteve três senegaleses. A partir dos documentos detidos, além disso a polícia senegalesa descobriu que os narcotraficantes efetuaram diversas viagens aos países limítrofes: Serra Leoa, Guiné Conakry, Guiné-Bissau e Gâmbia.
As autoridades senegalesas reiteraram que em seu país não existem depósitos de cocaína, mas admitiram a infiltração de grupos criminais estrangeiros, que utilizam o aeroporto de Dakar para enviar cocaína à Europa. No período de janeiro a junho de 2007, a polícia senegalesa afirma ter apreendido no aeroporto de Dakar 44 quilos de cocaína e detido cerca de 30 “mulas” da droga, a maior parte dos quais nigeriano.
Está em aumento também o número de “mulas” da Guiné-Bissau detidos no momento do embarque para Portugal, onde podem entrar sem visto. Além disso, foram descobertas algumas operações de reciclagem de dinheiro sujo por parte de organizações estrangeiras. A apreensão recorde efetuada pela polícia senegalesa, equivalente ao total de apreensões de cocaína na África ocidental de setembro de 2006 a maio de 2007, é somente o último de uma série efetuada nos primeiros seis meses de 2007 em várias localidades da África ocidental.
Entre essas, há 800 quilos de cocaína recuperados no mar diante das ilhas Canárias, e uma quantia análoga apreendida pela marinha francesa no largo da Costa do Marfim. Além dos navios, as organizações criminais recorrem a aviões para alimentar seus tráficos ilícitos.
Na Venezuela foi bloqueado um avião com 2,5 toneladas de cocaína, que se preparava a partir para Serra Leoa, enquanto em maio de 2007 foram apreendidos 600 quilos de cocaína a bordo de um Cessna, matriculado na Venezuela, que efetuou uma aterrissagem de emergência em Nouadhibou, na Mauritânia.
Segundo um responsável do ONUDC, para a África ocidental o aumento de confiscos das cargas de cocaína na região é devido mais a incidentes de percurso que a uma maior eficácia da polícia.
O funcionário considera que a cada dez expedições de droga em direção à Europa, nove chegam a seu destino sem problemas.

O SAHEL: NOVA FRONTEIRA DO NARCOTRÁFICO?
Das costas da África ocidental as organizações de narcotraficantes estão progressivamente se expandindo aos países do Sahel, cujo papel estratégico entre o Atlântico e o Magreb, e, portanto o Mediterrâneo, é apreciado também pelos traficantes de seres humanos e, provavelmente, pelo terrorismo internacional. Não se pode excluir a priori uma interconexão entre essas realidades criminais, de que são cúmplices a debilidade dos Estados e a vastidão dos territórios a controlar. Um realidade que suscita o alarme dos governos interessados.
Em abril deste ano, depois da apreensão de três caminhões cheios de droga e armas, o Presidente do Níger, Mamadou Tandja, declarou que o exército local pretende aumentar os esforços para impedir que o seu país seja “circundado” pelos traficantes de armas e de droga, que são uma “ameaça real” para o país.
Também Burkina Fasso não foge ao fenômeno. Segundo o Coordenador do Comitê contra os tráficos ilícitos de droga em Burkina Fasso, o volume das cargas de droga interceptadas nos primeiros três meses de 2007 é “incrível”. O funcionário indica a existência de uma nova rota de trânsito da droga no oeste e no sudoeste do país. No início de abril de 2007, 49 quilos de cocaína, num valor de 10 milhões de dólares, foram interceptados pela polícia de Burkina Fasso na fronteira com o Mali, que é um importante ponto de trânsito para o tráfico de seres humanos. Países como Mali e Níger são há milênios atravessados por vias de caravanas, que agora se converteram num uso criminal: para o tráfico de seres humanos, mas também de armas, droga e cigarros de contrabando. “Nos últimos meses notamos um aumento da utilização dos países do Sahel, como Mali e Níger, para o tráfico de cocaína”, disse Antonio Razzitelli, Diretor do departamento do UNODC para a África ocidental.
Segundo o órgão anticrime da ONU, os traficantes importam a droga por meio das cidades costeiras como Conakry, na Guiné, Dakar, no Senegal, e Lomé, no Togo, e depois a transportam para as cidades do interior, como Bamako, no Mali, e Ouagadougou, em Burkina Fasso. Dessas localidades, a cocaína prossegue a sua viagem até a Europa.
Segundo o responsável do Comitê contra os tráficos ilícitos de droga em Burkina Fasso, é preciso coordenar os esforços entre as polícias dos Estados da região. “Há uma necessidade urgente de reunir todos os entes nacionais antidroga da região para encontrar o modo de cooperar entre si, para tentar deter as redes criminais”, disse, destacando que a escassa cooperação entre as fronteiras dos países do Sahel e a falta de meios das polícias locais constituem problemas adjuntos para uma eficaz ação de contraste às redes criminais.

O MERCADO DA CÂNABIS
Enquanto a África permanece, no momento, somente um local de trânsito e um mercado residual para drogas como cocaína e heroína, a principal produção local de substâncias entorpecentes é representada pela cânabis.
O cultivo da cânabis foi introduzido na África oriental pelos mercantes árabes, pérsios e indianos no século XII. De lá se difundiu primeiramente na África austral, no século XV, e depois no Congo e em Angola no século XIX. Somente depois da Segunda Guerra Mundial a cânabis chegou à África ocidental, levada por soldados nigerianos e ganenses que combateram com as tropas britânicas na Birmânia (atual Mianmar), onde adquiriram o hábito de fumar marijuana. Este fato explica porque nos países onde a cânabis é conhecida há mais tempo, ela é utilizada na medicina tradicional, enquanto na África ocidental é usada para fins “recreativos”. Até os anos 80, porém, a produção africana da cânabis permaneceu limitada. A partir daqueles anos, porém, notou-se um incremento notável da superfície cultivada com a cânabis para fins comerciais.
A produção desta substância se divide em três categorias: a erva da cânabis (flores e folhas), resina ou haxixe (secreções emitidas pela planta durante a fase de florescimento) e óleo de haxixe, o menos utilizado. Segundo o World Drug Report 2006, a erva da cânabis é cultivada, sobretudo de modo ilegal, em 176 países em todo o mundo. A África representa 27% da produção mundial e os principais produtores são Marrocos (3.700 toneladas), África do Sul (2.200 toneladas) e Nigéria (2 mil toneladas).
No que concerne ao haxixe, o principal produtor mundial é Marrocos, que fornece os mercados norte-africanos e europeus. Graças ao esforço das autoridades marroquinas nos últimos anos, deu-se a diminuição da produção local da cânabis, à qual corresponde um aumento da produção em outros países, da Ásia ocidental (Afeganistão, Paquistão) à Albânia. O UNODC reconhece que desde 2003 o governo de Rabat conduziu uma campanha para estimar a produção de resina da cânabis no país, em cooperação com a Agência anticrime das Nações Unidas. Segundo uma investigação efetuada em 2003, a produção da cânabis foi de 3.060 toneladas, cultivada em 134 mil hectares de terra na região do Rif (norte do país) por 96.600 famílias de camponeses. A investigação feita em 2004 registrou uma diminuição de 10% das terras cultivas com a cânabis, que passaram a 120.500 hectares, com uma produção estimada de 2.760 toneladas.
Em 2005 notou-se uma ulterior diminuição de 37%, sendo a superfície cultivada com a cânabis de 72.500 hectares, enquanto a produção diminuiu para 1.070 toneladas. Quanto às apreensões da cânabis, nos últimos 12-15 anos se registrou um aumento da porcentagem mundial de apreensões no continente africano desta substância. Enquanto em 1990 16% do total mundial das apreensões da cânabis ocorria na África, em 2002 este dado subiu para 20%, para alcançar 31% em 2004. O aumento das apreensões na África é determinado sobretudo pelo aumento dos controles policiais e alfandegários efetuados pela Nigéria e pela África do Sul.
O principal mercado de consumo da cânabis é a Europa ocidental, e 80% da cânabis consumada na Europa provém do Marrocos, passando pela Espanha e pela Holanda e dali distribuída aos outros países. O terceiro mercado mundial de consumo é representado pelos países do norte da África, onde a cânabis provém principalmente do Marrocos. Parte da cânabis produzida no Afeganistão e Paquistão, além disso, alimenta o mercado dos países da África oriental.
No que concerne às problemáticas sociais ligadas ao consumo da cânabis, é preciso recordar que esta substância é a droga mais difundida e usada em nível mundial. Estima-se que, em 2004, 162 milhões de pessoas a tenham usado, o equivalente a 3,9% da população mundial entre 15 e 64 anos. Em termos relativos (a porcentagem de habitantes que faz uso da cânabis em relação a outras substância entorpecentes), a cânabis é prevalentemente utilizada na Oceania, seguida por América do Norte e África. Desde 1992, na África, notou-se também uma tendência ao aumento do seu consumo, em particular na Argélia, Nigéria e Zâmbia.
É provável que a tendência ao uso desta droga seja subestimada em diversos países da África, que não têm uma capacidade de coleta de dados adequados para seguir o fenômeno. Segundo dados parciais, notou-se nos últimos anos um forte incremento do abuso da cânabis na África ocidental, oriental e no norte da África, em sintonia com a tendência em nível global de uma ulterior expansão do consumo desta substância.
Até os anos 80, porém, a produção africana da cânabis permaneceu limitada. A partir daqueles anos, porém, notou-se um incremento notável da superfície cultivada com a cânabis para fins comerciais.
A produção africana de droga subtraiu terras e recursos à agricultura, isso porque naquele período se registrou uma forte queda dos preços dos produtos agrícolas em todo o mundo. A agricultura africana, já frágil, entrou em crise. Diversos camponeses, portanto, deixaram-se tentar pelo cultivo da cânabis em detrimento do cultivo de produtos lícitos.
Um simples cálculo econômico demonstra o forte poder de atração de uma semelhante produção; já em 1995, na Guiné, um saco de 20-25 quilos de marijuana tinha o valor de aproximadamente a renda anual média de uma famílias de oitos pessoas que se dedica à produção de cultivo lícito. No mercado de Kinshasa, na República Democrática do Congo (RDC), um saco de 25 quilos de marijuana é vendido por mil dólares, enquanto um saco de 80 quilos de mandioca vale somente 10 dólares.
Compreende-se, assim, que o cultivo desta substância entorpecente tem sérias repercussões na auto-suficiência alimentar de diversos países africanos. Segundo a associação de luta à toxicomania de Kinshasa, LIPILDRO, por causa do abandono dos cultivos legais por aqueles da cânabis, até 2010 a maior parte das cidades congolesas será atingida por um crise alimentar.
Além disso, na RDC se verificaram experiências para o cultivo da papoula de ópio (na província do Equador) e da cocaína (na região do Shaba). O mais importante produtor da cânabis na África subsaariana permanece, porém, a África do Sul. Importante produções são sinalizadas também em Lesoto e em Malauí.

DROGAS SINTÉTICAS
A produção de drogas sintéticas é limitada na África, com exceção da África do Sul, onde a fabricação de metanfetaminas e methaqualone aumentou nos últimos anos. Os dados sobre a descoberta de laboratórios clandestinos confirmam esta tendência.
Com efeito, se passou da descoberta à destruição de um laboratório por ano no período 1995-1999, aos 17 no período 2000-2003, até aos 28 destruídos somente em 2004. Um outro dado que demonstra o incremento do uso de drogas sintéticas na África do Sul é o aumento das apreensões de ecstasy: em 2004, houve um incremento de 385% das apreensões em relação ao ano precedente.
Além disso, as drogas sintéticas faziam parte do programa de guerra secreta química e biológica aplicado pelo regime do apartheid. Segundo os testemunhos reunidos durante o processo contra o responsável do programa, doutor Wouter Basson (definido “Doutor Morte” pela imprensa local), no âmbito do chamado “Project Coast”, entre 1992 e 1993 os laboratórios relacionados aos serviços secretos sul-africanos tinham produzido mais de 900 quilos de cristais de ecstasy (correspondente a 73 milhões de pílulas). No ano precedente, uma empresa de serviços do regime do apartheid tinha importado 500 quilos desta substância da Croácia.
Essas quantidades de drogas sintéticas foram importadas e produzidas para serem usadas como agente incapacitador para o controle da multidão (e talvez também para drogar secretamente os líderes da oposição para desacreditá-los, fazendo-os cometer gestos ridículos em público) e para serem distribuídas nas favelas habitadas pela população negra para promover o abuso de droga e a dependência.
O fim do regime do apartheid bloqueou este e outros projetos criminais aplicados no âmbito do “Project Coast”. Antes da queda do regime, porém, o dr. Basson tinha organizado a venda das empresas de cobertura dos serviços secretos sul-africanos, alguns dos quais fabricavam armas químicas e biológicas e drogas sintéticas.
Além disso, desapareceram centenas de quilos de substâncias químicas usadas na produção desses instrumentos de morte.
O dr. Basson é suspeito de ter aberto um empresa privada e, com efeito, quando foi detido em 1997 foi encontrado em posse de pílulas de ecstasy num valor de 20 mil dólares.

ÁFRICA ORIENTAL: UMA SITUAÇÃO PREOCUPANTE
Na África oriental, o Quênia é o principal ponto de trânsito da cocaína. Somente em 2004 foi apreendida 1,1 tonelada de cocaína entre a capital Nairóbi e o centro costeiro de Malindi. No decorrer da operação da polícia, que levou à descoberta desta importante carga de droga, foram detidos diversos funcionários da companhia aérea local (que resultou estranha ao narcotráfico), alguns dos quais foram capturados em Londres.
Das investigações emergiu que a droga que passava pelo Quênia era inserida no mercado britânico com a colaboração de alguns funcionários infiéis da companhia aérea. Além do Quênia, os países da África oriental interessados pelo narcotráfico são Etiópia, Botsuana, Zâmbia e África do Sul. Neste último, segundo o South African Institute of International Affaire, existem 500 mil pessoas que fazem uso de cocaína, enquanto 1/3 dos adolescentes utiliza entorpecentes. Segundo o centro de estudos sul-africano, no país atuam 300 organizações criminais internacionais envolvidas no narcotráfico.
Os países da região se tornaram não somente uma região de trânsito, mas também um novo mercado para os entorpecentes e, em particular, para a cocaína. Na Zâmbia, por exemplo, 80% da cocaína que chega ao país é transferida para a Europa e o restante 20% é consumado localmente.
A Interpol lançou o alarme sobre o crescente consumo de entorpecentes na África. “As drogas não somente transitam nos países, mas permanecem lá”, disse um responsável da organização internacional de polícia diante dos delegados de 150 organismos de polícia de todo o mundo, reunidos para o encontro anual da Interpol no Rio de Janeiro (Brasil). “Já se tornaram habituais as cargas de diversas toneladas de cocaína que passam pela África”, acrescentou.
Segundo um analista presente no seminário, se a tendência ao incremento do uso de entorpecentes continuar avançando, a África deverá enfrentar uma grave crise social derivante da droga.
As condições climáticas da maior parte da África são favoráveis ao cultivo da cânabis. Trata-se de um cultivo que permite um alto lucro para o agricultor e necessita de um trabalho menos intensivo em relação aos outros cultivos.
Inteiras famílias de agricultores podem viver, assim, de modo decente e permitir-se comprar alimento e medicamentos e enviar seus filhos à escola.
A cânabis é cultivada na África principalmente para o mercado local, mas nos últimos anos notou-se um aumento dos tráficos da cânabis originados na África subsaariana. Os maiores cultivos da cânabis se encontram em Comores, Etiópia, Quênia, Madagascar, Tanzânia e Uganda.
No Quênia, o cultivo da cânabis tem uma antiga tradição, mas nos últimos anos se tornou primeiramente uma produção limitada ao mercado local, para depois transformar-se em uma verdadeira empresa comercial ilícita estendida internacionalmente.
A cânabis é cultivada na região ocidental e naquela do Monte Quênia, onde, segundo alguns relatórios, existem cerca de 1.500 hectares cultivados com a cânabis. Os cultivos de droga estão escondidos entre aqueles tradicionais destinados à alimentação, mas há também cultivos menores em algumas áreas protegidas da reserva natural nacional.
Também as regiões costeiras se tornaram produtores da cânabis. Lá, com efeito, se instalaram diversos agricultores provenientes do interior, que lá encontraram áreas férteis e pouco controladas pela polícia, e um mercado constituído pela população local, pelos turistas e pelos residentes estrangeiros que preferem as costas do país.
Quanto ao ópio, no passado foram sinalizados alguns cultivos no Quênia e nas costas de Madagascar. Desde 1993 não foram sinalizados cultivos de opiáceos na África oriental, mas a vastidão do território e os escassos controles das autoridades locais tornam sempre possível uma retomada do cultivo da papoula de ópio.
No que diz respeito à produção local de drogas sintéticas, a África oriental é o ponto de trânsito do methaqualone (Mandrax) proveniente da Índia e destinado ao mercado sul-africano.
Nos últimos anos, a redução do Mandrax proveniente da Índia gerou uma produção local desta substância. Com efeito, foram descobertos laboratórios químicos clandestinos utilizados para a fabricação desta droga sintética em alguns países da África oriental e meridional.
Nos casos dos laboratórios descobertos no Quênia e na Tanzânia, se tratava somente de pequenos centros onde o pó do Mandrax ainda proveniente da Índia era transformado em pílulas, mas em outros casos deparou-se com verdadeiras oficinas para a fabricação do Mandrax com precursores químicos, cuja proveniência permaneceu desconhecida. A este propósito, as substâncias que mais causam preocupação são as efedrinas, as pseudo-efedrinas, o anidrido acético e o ácido N-acetilantranílico (utilizado na fabricação do Mandrax) e o pergamenato de potássio.
O mais famoso cultivo de planta entorpecente local é o khat, que é uma produção legal em diversos países da África oriental. O khat é cultivado na Etiópia e no Quênia e, em medida menos extensa, na Tanzânia, Comores e na parte setentrional de Madagascar. É exportado para os principais mercados da área (Djibuti, Eritréia, Somália e Iêmen), além da Europa e da América setentrional.
O uso do khat continua a expandir-se no Chifre da África e tem um papel-chave na contínua instabilidade da Somália, onde se calcula que a população gasta todos os anos 64 milhões de dólares por ano para comprar o khat. Trata-se de um quantia que é quase o dobro do total das ajudas internacionais doadas ao país. O khat não somente contribui para provocar problemas na sociedade, criando pessoas afetadas pela dependência de entorpecentes, mas tem também um papel na difusão no país de armas leves, frequentemente repassadas em troca de um pouco de droga.
As organizações de narcotraficantes olham com interesse aos países da África oriental e meridional por causa de suas infra-estruturas portuárias e aeroportuárias, dos comprimentos de suas costas e dos fluxos turísticos.
Todos elementos que permitem esconder os tráficos de droga. O Quênia tem o maior porto comercial da região, Mombasa, que serve a maior parte dos países privados de acesso direto ao mar, enquanto o aeroporto de Nairóbi é um dos mais traficados da área. As redes do narcotráfico utilizam também os portos de Dar-es-Salaam (na Tanzânia), Djibuti, Durban (na África do Sul) e Maputo (em Moçambique) e estão expandindo suas atividades também na Etiópia, Mauritius, Tanzânia e Uganda. Esses últimos países são usados como pontos de trânsito para a droga enviada para o Quênia, a África do Sul e a África ocidental e dessas áreas para a Europa e a América do Norte.
A maior parte das substâncias entorpecentes chega à região via mar, escondida nas cargas dos containers transportados pelos navios mercantis que navegam o Oceano Índico. Em alguns casos, os navios dos narcotraficantes se encontram em alto mar com embarcações menores, que levam para a terra a carga ilícita. Grandes quantidades de heroína chegam assim à região, mas se recorre também a carteiros, homens e mulheres, que chegam com vôos comerciais, e ao envio por correio.
Entre os países da África oriental interessados pelo tráfico e pelo consumo de substâncias entorpecentes, está Uganda.
Segundo um recente relatório do UNODC, “Uganda se tornou o país líder no tráfico e no consumo de droga em relação ao restante dos Estados da África oriental”. Entre as drogas presentes no mercado ilícito ugandense, existem a cânabis, a heroína, a cocaína e o mandrax, além do khat. Segundo a agência anticrime da ONU, o aumento do consumo de substâncias entorpecentes é devido a “duas décadas de conflitos armados e à falta de lei, que prejudicaram gravemente a infra-estrutura policial”.
O relatório observa que as condições climáticas de todo o território ugandense são favoráveis ao cultivo da cânabis: “O cultivo ilícito da planta é, porém, relevante em áreas remotas das regiões meridional, ocidental, central, oriental e norte-oriental. As dimensões exatas dos cultivos da cânabis não são conhecidas, mas se notou um aumento da produção da cânabis sobretudo para a exportação”. O aeroporto de Entebbe é, por fim, utilizado como ponto de trânsito para o envio de heroína e de mandrax ao extremo Oriente e à África do Sul.

CONCLUSÕES
A África é um ponto de trânsito sempre mais importante para as organizações de narcotraficantes, apesar de, no momento, a maior parte das apreensões de entorpecentes ocorrer em outras partes do mundo.
Vista a escassa eficiência das polícias africanas e a relativa recente conscientização do problema por parte dos entes locais e internacionais, pode-se supor que a quantidade das apreensões de droga na África não corresponda à entidade efetiva das cargas que transitam pelo continente.
A África, porém, não é mais somente um ponto de passagem da droga proveniente da América Latina e da Ásia em direção à Europa e à América setentrional, mas já se tornou um mercado ainda talvez “residual”, mas em todo caso que não pode ser ignorado pelas redes de narcotraficantes.
Redes nas quais estão presentes africanos, em particular nigerianos, em papéis não somente de gregários, mas também de organizadores. O crescente consumo de drogas por via endovenosa em diversos países africanos, como Tanzânia e Quênia, agrava o problema da difusão da AIDS.
Na Nigéria, por exemplo, um estudo revelou que o consumo de drogas se expande no mesmo ritmo do aumento das pessoas infetadas com o vírus HIV, em cidades como Kano e Port Harcourt.

 
At 9/17/2007 3:07 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

A DROGA NA ÁFRICA: UM PROBLEMA MUNDIAL

A droga já é um problema na África e representa um ulterior obstáculo ao desenvolvimento do continente. É o que afirmam diversos organismos internacionais encarregados da luta ao tráfico de entorpecentes. Já em 2001, um relatório do Órgão Internacional de Controle das Drogas afirmava que “graças à sua experiência no campo do contrabando de haxixe e de heroína, os cartéis da droga da África ocidental buscam novos contatos na América Latina para estender o tráfico de cocaína a toda a região da África subsaariana”.
Trata-se de uma reviravolta fundamental na estratégia do narcotráfico mundial, que vê a África se tornar uma das áreas “fulcro” para a distribuição de drogas em todo o mundo. Até os primeiros anos da década de 90 do século passado, a África era mantida às margens das rotas da droga. A mudança ocorreu em 1993, quando foram apreendidos na Nigéria 300 quilos de heroína provenientes da Tailândia. É o sinal de uma mudança que vê a transformação de tantos pequenos contrabandistas africanos (a maioria nigerianos) de simples transportadores por conta de terceiros a membros de gangues guiadas por africanos, capazes de tratar no mesmo nível com análogas organizações de outros continentes.
A presença dessas organizações criminais, a forte urbanização, a perda dos valores tradicionais africanos e a difusão de uma cultura hedonista são todos fatores que criaram as premissas para um mercado africano da droga. A África, portanto, não é somente um local de trânsito dos entorpecentes, mas terreno “virgem” para o tráfico de droga.

PREMESSA METODOLÓGICA
Os dados apresentados são úteis para analisar a tendência (incremento ou decremento) do tráfico de entorpecentes, apesar de serem muito provavelmente aproximativos.
Segundo um estudo crítico efetuado pela associação ‘Libera’ do pe. Ciotti, com efeito os dados apresentados pelos entes antidrogas internacionais e de alguns Estados não relatam fielmente toda a produção mundial de cocaína. Segundo este estudo (referido somente à cocaína e não a outras drogas), existe uma discrepância entre a estimativa sobre a produção mundial de cocaína efetuada pela ONU e os dados relativos às apreensões e ao consumo de cocaína somente na América.
Segundo os elaboradores do relatório, com efeito, subtraindo das 937 toneladas de produção, indicada pelas Nações Unidas em 2004, as cerca de 450 consumadas nos Estados Unidos, Canadá, México e em toda a América do Sul e as cerca de 490 toneladas apreendidas em todas as Américas, se chegaria a um saldo negativo de 3 toneladas.
“A este ponto, não se saberia mais de onde subtrair as cerca de 99 toneladas de cocaína apreendidas no “resto do mundo”, afirma o relatório. Fazendo-o, se chegaria ao paradoxal saldo negativo de 102 toneladas de cocaína “não resultantes”, não tendo feito frente ainda à demanda de cocaína no “resto do mundo”, estimada em ao menos 300 toneladas, se chega a calcular uma espécie de buraco negro de aproximadamente 400 toneladas de cocaína não resultantes.
Este buraco negro assume proporções ainda mais macroscópicas, cerca de 700 toneladas, se calculado com base nos dados da Agência antidroga norte-americana.
Apesar dos seus limites, os relatórios dos organismos internacionais de luta contra a droga permanecem frequentemente os únicos instrumentos para analisar o fenômeno do narcotráfico.

A HEROÍNA NA ÁFRICA
A apreensão de opiáceos na África registrou um forte incremento nos últimos anos. Segundo dados da ONU, por exemplo, em 2004 ocorreu um incremento da apreensão de heroína de 60% em relação ao ano precedente.
A maior parte deste incremento é devido à apreensão ocorrida na África central e ocidental, que quase triplicou de 2003 a 2004. A heroína que passa pela África é destinada em primeiro lugar aos mercados europeus e, em segundo lugar, aos da América do Norte. A heroína provém dos países do sudoeste e sudeste da Ásia.
A quantia total dos opiáceos apreendida na África permanece ainda modesto (0,3% do total de apreensões em nível mundial). Porém, deve-se levar em consideração que não existem estatísticas confiáveis e que o nível das apreensões não reflete o verdadeiro fluxo de narcóticos que passa pela África por causa da debilidade da polícia local, que tem dificuldade em interceptar as cargas ilícitas.
No que concerne ao uso de opiáceos na África, segundo os dados do Departamento das Nações Unidas para a luta à criminalidade (UNODC), nota-se um aumento de seu consumo no continente africano, em particular na África oriental e naquela austral e em alguns países da África ocidental. Segundo os especialistas das Nações Unidas, o crescimento do consumo de heroína nessas áreas deriva do fato de que são utilizadas como locais de trânsito dos narcotraficantes, os quais, porém, não desdenham em criar um mercado local.
Na África do Sul, um dos poucos países africanos que dispõe de dados confiáveis, até os primeiros anos do novo milênio, o pedido de tratamentos por abuso de heroína representava somente 1% do total dos pedidos de cura por dependência de substâncias entorpecentes (incluído o álcool). Em 2005, esta porcentagem subiu para 7%.
Segundo o relatório do UNODC sobre o tráfico de entorpecentes de 2007, o mercado da heroína está dividido deste modo: a heroína afegã é destinada aos mercados da Ásia central, da Europa, do Oriente Médio e da África; aquela produzida no chamado “triângulo de ouro” alimenta o mercado chinês e o dos outros países asiáticos e da Oceania; aquela proveniente da América Latina serve o mercado norte-americano.
O relatório nota, porém, que “uma parte pequena, mas em crescimento, da produção de opiáceos afegãos é enviada à América setentrional, seja por meio da África oriental e ocidental, seja por meio da Europa”.
O relatório afirma que a demanda global de heroína permaneceu estável, “apesar de importantes incrementos nos países que se encontram no caminho das principais rotas do narcotráfico”.
Entre esses estão também diversos países africanos, afirma o documento, que destaca os efeitos prejudiciais da difusão da heroína e de outras substâncias entorpecentes nas populações já duramente provadas pela pobreza e pela difusão da AIDS.
Os últimos dados do UNODC mostram um forte incremento do uso de heroína em alguns países africanos como Moçambique, Zâmbia, Quênia, Tanzânia e Costa do Marfim, enquanto outros países tiveram um aumento mais contido. Entre esses, África do Sul, Madagascar, Gana, Libéria e Senegal.

DOS ANDES AO KILIMANJARO: UM FLUXO DE COCAÍNA INVADE A ÁFRICA
O dado mais preocupante, porém, é o da cocaína que transita da África em direção principalmente à Europa e, secundariamente, à América setentrional.
A importância da África, e em particular da África ocidental, como ponto de trânsito da cocaína em direção aos ricos mercados ocidentais é demonstrada pelo nível das apreensões registradas nos últimos anos. As apreensões de cocaína em toda a África aumentaram três vezes entre 2003 e 2004, enquanto no mesmo período as apreensões na África ocidental e central aumentaram seis vezes. As apreensões mais importantes no período 2000-2004 se registraram em Cabo Verde, seguido por África do Sul, Quênia, Gana e Nigéria. Mas as apreensões de cocaína na África representam somente 1% do total mundial das apreensões desta substância entorpecente. Também neste caso, porém, o dado é prejudicado devido à debilidade das polícias locais, incapazes de interceptar a maior parte dos fluxos de cocaína proveniente da América do Sul.
Em 2004, 50% das apreensões de cocaína no continente ocorreram na África ocidental e central. A zona de passagem mais utilizada pelos traficantes de cocaína é o Golfo da Guiné, de onde a substância entorpecente é transportada para a Europa em pequenas quantidades, através dos chamados “mulas”, pessoas que assumem o risco de ingerir óvulos de cocaína com a esperança de superar as alfândegas nos aeroportos de destinação. Nos últimos anos, também na África oriental aumentou a quantia de cocaína apreendida, indicando uma tendência a utilizar em medida crescente esta área como ponto de trânsito para a cocaína destinada à Europa e à Ásia.
Um dos países mais atingidos pelo fenômeno é o Quênia, onde em 2004 foi apreendida uma tonelada de cocaína. Em termos gerais, o crescimento da difusão da cocaína na África é demonstrada pelo fato que dos 32 países africanos que fornecem estatísticas sobre as apreensões de entorpecentes na UNODC, 23 (72%) relataram apreensões de cocaína, contra 34% em 1990.
Os traficantes de cocaína tendem a servir-se da África cada vez mais como ponto de trânsito por dois motivos. O primeiro deriva do melhoramento dos sistemas de inspeção utilizados pelas autoridades locais e por aquelas norte-americanas na área caribenha e centro-americana, tradicional rota utilizada pelos traficantes. Nos últimos anos, por exemplo, surgiram bases de inspeção norte-americanas dos Andes às ilhas caribenhas. Também as autoridades holandesas intensificaram a inspeção com patrulhas aéreas baseadas nas ilhas de Curaçao e Saint Martin.
O segundo fator está ligado à diminuição do consumo de cocaína, que se registrou nos Estados Unidos diante de um aumento da demanda na Europa. Se na América do Norte há o mais alto número de consumidores mundiais (6 milhões e meio, correspondente a cerca da metade do consumo mundial), a tendência é diminuir a demanda.
De 1998 a 2004, de fato, se registrou uma queda de 20% da difusão desta substância. No mesmo período, na Europa ocidental, onde os consumidores de cocaína são 3 milhões e meio (26% do total mundial), se notou um aumento do consumo e da difusão do “pó branco”. Na Espanha e no Reino Unido, este dado é de 2%.
A África, portanto, é uma cômoda e segura rota para alcançar um mercado em crescimento.
Além disso, como efeito colateral criou-se um mercado africano que está registrando nos últimos anos preocupantes aumentos.
A crescente disponibilidade de cocaína se traduz, com efeito, em um aumento do consumo desta substância na África. Segundo os dados do UNODC, no período 1992-2004 o abuso da cocaína na África cresceu em um ritmo mais sustentado do que no restante do mundo. Este incremento é mais remarcado nos países da África meridional e nos da África ocidental.
Se forem analisados os dados das pessoas que recorrem aos tratamentos de desintoxicação, o aumento do consumo de cocaína emerge com evidência. No início dos anos 90, as pessoas em tratamento por abuso de cocaína eram pouquíssimas, no final de 1996 constituíam 1.5% dos casos tratados pelas estruturas de recuperação dos toxicômanos, no biênio 1999-2000 eram 6%. No período 2001-2004, notou-se uma inflexão na porcentagem de pessoas que pediam para ser tratadas da dependência de cocaína (menos de 5%).
A partir do final de 2004, este dado está em crescimento: de 7,5% em 2004 passou-se a 8,5% nos primeiros meses de 2005.

A COCAÍNA NA ÁFRICA OCIDENTAL
O país tradicionalmente mais envolvido no narcotráfico é a Nigéria. Lá, com efeito, em 1993 houve a primeira grande apreensão de cocaína na África e as organizações criminais nigerianas estão perfeitamente inseridas no sistema criminal global e transnacional. A afirmação das máfias nigerianas deriva também da pertença da Nigéria ao Commonwealth, que permitiu abrir estreitas relações comerciais com o subcontinente indiano, produtor de ópio e de heroína, e com o mundo anglo-saxão consumidor.
No final dos anos 80, registrou-se um incremento importante no papel de centro estratégico e, em 1992, as apreensões de cocaína no aeroporto de Lagos foram tão relevantes que as autoridades nigerianas suspenderam os vôos diretos para o Rio de Janeiro. Desde então, os traficantes nigerianos são considerados os principais transportadores da droga, uma verdadeira indústria a serviço do comércio de heroína e da coca. Eles estão presentes em todos os pontos-chaves da produção e do tráfico de drogas. Graças aos compatriotas residentes no exterior, formaram clãs criminais comparáveis aos colombianos, turcos e chineses.
As organizações mafiosas nigerianas, como as outras, se baseiam na solidariedade étnica, de clã e de famílias. Já em 1995 as autoridades norte-americanas estimavam que 50% da heroína circulante em seu país era introduzida pelos nigerianos, os quais usam a Polônia e a Hungria como pontos de trânsito para a cocaína destinada à Europa ocidental.
Um dos países da África ocidental dos quais se têm estatísticas confiáveis sobre o incremento do tráfico de cocaína é Gana. Segundo os dados divulgados pelas autoridades locais, em um único ano as apreensões de cocaína aumentaram 40 vezes, passando dos 15 quilogramas de 2003 aos 617 quilos de 2004. A maior parte da cocaína é destinada ao mercado britânico.
Trata-se de um dado significativo, levando-se em consideração que, em termos porcentuais, as apreensões de cocaína aumentaram 18% em nível mundial e 4.000% em Gana de 2003 a 2004. No mesmo período, na África, as apreensões de cocaína aumentaram 3 vezes, passando das 1,1 tonelada para 3,6 toneladas.
Nos anos sucessivos, emergiram outros fatos que demonstram que Gana se tornou um importante ponto de passagem da cocaína na África ocidental. Em novembro de 2005, a polícia ganense apreendeu 588 quilos no decorrer de uma perquirição em uma habitação em East Lagon. Em abril de 2006, foram descobertos a bordo do navio MV Benjamin, atracado no porto de Tema, 2.310 quilos de cocaína.
Segundo um responsável do UNODC, as organizações de narcotraficantes tendem a fazer transitar a droga por meio da África ocidental porque, até agora, as autoridades alfandegárias européias e norte-americanas controlam com menos atenção as mercadorias e as bagagens provenientes da África em relação àquelas provenientes da América Latina. No caso de Gana, como de outros países da região, o fato de não estar inserido na lista dos países produtores de cocaína significa que as suas mercadorias não são sujeitas a inspeções detalhadas. Mas nos últimos anos, as coisas mudaram e Gana foi inserida na lista dos países “de alta prioridade” de inspeção.
Os traficantes buscam corromper os policiais e a polícia para permitir o trânsito das cargas de entorpecentes. Para investigar casos de corrupção de policiais, o Ministério da Fazenda de Gana criou uma Comissão de investigação, que recebeu o nome da sua Presidenta, Georgina Wood, que desempenhou importantes cargos na polícia e na magistratura local. O “Georgina Wood Committee” nasceu após duas importantes apreensões de cocaína citadas precedentemente, nas quais resultaram envolvidos alguns policiais. Entre as recomendações apresentadas pelo Comitê, está reforçar o patrulhamento das costas do país por meio seja da potenciação dos meios da marinha e da aeronáutica, seja com a criação de um serviço de guarda-costas independente.
A Guiné-Bissau é um outro país que se tornou ponto de trânsito da cocaína da América Latina à Europa, como demonstrado numa recente operação que levou à captura de 674 quilos de cocaína e à detenção de alguns narcotraficantes sul-americanos. Na África ocidental, os países mais envolvidos pelos fluxos de droga, além de Gana, são Costa do Marfim, Senegal e Nigéria.
Os traficantes de cocaína na Guiné-Bissau estão ligados aos que passam através do vizinho Senegal, como emergiu da operação efetuada no final de junho de 2007 pela polícia de Dakar, que levou à apreensão de mais de duas toneladas de cocaína. Parte da droga se encontrava em um veleiro que estava à deriva diante das costas senegalesas, e uma outra em uma habitação na área balneária de Mbour, a sul de Dakar.
No veleiro os investigadores encontraram uma documentação que comprova que os narcotraficantes utilizam a Guiné-Bissau como depósito de trânsito da cocaína proveniente da América Latina e destinada à Europa. Também a nacionalidade dos detidos demonstra o grau de internacionalização das organizações criminais dedicadas ao narcotráfico. Além de três cidadãos sul-americanos (um colombiano, um venezuelano e um equatoriano) e de uma cidadã francesa, a polícia deteve três senegaleses. A partir dos documentos detidos, além disso a polícia senegalesa descobriu que os narcotraficantes efetuaram diversas viagens aos países limítrofes: Serra Leoa, Guiné Conakry, Guiné-Bissau e Gâmbia.
As autoridades senegalesas reiteraram que em seu país não existem depósitos de cocaína, mas admitiram a infiltração de grupos criminais estrangeiros, que utilizam o aeroporto de Dakar para enviar cocaína à Europa. No período de janeiro a junho de 2007, a polícia senegalesa afirma ter apreendido no aeroporto de Dakar 44 quilos de cocaína e detido cerca de 30 “mulas” da droga, a maior parte dos quais nigeriano.
Está em aumento também o número de “mulas” da Guiné-Bissau detidos no momento do embarque para Portugal, onde podem entrar sem visto. Além disso, foram descobertas algumas operações de reciclagem de dinheiro sujo por parte de organizações estrangeiras. A apreensão recorde efetuada pela polícia senegalesa, equivalente ao total de apreensões de cocaína na África ocidental de setembro de 2006 a maio de 2007, é somente o último de uma série efetuada nos primeiros seis meses de 2007 em várias localidades da África ocidental.
Entre essas, há 800 quilos de cocaína recuperados no mar diante das ilhas Canárias, e uma quantia análoga apreendida pela marinha francesa no largo da Costa do Marfim. Além dos navios, as organizações criminais recorrem a aviões para alimentar seus tráficos ilícitos.
Na Venezuela foi bloqueado um avião com 2,5 toneladas de cocaína, que se preparava a partir para Serra Leoa, enquanto em maio de 2007 foram apreendidos 600 quilos de cocaína a bordo de um Cessna, matriculado na Venezuela, que efetuou uma aterrissagem de emergência em Nouadhibou, na Mauritânia.
Segundo um responsável do ONUDC, para a África ocidental o aumento de confiscos das cargas de cocaína na região é devido mais a incidentes de percurso que a uma maior eficácia da polícia.
O funcionário considera que a cada dez expedições de droga em direção à Europa, nove chegam a seu destino sem problemas.

O SAHEL: NOVA FRONTEIRA DO NARCOTRÁFICO?
Das costas da África ocidental as organizações de narcotraficantes estão progressivamente se expandindo aos países do Sahel, cujo papel estratégico entre o Atlântico e o Magreb, e, portanto o Mediterrâneo, é apreciado também pelos traficantes de seres humanos e, provavelmente, pelo terrorismo internacional. Não se pode excluir a priori uma interconexão entre essas realidades criminais, de que são cúmplices a debilidade dos Estados e a vastidão dos territórios a controlar. Um realidade que suscita o alarme dos governos interessados.
Em abril deste ano, depois da apreensão de três caminhões cheios de droga e armas, o Presidente do Níger, Mamadou Tandja, declarou que o exército local pretende aumentar os esforços para impedir que o seu país seja “circundado” pelos traficantes de armas e de droga, que são uma “ameaça real” para o país.
Também Burkina Fasso não foge ao fenômeno. Segundo o Coordenador do Comitê contra os tráficos ilícitos de droga em Burkina Fasso, o volume das cargas de droga interceptadas nos primeiros três meses de 2007 é “incrível”. O funcionário indica a existência de uma nova rota de trânsito da droga no oeste e no sudoeste do país. No início de abril de 2007, 49 quilos de cocaína, num valor de 10 milhões de dólares, foram interceptados pela polícia de Burkina Fasso na fronteira com o Mali, que é um importante ponto de trânsito para o tráfico de seres humanos. Países como Mali e Níger são há milênios atravessados por vias de caravanas, que agora se converteram num uso criminal: para o tráfico de seres humanos, mas também de armas, droga e cigarros de contrabando. “Nos últimos meses notamos um aumento da utilização dos países do Sahel, como Mali e Níger, para o tráfico de cocaína”, disse Antonio Razzitelli, Diretor do departamento do UNODC para a África ocidental.
Segundo o órgão anticrime da ONU, os traficantes importam a droga por meio das cidades costeiras como Conakry, na Guiné, Dakar, no Senegal, e Lomé, no Togo, e depois a transportam para as cidades do interior, como Bamako, no Mali, e Ouagadougou, em Burkina Fasso. Dessas localidades, a cocaína prossegue a sua viagem até a Europa.
Segundo o responsável do Comitê contra os tráficos ilícitos de droga em Burkina Fasso, é preciso coordenar os esforços entre as polícias dos Estados da região. “Há uma necessidade urgente de reunir todos os entes nacionais antidroga da região para encontrar o modo de cooperar entre si, para tentar deter as redes criminais”, disse, destacando que a escassa cooperação entre as fronteiras dos países do Sahel e a falta de meios das polícias locais constituem problemas adjuntos para uma eficaz ação de contraste às redes criminais.

O MERCADO DA CÂNABIS
Enquanto a África permanece, no momento, somente um local de trânsito e um mercado residual para drogas como cocaína e heroína, a principal produção local de substâncias entorpecentes é representada pela cânabis.
O cultivo da cânabis foi introduzido na África oriental pelos mercantes árabes, pérsios e indianos no século XII. De lá se difundiu primeiramente na África austral, no século XV, e depois no Congo e em Angola no século XIX. Somente depois da Segunda Guerra Mundial a cânabis chegou à África ocidental, levada por soldados nigerianos e ganenses que combateram com as tropas britânicas na Birmânia (atual Mianmar), onde adquiriram o hábito de fumar marijuana. Este fato explica porque nos países onde a cânabis é conhecida há mais tempo, ela é utilizada na medicina tradicional, enquanto na África ocidental é usada para fins “recreativos”. Até os anos 80, porém, a produção africana da cânabis permaneceu limitada. A partir daqueles anos, porém, notou-se um incremento notável da superfície cultivada com a cânabis para fins comerciais.
A produção desta substância se divide em três categorias: a erva da cânabis (flores e folhas), resina ou haxixe (secreções emitidas pela planta durante a fase de florescimento) e óleo de haxixe, o menos utilizado. Segundo o World Drug Report 2006, a erva da cânabis é cultivada, sobretudo de modo ilegal, em 176 países em todo o mundo. A África representa 27% da produção mundial e os principais produtores são Marrocos (3.700 toneladas), África do Sul (2.200 toneladas) e Nigéria (2 mil toneladas).
No que concerne ao haxixe, o principal produtor mundial é Marrocos, que fornece os mercados norte-africanos e europeus. Graças ao esforço das autoridades marroquinas nos últimos anos, deu-se a diminuição da produção local da cânabis, à qual corresponde um aumento da produção em outros países, da Ásia ocidental (Afeganistão, Paquistão) à Albânia. O UNODC reconhece que desde 2003 o governo de Rabat conduziu uma campanha para estimar a produção de resina da cânabis no país, em cooperação com a Agência anticrime das Nações Unidas. Segundo uma investigação efetuada em 2003, a produção da cânabis foi de 3.060 toneladas, cultivada em 134 mil hectares de terra na região do Rif (norte do país) por 96.600 famílias de camponeses. A investigação feita em 2004 registrou uma diminuição de 10% das terras cultivas com a cânabis, que passaram a 120.500 hectares, com uma produção estimada de 2.760 toneladas.
Em 2005 notou-se uma ulterior diminuição de 37%, sendo a superfície cultivada com a cânabis de 72.500 hectares, enquanto a produção diminuiu para 1.070 toneladas. Quanto às apreensões da cânabis, nos últimos 12-15 anos se registrou um aumento da porcentagem mundial de apreensões no continente africano desta substância. Enquanto em 1990 16% do total mundial das apreensões da cânabis ocorria na África, em 2002 este dado subiu para 20%, para alcançar 31% em 2004. O aumento das apreensões na África é determinado sobretudo pelo aumento dos controles policiais e alfandegários efetuados pela Nigéria e pela África do Sul.
O principal mercado de consumo da cânabis é a Europa ocidental, e 80% da cânabis consumada na Europa provém do Marrocos, passando pela Espanha e pela Holanda e dali distribuída aos outros países. O terceiro mercado mundial de consumo é representado pelos países do norte da África, onde a cânabis provém principalmente do Marrocos. Parte da cânabis produzida no Afeganistão e Paquistão, além disso, alimenta o mercado dos países da África oriental.
No que concerne às problemáticas sociais ligadas ao consumo da cânabis, é preciso recordar que esta substância é a droga mais difundida e usada em nível mundial. Estima-se que, em 2004, 162 milhões de pessoas a tenham usado, o equivalente a 3,9% da população mundial entre 15 e 64 anos. Em termos relativos (a porcentagem de habitantes que faz uso da cânabis em relação a outras substância entorpecentes), a cânabis é prevalentemente utilizada na Oceania, seguida por América do Norte e África. Desde 1992, na África, notou-se também uma tendência ao aumento do seu consumo, em particular na Argélia, Nigéria e Zâmbia.
É provável que a tendência ao uso desta droga seja subestimada em diversos países da África, que não têm uma capacidade de coleta de dados adequados para seguir o fenômeno. Segundo dados parciais, notou-se nos últimos anos um forte incremento do abuso da cânabis na África ocidental, oriental e no norte da África, em sintonia com a tendência em nível global de uma ulterior expansão do consumo desta substância.
Até os anos 80, porém, a produção africana da cânabis permaneceu limitada. A partir daqueles anos, porém, notou-se um incremento notável da superfície cultivada com a cânabis para fins comerciais.
A produção africana de droga subtraiu terras e recursos à agricultura, isso porque naquele período se registrou uma forte queda dos preços dos produtos agrícolas em todo o mundo. A agricultura africana, já frágil, entrou em crise. Diversos camponeses, portanto, deixaram-se tentar pelo cultivo da cânabis em detrimento do cultivo de produtos lícitos.
Um simples cálculo econômico demonstra o forte poder de atração de uma semelhante produção; já em 1995, na Guiné, um saco de 20-25 quilos de marijuana tinha o valor de aproximadamente a renda anual média de uma famílias de oitos pessoas que se dedica à produção de cultivo lícito. No mercado de Kinshasa, na República Democrática do Congo (RDC), um saco de 25 quilos de marijuana é vendido por mil dólares, enquanto um saco de 80 quilos de mandioca vale somente 10 dólares.
Compreende-se, assim, que o cultivo desta substância entorpecente tem sérias repercussões na auto-suficiência alimentar de diversos países africanos. Segundo a associação de luta à toxicomania de Kinshasa, LIPILDRO, por causa do abandono dos cultivos legais por aqueles da cânabis, até 2010 a maior parte das cidades congolesas será atingida por um crise alimentar.
Além disso, na RDC se verificaram experiências para o cultivo da papoula de ópio (na província do Equador) e da cocaína (na região do Shaba). O mais importante produtor da cânabis na África subsaariana permanece, porém, a África do Sul. Importante produções são sinalizadas também em Lesoto e em Malauí.

DROGAS SINTÉTICAS
A produção de drogas sintéticas é limitada na África, com exceção da África do Sul, onde a fabricação de metanfetaminas e methaqualone aumentou nos últimos anos. Os dados sobre a descoberta de laboratórios clandestinos confirmam esta tendência.
Com efeito, se passou da descoberta à destruição de um laboratório por ano no período 1995-1999, aos 17 no período 2000-2003, até aos 28 destruídos somente em 2004. Um outro dado que demonstra o incremento do uso de drogas sintéticas na África do Sul é o aumento das apreensões de ecstasy: em 2004, houve um incremento de 385% das apreensões em relação ao ano precedente.
Além disso, as drogas sintéticas faziam parte do programa de guerra secreta química e biológica aplicado pelo regime do apartheid. Segundo os testemunhos reunidos durante o processo contra o responsável do programa, doutor Wouter Basson (definido “Doutor Morte” pela imprensa local), no âmbito do chamado “Project Coast”, entre 1992 e 1993 os laboratórios relacionados aos serviços secretos sul-africanos tinham produzido mais de 900 quilos de cristais de ecstasy (correspondente a 73 milhões de pílulas). No ano precedente, uma empresa de serviços do regime do apartheid tinha importado 500 quilos desta substância da Croácia.
Essas quantidades de drogas sintéticas foram importadas e produzidas para serem usadas como agente incapacitador para o controle da multidão (e talvez também para drogar secretamente os líderes da oposição para desacreditá-los, fazendo-os cometer gestos ridículos em público) e para serem distribuídas nas favelas habitadas pela população negra para promover o abuso de droga e a dependência.
O fim do regime do apartheid bloqueou este e outros projetos criminais aplicados no âmbito do “Project Coast”. Antes da queda do regime, porém, o dr. Basson tinha organizado a venda das empresas de cobertura dos serviços secretos sul-africanos, alguns dos quais fabricavam armas químicas e biológicas e drogas sintéticas.
Além disso, desapareceram centenas de quilos de substâncias químicas usadas na produção desses instrumentos de morte.
O dr. Basson é suspeito de ter aberto um empresa privada e, com efeito, quando foi detido em 1997 foi encontrado em posse de pílulas de ecstasy num valor de 20 mil dólares.

ÁFRICA ORIENTAL: UMA SITUAÇÃO PREOCUPANTE
Na África oriental, o Quênia é o principal ponto de trânsito da cocaína. Somente em 2004 foi apreendida 1,1 tonelada de cocaína entre a capital Nairóbi e o centro costeiro de Malindi. No decorrer da operação da polícia, que levou à descoberta desta importante carga de droga, foram detidos diversos funcionários da companhia aérea local (que resultou estranha ao narcotráfico), alguns dos quais foram capturados em Londres.
Das investigações emergiu que a droga que passava pelo Quênia era inserida no mercado britânico com a colaboração de alguns funcionários infiéis da companhia aérea. Além do Quênia, os países da África oriental interessados pelo narcotráfico são Etiópia, Botsuana, Zâmbia e África do Sul. Neste último, segundo o South African Institute of International Affaire, existem 500 mil pessoas que fazem uso de cocaína, enquanto 1/3 dos adolescentes utiliza entorpecentes. Segundo o centro de estudos sul-africano, no país atuam 300 organizações criminais internacionais envolvidas no narcotráfico.
Os países da região se tornaram não somente uma região de trânsito, mas também um novo mercado para os entorpecentes e, em particular, para a cocaína. Na Zâmbia, por exemplo, 80% da cocaína que chega ao país é transferida para a Europa e o restante 20% é consumado localmente.
A Interpol lançou o alarme sobre o crescente consumo de entorpecentes na África. “As drogas não somente transitam nos países, mas permanecem lá”, disse um responsável da organização internacional de polícia diante dos delegados de 150 organismos de polícia de todo o mundo, reunidos para o encontro anual da Interpol no Rio de Janeiro (Brasil). “Já se tornaram habituais as cargas de diversas toneladas de cocaína que passam pela África”, acrescentou.
Segundo um analista presente no seminário, se a tendência ao incremento do uso de entorpecentes continuar avançando, a África deverá enfrentar uma grave crise social derivante da droga.
As condições climáticas da maior parte da África são favoráveis ao cultivo da cânabis. Trata-se de um cultivo que permite um alto lucro para o agricultor e necessita de um trabalho menos intensivo em relação aos outros cultivos.
Inteiras famílias de agricultores podem viver, assim, de modo decente e permitir-se comprar alimento e medicamentos e enviar seus filhos à escola.
A cânabis é cultivada na África principalmente para o mercado local, mas nos últimos anos notou-se um aumento dos tráficos da cânabis originados na África subsaariana. Os maiores cultivos da cânabis se encontram em Comores, Etiópia, Quênia, Madagascar, Tanzânia e Uganda.
No Quênia, o cultivo da cânabis tem uma antiga tradição, mas nos últimos anos se tornou primeiramente uma produção limitada ao mercado local, para depois transformar-se em uma verdadeira empresa comercial ilícita estendida internacionalmente.
A cânabis é cultivada na região ocidental e naquela do Monte Quênia, onde, segundo alguns relatórios, existem cerca de 1.500 hectares cultivados com a cânabis. Os cultivos de droga estão escondidos entre aqueles tradicionais destinados à alimentação, mas há também cultivos menores em algumas áreas protegidas da reserva natural nacional.
Também as regiões costeiras se tornaram produtores da cânabis. Lá, com efeito, se instalaram diversos agricultores provenientes do interior, que lá encontraram áreas férteis e pouco controladas pela polícia, e um mercado constituído pela população local, pelos turistas e pelos residentes estrangeiros que preferem as costas do país.
Quanto ao ópio, no passado foram sinalizados alguns cultivos no Quênia e nas costas de Madagascar. Desde 1993 não foram sinalizados cultivos de opiáceos na África oriental, mas a vastidão do território e os escassos controles das autoridades locais tornam sempre possível uma retomada do cultivo da papoula de ópio.
No que diz respeito à produção local de drogas sintéticas, a África oriental é o ponto de trânsito do methaqualone (Mandrax) proveniente da Índia e destinado ao mercado sul-africano.
Nos últimos anos, a redução do Mandrax proveniente da Índia gerou uma produção local desta substância. Com efeito, foram descobertos laboratórios químicos clandestinos utilizados para a fabricação desta droga sintética em alguns países da África oriental e meridional.
Nos casos dos laboratórios descobertos no Quênia e na Tanzânia, se tratava somente de pequenos centros onde o pó do Mandrax ainda proveniente da Índia era transformado em pílulas, mas em outros casos deparou-se com verdadeiras oficinas para a fabricação do Mandrax com precursores químicos, cuja proveniência permaneceu desconhecida. A este propósito, as substâncias que mais causam preocupação são as efedrinas, as pseudo-efedrinas, o anidrido acético e o ácido N-acetilantranílico (utilizado na fabricação do Mandrax) e o pergamenato de potássio.
O mais famoso cultivo de planta entorpecente local é o khat, que é uma produção legal em diversos países da África oriental. O khat é cultivado na Etiópia e no Quênia e, em medida menos extensa, na Tanzânia, Comores e na parte setentrional de Madagascar. É exportado para os principais mercados da área (Djibuti, Eritréia, Somália e Iêmen), além da Europa e da América setentrional.
O uso do khat continua a expandir-se no Chifre da África e tem um papel-chave na contínua instabilidade da Somália, onde se calcula que a população gasta todos os anos 64 milhões de dólares por ano para comprar o khat. Trata-se de um quantia que é quase o dobro do total das ajudas internacionais doadas ao país. O khat não somente contribui para provocar problemas na sociedade, criando pessoas afetadas pela dependência de entorpecentes, mas tem também um papel na difusão no país de armas leves, frequentemente repassadas em troca de um pouco de droga.
As organizações de narcotraficantes olham com interesse aos países da África oriental e meridional por causa de suas infra-estruturas portuárias e aeroportuárias, dos comprimentos de suas costas e dos fluxos turísticos.
Todos elementos que permitem esconder os tráficos de droga. O Quênia tem o maior porto comercial da região, Mombasa, que serve a maior parte dos países privados de acesso direto ao mar, enquanto o aeroporto de Nairóbi é um dos mais traficados da área. As redes do narcotráfico utilizam também os portos de Dar-es-Salaam (na Tanzânia), Djibuti, Durban (na África do Sul) e Maputo (em Moçambique) e estão expandindo suas atividades também na Etiópia, Mauritius, Tanzânia e Uganda. Esses últimos países são usados como pontos de trânsito para a droga enviada para o Quênia, a África do Sul e a África ocidental e dessas áreas para a Europa e a América do Norte.
A maior parte das substâncias entorpecentes chega à região via mar, escondida nas cargas dos containers transportados pelos navios mercantis que navegam o Oceano Índico. Em alguns casos, os navios dos narcotraficantes se encontram em alto mar com embarcações menores, que levam para a terra a carga ilícita. Grandes quantidades de heroína chegam assim à região, mas se recorre também a carteiros, homens e mulheres, que chegam com vôos comerciais, e ao envio por correio.
Entre os países da África oriental interessados pelo tráfico e pelo consumo de substâncias entorpecentes, está Uganda.
Segundo um recente relatório do UNODC, “Uganda se tornou o país líder no tráfico e no consumo de droga em relação ao restante dos Estados da África oriental”. Entre as drogas presentes no mercado ilícito ugandense, existem a cânabis, a heroína, a cocaína e o mandrax, além do khat. Segundo a agência anticrime da ONU, o aumento do consumo de substâncias entorpecentes é devido a “duas décadas de conflitos armados e à falta de lei, que prejudicaram gravemente a infra-estrutura policial”.
O relatório observa que as condições climáticas de todo o território ugandense são favoráveis ao cultivo da cânabis: “O cultivo ilícito da planta é, porém, relevante em áreas remotas das regiões meridional, ocidental, central, oriental e norte-oriental. As dimensões exatas dos cultivos da cânabis não são conhecidas, mas se notou um aumento da produção da cânabis sobretudo para a exportação”. O aeroporto de Entebbe é, por fim, utilizado como ponto de trânsito para o envio de heroína e de mandrax ao extremo Oriente e à África do Sul.

CONCLUSÕES
A África é um ponto de trânsito sempre mais importante para as organizações de narcotraficantes, apesar de, no momento, a maior parte das apreensões de entorpecentes ocorrer em outras partes do mundo.
Vista a escassa eficiência das polícias africanas e a relativa recente conscientização do problema por parte dos entes locais e internacionais, pode-se supor que a quantidade das apreensões de droga na África não corresponda à entidade efetiva das cargas que transitam pelo continente.
A África, porém, não é mais somente um ponto de passagem da droga proveniente da América Latina e da Ásia em direção à Europa e à América setentrional, mas já se tornou um mercado ainda talvez “residual”, mas em todo caso que não pode ser ignorado pelas redes de narcotraficantes.
Redes nas quais estão presentes africanos, em particular nigerianos, em papéis não somente de gregários, mas também de organizadores. O crescente consumo de drogas por via endovenosa em diversos países africanos, como Tanzânia e Quênia, agrava o problema da difusão da AIDS.
Na Nigéria, por exemplo, um estudo revelou que o consumo de drogas se expande no mesmo ritmo do aumento das pessoas infetadas com o vírus HIV, em cidades como Kano e Port Harcourt.

 
At 9/17/2007 3:07 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

A DROGA NA ÁFRICA: UM PROBLEMA MUNDIAL

A droga já é um problema na África e representa um ulterior obstáculo ao desenvolvimento do continente. É o que afirmam diversos organismos internacionais encarregados da luta ao tráfico de entorpecentes. Já em 2001, um relatório do Órgão Internacional de Controle das Drogas afirmava que “graças à sua experiência no campo do contrabando de haxixe e de heroína, os cartéis da droga da África ocidental buscam novos contatos na América Latina para estender o tráfico de cocaína a toda a região da África subsaariana”.
Trata-se de uma reviravolta fundamental na estratégia do narcotráfico mundial, que vê a África se tornar uma das áreas “fulcro” para a distribuição de drogas em todo o mundo. Até os primeiros anos da década de 90 do século passado, a África era mantida às margens das rotas da droga. A mudança ocorreu em 1993, quando foram apreendidos na Nigéria 300 quilos de heroína provenientes da Tailândia. É o sinal de uma mudança que vê a transformação de tantos pequenos contrabandistas africanos (a maioria nigerianos) de simples transportadores por conta de terceiros a membros de gangues guiadas por africanos, capazes de tratar no mesmo nível com análogas organizações de outros continentes.
A presença dessas organizações criminais, a forte urbanização, a perda dos valores tradicionais africanos e a difusão de uma cultura hedonista são todos fatores que criaram as premissas para um mercado africano da droga. A África, portanto, não é somente um local de trânsito dos entorpecentes, mas terreno “virgem” para o tráfico de droga.

PREMESSA METODOLÓGICA
Os dados apresentados são úteis para analisar a tendência (incremento ou decremento) do tráfico de entorpecentes, apesar de serem muito provavelmente aproximativos.
Segundo um estudo crítico efetuado pela associação ‘Libera’ do pe. Ciotti, com efeito os dados apresentados pelos entes antidrogas internacionais e de alguns Estados não relatam fielmente toda a produção mundial de cocaína. Segundo este estudo (referido somente à cocaína e não a outras drogas), existe uma discrepância entre a estimativa sobre a produção mundial de cocaína efetuada pela ONU e os dados relativos às apreensões e ao consumo de cocaína somente na América.
Segundo os elaboradores do relatório, com efeito, subtraindo das 937 toneladas de produção, indicada pelas Nações Unidas em 2004, as cerca de 450 consumadas nos Estados Unidos, Canadá, México e em toda a América do Sul e as cerca de 490 toneladas apreendidas em todas as Américas, se chegaria a um saldo negativo de 3 toneladas.
“A este ponto, não se saberia mais de onde subtrair as cerca de 99 toneladas de cocaína apreendidas no “resto do mundo”, afirma o relatório. Fazendo-o, se chegaria ao paradoxal saldo negativo de 102 toneladas de cocaína “não resultantes”, não tendo feito frente ainda à demanda de cocaína no “resto do mundo”, estimada em ao menos 300 toneladas, se chega a calcular uma espécie de buraco negro de aproximadamente 400 toneladas de cocaína não resultantes.
Este buraco negro assume proporções ainda mais macroscópicas, cerca de 700 toneladas, se calculado com base nos dados da Agência antidroga norte-americana.
Apesar dos seus limites, os relatórios dos organismos internacionais de luta contra a droga permanecem frequentemente os únicos instrumentos para analisar o fenômeno do narcotráfico.

A HEROÍNA NA ÁFRICA
A apreensão de opiáceos na África registrou um forte incremento nos últimos anos. Segundo dados da ONU, por exemplo, em 2004 ocorreu um incremento da apreensão de heroína de 60% em relação ao ano precedente.
A maior parte deste incremento é devido à apreensão ocorrida na África central e ocidental, que quase triplicou de 2003 a 2004. A heroína que passa pela África é destinada em primeiro lugar aos mercados europeus e, em segundo lugar, aos da América do Norte. A heroína provém dos países do sudoeste e sudeste da Ásia.
A quantia total dos opiáceos apreendida na África permanece ainda modesto (0,3% do total de apreensões em nível mundial). Porém, deve-se levar em consideração que não existem estatísticas confiáveis e que o nível das apreensões não reflete o verdadeiro fluxo de narcóticos que passa pela África por causa da debilidade da polícia local, que tem dificuldade em interceptar as cargas ilícitas.
No que concerne ao uso de opiáceos na África, segundo os dados do Departamento das Nações Unidas para a luta à criminalidade (UNODC), nota-se um aumento de seu consumo no continente africano, em particular na África oriental e naquela austral e em alguns países da África ocidental. Segundo os especialistas das Nações Unidas, o crescimento do consumo de heroína nessas áreas deriva do fato de que são utilizadas como locais de trânsito dos narcotraficantes, os quais, porém, não desdenham em criar um mercado local.
Na África do Sul, um dos poucos países africanos que dispõe de dados confiáveis, até os primeiros anos do novo milênio, o pedido de tratamentos por abuso de heroína representava somente 1% do total dos pedidos de cura por dependência de substâncias entorpecentes (incluído o álcool). Em 2005, esta porcentagem subiu para 7%.
Segundo o relatório do UNODC sobre o tráfico de entorpecentes de 2007, o mercado da heroína está dividido deste modo: a heroína afegã é destinada aos mercados da Ásia central, da Europa, do Oriente Médio e da África; aquela produzida no chamado “triângulo de ouro” alimenta o mercado chinês e o dos outros países asiáticos e da Oceania; aquela proveniente da América Latina serve o mercado norte-americano.
O relatório nota, porém, que “uma parte pequena, mas em crescimento, da produção de opiáceos afegãos é enviada à América setentrional, seja por meio da África oriental e ocidental, seja por meio da Europa”.
O relatório afirma que a demanda global de heroína permaneceu estável, “apesar de importantes incrementos nos países que se encontram no caminho das principais rotas do narcotráfico”.
Entre esses estão também diversos países africanos, afirma o documento, que destaca os efeitos prejudiciais da difusão da heroína e de outras substâncias entorpecentes nas populações já duramente provadas pela pobreza e pela difusão da AIDS.
Os últimos dados do UNODC mostram um forte incremento do uso de heroína em alguns países africanos como Moçambique, Zâmbia, Quênia, Tanzânia e Costa do Marfim, enquanto outros países tiveram um aumento mais contido. Entre esses, África do Sul, Madagascar, Gana, Libéria e Senegal.

DOS ANDES AO KILIMANJARO: UM FLUXO DE COCAÍNA INVADE A ÁFRICA
O dado mais preocupante, porém, é o da cocaína que transita da África em direção principalmente à Europa e, secundariamente, à América setentrional.
A importância da África, e em particular da África ocidental, como ponto de trânsito da cocaína em direção aos ricos mercados ocidentais é demonstrada pelo nível das apreensões registradas nos últimos anos. As apreensões de cocaína em toda a África aumentaram três vezes entre 2003 e 2004, enquanto no mesmo período as apreensões na África ocidental e central aumentaram seis vezes. As apreensões mais importantes no período 2000-2004 se registraram em Cabo Verde, seguido por África do Sul, Quênia, Gana e Nigéria. Mas as apreensões de cocaína na África representam somente 1% do total mundial das apreensões desta substância entorpecente. Também neste caso, porém, o dado é prejudicado devido à debilidade das polícias locais, incapazes de interceptar a maior parte dos fluxos de cocaína proveniente da América do Sul.
Em 2004, 50% das apreensões de cocaína no continente ocorreram na África ocidental e central. A zona de passagem mais utilizada pelos traficantes de cocaína é o Golfo da Guiné, de onde a substância entorpecente é transportada para a Europa em pequenas quantidades, através dos chamados “mulas”, pessoas que assumem o risco de ingerir óvulos de cocaína com a esperança de superar as alfândegas nos aeroportos de destinação. Nos últimos anos, também na África oriental aumentou a quantia de cocaína apreendida, indicando uma tendência a utilizar em medida crescente esta área como ponto de trânsito para a cocaína destinada à Europa e à Ásia.
Um dos países mais atingidos pelo fenômeno é o Quênia, onde em 2004 foi apreendida uma tonelada de cocaína. Em termos gerais, o crescimento da difusão da cocaína na África é demonstrada pelo fato que dos 32 países africanos que fornecem estatísticas sobre as apreensões de entorpecentes na UNODC, 23 (72%) relataram apreensões de cocaína, contra 34% em 1990.
Os traficantes de cocaína tendem a servir-se da África cada vez mais como ponto de trânsito por dois motivos. O primeiro deriva do melhoramento dos sistemas de inspeção utilizados pelas autoridades locais e por aquelas norte-americanas na área caribenha e centro-americana, tradicional rota utilizada pelos traficantes. Nos últimos anos, por exemplo, surgiram bases de inspeção norte-americanas dos Andes às ilhas caribenhas. Também as autoridades holandesas intensificaram a inspeção com patrulhas aéreas baseadas nas ilhas de Curaçao e Saint Martin.
O segundo fator está ligado à diminuição do consumo de cocaína, que se registrou nos Estados Unidos diante de um aumento da demanda na Europa. Se na América do Norte há o mais alto número de consumidores mundiais (6 milhões e meio, correspondente a cerca da metade do consumo mundial), a tendência é diminuir a demanda.
De 1998 a 2004, de fato, se registrou uma queda de 20% da difusão desta substância. No mesmo período, na Europa ocidental, onde os consumidores de cocaína são 3 milhões e meio (26% do total mundial), se notou um aumento do consumo e da difusão do “pó branco”. Na Espanha e no Reino Unido, este dado é de 2%.
A África, portanto, é uma cômoda e segura rota para alcançar um mercado em crescimento.
Além disso, como efeito colateral criou-se um mercado africano que está registrando nos últimos anos preocupantes aumentos.
A crescente disponibilidade de cocaína se traduz, com efeito, em um aumento do consumo desta substância na África. Segundo os dados do UNODC, no período 1992-2004 o abuso da cocaína na África cresceu em um ritmo mais sustentado do que no restante do mundo. Este incremento é mais remarcado nos países da África meridional e nos da África ocidental.
Se forem analisados os dados das pessoas que recorrem aos tratamentos de desintoxicação, o aumento do consumo de cocaína emerge com evidência. No início dos anos 90, as pessoas em tratamento por abuso de cocaína eram pouquíssimas, no final de 1996 constituíam 1.5% dos casos tratados pelas estruturas de recuperação dos toxicômanos, no biênio 1999-2000 eram 6%. No período 2001-2004, notou-se uma inflexão na porcentagem de pessoas que pediam para ser tratadas da dependência de cocaína (menos de 5%).
A partir do final de 2004, este dado está em crescimento: de 7,5% em 2004 passou-se a 8,5% nos primeiros meses de 2005.

A COCAÍNA NA ÁFRICA OCIDENTAL
O país tradicionalmente mais envolvido no narcotráfico é a Nigéria. Lá, com efeito, em 1993 houve a primeira grande apreensão de cocaína na África e as organizações criminais nigerianas estão perfeitamente inseridas no sistema criminal global e transnacional. A afirmação das máfias nigerianas deriva também da pertença da Nigéria ao Commonwealth, que permitiu abrir estreitas relações comerciais com o subcontinente indiano, produtor de ópio e de heroína, e com o mundo anglo-saxão consumidor.
No final dos anos 80, registrou-se um incremento importante no papel de centro estratégico e, em 1992, as apreensões de cocaína no aeroporto de Lagos foram tão relevantes que as autoridades nigerianas suspenderam os vôos diretos para o Rio de Janeiro. Desde então, os traficantes nigerianos são considerados os principais transportadores da droga, uma verdadeira indústria a serviço do comércio de heroína e da coca. Eles estão presentes em todos os pontos-chaves da produção e do tráfico de drogas. Graças aos compatriotas residentes no exterior, formaram clãs criminais comparáveis aos colombianos, turcos e chineses.
As organizações mafiosas nigerianas, como as outras, se baseiam na solidariedade étnica, de clã e de famílias. Já em 1995 as autoridades norte-americanas estimavam que 50% da heroína circulante em seu país era introduzida pelos nigerianos, os quais usam a Polônia e a Hungria como pontos de trânsito para a cocaína destinada à Europa ocidental.
Um dos países da África ocidental dos quais se têm estatísticas confiáveis sobre o incremento do tráfico de cocaína é Gana. Segundo os dados divulgados pelas autoridades locais, em um único ano as apreensões de cocaína aumentaram 40 vezes, passando dos 15 quilogramas de 2003 aos 617 quilos de 2004. A maior parte da cocaína é destinada ao mercado britânico.
Trata-se de um dado significativo, levando-se em consideração que, em termos porcentuais, as apreensões de cocaína aumentaram 18% em nível mundial e 4.000% em Gana de 2003 a 2004. No mesmo período, na África, as apreensões de cocaína aumentaram 3 vezes, passando das 1,1 tonelada para 3,6 toneladas.
Nos anos sucessivos, emergiram outros fatos que demonstram que Gana se tornou um importante ponto de passagem da cocaína na África ocidental. Em novembro de 2005, a polícia ganense apreendeu 588 quilos no decorrer de uma perquirição em uma habitação em East Lagon. Em abril de 2006, foram descobertos a bordo do navio MV Benjamin, atracado no porto de Tema, 2.310 quilos de cocaína.
Segundo um responsável do UNODC, as organizações de narcotraficantes tendem a fazer transitar a droga por meio da África ocidental porque, até agora, as autoridades alfandegárias européias e norte-americanas controlam com menos atenção as mercadorias e as bagagens provenientes da África em relação àquelas provenientes da América Latina. No caso de Gana, como de outros países da região, o fato de não estar inserido na lista dos países produtores de cocaína significa que as suas mercadorias não são sujeitas a inspeções detalhadas. Mas nos últimos anos, as coisas mudaram e Gana foi inserida na lista dos países “de alta prioridade” de inspeção.
Os traficantes buscam corromper os policiais e a polícia para permitir o trânsito das cargas de entorpecentes. Para investigar casos de corrupção de policiais, o Ministério da Fazenda de Gana criou uma Comissão de investigação, que recebeu o nome da sua Presidenta, Georgina Wood, que desempenhou importantes cargos na polícia e na magistratura local. O “Georgina Wood Committee” nasceu após duas importantes apreensões de cocaína citadas precedentemente, nas quais resultaram envolvidos alguns policiais. Entre as recomendações apresentadas pelo Comitê, está reforçar o patrulhamento das costas do país por meio seja da potenciação dos meios da marinha e da aeronáutica, seja com a criação de um serviço de guarda-costas independente.
A Guiné-Bissau é um outro país que se tornou ponto de trânsito da cocaína da América Latina à Europa, como demonstrado numa recente operação que levou à captura de 674 quilos de cocaína e à detenção de alguns narcotraficantes sul-americanos. Na África ocidental, os países mais envolvidos pelos fluxos de droga, além de Gana, são Costa do Marfim, Senegal e Nigéria.
Os traficantes de cocaína na Guiné-Bissau estão ligados aos que passam através do vizinho Senegal, como emergiu da operação efetuada no final de junho de 2007 pela polícia de Dakar, que levou à apreensão de mais de duas toneladas de cocaína. Parte da droga se encontrava em um veleiro que estava à deriva diante das costas senegalesas, e uma outra em uma habitação na área balneária de Mbour, a sul de Dakar.
No veleiro os investigadores encontraram uma documentação que comprova que os narcotraficantes utilizam a Guiné-Bissau como depósito de trânsito da cocaína proveniente da América Latina e destinada à Europa. Também a nacionalidade dos detidos demonstra o grau de internacionalização das organizações criminais dedicadas ao narcotráfico. Além de três cidadãos sul-americanos (um colombiano, um venezuelano e um equatoriano) e de uma cidadã francesa, a polícia deteve três senegaleses. A partir dos documentos detidos, além disso a polícia senegalesa descobriu que os narcotraficantes efetuaram diversas viagens aos países limítrofes: Serra Leoa, Guiné Conakry, Guiné-Bissau e Gâmbia.
As autoridades senegalesas reiteraram que em seu país não existem depósitos de cocaína, mas admitiram a infiltração de grupos criminais estrangeiros, que utilizam o aeroporto de Dakar para enviar cocaína à Europa. No período de janeiro a junho de 2007, a polícia senegalesa afirma ter apreendido no aeroporto de Dakar 44 quilos de cocaína e detido cerca de 30 “mulas” da droga, a maior parte dos quais nigeriano.
Está em aumento também o número de “mulas” da Guiné-Bissau detidos no momento do embarque para Portugal, onde podem entrar sem visto. Além disso, foram descobertas algumas operações de reciclagem de dinheiro sujo por parte de organizações estrangeiras. A apreensão recorde efetuada pela polícia senegalesa, equivalente ao total de apreensões de cocaína na África ocidental de setembro de 2006 a maio de 2007, é somente o último de uma série efetuada nos primeiros seis meses de 2007 em várias localidades da África ocidental.
Entre essas, há 800 quilos de cocaína recuperados no mar diante das ilhas Canárias, e uma quantia análoga apreendida pela marinha francesa no largo da Costa do Marfim. Além dos navios, as organizações criminais recorrem a aviões para alimentar seus tráficos ilícitos.
Na Venezuela foi bloqueado um avião com 2,5 toneladas de cocaína, que se preparava a partir para Serra Leoa, enquanto em maio de 2007 foram apreendidos 600 quilos de cocaína a bordo de um Cessna, matriculado na Venezuela, que efetuou uma aterrissagem de emergência em Nouadhibou, na Mauritânia.
Segundo um responsável do ONUDC, para a África ocidental o aumento de confiscos das cargas de cocaína na região é devido mais a incidentes de percurso que a uma maior eficácia da polícia.
O funcionário considera que a cada dez expedições de droga em direção à Europa, nove chegam a seu destino sem problemas.

O SAHEL: NOVA FRONTEIRA DO NARCOTRÁFICO?
Das costas da África ocidental as organizações de narcotraficantes estão progressivamente se expandindo aos países do Sahel, cujo papel estratégico entre o Atlântico e o Magreb, e, portanto o Mediterrâneo, é apreciado também pelos traficantes de seres humanos e, provavelmente, pelo terrorismo internacional. Não se pode excluir a priori uma interconexão entre essas realidades criminais, de que são cúmplices a debilidade dos Estados e a vastidão dos territórios a controlar. Um realidade que suscita o alarme dos governos interessados.
Em abril deste ano, depois da apreensão de três caminhões cheios de droga e armas, o Presidente do Níger, Mamadou Tandja, declarou que o exército local pretende aumentar os esforços para impedir que o seu país seja “circundado” pelos traficantes de armas e de droga, que são uma “ameaça real” para o país.
Também Burkina Fasso não foge ao fenômeno. Segundo o Coordenador do Comitê contra os tráficos ilícitos de droga em Burkina Fasso, o volume das cargas de droga interceptadas nos primeiros três meses de 2007 é “incrível”. O funcionário indica a existência de uma nova rota de trânsito da droga no oeste e no sudoeste do país. No início de abril de 2007, 49 quilos de cocaína, num valor de 10 milhões de dólares, foram interceptados pela polícia de Burkina Fasso na fronteira com o Mali, que é um importante ponto de trânsito para o tráfico de seres humanos. Países como Mali e Níger são há milênios atravessados por vias de caravanas, que agora se converteram num uso criminal: para o tráfico de seres humanos, mas também de armas, droga e cigarros de contrabando. “Nos últimos meses notamos um aumento da utilização dos países do Sahel, como Mali e Níger, para o tráfico de cocaína”, disse Antonio Razzitelli, Diretor do departamento do UNODC para a África ocidental.
Segundo o órgão anticrime da ONU, os traficantes importam a droga por meio das cidades costeiras como Conakry, na Guiné, Dakar, no Senegal, e Lomé, no Togo, e depois a transportam para as cidades do interior, como Bamako, no Mali, e Ouagadougou, em Burkina Fasso. Dessas localidades, a cocaína prossegue a sua viagem até a Europa.
Segundo o responsável do Comitê contra os tráficos ilícitos de droga em Burkina Fasso, é preciso coordenar os esforços entre as polícias dos Estados da região. “Há uma necessidade urgente de reunir todos os entes nacionais antidroga da região para encontrar o modo de cooperar entre si, para tentar deter as redes criminais”, disse, destacando que a escassa cooperação entre as fronteiras dos países do Sahel e a falta de meios das polícias locais constituem problemas adjuntos para uma eficaz ação de contraste às redes criminais.

O MERCADO DA CÂNABIS
Enquanto a África permanece, no momento, somente um local de trânsito e um mercado residual para drogas como cocaína e heroína, a principal produção local de substâncias entorpecentes é representada pela cânabis.
O cultivo da cânabis foi introduzido na África oriental pelos mercantes árabes, pérsios e indianos no século XII. De lá se difundiu primeiramente na África austral, no século XV, e depois no Congo e em Angola no século XIX. Somente depois da Segunda Guerra Mundial a cânabis chegou à África ocidental, levada por soldados nigerianos e ganenses que combateram com as tropas britânicas na Birmânia (atual Mianmar), onde adquiriram o hábito de fumar marijuana. Este fato explica porque nos países onde a cânabis é conhecida há mais tempo, ela é utilizada na medicina tradicional, enquanto na África ocidental é usada para fins “recreativos”. Até os anos 80, porém, a produção africana da cânabis permaneceu limitada. A partir daqueles anos, porém, notou-se um incremento notável da superfície cultivada com a cânabis para fins comerciais.
A produção desta substância se divide em três categorias: a erva da cânabis (flores e folhas), resina ou haxixe (secreções emitidas pela planta durante a fase de florescimento) e óleo de haxixe, o menos utilizado. Segundo o World Drug Report 2006, a erva da cânabis é cultivada, sobretudo de modo ilegal, em 176 países em todo o mundo. A África representa 27% da produção mundial e os principais produtores são Marrocos (3.700 toneladas), África do Sul (2.200 toneladas) e Nigéria (2 mil toneladas).
No que concerne ao haxixe, o principal produtor mundial é Marrocos, que fornece os mercados norte-africanos e europeus. Graças ao esforço das autoridades marroquinas nos últimos anos, deu-se a diminuição da produção local da cânabis, à qual corresponde um aumento da produção em outros países, da Ásia ocidental (Afeganistão, Paquistão) à Albânia. O UNODC reconhece que desde 2003 o governo de Rabat conduziu uma campanha para estimar a produção de resina da cânabis no país, em cooperação com a Agência anticrime das Nações Unidas. Segundo uma investigação efetuada em 2003, a produção da cânabis foi de 3.060 toneladas, cultivada em 134 mil hectares de terra na região do Rif (norte do país) por 96.600 famílias de camponeses. A investigação feita em 2004 registrou uma diminuição de 10% das terras cultivas com a cânabis, que passaram a 120.500 hectares, com uma produção estimada de 2.760 toneladas.
Em 2005 notou-se uma ulterior diminuição de 37%, sendo a superfície cultivada com a cânabis de 72.500 hectares, enquanto a produção diminuiu para 1.070 toneladas. Quanto às apreensões da cânabis, nos últimos 12-15 anos se registrou um aumento da porcentagem mundial de apreensões no continente africano desta substância. Enquanto em 1990 16% do total mundial das apreensões da cânabis ocorria na África, em 2002 este dado subiu para 20%, para alcançar 31% em 2004. O aumento das apreensões na África é determinado sobretudo pelo aumento dos controles policiais e alfandegários efetuados pela Nigéria e pela África do Sul.
O principal mercado de consumo da cânabis é a Europa ocidental, e 80% da cânabis consumada na Europa provém do Marrocos, passando pela Espanha e pela Holanda e dali distribuída aos outros países. O terceiro mercado mundial de consumo é representado pelos países do norte da África, onde a cânabis provém principalmente do Marrocos. Parte da cânabis produzida no Afeganistão e Paquistão, além disso, alimenta o mercado dos países da África oriental.
No que concerne às problemáticas sociais ligadas ao consumo da cânabis, é preciso recordar que esta substância é a droga mais difundida e usada em nível mundial. Estima-se que, em 2004, 162 milhões de pessoas a tenham usado, o equivalente a 3,9% da população mundial entre 15 e 64 anos. Em termos relativos (a porcentagem de habitantes que faz uso da cânabis em relação a outras substância entorpecentes), a cânabis é prevalentemente utilizada na Oceania, seguida por América do Norte e África. Desde 1992, na África, notou-se também uma tendência ao aumento do seu consumo, em particular na Argélia, Nigéria e Zâmbia.
É provável que a tendência ao uso desta droga seja subestimada em diversos países da África, que não têm uma capacidade de coleta de dados adequados para seguir o fenômeno. Segundo dados parciais, notou-se nos últimos anos um forte incremento do abuso da cânabis na África ocidental, oriental e no norte da África, em sintonia com a tendência em nível global de uma ulterior expansão do consumo desta substância.
Até os anos 80, porém, a produção africana da cânabis permaneceu limitada. A partir daqueles anos, porém, notou-se um incremento notável da superfície cultivada com a cânabis para fins comerciais.
A produção africana de droga subtraiu terras e recursos à agricultura, isso porque naquele período se registrou uma forte queda dos preços dos produtos agrícolas em todo o mundo. A agricultura africana, já frágil, entrou em crise. Diversos camponeses, portanto, deixaram-se tentar pelo cultivo da cânabis em detrimento do cultivo de produtos lícitos.
Um simples cálculo econômico demonstra o forte poder de atração de uma semelhante produção; já em 1995, na Guiné, um saco de 20-25 quilos de marijuana tinha o valor de aproximadamente a renda anual média de uma famílias de oitos pessoas que se dedica à produção de cultivo lícito. No mercado de Kinshasa, na República Democrática do Congo (RDC), um saco de 25 quilos de marijuana é vendido por mil dólares, enquanto um saco de 80 quilos de mandioca vale somente 10 dólares.
Compreende-se, assim, que o cultivo desta substância entorpecente tem sérias repercussões na auto-suficiência alimentar de diversos países africanos. Segundo a associação de luta à toxicomania de Kinshasa, LIPILDRO, por causa do abandono dos cultivos legais por aqueles da cânabis, até 2010 a maior parte das cidades congolesas será atingida por um crise alimentar.
Além disso, na RDC se verificaram experiências para o cultivo da papoula de ópio (na província do Equador) e da cocaína (na região do Shaba). O mais importante produtor da cânabis na África subsaariana permanece, porém, a África do Sul. Importante produções são sinalizadas também em Lesoto e em Malauí.

DROGAS SINTÉTICAS
A produção de drogas sintéticas é limitada na África, com exceção da África do Sul, onde a fabricação de metanfetaminas e methaqualone aumentou nos últimos anos. Os dados sobre a descoberta de laboratórios clandestinos confirmam esta tendência.
Com efeito, se passou da descoberta à destruição de um laboratório por ano no período 1995-1999, aos 17 no período 2000-2003, até aos 28 destruídos somente em 2004. Um outro dado que demonstra o incremento do uso de drogas sintéticas na África do Sul é o aumento das apreensões de ecstasy: em 2004, houve um incremento de 385% das apreensões em relação ao ano precedente.
Além disso, as drogas sintéticas faziam parte do programa de guerra secreta química e biológica aplicado pelo regime do apartheid. Segundo os testemunhos reunidos durante o processo contra o responsável do programa, doutor Wouter Basson (definido “Doutor Morte” pela imprensa local), no âmbito do chamado “Project Coast”, entre 1992 e 1993 os laboratórios relacionados aos serviços secretos sul-africanos tinham produzido mais de 900 quilos de cristais de ecstasy (correspondente a 73 milhões de pílulas). No ano precedente, uma empresa de serviços do regime do apartheid tinha importado 500 quilos desta substância da Croácia.
Essas quantidades de drogas sintéticas foram importadas e produzidas para serem usadas como agente incapacitador para o controle da multidão (e talvez também para drogar secretamente os líderes da oposição para desacreditá-los, fazendo-os cometer gestos ridículos em público) e para serem distribuídas nas favelas habitadas pela população negra para promover o abuso de droga e a dependência.
O fim do regime do apartheid bloqueou este e outros projetos criminais aplicados no âmbito do “Project Coast”. Antes da queda do regime, porém, o dr. Basson tinha organizado a venda das empresas de cobertura dos serviços secretos sul-africanos, alguns dos quais fabricavam armas químicas e biológicas e drogas sintéticas.
Além disso, desapareceram centenas de quilos de substâncias químicas usadas na produção desses instrumentos de morte.
O dr. Basson é suspeito de ter aberto um empresa privada e, com efeito, quando foi detido em 1997 foi encontrado em posse de pílulas de ecstasy num valor de 20 mil dólares.

ÁFRICA ORIENTAL: UMA SITUAÇÃO PREOCUPANTE
Na África oriental, o Quênia é o principal ponto de trânsito da cocaína. Somente em 2004 foi apreendida 1,1 tonelada de cocaína entre a capital Nairóbi e o centro costeiro de Malindi. No decorrer da operação da polícia, que levou à descoberta desta importante carga de droga, foram detidos diversos funcionários da companhia aérea local (que resultou estranha ao narcotráfico), alguns dos quais foram capturados em Londres.
Das investigações emergiu que a droga que passava pelo Quênia era inserida no mercado britânico com a colaboração de alguns funcionários infiéis da companhia aérea. Além do Quênia, os países da África oriental interessados pelo narcotráfico são Etiópia, Botsuana, Zâmbia e África do Sul. Neste último, segundo o South African Institute of International Affaire, existem 500 mil pessoas que fazem uso de cocaína, enquanto 1/3 dos adolescentes utiliza entorpecentes. Segundo o centro de estudos sul-africano, no país atuam 300 organizações criminais internacionais envolvidas no narcotráfico.
Os países da região se tornaram não somente uma região de trânsito, mas também um novo mercado para os entorpecentes e, em particular, para a cocaína. Na Zâmbia, por exemplo, 80% da cocaína que chega ao país é transferida para a Europa e o restante 20% é consumado localmente.
A Interpol lançou o alarme sobre o crescente consumo de entorpecentes na África. “As drogas não somente transitam nos países, mas permanecem lá”, disse um responsável da organização internacional de polícia diante dos delegados de 150 organismos de polícia de todo o mundo, reunidos para o encontro anual da Interpol no Rio de Janeiro (Brasil). “Já se tornaram habituais as cargas de diversas toneladas de cocaína que passam pela África”, acrescentou.
Segundo um analista presente no seminário, se a tendência ao incremento do uso de entorpecentes continuar avançando, a África deverá enfrentar uma grave crise social derivante da droga.
As condições climáticas da maior parte da África são favoráveis ao cultivo da cânabis. Trata-se de um cultivo que permite um alto lucro para o agricultor e necessita de um trabalho menos intensivo em relação aos outros cultivos.
Inteiras famílias de agricultores podem viver, assim, de modo decente e permitir-se comprar alimento e medicamentos e enviar seus filhos à escola.
A cânabis é cultivada na África principalmente para o mercado local, mas nos últimos anos notou-se um aumento dos tráficos da cânabis originados na África subsaariana. Os maiores cultivos da cânabis se encontram em Comores, Etiópia, Quênia, Madagascar, Tanzânia e Uganda.
No Quênia, o cultivo da cânabis tem uma antiga tradição, mas nos últimos anos se tornou primeiramente uma produção limitada ao mercado local, para depois transformar-se em uma verdadeira empresa comercial ilícita estendida internacionalmente.
A cânabis é cultivada na região ocidental e naquela do Monte Quênia, onde, segundo alguns relatórios, existem cerca de 1.500 hectares cultivados com a cânabis. Os cultivos de droga estão escondidos entre aqueles tradicionais destinados à alimentação, mas há também cultivos menores em algumas áreas protegidas da reserva natural nacional.
Também as regiões costeiras se tornaram produtores da cânabis. Lá, com efeito, se instalaram diversos agricultores provenientes do interior, que lá encontraram áreas férteis e pouco controladas pela polícia, e um mercado constituído pela população local, pelos turistas e pelos residentes estrangeiros que preferem as costas do país.
Quanto ao ópio, no passado foram sinalizados alguns cultivos no Quênia e nas costas de Madagascar. Desde 1993 não foram sinalizados cultivos de opiáceos na África oriental, mas a vastidão do território e os escassos controles das autoridades locais tornam sempre possível uma retomada do cultivo da papoula de ópio.
No que diz respeito à produção local de drogas sintéticas, a África oriental é o ponto de trânsito do methaqualone (Mandrax) proveniente da Índia e destinado ao mercado sul-africano.
Nos últimos anos, a redução do Mandrax proveniente da Índia gerou uma produção local desta substância. Com efeito, foram descobertos laboratórios químicos clandestinos utilizados para a fabricação desta droga sintética em alguns países da África oriental e meridional.
Nos casos dos laboratórios descobertos no Quênia e na Tanzânia, se tratava somente de pequenos centros onde o pó do Mandrax ainda proveniente da Índia era transformado em pílulas, mas em outros casos deparou-se com verdadeiras oficinas para a fabricação do Mandrax com precursores químicos, cuja proveniência permaneceu desconhecida. A este propósito, as substâncias que mais causam preocupação são as efedrinas, as pseudo-efedrinas, o anidrido acético e o ácido N-acetilantranílico (utilizado na fabricação do Mandrax) e o pergamenato de potássio.
O mais famoso cultivo de planta entorpecente local é o khat, que é uma produção legal em diversos países da África oriental. O khat é cultivado na Etiópia e no Quênia e, em medida menos extensa, na Tanzânia, Comores e na parte setentrional de Madagascar. É exportado para os principais mercados da área (Djibuti, Eritréia, Somália e Iêmen), além da Europa e da América setentrional.
O uso do khat continua a expandir-se no Chifre da África e tem um papel-chave na contínua instabilidade da Somália, onde se calcula que a população gasta todos os anos 64 milhões de dólares por ano para comprar o khat. Trata-se de um quantia que é quase o dobro do total das ajudas internacionais doadas ao país. O khat não somente contribui para provocar problemas na sociedade, criando pessoas afetadas pela dependência de entorpecentes, mas tem também um papel na difusão no país de armas leves, frequentemente repassadas em troca de um pouco de droga.
As organizações de narcotraficantes olham com interesse aos países da África oriental e meridional por causa de suas infra-estruturas portuárias e aeroportuárias, dos comprimentos de suas costas e dos fluxos turísticos.
Todos elementos que permitem esconder os tráficos de droga. O Quênia tem o maior porto comercial da região, Mombasa, que serve a maior parte dos países privados de acesso direto ao mar, enquanto o aeroporto de Nairóbi é um dos mais traficados da área. As redes do narcotráfico utilizam também os portos de Dar-es-Salaam (na Tanzânia), Djibuti, Durban (na África do Sul) e Maputo (em Moçambique) e estão expandindo suas atividades também na Etiópia, Mauritius, Tanzânia e Uganda. Esses últimos países são usados como pontos de trânsito para a droga enviada para o Quênia, a África do Sul e a África ocidental e dessas áreas para a Europa e a América do Norte.
A maior parte das substâncias entorpecentes chega à região via mar, escondida nas cargas dos containers transportados pelos navios mercantis que navegam o Oceano Índico. Em alguns casos, os navios dos narcotraficantes se encontram em alto mar com embarcações menores, que levam para a terra a carga ilícita. Grandes quantidades de heroína chegam assim à região, mas se recorre também a carteiros, homens e mulheres, que chegam com vôos comerciais, e ao envio por correio.
Entre os países da África oriental interessados pelo tráfico e pelo consumo de substâncias entorpecentes, está Uganda.
Segundo um recente relatório do UNODC, “Uganda se tornou o país líder no tráfico e no consumo de droga em relação ao restante dos Estados da África oriental”. Entre as drogas presentes no mercado ilícito ugandense, existem a cânabis, a heroína, a cocaína e o mandrax, além do khat. Segundo a agência anticrime da ONU, o aumento do consumo de substâncias entorpecentes é devido a “duas décadas de conflitos armados e à falta de lei, que prejudicaram gravemente a infra-estrutura policial”.
O relatório observa que as condições climáticas de todo o território ugandense são favoráveis ao cultivo da cânabis: “O cultivo ilícito da planta é, porém, relevante em áreas remotas das regiões meridional, ocidental, central, oriental e norte-oriental. As dimensões exatas dos cultivos da cânabis não são conhecidas, mas se notou um aumento da produção da cânabis sobretudo para a exportação”. O aeroporto de Entebbe é, por fim, utilizado como ponto de trânsito para o envio de heroína e de mandrax ao extremo Oriente e à África do Sul.

CONCLUSÕES
A África é um ponto de trânsito sempre mais importante para as organizações de narcotraficantes, apesar de, no momento, a maior parte das apreensões de entorpecentes ocorrer em outras partes do mundo.
Vista a escassa eficiência das polícias africanas e a relativa recente conscientização do problema por parte dos entes locais e internacionais, pode-se supor que a quantidade das apreensões de droga na África não corresponda à entidade efetiva das cargas que transitam pelo continente.
A África, porém, não é mais somente um ponto de passagem da droga proveniente da América Latina e da Ásia em direção à Europa e à América setentrional, mas já se tornou um mercado ainda talvez “residual”, mas em todo caso que não pode ser ignorado pelas redes de narcotraficantes.
Redes nas quais estão presentes africanos, em particular nigerianos, em papéis não somente de gregários, mas também de organizadores. O crescente consumo de drogas por via endovenosa em diversos países africanos, como Tanzânia e Quênia, agrava o problema da difusão da AIDS.
Na Nigéria, por exemplo, um estudo revelou que o consumo de drogas se expande no mesmo ritmo do aumento das pessoas infetadas com o vírus HIV, em cidades como Kano e Port Harcourt.

 
At 9/17/2007 3:07 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

A DROGA NA ÁFRICA: UM PROBLEMA MUNDIAL

A droga já é um problema na África e representa um ulterior obstáculo ao desenvolvimento do continente. É o que afirmam diversos organismos internacionais encarregados da luta ao tráfico de entorpecentes. Já em 2001, um relatório do Órgão Internacional de Controle das Drogas afirmava que “graças à sua experiência no campo do contrabando de haxixe e de heroína, os cartéis da droga da África ocidental buscam novos contatos na América Latina para estender o tráfico de cocaína a toda a região da África subsaariana”.
Trata-se de uma reviravolta fundamental na estratégia do narcotráfico mundial, que vê a África se tornar uma das áreas “fulcro” para a distribuição de drogas em todo o mundo. Até os primeiros anos da década de 90 do século passado, a África era mantida às margens das rotas da droga. A mudança ocorreu em 1993, quando foram apreendidos na Nigéria 300 quilos de heroína provenientes da Tailândia. É o sinal de uma mudança que vê a transformação de tantos pequenos contrabandistas africanos (a maioria nigerianos) de simples transportadores por conta de terceiros a membros de gangues guiadas por africanos, capazes de tratar no mesmo nível com análogas organizações de outros continentes.
A presença dessas organizações criminais, a forte urbanização, a perda dos valores tradicionais africanos e a difusão de uma cultura hedonista são todos fatores que criaram as premissas para um mercado africano da droga. A África, portanto, não é somente um local de trânsito dos entorpecentes, mas terreno “virgem” para o tráfico de droga.

PREMESSA METODOLÓGICA
Os dados apresentados são úteis para analisar a tendência (incremento ou decremento) do tráfico de entorpecentes, apesar de serem muito provavelmente aproximativos.
Segundo um estudo crítico efetuado pela associação ‘Libera’ do pe. Ciotti, com efeito os dados apresentados pelos entes antidrogas internacionais e de alguns Estados não relatam fielmente toda a produção mundial de cocaína. Segundo este estudo (referido somente à cocaína e não a outras drogas), existe uma discrepância entre a estimativa sobre a produção mundial de cocaína efetuada pela ONU e os dados relativos às apreensões e ao consumo de cocaína somente na América.
Segundo os elaboradores do relatório, com efeito, subtraindo das 937 toneladas de produção, indicada pelas Nações Unidas em 2004, as cerca de 450 consumadas nos Estados Unidos, Canadá, México e em toda a América do Sul e as cerca de 490 toneladas apreendidas em todas as Américas, se chegaria a um saldo negativo de 3 toneladas.
“A este ponto, não se saberia mais de onde subtrair as cerca de 99 toneladas de cocaína apreendidas no “resto do mundo”, afirma o relatório. Fazendo-o, se chegaria ao paradoxal saldo negativo de 102 toneladas de cocaína “não resultantes”, não tendo feito frente ainda à demanda de cocaína no “resto do mundo”, estimada em ao menos 300 toneladas, se chega a calcular uma espécie de buraco negro de aproximadamente 400 toneladas de cocaína não resultantes.
Este buraco negro assume proporções ainda mais macroscópicas, cerca de 700 toneladas, se calculado com base nos dados da Agência antidroga norte-americana.
Apesar dos seus limites, os relatórios dos organismos internacionais de luta contra a droga permanecem frequentemente os únicos instrumentos para analisar o fenômeno do narcotráfico.

A HEROÍNA NA ÁFRICA
A apreensão de opiáceos na África registrou um forte incremento nos últimos anos. Segundo dados da ONU, por exemplo, em 2004 ocorreu um incremento da apreensão de heroína de 60% em relação ao ano precedente.
A maior parte deste incremento é devido à apreensão ocorrida na África central e ocidental, que quase triplicou de 2003 a 2004. A heroína que passa pela África é destinada em primeiro lugar aos mercados europeus e, em segundo lugar, aos da América do Norte. A heroína provém dos países do sudoeste e sudeste da Ásia.
A quantia total dos opiáceos apreendida na África permanece ainda modesto (0,3% do total de apreensões em nível mundial). Porém, deve-se levar em consideração que não existem estatísticas confiáveis e que o nível das apreensões não reflete o verdadeiro fluxo de narcóticos que passa pela África por causa da debilidade da polícia local, que tem dificuldade em interceptar as cargas ilícitas.
No que concerne ao uso de opiáceos na África, segundo os dados do Departamento das Nações Unidas para a luta à criminalidade (UNODC), nota-se um aumento de seu consumo no continente africano, em particular na África oriental e naquela austral e em alguns países da África ocidental. Segundo os especialistas das Nações Unidas, o crescimento do consumo de heroína nessas áreas deriva do fato de que são utilizadas como locais de trânsito dos narcotraficantes, os quais, porém, não desdenham em criar um mercado local.
Na África do Sul, um dos poucos países africanos que dispõe de dados confiáveis, até os primeiros anos do novo milênio, o pedido de tratamentos por abuso de heroína representava somente 1% do total dos pedidos de cura por dependência de substâncias entorpecentes (incluído o álcool). Em 2005, esta porcentagem subiu para 7%.
Segundo o relatório do UNODC sobre o tráfico de entorpecentes de 2007, o mercado da heroína está dividido deste modo: a heroína afegã é destinada aos mercados da Ásia central, da Europa, do Oriente Médio e da África; aquela produzida no chamado “triângulo de ouro” alimenta o mercado chinês e o dos outros países asiáticos e da Oceania; aquela proveniente da América Latina serve o mercado norte-americano.
O relatório nota, porém, que “uma parte pequena, mas em crescimento, da produção de opiáceos afegãos é enviada à América setentrional, seja por meio da África oriental e ocidental, seja por meio da Europa”.
O relatório afirma que a demanda global de heroína permaneceu estável, “apesar de importantes incrementos nos países que se encontram no caminho das principais rotas do narcotráfico”.
Entre esses estão também diversos países africanos, afirma o documento, que destaca os efeitos prejudiciais da difusão da heroína e de outras substâncias entorpecentes nas populações já duramente provadas pela pobreza e pela difusão da AIDS.
Os últimos dados do UNODC mostram um forte incremento do uso de heroína em alguns países africanos como Moçambique, Zâmbia, Quênia, Tanzânia e Costa do Marfim, enquanto outros países tiveram um aumento mais contido. Entre esses, África do Sul, Madagascar, Gana, Libéria e Senegal.

DOS ANDES AO KILIMANJARO: UM FLUXO DE COCAÍNA INVADE A ÁFRICA
O dado mais preocupante, porém, é o da cocaína que transita da África em direção principalmente à Europa e, secundariamente, à América setentrional.
A importância da África, e em particular da África ocidental, como ponto de trânsito da cocaína em direção aos ricos mercados ocidentais é demonstrada pelo nível das apreensões registradas nos últimos anos. As apreensões de cocaína em toda a África aumentaram três vezes entre 2003 e 2004, enquanto no mesmo período as apreensões na África ocidental e central aumentaram seis vezes. As apreensões mais importantes no período 2000-2004 se registraram em Cabo Verde, seguido por África do Sul, Quênia, Gana e Nigéria. Mas as apreensões de cocaína na África representam somente 1% do total mundial das apreensões desta substância entorpecente. Também neste caso, porém, o dado é prejudicado devido à debilidade das polícias locais, incapazes de interceptar a maior parte dos fluxos de cocaína proveniente da América do Sul.
Em 2004, 50% das apreensões de cocaína no continente ocorreram na África ocidental e central. A zona de passagem mais utilizada pelos traficantes de cocaína é o Golfo da Guiné, de onde a substância entorpecente é transportada para a Europa em pequenas quantidades, através dos chamados “mulas”, pessoas que assumem o risco de ingerir óvulos de cocaína com a esperança de superar as alfândegas nos aeroportos de destinação. Nos últimos anos, também na África oriental aumentou a quantia de cocaína apreendida, indicando uma tendência a utilizar em medida crescente esta área como ponto de trânsito para a cocaína destinada à Europa e à Ásia.
Um dos países mais atingidos pelo fenômeno é o Quênia, onde em 2004 foi apreendida uma tonelada de cocaína. Em termos gerais, o crescimento da difusão da cocaína na África é demonstrada pelo fato que dos 32 países africanos que fornecem estatísticas sobre as apreensões de entorpecentes na UNODC, 23 (72%) relataram apreensões de cocaína, contra 34% em 1990.
Os traficantes de cocaína tendem a servir-se da África cada vez mais como ponto de trânsito por dois motivos. O primeiro deriva do melhoramento dos sistemas de inspeção utilizados pelas autoridades locais e por aquelas norte-americanas na área caribenha e centro-americana, tradicional rota utilizada pelos traficantes. Nos últimos anos, por exemplo, surgiram bases de inspeção norte-americanas dos Andes às ilhas caribenhas. Também as autoridades holandesas intensificaram a inspeção com patrulhas aéreas baseadas nas ilhas de Curaçao e Saint Martin.
O segundo fator está ligado à diminuição do consumo de cocaína, que se registrou nos Estados Unidos diante de um aumento da demanda na Europa. Se na América do Norte há o mais alto número de consumidores mundiais (6 milhões e meio, correspondente a cerca da metade do consumo mundial), a tendência é diminuir a demanda.
De 1998 a 2004, de fato, se registrou uma queda de 20% da difusão desta substância. No mesmo período, na Europa ocidental, onde os consumidores de cocaína são 3 milhões e meio (26% do total mundial), se notou um aumento do consumo e da difusão do “pó branco”. Na Espanha e no Reino Unido, este dado é de 2%.
A África, portanto, é uma cômoda e segura rota para alcançar um mercado em crescimento.
Além disso, como efeito colateral criou-se um mercado africano que está registrando nos últimos anos preocupantes aumentos.
A crescente disponibilidade de cocaína se traduz, com efeito, em um aumento do consumo desta substância na África. Segundo os dados do UNODC, no período 1992-2004 o abuso da cocaína na África cresceu em um ritmo mais sustentado do que no restante do mundo. Este incremento é mais remarcado nos países da África meridional e nos da África ocidental.
Se forem analisados os dados das pessoas que recorrem aos tratamentos de desintoxicação, o aumento do consumo de cocaína emerge com evidência. No início dos anos 90, as pessoas em tratamento por abuso de cocaína eram pouquíssimas, no final de 1996 constituíam 1.5% dos casos tratados pelas estruturas de recuperação dos toxicômanos, no biênio 1999-2000 eram 6%. No período 2001-2004, notou-se uma inflexão na porcentagem de pessoas que pediam para ser tratadas da dependência de cocaína (menos de 5%).
A partir do final de 2004, este dado está em crescimento: de 7,5% em 2004 passou-se a 8,5% nos primeiros meses de 2005.

A COCAÍNA NA ÁFRICA OCIDENTAL
O país tradicionalmente mais envolvido no narcotráfico é a Nigéria. Lá, com efeito, em 1993 houve a primeira grande apreensão de cocaína na África e as organizações criminais nigerianas estão perfeitamente inseridas no sistema criminal global e transnacional. A afirmação das máfias nigerianas deriva também da pertença da Nigéria ao Commonwealth, que permitiu abrir estreitas relações comerciais com o subcontinente indiano, produtor de ópio e de heroína, e com o mundo anglo-saxão consumidor.
No final dos anos 80, registrou-se um incremento importante no papel de centro estratégico e, em 1992, as apreensões de cocaína no aeroporto de Lagos foram tão relevantes que as autoridades nigerianas suspenderam os vôos diretos para o Rio de Janeiro. Desde então, os traficantes nigerianos são considerados os principais transportadores da droga, uma verdadeira indústria a serviço do comércio de heroína e da coca. Eles estão presentes em todos os pontos-chaves da produção e do tráfico de drogas. Graças aos compatriotas residentes no exterior, formaram clãs criminais comparáveis aos colombianos, turcos e chineses.
As organizações mafiosas nigerianas, como as outras, se baseiam na solidariedade étnica, de clã e de famílias. Já em 1995 as autoridades norte-americanas estimavam que 50% da heroína circulante em seu país era introduzida pelos nigerianos, os quais usam a Polônia e a Hungria como pontos de trânsito para a cocaína destinada à Europa ocidental.
Um dos países da África ocidental dos quais se têm estatísticas confiáveis sobre o incremento do tráfico de cocaína é Gana. Segundo os dados divulgados pelas autoridades locais, em um único ano as apreensões de cocaína aumentaram 40 vezes, passando dos 15 quilogramas de 2003 aos 617 quilos de 2004. A maior parte da cocaína é destinada ao mercado britânico.
Trata-se de um dado significativo, levando-se em consideração que, em termos porcentuais, as apreensões de cocaína aumentaram 18% em nível mundial e 4.000% em Gana de 2003 a 2004. No mesmo período, na África, as apreensões de cocaína aumentaram 3 vezes, passando das 1,1 tonelada para 3,6 toneladas.
Nos anos sucessivos, emergiram outros fatos que demonstram que Gana se tornou um importante ponto de passagem da cocaína na África ocidental. Em novembro de 2005, a polícia ganense apreendeu 588 quilos no decorrer de uma perquirição em uma habitação em East Lagon. Em abril de 2006, foram descobertos a bordo do navio MV Benjamin, atracado no porto de Tema, 2.310 quilos de cocaína.
Segundo um responsável do UNODC, as organizações de narcotraficantes tendem a fazer transitar a droga por meio da África ocidental porque, até agora, as autoridades alfandegárias européias e norte-americanas controlam com menos atenção as mercadorias e as bagagens provenientes da África em relação àquelas provenientes da América Latina. No caso de Gana, como de outros países da região, o fato de não estar inserido na lista dos países produtores de cocaína significa que as suas mercadorias não são sujeitas a inspeções detalhadas. Mas nos últimos anos, as coisas mudaram e Gana foi inserida na lista dos países “de alta prioridade” de inspeção.
Os traficantes buscam corromper os policiais e a polícia para permitir o trânsito das cargas de entorpecentes. Para investigar casos de corrupção de policiais, o Ministério da Fazenda de Gana criou uma Comissão de investigação, que recebeu o nome da sua Presidenta, Georgina Wood, que desempenhou importantes cargos na polícia e na magistratura local. O “Georgina Wood Committee” nasceu após duas importantes apreensões de cocaína citadas precedentemente, nas quais resultaram envolvidos alguns policiais. Entre as recomendações apresentadas pelo Comitê, está reforçar o patrulhamento das costas do país por meio seja da potenciação dos meios da marinha e da aeronáutica, seja com a criação de um serviço de guarda-costas independente.
A Guiné-Bissau é um outro país que se tornou ponto de trânsito da cocaína da América Latina à Europa, como demonstrado numa recente operação que levou à captura de 674 quilos de cocaína e à detenção de alguns narcotraficantes sul-americanos. Na África ocidental, os países mais envolvidos pelos fluxos de droga, além de Gana, são Costa do Marfim, Senegal e Nigéria.
Os traficantes de cocaína na Guiné-Bissau estão ligados aos que passam através do vizinho Senegal, como emergiu da operação efetuada no final de junho de 2007 pela polícia de Dakar, que levou à apreensão de mais de duas toneladas de cocaína. Parte da droga se encontrava em um veleiro que estava à deriva diante das costas senegalesas, e uma outra em uma habitação na área balneária de Mbour, a sul de Dakar.
No veleiro os investigadores encontraram uma documentação que comprova que os narcotraficantes utilizam a Guiné-Bissau como depósito de trânsito da cocaína proveniente da América Latina e destinada à Europa. Também a nacionalidade dos detidos demonstra o grau de internacionalização das organizações criminais dedicadas ao narcotráfico. Além de três cidadãos sul-americanos (um colombiano, um venezuelano e um equatoriano) e de uma cidadã francesa, a polícia deteve três senegaleses. A partir dos documentos detidos, além disso a polícia senegalesa descobriu que os narcotraficantes efetuaram diversas viagens aos países limítrofes: Serra Leoa, Guiné Conakry, Guiné-Bissau e Gâmbia.
As autoridades senegalesas reiteraram que em seu país não existem depósitos de cocaína, mas admitiram a infiltração de grupos criminais estrangeiros, que utilizam o aeroporto de Dakar para enviar cocaína à Europa. No período de janeiro a junho de 2007, a polícia senegalesa afirma ter apreendido no aeroporto de Dakar 44 quilos de cocaína e detido cerca de 30 “mulas” da droga, a maior parte dos quais nigeriano.
Está em aumento também o número de “mulas” da Guiné-Bissau detidos no momento do embarque para Portugal, onde podem entrar sem visto. Além disso, foram descobertas algumas operações de reciclagem de dinheiro sujo por parte de organizações estrangeiras. A apreensão recorde efetuada pela polícia senegalesa, equivalente ao total de apreensões de cocaína na África ocidental de setembro de 2006 a maio de 2007, é somente o último de uma série efetuada nos primeiros seis meses de 2007 em várias localidades da África ocidental.
Entre essas, há 800 quilos de cocaína recuperados no mar diante das ilhas Canárias, e uma quantia análoga apreendida pela marinha francesa no largo da Costa do Marfim. Além dos navios, as organizações criminais recorrem a aviões para alimentar seus tráficos ilícitos.
Na Venezuela foi bloqueado um avião com 2,5 toneladas de cocaína, que se preparava a partir para Serra Leoa, enquanto em maio de 2007 foram apreendidos 600 quilos de cocaína a bordo de um Cessna, matriculado na Venezuela, que efetuou uma aterrissagem de emergência em Nouadhibou, na Mauritânia.
Segundo um responsável do ONUDC, para a África ocidental o aumento de confiscos das cargas de cocaína na região é devido mais a incidentes de percurso que a uma maior eficácia da polícia.
O funcionário considera que a cada dez expedições de droga em direção à Europa, nove chegam a seu destino sem problemas.

O SAHEL: NOVA FRONTEIRA DO NARCOTRÁFICO?
Das costas da África ocidental as organizações de narcotraficantes estão progressivamente se expandindo aos países do Sahel, cujo papel estratégico entre o Atlântico e o Magreb, e, portanto o Mediterrâneo, é apreciado também pelos traficantes de seres humanos e, provavelmente, pelo terrorismo internacional. Não se pode excluir a priori uma interconexão entre essas realidades criminais, de que são cúmplices a debilidade dos Estados e a vastidão dos territórios a controlar. Um realidade que suscita o alarme dos governos interessados.
Em abril deste ano, depois da apreensão de três caminhões cheios de droga e armas, o Presidente do Níger, Mamadou Tandja, declarou que o exército local pretende aumentar os esforços para impedir que o seu país seja “circundado” pelos traficantes de armas e de droga, que são uma “ameaça real” para o país.
Também Burkina Fasso não foge ao fenômeno. Segundo o Coordenador do Comitê contra os tráficos ilícitos de droga em Burkina Fasso, o volume das cargas de droga interceptadas nos primeiros três meses de 2007 é “incrível”. O funcionário indica a existência de uma nova rota de trânsito da droga no oeste e no sudoeste do país. No início de abril de 2007, 49 quilos de cocaína, num valor de 10 milhões de dólares, foram interceptados pela polícia de Burkina Fasso na fronteira com o Mali, que é um importante ponto de trânsito para o tráfico de seres humanos. Países como Mali e Níger são há milênios atravessados por vias de caravanas, que agora se converteram num uso criminal: para o tráfico de seres humanos, mas também de armas, droga e cigarros de contrabando. “Nos últimos meses notamos um aumento da utilização dos países do Sahel, como Mali e Níger, para o tráfico de cocaína”, disse Antonio Razzitelli, Diretor do departamento do UNODC para a África ocidental.
Segundo o órgão anticrime da ONU, os traficantes importam a droga por meio das cidades costeiras como Conakry, na Guiné, Dakar, no Senegal, e Lomé, no Togo, e depois a transportam para as cidades do interior, como Bamako, no Mali, e Ouagadougou, em Burkina Fasso. Dessas localidades, a cocaína prossegue a sua viagem até a Europa.
Segundo o responsável do Comitê contra os tráficos ilícitos de droga em Burkina Fasso, é preciso coordenar os esforços entre as polícias dos Estados da região. “Há uma necessidade urgente de reunir todos os entes nacionais antidroga da região para encontrar o modo de cooperar entre si, para tentar deter as redes criminais”, disse, destacando que a escassa cooperação entre as fronteiras dos países do Sahel e a falta de meios das polícias locais constituem problemas adjuntos para uma eficaz ação de contraste às redes criminais.

O MERCADO DA CÂNABIS
Enquanto a África permanece, no momento, somente um local de trânsito e um mercado residual para drogas como cocaína e heroína, a principal produção local de substâncias entorpecentes é representada pela cânabis.
O cultivo da cânabis foi introduzido na África oriental pelos mercantes árabes, pérsios e indianos no século XII. De lá se difundiu primeiramente na África austral, no século XV, e depois no Congo e em Angola no século XIX. Somente depois da Segunda Guerra Mundial a cânabis chegou à África ocidental, levada por soldados nigerianos e ganenses que combateram com as tropas britânicas na Birmânia (atual Mianmar), onde adquiriram o hábito de fumar marijuana. Este fato explica porque nos países onde a cânabis é conhecida há mais tempo, ela é utilizada na medicina tradicional, enquanto na África ocidental é usada para fins “recreativos”. Até os anos 80, porém, a produção africana da cânabis permaneceu limitada. A partir daqueles anos, porém, notou-se um incremento notável da superfície cultivada com a cânabis para fins comerciais.
A produção desta substância se divide em três categorias: a erva da cânabis (flores e folhas), resina ou haxixe (secreções emitidas pela planta durante a fase de florescimento) e óleo de haxixe, o menos utilizado. Segundo o World Drug Report 2006, a erva da cânabis é cultivada, sobretudo de modo ilegal, em 176 países em todo o mundo. A África representa 27% da produção mundial e os principais produtores são Marrocos (3.700 toneladas), África do Sul (2.200 toneladas) e Nigéria (2 mil toneladas).
No que concerne ao haxixe, o principal produtor mundial é Marrocos, que fornece os mercados norte-africanos e europeus. Graças ao esforço das autoridades marroquinas nos últimos anos, deu-se a diminuição da produção local da cânabis, à qual corresponde um aumento da produção em outros países, da Ásia ocidental (Afeganistão, Paquistão) à Albânia. O UNODC reconhece que desde 2003 o governo de Rabat conduziu uma campanha para estimar a produção de resina da cânabis no país, em cooperação com a Agência anticrime das Nações Unidas. Segundo uma investigação efetuada em 2003, a produção da cânabis foi de 3.060 toneladas, cultivada em 134 mil hectares de terra na região do Rif (norte do país) por 96.600 famílias de camponeses. A investigação feita em 2004 registrou uma diminuição de 10% das terras cultivas com a cânabis, que passaram a 120.500 hectares, com uma produção estimada de 2.760 toneladas.
Em 2005 notou-se uma ulterior diminuição de 37%, sendo a superfície cultivada com a cânabis de 72.500 hectares, enquanto a produção diminuiu para 1.070 toneladas. Quanto às apreensões da cânabis, nos últimos 12-15 anos se registrou um aumento da porcentagem mundial de apreensões no continente africano desta substância. Enquanto em 1990 16% do total mundial das apreensões da cânabis ocorria na África, em 2002 este dado subiu para 20%, para alcançar 31% em 2004. O aumento das apreensões na África é determinado sobretudo pelo aumento dos controles policiais e alfandegários efetuados pela Nigéria e pela África do Sul.
O principal mercado de consumo da cânabis é a Europa ocidental, e 80% da cânabis consumada na Europa provém do Marrocos, passando pela Espanha e pela Holanda e dali distribuída aos outros países. O terceiro mercado mundial de consumo é representado pelos países do norte da África, onde a cânabis provém principalmente do Marrocos. Parte da cânabis produzida no Afeganistão e Paquistão, além disso, alimenta o mercado dos países da África oriental.
No que concerne às problemáticas sociais ligadas ao consumo da cânabis, é preciso recordar que esta substância é a droga mais difundida e usada em nível mundial. Estima-se que, em 2004, 162 milhões de pessoas a tenham usado, o equivalente a 3,9% da população mundial entre 15 e 64 anos. Em termos relativos (a porcentagem de habitantes que faz uso da cânabis em relação a outras substância entorpecentes), a cânabis é prevalentemente utilizada na Oceania, seguida por América do Norte e África. Desde 1992, na África, notou-se também uma tendência ao aumento do seu consumo, em particular na Argélia, Nigéria e Zâmbia.
É provável que a tendência ao uso desta droga seja subestimada em diversos países da África, que não têm uma capacidade de coleta de dados adequados para seguir o fenômeno. Segundo dados parciais, notou-se nos últimos anos um forte incremento do abuso da cânabis na África ocidental, oriental e no norte da África, em sintonia com a tendência em nível global de uma ulterior expansão do consumo desta substância.
Até os anos 80, porém, a produção africana da cânabis permaneceu limitada. A partir daqueles anos, porém, notou-se um incremento notável da superfície cultivada com a cânabis para fins comerciais.
A produção africana de droga subtraiu terras e recursos à agricultura, isso porque naquele período se registrou uma forte queda dos preços dos produtos agrícolas em todo o mundo. A agricultura africana, já frágil, entrou em crise. Diversos camponeses, portanto, deixaram-se tentar pelo cultivo da cânabis em detrimento do cultivo de produtos lícitos.
Um simples cálculo econômico demonstra o forte poder de atração de uma semelhante produção; já em 1995, na Guiné, um saco de 20-25 quilos de marijuana tinha o valor de aproximadamente a renda anual média de uma famílias de oitos pessoas que se dedica à produção de cultivo lícito. No mercado de Kinshasa, na República Democrática do Congo (RDC), um saco de 25 quilos de marijuana é vendido por mil dólares, enquanto um saco de 80 quilos de mandioca vale somente 10 dólares.
Compreende-se, assim, que o cultivo desta substância entorpecente tem sérias repercussões na auto-suficiência alimentar de diversos países africanos. Segundo a associação de luta à toxicomania de Kinshasa, LIPILDRO, por causa do abandono dos cultivos legais por aqueles da cânabis, até 2010 a maior parte das cidades congolesas será atingida por um crise alimentar.
Além disso, na RDC se verificaram experiências para o cultivo da papoula de ópio (na província do Equador) e da cocaína (na região do Shaba). O mais importante produtor da cânabis na África subsaariana permanece, porém, a África do Sul. Importante produções são sinalizadas também em Lesoto e em Malauí.

DROGAS SINTÉTICAS
A produção de drogas sintéticas é limitada na África, com exceção da África do Sul, onde a fabricação de metanfetaminas e methaqualone aumentou nos últimos anos. Os dados sobre a descoberta de laboratórios clandestinos confirmam esta tendência.
Com efeito, se passou da descoberta à destruição de um laboratório por ano no período 1995-1999, aos 17 no período 2000-2003, até aos 28 destruídos somente em 2004. Um outro dado que demonstra o incremento do uso de drogas sintéticas na África do Sul é o aumento das apreensões de ecstasy: em 2004, houve um incremento de 385% das apreensões em relação ao ano precedente.
Além disso, as drogas sintéticas faziam parte do programa de guerra secreta química e biológica aplicado pelo regime do apartheid. Segundo os testemunhos reunidos durante o processo contra o responsável do programa, doutor Wouter Basson (definido “Doutor Morte” pela imprensa local), no âmbito do chamado “Project Coast”, entre 1992 e 1993 os laboratórios relacionados aos serviços secretos sul-africanos tinham produzido mais de 900 quilos de cristais de ecstasy (correspondente a 73 milhões de pílulas). No ano precedente, uma empresa de serviços do regime do apartheid tinha importado 500 quilos desta substância da Croácia.
Essas quantidades de drogas sintéticas foram importadas e produzidas para serem usadas como agente incapacitador para o controle da multidão (e talvez também para drogar secretamente os líderes da oposição para desacreditá-los, fazendo-os cometer gestos ridículos em público) e para serem distribuídas nas favelas habitadas pela população negra para promover o abuso de droga e a dependência.
O fim do regime do apartheid bloqueou este e outros projetos criminais aplicados no âmbito do “Project Coast”. Antes da queda do regime, porém, o dr. Basson tinha organizado a venda das empresas de cobertura dos serviços secretos sul-africanos, alguns dos quais fabricavam armas químicas e biológicas e drogas sintéticas.
Além disso, desapareceram centenas de quilos de substâncias químicas usadas na produção desses instrumentos de morte.
O dr. Basson é suspeito de ter aberto um empresa privada e, com efeito, quando foi detido em 1997 foi encontrado em posse de pílulas de ecstasy num valor de 20 mil dólares.

ÁFRICA ORIENTAL: UMA SITUAÇÃO PREOCUPANTE
Na África oriental, o Quênia é o principal ponto de trânsito da cocaína. Somente em 2004 foi apreendida 1,1 tonelada de cocaína entre a capital Nairóbi e o centro costeiro de Malindi. No decorrer da operação da polícia, que levou à descoberta desta importante carga de droga, foram detidos diversos funcionários da companhia aérea local (que resultou estranha ao narcotráfico), alguns dos quais foram capturados em Londres.
Das investigações emergiu que a droga que passava pelo Quênia era inserida no mercado britânico com a colaboração de alguns funcionários infiéis da companhia aérea. Além do Quênia, os países da África oriental interessados pelo narcotráfico são Etiópia, Botsuana, Zâmbia e África do Sul. Neste último, segundo o South African Institute of International Affaire, existem 500 mil pessoas que fazem uso de cocaína, enquanto 1/3 dos adolescentes utiliza entorpecentes. Segundo o centro de estudos sul-africano, no país atuam 300 organizações criminais internacionais envolvidas no narcotráfico.
Os países da região se tornaram não somente uma região de trânsito, mas também um novo mercado para os entorpecentes e, em particular, para a cocaína. Na Zâmbia, por exemplo, 80% da cocaína que chega ao país é transferida para a Europa e o restante 20% é consumado localmente.
A Interpol lançou o alarme sobre o crescente consumo de entorpecentes na África. “As drogas não somente transitam nos países, mas permanecem lá”, disse um responsável da organização internacional de polícia diante dos delegados de 150 organismos de polícia de todo o mundo, reunidos para o encontro anual da Interpol no Rio de Janeiro (Brasil). “Já se tornaram habituais as cargas de diversas toneladas de cocaína que passam pela África”, acrescentou.
Segundo um analista presente no seminário, se a tendência ao incremento do uso de entorpecentes continuar avançando, a África deverá enfrentar uma grave crise social derivante da droga.
As condições climáticas da maior parte da África são favoráveis ao cultivo da cânabis. Trata-se de um cultivo que permite um alto lucro para o agricultor e necessita de um trabalho menos intensivo em relação aos outros cultivos.
Inteiras famílias de agricultores podem viver, assim, de modo decente e permitir-se comprar alimento e medicamentos e enviar seus filhos à escola.
A cânabis é cultivada na África principalmente para o mercado local, mas nos últimos anos notou-se um aumento dos tráficos da cânabis originados na África subsaariana. Os maiores cultivos da cânabis se encontram em Comores, Etiópia, Quênia, Madagascar, Tanzânia e Uganda.
No Quênia, o cultivo da cânabis tem uma antiga tradição, mas nos últimos anos se tornou primeiramente uma produção limitada ao mercado local, para depois transformar-se em uma verdadeira empresa comercial ilícita estendida internacionalmente.
A cânabis é cultivada na região ocidental e naquela do Monte Quênia, onde, segundo alguns relatórios, existem cerca de 1.500 hectares cultivados com a cânabis. Os cultivos de droga estão escondidos entre aqueles tradicionais destinados à alimentação, mas há também cultivos menores em algumas áreas protegidas da reserva natural nacional.
Também as regiões costeiras se tornaram produtores da cânabis. Lá, com efeito, se instalaram diversos agricultores provenientes do interior, que lá encontraram áreas férteis e pouco controladas pela polícia, e um mercado constituído pela população local, pelos turistas e pelos residentes estrangeiros que preferem as costas do país.
Quanto ao ópio, no passado foram sinalizados alguns cultivos no Quênia e nas costas de Madagascar. Desde 1993 não foram sinalizados cultivos de opiáceos na África oriental, mas a vastidão do território e os escassos controles das autoridades locais tornam sempre possível uma retomada do cultivo da papoula de ópio.
No que diz respeito à produção local de drogas sintéticas, a África oriental é o ponto de trânsito do methaqualone (Mandrax) proveniente da Índia e destinado ao mercado sul-africano.
Nos últimos anos, a redução do Mandrax proveniente da Índia gerou uma produção local desta substância. Com efeito, foram descobertos laboratórios químicos clandestinos utilizados para a fabricação desta droga sintética em alguns países da África oriental e meridional.
Nos casos dos laboratórios descobertos no Quênia e na Tanzânia, se tratava somente de pequenos centros onde o pó do Mandrax ainda proveniente da Índia era transformado em pílulas, mas em outros casos deparou-se com verdadeiras oficinas para a fabricação do Mandrax com precursores químicos, cuja proveniência permaneceu desconhecida. A este propósito, as substâncias que mais causam preocupação são as efedrinas, as pseudo-efedrinas, o anidrido acético e o ácido N-acetilantranílico (utilizado na fabricação do Mandrax) e o pergamenato de potássio.
O mais famoso cultivo de planta entorpecente local é o khat, que é uma produção legal em diversos países da África oriental. O khat é cultivado na Etiópia e no Quênia e, em medida menos extensa, na Tanzânia, Comores e na parte setentrional de Madagascar. É exportado para os principais mercados da área (Djibuti, Eritréia, Somália e Iêmen), além da Europa e da América setentrional.
O uso do khat continua a expandir-se no Chifre da África e tem um papel-chave na contínua instabilidade da Somália, onde se calcula que a população gasta todos os anos 64 milhões de dólares por ano para comprar o khat. Trata-se de um quantia que é quase o dobro do total das ajudas internacionais doadas ao país. O khat não somente contribui para provocar problemas na sociedade, criando pessoas afetadas pela dependência de entorpecentes, mas tem também um papel na difusão no país de armas leves, frequentemente repassadas em troca de um pouco de droga.
As organizações de narcotraficantes olham com interesse aos países da África oriental e meridional por causa de suas infra-estruturas portuárias e aeroportuárias, dos comprimentos de suas costas e dos fluxos turísticos.
Todos elementos que permitem esconder os tráficos de droga. O Quênia tem o maior porto comercial da região, Mombasa, que serve a maior parte dos países privados de acesso direto ao mar, enquanto o aeroporto de Nairóbi é um dos mais traficados da área. As redes do narcotráfico utilizam também os portos de Dar-es-Salaam (na Tanzânia), Djibuti, Durban (na África do Sul) e Maputo (em Moçambique) e estão expandindo suas atividades também na Etiópia, Mauritius, Tanzânia e Uganda. Esses últimos países são usados como pontos de trânsito para a droga enviada para o Quênia, a África do Sul e a África ocidental e dessas áreas para a Europa e a América do Norte.
A maior parte das substâncias entorpecentes chega à região via mar, escondida nas cargas dos containers transportados pelos navios mercantis que navegam o Oceano Índico. Em alguns casos, os navios dos narcotraficantes se encontram em alto mar com embarcações menores, que levam para a terra a carga ilícita. Grandes quantidades de heroína chegam assim à região, mas se recorre também a carteiros, homens e mulheres, que chegam com vôos comerciais, e ao envio por correio.
Entre os países da África oriental interessados pelo tráfico e pelo consumo de substâncias entorpecentes, está Uganda.
Segundo um recente relatório do UNODC, “Uganda se tornou o país líder no tráfico e no consumo de droga em relação ao restante dos Estados da África oriental”. Entre as drogas presentes no mercado ilícito ugandense, existem a cânabis, a heroína, a cocaína e o mandrax, além do khat. Segundo a agência anticrime da ONU, o aumento do consumo de substâncias entorpecentes é devido a “duas décadas de conflitos armados e à falta de lei, que prejudicaram gravemente a infra-estrutura policial”.
O relatório observa que as condições climáticas de todo o território ugandense são favoráveis ao cultivo da cânabis: “O cultivo ilícito da planta é, porém, relevante em áreas remotas das regiões meridional, ocidental, central, oriental e norte-oriental. As dimensões exatas dos cultivos da cânabis não são conhecidas, mas se notou um aumento da produção da cânabis sobretudo para a exportação”. O aeroporto de Entebbe é, por fim, utilizado como ponto de trânsito para o envio de heroína e de mandrax ao extremo Oriente e à África do Sul.

CONCLUSÕES
A África é um ponto de trânsito sempre mais importante para as organizações de narcotraficantes, apesar de, no momento, a maior parte das apreensões de entorpecentes ocorrer em outras partes do mundo.
Vista a escassa eficiência das polícias africanas e a relativa recente conscientização do problema por parte dos entes locais e internacionais, pode-se supor que a quantidade das apreensões de droga na África não corresponda à entidade efetiva das cargas que transitam pelo continente.
A África, porém, não é mais somente um ponto de passagem da droga proveniente da América Latina e da Ásia em direção à Europa e à América setentrional, mas já se tornou um mercado ainda talvez “residual”, mas em todo caso que não pode ser ignorado pelas redes de narcotraficantes.
Redes nas quais estão presentes africanos, em particular nigerianos, em papéis não somente de gregários, mas também de organizadores. O crescente consumo de drogas por via endovenosa em diversos países africanos, como Tanzânia e Quênia, agrava o problema da difusão da AIDS.
Na Nigéria, por exemplo, um estudo revelou que o consumo de drogas se expande no mesmo ritmo do aumento das pessoas infetadas com o vírus HIV, em cidades como Kano e Port Harcourt.

 
At 9/17/2007 3:07 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

A DROGA NA ÁFRICA: UM PROBLEMA MUNDIAL

A droga já é um problema na África e representa um ulterior obstáculo ao desenvolvimento do continente. É o que afirmam diversos organismos internacionais encarregados da luta ao tráfico de entorpecentes. Já em 2001, um relatório do Órgão Internacional de Controle das Drogas afirmava que “graças à sua experiência no campo do contrabando de haxixe e de heroína, os cartéis da droga da África ocidental buscam novos contatos na América Latina para estender o tráfico de cocaína a toda a região da África subsaariana”.
Trata-se de uma reviravolta fundamental na estratégia do narcotráfico mundial, que vê a África se tornar uma das áreas “fulcro” para a distribuição de drogas em todo o mundo. Até os primeiros anos da década de 90 do século passado, a África era mantida às margens das rotas da droga. A mudança ocorreu em 1993, quando foram apreendidos na Nigéria 300 quilos de heroína provenientes da Tailândia. É o sinal de uma mudança que vê a transformação de tantos pequenos contrabandistas africanos (a maioria nigerianos) de simples transportadores por conta de terceiros a membros de gangues guiadas por africanos, capazes de tratar no mesmo nível com análogas organizações de outros continentes.
A presença dessas organizações criminais, a forte urbanização, a perda dos valores tradicionais africanos e a difusão de uma cultura hedonista são todos fatores que criaram as premissas para um mercado africano da droga. A África, portanto, não é somente um local de trânsito dos entorpecentes, mas terreno “virgem” para o tráfico de droga.

PREMESSA METODOLÓGICA
Os dados apresentados são úteis para analisar a tendência (incremento ou decremento) do tráfico de entorpecentes, apesar de serem muito provavelmente aproximativos.
Segundo um estudo crítico efetuado pela associação ‘Libera’ do pe. Ciotti, com efeito os dados apresentados pelos entes antidrogas internacionais e de alguns Estados não relatam fielmente toda a produção mundial de cocaína. Segundo este estudo (referido somente à cocaína e não a outras drogas), existe uma discrepância entre a estimativa sobre a produção mundial de cocaína efetuada pela ONU e os dados relativos às apreensões e ao consumo de cocaína somente na América.
Segundo os elaboradores do relatório, com efeito, subtraindo das 937 toneladas de produção, indicada pelas Nações Unidas em 2004, as cerca de 450 consumadas nos Estados Unidos, Canadá, México e em toda a América do Sul e as cerca de 490 toneladas apreendidas em todas as Américas, se chegaria a um saldo negativo de 3 toneladas.
“A este ponto, não se saberia mais de onde subtrair as cerca de 99 toneladas de cocaína apreendidas no “resto do mundo”, afirma o relatório. Fazendo-o, se chegaria ao paradoxal saldo negativo de 102 toneladas de cocaína “não resultantes”, não tendo feito frente ainda à demanda de cocaína no “resto do mundo”, estimada em ao menos 300 toneladas, se chega a calcular uma espécie de buraco negro de aproximadamente 400 toneladas de cocaína não resultantes.
Este buraco negro assume proporções ainda mais macroscópicas, cerca de 700 toneladas, se calculado com base nos dados da Agência antidroga norte-americana.
Apesar dos seus limites, os relatórios dos organismos internacionais de luta contra a droga permanecem frequentemente os únicos instrumentos para analisar o fenômeno do narcotráfico.

A HEROÍNA NA ÁFRICA
A apreensão de opiáceos na África registrou um forte incremento nos últimos anos. Segundo dados da ONU, por exemplo, em 2004 ocorreu um incremento da apreensão de heroína de 60% em relação ao ano precedente.
A maior parte deste incremento é devido à apreensão ocorrida na África central e ocidental, que quase triplicou de 2003 a 2004. A heroína que passa pela África é destinada em primeiro lugar aos mercados europeus e, em segundo lugar, aos da América do Norte. A heroína provém dos países do sudoeste e sudeste da Ásia.
A quantia total dos opiáceos apreendida na África permanece ainda modesto (0,3% do total de apreensões em nível mundial). Porém, deve-se levar em consideração que não existem estatísticas confiáveis e que o nível das apreensões não reflete o verdadeiro fluxo de narcóticos que passa pela África por causa da debilidade da polícia local, que tem dificuldade em interceptar as cargas ilícitas.
No que concerne ao uso de opiáceos na África, segundo os dados do Departamento das Nações Unidas para a luta à criminalidade (UNODC), nota-se um aumento de seu consumo no continente africano, em particular na África oriental e naquela austral e em alguns países da África ocidental. Segundo os especialistas das Nações Unidas, o crescimento do consumo de heroína nessas áreas deriva do fato de que são utilizadas como locais de trânsito dos narcotraficantes, os quais, porém, não desdenham em criar um mercado local.
Na África do Sul, um dos poucos países africanos que dispõe de dados confiáveis, até os primeiros anos do novo milênio, o pedido de tratamentos por abuso de heroína representava somente 1% do total dos pedidos de cura por dependência de substâncias entorpecentes (incluído o álcool). Em 2005, esta porcentagem subiu para 7%.
Segundo o relatório do UNODC sobre o tráfico de entorpecentes de 2007, o mercado da heroína está dividido deste modo: a heroína afegã é destinada aos mercados da Ásia central, da Europa, do Oriente Médio e da África; aquela produzida no chamado “triângulo de ouro” alimenta o mercado chinês e o dos outros países asiáticos e da Oceania; aquela proveniente da América Latina serve o mercado norte-americano.
O relatório nota, porém, que “uma parte pequena, mas em crescimento, da produção de opiáceos afegãos é enviada à América setentrional, seja por meio da África oriental e ocidental, seja por meio da Europa”.
O relatório afirma que a demanda global de heroína permaneceu estável, “apesar de importantes incrementos nos países que se encontram no caminho das principais rotas do narcotráfico”.
Entre esses estão também diversos países africanos, afirma o documento, que destaca os efeitos prejudiciais da difusão da heroína e de outras substâncias entorpecentes nas populações já duramente provadas pela pobreza e pela difusão da AIDS.
Os últimos dados do UNODC mostram um forte incremento do uso de heroína em alguns países africanos como Moçambique, Zâmbia, Quênia, Tanzânia e Costa do Marfim, enquanto outros países tiveram um aumento mais contido. Entre esses, África do Sul, Madagascar, Gana, Libéria e Senegal.

DOS ANDES AO KILIMANJARO: UM FLUXO DE COCAÍNA INVADE A ÁFRICA
O dado mais preocupante, porém, é o da cocaína que transita da África em direção principalmente à Europa e, secundariamente, à América setentrional.
A importância da África, e em particular da África ocidental, como ponto de trânsito da cocaína em direção aos ricos mercados ocidentais é demonstrada pelo nível das apreensões registradas nos últimos anos. As apreensões de cocaína em toda a África aumentaram três vezes entre 2003 e 2004, enquanto no mesmo período as apreensões na África ocidental e central aumentaram seis vezes. As apreensões mais importantes no período 2000-2004 se registraram em Cabo Verde, seguido por África do Sul, Quênia, Gana e Nigéria. Mas as apreensões de cocaína na África representam somente 1% do total mundial das apreensões desta substância entorpecente. Também neste caso, porém, o dado é prejudicado devido à debilidade das polícias locais, incapazes de interceptar a maior parte dos fluxos de cocaína proveniente da América do Sul.
Em 2004, 50% das apreensões de cocaína no continente ocorreram na África ocidental e central. A zona de passagem mais utilizada pelos traficantes de cocaína é o Golfo da Guiné, de onde a substância entorpecente é transportada para a Europa em pequenas quantidades, através dos chamados “mulas”, pessoas que assumem o risco de ingerir óvulos de cocaína com a esperança de superar as alfândegas nos aeroportos de destinação. Nos últimos anos, também na África oriental aumentou a quantia de cocaína apreendida, indicando uma tendência a utilizar em medida crescente esta área como ponto de trânsito para a cocaína destinada à Europa e à Ásia.
Um dos países mais atingidos pelo fenômeno é o Quênia, onde em 2004 foi apreendida uma tonelada de cocaína. Em termos gerais, o crescimento da difusão da cocaína na África é demonstrada pelo fato que dos 32 países africanos que fornecem estatísticas sobre as apreensões de entorpecentes na UNODC, 23 (72%) relataram apreensões de cocaína, contra 34% em 1990.
Os traficantes de cocaína tendem a servir-se da África cada vez mais como ponto de trânsito por dois motivos. O primeiro deriva do melhoramento dos sistemas de inspeção utilizados pelas autoridades locais e por aquelas norte-americanas na área caribenha e centro-americana, tradicional rota utilizada pelos traficantes. Nos últimos anos, por exemplo, surgiram bases de inspeção norte-americanas dos Andes às ilhas caribenhas. Também as autoridades holandesas intensificaram a inspeção com patrulhas aéreas baseadas nas ilhas de Curaçao e Saint Martin.
O segundo fator está ligado à diminuição do consumo de cocaína, que se registrou nos Estados Unidos diante de um aumento da demanda na Europa. Se na América do Norte há o mais alto número de consumidores mundiais (6 milhões e meio, correspondente a cerca da metade do consumo mundial), a tendência é diminuir a demanda.
De 1998 a 2004, de fato, se registrou uma queda de 20% da difusão desta substância. No mesmo período, na Europa ocidental, onde os consumidores de cocaína são 3 milhões e meio (26% do total mundial), se notou um aumento do consumo e da difusão do “pó branco”. Na Espanha e no Reino Unido, este dado é de 2%.
A África, portanto, é uma cômoda e segura rota para alcançar um mercado em crescimento.
Além disso, como efeito colateral criou-se um mercado africano que está registrando nos últimos anos preocupantes aumentos.
A crescente disponibilidade de cocaína se traduz, com efeito, em um aumento do consumo desta substância na África. Segundo os dados do UNODC, no período 1992-2004 o abuso da cocaína na África cresceu em um ritmo mais sustentado do que no restante do mundo. Este incremento é mais remarcado nos países da África meridional e nos da África ocidental.
Se forem analisados os dados das pessoas que recorrem aos tratamentos de desintoxicação, o aumento do consumo de cocaína emerge com evidência. No início dos anos 90, as pessoas em tratamento por abuso de cocaína eram pouquíssimas, no final de 1996 constituíam 1.5% dos casos tratados pelas estruturas de recuperação dos toxicômanos, no biênio 1999-2000 eram 6%. No período 2001-2004, notou-se uma inflexão na porcentagem de pessoas que pediam para ser tratadas da dependência de cocaína (menos de 5%).
A partir do final de 2004, este dado está em crescimento: de 7,5% em 2004 passou-se a 8,5% nos primeiros meses de 2005.

A COCAÍNA NA ÁFRICA OCIDENTAL
O país tradicionalmente mais envolvido no narcotráfico é a Nigéria. Lá, com efeito, em 1993 houve a primeira grande apreensão de cocaína na África e as organizações criminais nigerianas estão perfeitamente inseridas no sistema criminal global e transnacional. A afirmação das máfias nigerianas deriva também da pertença da Nigéria ao Commonwealth, que permitiu abrir estreitas relações comerciais com o subcontinente indiano, produtor de ópio e de heroína, e com o mundo anglo-saxão consumidor.
No final dos anos 80, registrou-se um incremento importante no papel de centro estratégico e, em 1992, as apreensões de cocaína no aeroporto de Lagos foram tão relevantes que as autoridades nigerianas suspenderam os vôos diretos para o Rio de Janeiro. Desde então, os traficantes nigerianos são considerados os principais transportadores da droga, uma verdadeira indústria a serviço do comércio de heroína e da coca. Eles estão presentes em todos os pontos-chaves da produção e do tráfico de drogas. Graças aos compatriotas residentes no exterior, formaram clãs criminais comparáveis aos colombianos, turcos e chineses.
As organizações mafiosas nigerianas, como as outras, se baseiam na solidariedade étnica, de clã e de famílias. Já em 1995 as autoridades norte-americanas estimavam que 50% da heroína circulante em seu país era introduzida pelos nigerianos, os quais usam a Polônia e a Hungria como pontos de trânsito para a cocaína destinada à Europa ocidental.
Um dos países da África ocidental dos quais se têm estatísticas confiáveis sobre o incremento do tráfico de cocaína é Gana. Segundo os dados divulgados pelas autoridades locais, em um único ano as apreensões de cocaína aumentaram 40 vezes, passando dos 15 quilogramas de 2003 aos 617 quilos de 2004. A maior parte da cocaína é destinada ao mercado britânico.
Trata-se de um dado significativo, levando-se em consideração que, em termos porcentuais, as apreensões de cocaína aumentaram 18% em nível mundial e 4.000% em Gana de 2003 a 2004. No mesmo período, na África, as apreensões de cocaína aumentaram 3 vezes, passando das 1,1 tonelada para 3,6 toneladas.
Nos anos sucessivos, emergiram outros fatos que demonstram que Gana se tornou um importante ponto de passagem da cocaína na África ocidental. Em novembro de 2005, a polícia ganense apreendeu 588 quilos no decorrer de uma perquirição em uma habitação em East Lagon. Em abril de 2006, foram descobertos a bordo do navio MV Benjamin, atracado no porto de Tema, 2.310 quilos de cocaína.
Segundo um responsável do UNODC, as organizações de narcotraficantes tendem a fazer transitar a droga por meio da África ocidental porque, até agora, as autoridades alfandegárias européias e norte-americanas controlam com menos atenção as mercadorias e as bagagens provenientes da África em relação àquelas provenientes da América Latina. No caso de Gana, como de outros países da região, o fato de não estar inserido na lista dos países produtores de cocaína significa que as suas mercadorias não são sujeitas a inspeções detalhadas. Mas nos últimos anos, as coisas mudaram e Gana foi inserida na lista dos países “de alta prioridade” de inspeção.
Os traficantes buscam corromper os policiais e a polícia para permitir o trânsito das cargas de entorpecentes. Para investigar casos de corrupção de policiais, o Ministério da Fazenda de Gana criou uma Comissão de investigação, que recebeu o nome da sua Presidenta, Georgina Wood, que desempenhou importantes cargos na polícia e na magistratura local. O “Georgina Wood Committee” nasceu após duas importantes apreensões de cocaína citadas precedentemente, nas quais resultaram envolvidos alguns policiais. Entre as recomendações apresentadas pelo Comitê, está reforçar o patrulhamento das costas do país por meio seja da potenciação dos meios da marinha e da aeronáutica, seja com a criação de um serviço de guarda-costas independente.
A Guiné-Bissau é um outro país que se tornou ponto de trânsito da cocaína da América Latina à Europa, como demonstrado numa recente operação que levou à captura de 674 quilos de cocaína e à detenção de alguns narcotraficantes sul-americanos. Na África ocidental, os países mais envolvidos pelos fluxos de droga, além de Gana, são Costa do Marfim, Senegal e Nigéria.
Os traficantes de cocaína na Guiné-Bissau estão ligados aos que passam através do vizinho Senegal, como emergiu da operação efetuada no final de junho de 2007 pela polícia de Dakar, que levou à apreensão de mais de duas toneladas de cocaína. Parte da droga se encontrava em um veleiro que estava à deriva diante das costas senegalesas, e uma outra em uma habitação na área balneária de Mbour, a sul de Dakar.
No veleiro os investigadores encontraram uma documentação que comprova que os narcotraficantes utilizam a Guiné-Bissau como depósito de trânsito da cocaína proveniente da América Latina e destinada à Europa. Também a nacionalidade dos detidos demonstra o grau de internacionalização das organizações criminais dedicadas ao narcotráfico. Além de três cidadãos sul-americanos (um colombiano, um venezuelano e um equatoriano) e de uma cidadã francesa, a polícia deteve três senegaleses. A partir dos documentos detidos, além disso a polícia senegalesa descobriu que os narcotraficantes efetuaram diversas viagens aos países limítrofes: Serra Leoa, Guiné Conakry, Guiné-Bissau e Gâmbia.
As autoridades senegalesas reiteraram que em seu país não existem depósitos de cocaína, mas admitiram a infiltração de grupos criminais estrangeiros, que utilizam o aeroporto de Dakar para enviar cocaína à Europa. No período de janeiro a junho de 2007, a polícia senegalesa afirma ter apreendido no aeroporto de Dakar 44 quilos de cocaína e detido cerca de 30 “mulas” da droga, a maior parte dos quais nigeriano.
Está em aumento também o número de “mulas” da Guiné-Bissau detidos no momento do embarque para Portugal, onde podem entrar sem visto. Além disso, foram descobertas algumas operações de reciclagem de dinheiro sujo por parte de organizações estrangeiras. A apreensão recorde efetuada pela polícia senegalesa, equivalente ao total de apreensões de cocaína na África ocidental de setembro de 2006 a maio de 2007, é somente o último de uma série efetuada nos primeiros seis meses de 2007 em várias localidades da África ocidental.
Entre essas, há 800 quilos de cocaína recuperados no mar diante das ilhas Canárias, e uma quantia análoga apreendida pela marinha francesa no largo da Costa do Marfim. Além dos navios, as organizações criminais recorrem a aviões para alimentar seus tráficos ilícitos.
Na Venezuela foi bloqueado um avião com 2,5 toneladas de cocaína, que se preparava a partir para Serra Leoa, enquanto em maio de 2007 foram apreendidos 600 quilos de cocaína a bordo de um Cessna, matriculado na Venezuela, que efetuou uma aterrissagem de emergência em Nouadhibou, na Mauritânia.
Segundo um responsável do ONUDC, para a África ocidental o aumento de confiscos das cargas de cocaína na região é devido mais a incidentes de percurso que a uma maior eficácia da polícia.
O funcionário considera que a cada dez expedições de droga em direção à Europa, nove chegam a seu destino sem problemas.

O SAHEL: NOVA FRONTEIRA DO NARCOTRÁFICO?
Das costas da África ocidental as organizações de narcotraficantes estão progressivamente se expandindo aos países do Sahel, cujo papel estratégico entre o Atlântico e o Magreb, e, portanto o Mediterrâneo, é apreciado também pelos traficantes de seres humanos e, provavelmente, pelo terrorismo internacional. Não se pode excluir a priori uma interconexão entre essas realidades criminais, de que são cúmplices a debilidade dos Estados e a vastidão dos territórios a controlar. Um realidade que suscita o alarme dos governos interessados.
Em abril deste ano, depois da apreensão de três caminhões cheios de droga e armas, o Presidente do Níger, Mamadou Tandja, declarou que o exército local pretende aumentar os esforços para impedir que o seu país seja “circundado” pelos traficantes de armas e de droga, que são uma “ameaça real” para o país.
Também Burkina Fasso não foge ao fenômeno. Segundo o Coordenador do Comitê contra os tráficos ilícitos de droga em Burkina Fasso, o volume das cargas de droga interceptadas nos primeiros três meses de 2007 é “incrível”. O funcionário indica a existência de uma nova rota de trânsito da droga no oeste e no sudoeste do país. No início de abril de 2007, 49 quilos de cocaína, num valor de 10 milhões de dólares, foram interceptados pela polícia de Burkina Fasso na fronteira com o Mali, que é um importante ponto de trânsito para o tráfico de seres humanos. Países como Mali e Níger são há milênios atravessados por vias de caravanas, que agora se converteram num uso criminal: para o tráfico de seres humanos, mas também de armas, droga e cigarros de contrabando. “Nos últimos meses notamos um aumento da utilização dos países do Sahel, como Mali e Níger, para o tráfico de cocaína”, disse Antonio Razzitelli, Diretor do departamento do UNODC para a África ocidental.
Segundo o órgão anticrime da ONU, os traficantes importam a droga por meio das cidades costeiras como Conakry, na Guiné, Dakar, no Senegal, e Lomé, no Togo, e depois a transportam para as cidades do interior, como Bamako, no Mali, e Ouagadougou, em Burkina Fasso. Dessas localidades, a cocaína prossegue a sua viagem até a Europa.
Segundo o responsável do Comitê contra os tráficos ilícitos de droga em Burkina Fasso, é preciso coordenar os esforços entre as polícias dos Estados da região. “Há uma necessidade urgente de reunir todos os entes nacionais antidroga da região para encontrar o modo de cooperar entre si, para tentar deter as redes criminais”, disse, destacando que a escassa cooperação entre as fronteiras dos países do Sahel e a falta de meios das polícias locais constituem problemas adjuntos para uma eficaz ação de contraste às redes criminais.

O MERCADO DA CÂNABIS
Enquanto a África permanece, no momento, somente um local de trânsito e um mercado residual para drogas como cocaína e heroína, a principal produção local de substâncias entorpecentes é representada pela cânabis.
O cultivo da cânabis foi introduzido na África oriental pelos mercantes árabes, pérsios e indianos no século XII. De lá se difundiu primeiramente na África austral, no século XV, e depois no Congo e em Angola no século XIX. Somente depois da Segunda Guerra Mundial a cânabis chegou à África ocidental, levada por soldados nigerianos e ganenses que combateram com as tropas britânicas na Birmânia (atual Mianmar), onde adquiriram o hábito de fumar marijuana. Este fato explica porque nos países onde a cânabis é conhecida há mais tempo, ela é utilizada na medicina tradicional, enquanto na África ocidental é usada para fins “recreativos”. Até os anos 80, porém, a produção africana da cânabis permaneceu limitada. A partir daqueles anos, porém, notou-se um incremento notável da superfície cultivada com a cânabis para fins comerciais.
A produção desta substância se divide em três categorias: a erva da cânabis (flores e folhas), resina ou haxixe (secreções emitidas pela planta durante a fase de florescimento) e óleo de haxixe, o menos utilizado. Segundo o World Drug Report 2006, a erva da cânabis é cultivada, sobretudo de modo ilegal, em 176 países em todo o mundo. A África representa 27% da produção mundial e os principais produtores são Marrocos (3.700 toneladas), África do Sul (2.200 toneladas) e Nigéria (2 mil toneladas).
No que concerne ao haxixe, o principal produtor mundial é Marrocos, que fornece os mercados norte-africanos e europeus. Graças ao esforço das autoridades marroquinas nos últimos anos, deu-se a diminuição da produção local da cânabis, à qual corresponde um aumento da produção em outros países, da Ásia ocidental (Afeganistão, Paquistão) à Albânia. O UNODC reconhece que desde 2003 o governo de Rabat conduziu uma campanha para estimar a produção de resina da cânabis no país, em cooperação com a Agência anticrime das Nações Unidas. Segundo uma investigação efetuada em 2003, a produção da cânabis foi de 3.060 toneladas, cultivada em 134 mil hectares de terra na região do Rif (norte do país) por 96.600 famílias de camponeses. A investigação feita em 2004 registrou uma diminuição de 10% das terras cultivas com a cânabis, que passaram a 120.500 hectares, com uma produção estimada de 2.760 toneladas.
Em 2005 notou-se uma ulterior diminuição de 37%, sendo a superfície cultivada com a cânabis de 72.500 hectares, enquanto a produção diminuiu para 1.070 toneladas. Quanto às apreensões da cânabis, nos últimos 12-15 anos se registrou um aumento da porcentagem mundial de apreensões no continente africano desta substância. Enquanto em 1990 16% do total mundial das apreensões da cânabis ocorria na África, em 2002 este dado subiu para 20%, para alcançar 31% em 2004. O aumento das apreensões na África é determinado sobretudo pelo aumento dos controles policiais e alfandegários efetuados pela Nigéria e pela África do Sul.
O principal mercado de consumo da cânabis é a Europa ocidental, e 80% da cânabis consumada na Europa provém do Marrocos, passando pela Espanha e pela Holanda e dali distribuída aos outros países. O terceiro mercado mundial de consumo é representado pelos países do norte da África, onde a cânabis provém principalmente do Marrocos. Parte da cânabis produzida no Afeganistão e Paquistão, além disso, alimenta o mercado dos países da África oriental.
No que concerne às problemáticas sociais ligadas ao consumo da cânabis, é preciso recordar que esta substância é a droga mais difundida e usada em nível mundial. Estima-se que, em 2004, 162 milhões de pessoas a tenham usado, o equivalente a 3,9% da população mundial entre 15 e 64 anos. Em termos relativos (a porcentagem de habitantes que faz uso da cânabis em relação a outras substância entorpecentes), a cânabis é prevalentemente utilizada na Oceania, seguida por América do Norte e África. Desde 1992, na África, notou-se também uma tendência ao aumento do seu consumo, em particular na Argélia, Nigéria e Zâmbia.
É provável que a tendência ao uso desta droga seja subestimada em diversos países da África, que não têm uma capacidade de coleta de dados adequados para seguir o fenômeno. Segundo dados parciais, notou-se nos últimos anos um forte incremento do abuso da cânabis na África ocidental, oriental e no norte da África, em sintonia com a tendência em nível global de uma ulterior expansão do consumo desta substância.
Até os anos 80, porém, a produção africana da cânabis permaneceu limitada. A partir daqueles anos, porém, notou-se um incremento notável da superfície cultivada com a cânabis para fins comerciais.
A produção africana de droga subtraiu terras e recursos à agricultura, isso porque naquele período se registrou uma forte queda dos preços dos produtos agrícolas em todo o mundo. A agricultura africana, já frágil, entrou em crise. Diversos camponeses, portanto, deixaram-se tentar pelo cultivo da cânabis em detrimento do cultivo de produtos lícitos.
Um simples cálculo econômico demonstra o forte poder de atração de uma semelhante produção; já em 1995, na Guiné, um saco de 20-25 quilos de marijuana tinha o valor de aproximadamente a renda anual média de uma famílias de oitos pessoas que se dedica à produção de cultivo lícito. No mercado de Kinshasa, na República Democrática do Congo (RDC), um saco de 25 quilos de marijuana é vendido por mil dólares, enquanto um saco de 80 quilos de mandioca vale somente 10 dólares.
Compreende-se, assim, que o cultivo desta substância entorpecente tem sérias repercussões na auto-suficiência alimentar de diversos países africanos. Segundo a associação de luta à toxicomania de Kinshasa, LIPILDRO, por causa do abandono dos cultivos legais por aqueles da cânabis, até 2010 a maior parte das cidades congolesas será atingida por um crise alimentar.
Além disso, na RDC se verificaram experiências para o cultivo da papoula de ópio (na província do Equador) e da cocaína (na região do Shaba). O mais importante produtor da cânabis na África subsaariana permanece, porém, a África do Sul. Importante produções são sinalizadas também em Lesoto e em Malauí.

DROGAS SINTÉTICAS
A produção de drogas sintéticas é limitada na África, com exceção da África do Sul, onde a fabricação de metanfetaminas e methaqualone aumentou nos últimos anos. Os dados sobre a descoberta de laboratórios clandestinos confirmam esta tendência.
Com efeito, se passou da descoberta à destruição de um laboratório por ano no período 1995-1999, aos 17 no período 2000-2003, até aos 28 destruídos somente em 2004. Um outro dado que demonstra o incremento do uso de drogas sintéticas na África do Sul é o aumento das apreensões de ecstasy: em 2004, houve um incremento de 385% das apreensões em relação ao ano precedente.
Além disso, as drogas sintéticas faziam parte do programa de guerra secreta química e biológica aplicado pelo regime do apartheid. Segundo os testemunhos reunidos durante o processo contra o responsável do programa, doutor Wouter Basson (definido “Doutor Morte” pela imprensa local), no âmbito do chamado “Project Coast”, entre 1992 e 1993 os laboratórios relacionados aos serviços secretos sul-africanos tinham produzido mais de 900 quilos de cristais de ecstasy (correspondente a 73 milhões de pílulas). No ano precedente, uma empresa de serviços do regime do apartheid tinha importado 500 quilos desta substância da Croácia.
Essas quantidades de drogas sintéticas foram importadas e produzidas para serem usadas como agente incapacitador para o controle da multidão (e talvez também para drogar secretamente os líderes da oposição para desacreditá-los, fazendo-os cometer gestos ridículos em público) e para serem distribuídas nas favelas habitadas pela população negra para promover o abuso de droga e a dependência.
O fim do regime do apartheid bloqueou este e outros projetos criminais aplicados no âmbito do “Project Coast”. Antes da queda do regime, porém, o dr. Basson tinha organizado a venda das empresas de cobertura dos serviços secretos sul-africanos, alguns dos quais fabricavam armas químicas e biológicas e drogas sintéticas.
Além disso, desapareceram centenas de quilos de substâncias químicas usadas na produção desses instrumentos de morte.
O dr. Basson é suspeito de ter aberto um empresa privada e, com efeito, quando foi detido em 1997 foi encontrado em posse de pílulas de ecstasy num valor de 20 mil dólares.

ÁFRICA ORIENTAL: UMA SITUAÇÃO PREOCUPANTE
Na África oriental, o Quênia é o principal ponto de trânsito da cocaína. Somente em 2004 foi apreendida 1,1 tonelada de cocaína entre a capital Nairóbi e o centro costeiro de Malindi. No decorrer da operação da polícia, que levou à descoberta desta importante carga de droga, foram detidos diversos funcionários da companhia aérea local (que resultou estranha ao narcotráfico), alguns dos quais foram capturados em Londres.
Das investigações emergiu que a droga que passava pelo Quênia era inserida no mercado britânico com a colaboração de alguns funcionários infiéis da companhia aérea. Além do Quênia, os países da África oriental interessados pelo narcotráfico são Etiópia, Botsuana, Zâmbia e África do Sul. Neste último, segundo o South African Institute of International Affaire, existem 500 mil pessoas que fazem uso de cocaína, enquanto 1/3 dos adolescentes utiliza entorpecentes. Segundo o centro de estudos sul-africano, no país atuam 300 organizações criminais internacionais envolvidas no narcotráfico.
Os países da região se tornaram não somente uma região de trânsito, mas também um novo mercado para os entorpecentes e, em particular, para a cocaína. Na Zâmbia, por exemplo, 80% da cocaína que chega ao país é transferida para a Europa e o restante 20% é consumado localmente.
A Interpol lançou o alarme sobre o crescente consumo de entorpecentes na África. “As drogas não somente transitam nos países, mas permanecem lá”, disse um responsável da organização internacional de polícia diante dos delegados de 150 organismos de polícia de todo o mundo, reunidos para o encontro anual da Interpol no Rio de Janeiro (Brasil). “Já se tornaram habituais as cargas de diversas toneladas de cocaína que passam pela África”, acrescentou.
Segundo um analista presente no seminário, se a tendência ao incremento do uso de entorpecentes continuar avançando, a África deverá enfrentar uma grave crise social derivante da droga.
As condições climáticas da maior parte da África são favoráveis ao cultivo da cânabis. Trata-se de um cultivo que permite um alto lucro para o agricultor e necessita de um trabalho menos intensivo em relação aos outros cultivos.
Inteiras famílias de agricultores podem viver, assim, de modo decente e permitir-se comprar alimento e medicamentos e enviar seus filhos à escola.
A cânabis é cultivada na África principalmente para o mercado local, mas nos últimos anos notou-se um aumento dos tráficos da cânabis originados na África subsaariana. Os maiores cultivos da cânabis se encontram em Comores, Etiópia, Quênia, Madagascar, Tanzânia e Uganda.
No Quênia, o cultivo da cânabis tem uma antiga tradição, mas nos últimos anos se tornou primeiramente uma produção limitada ao mercado local, para depois transformar-se em uma verdadeira empresa comercial ilícita estendida internacionalmente.
A cânabis é cultivada na região ocidental e naquela do Monte Quênia, onde, segundo alguns relatórios, existem cerca de 1.500 hectares cultivados com a cânabis. Os cultivos de droga estão escondidos entre aqueles tradicionais destinados à alimentação, mas há também cultivos menores em algumas áreas protegidas da reserva natural nacional.
Também as regiões costeiras se tornaram produtores da cânabis. Lá, com efeito, se instalaram diversos agricultores provenientes do interior, que lá encontraram áreas férteis e pouco controladas pela polícia, e um mercado constituído pela população local, pelos turistas e pelos residentes estrangeiros que preferem as costas do país.
Quanto ao ópio, no passado foram sinalizados alguns cultivos no Quênia e nas costas de Madagascar. Desde 1993 não foram sinalizados cultivos de opiáceos na África oriental, mas a vastidão do território e os escassos controles das autoridades locais tornam sempre possível uma retomada do cultivo da papoula de ópio.
No que diz respeito à produção local de drogas sintéticas, a África oriental é o ponto de trânsito do methaqualone (Mandrax) proveniente da Índia e destinado ao mercado sul-africano.
Nos últimos anos, a redução do Mandrax proveniente da Índia gerou uma produção local desta substância. Com efeito, foram descobertos laboratórios químicos clandestinos utilizados para a fabricação desta droga sintética em alguns países da África oriental e meridional.
Nos casos dos laboratórios descobertos no Quênia e na Tanzânia, se tratava somente de pequenos centros onde o pó do Mandrax ainda proveniente da Índia era transformado em pílulas, mas em outros casos deparou-se com verdadeiras oficinas para a fabricação do Mandrax com precursores químicos, cuja proveniência permaneceu desconhecida. A este propósito, as substâncias que mais causam preocupação são as efedrinas, as pseudo-efedrinas, o anidrido acético e o ácido N-acetilantranílico (utilizado na fabricação do Mandrax) e o pergamenato de potássio.
O mais famoso cultivo de planta entorpecente local é o khat, que é uma produção legal em diversos países da África oriental. O khat é cultivado na Etiópia e no Quênia e, em medida menos extensa, na Tanzânia, Comores e na parte setentrional de Madagascar. É exportado para os principais mercados da área (Djibuti, Eritréia, Somália e Iêmen), além da Europa e da América setentrional.
O uso do khat continua a expandir-se no Chifre da África e tem um papel-chave na contínua instabilidade da Somália, onde se calcula que a população gasta todos os anos 64 milhões de dólares por ano para comprar o khat. Trata-se de um quantia que é quase o dobro do total das ajudas internacionais doadas ao país. O khat não somente contribui para provocar problemas na sociedade, criando pessoas afetadas pela dependência de entorpecentes, mas tem também um papel na difusão no país de armas leves, frequentemente repassadas em troca de um pouco de droga.
As organizações de narcotraficantes olham com interesse aos países da África oriental e meridional por causa de suas infra-estruturas portuárias e aeroportuárias, dos comprimentos de suas costas e dos fluxos turísticos.
Todos elementos que permitem esconder os tráficos de droga. O Quênia tem o maior porto comercial da região, Mombasa, que serve a maior parte dos países privados de acesso direto ao mar, enquanto o aeroporto de Nairóbi é um dos mais traficados da área. As redes do narcotráfico utilizam também os portos de Dar-es-Salaam (na Tanzânia), Djibuti, Durban (na África do Sul) e Maputo (em Moçambique) e estão expandindo suas atividades também na Etiópia, Mauritius, Tanzânia e Uganda. Esses últimos países são usados como pontos de trânsito para a droga enviada para o Quênia, a África do Sul e a África ocidental e dessas áreas para a Europa e a América do Norte.
A maior parte das substâncias entorpecentes chega à região via mar, escondida nas cargas dos containers transportados pelos navios mercantis que navegam o Oceano Índico. Em alguns casos, os navios dos narcotraficantes se encontram em alto mar com embarcações menores, que levam para a terra a carga ilícita. Grandes quantidades de heroína chegam assim à região, mas se recorre também a carteiros, homens e mulheres, que chegam com vôos comerciais, e ao envio por correio.
Entre os países da África oriental interessados pelo tráfico e pelo consumo de substâncias entorpecentes, está Uganda.
Segundo um recente relatório do UNODC, “Uganda se tornou o país líder no tráfico e no consumo de droga em relação ao restante dos Estados da África oriental”. Entre as drogas presentes no mercado ilícito ugandense, existem a cânabis, a heroína, a cocaína e o mandrax, além do khat. Segundo a agência anticrime da ONU, o aumento do consumo de substâncias entorpecentes é devido a “duas décadas de conflitos armados e à falta de lei, que prejudicaram gravemente a infra-estrutura policial”.
O relatório observa que as condições climáticas de todo o território ugandense são favoráveis ao cultivo da cânabis: “O cultivo ilícito da planta é, porém, relevante em áreas remotas das regiões meridional, ocidental, central, oriental e norte-oriental. As dimensões exatas dos cultivos da cânabis não são conhecidas, mas se notou um aumento da produção da cânabis sobretudo para a exportação”. O aeroporto de Entebbe é, por fim, utilizado como ponto de trânsito para o envio de heroína e de mandrax ao extremo Oriente e à África do Sul.

CONCLUSÕES
A África é um ponto de trânsito sempre mais importante para as organizações de narcotraficantes, apesar de, no momento, a maior parte das apreensões de entorpecentes ocorrer em outras partes do mundo.
Vista a escassa eficiência das polícias africanas e a relativa recente conscientização do problema por parte dos entes locais e internacionais, pode-se supor que a quantidade das apreensões de droga na África não corresponda à entidade efetiva das cargas que transitam pelo continente.
A África, porém, não é mais somente um ponto de passagem da droga proveniente da América Latina e da Ásia em direção à Europa e à América setentrional, mas já se tornou um mercado ainda talvez “residual”, mas em todo caso que não pode ser ignorado pelas redes de narcotraficantes.
Redes nas quais estão presentes africanos, em particular nigerianos, em papéis não somente de gregários, mas também de organizadores. O crescente consumo de drogas por via endovenosa em diversos países africanos, como Tanzânia e Quênia, agrava o problema da difusão da AIDS.
Na Nigéria, por exemplo, um estudo revelou que o consumo de drogas se expande no mesmo ritmo do aumento das pessoas infetadas com o vírus HIV, em cidades como Kano e Port Harcourt.

 
At 9/17/2007 3:07 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

A DROGA NA ÁFRICA: UM PROBLEMA MUNDIAL

A droga já é um problema na África e representa um ulterior obstáculo ao desenvolvimento do continente. É o que afirmam diversos organismos internacionais encarregados da luta ao tráfico de entorpecentes. Já em 2001, um relatório do Órgão Internacional de Controle das Drogas afirmava que “graças à sua experiência no campo do contrabando de haxixe e de heroína, os cartéis da droga da África ocidental buscam novos contatos na América Latina para estender o tráfico de cocaína a toda a região da África subsaariana”.
Trata-se de uma reviravolta fundamental na estratégia do narcotráfico mundial, que vê a África se tornar uma das áreas “fulcro” para a distribuição de drogas em todo o mundo. Até os primeiros anos da década de 90 do século passado, a África era mantida às margens das rotas da droga. A mudança ocorreu em 1993, quando foram apreendidos na Nigéria 300 quilos de heroína provenientes da Tailândia. É o sinal de uma mudança que vê a transformação de tantos pequenos contrabandistas africanos (a maioria nigerianos) de simples transportadores por conta de terceiros a membros de gangues guiadas por africanos, capazes de tratar no mesmo nível com análogas organizações de outros continentes.
A presença dessas organizações criminais, a forte urbanização, a perda dos valores tradicionais africanos e a difusão de uma cultura hedonista são todos fatores que criaram as premissas para um mercado africano da droga. A África, portanto, não é somente um local de trânsito dos entorpecentes, mas terreno “virgem” para o tráfico de droga.

PREMESSA METODOLÓGICA
Os dados apresentados são úteis para analisar a tendência (incremento ou decremento) do tráfico de entorpecentes, apesar de serem muito provavelmente aproximativos.
Segundo um estudo crítico efetuado pela associação ‘Libera’ do pe. Ciotti, com efeito os dados apresentados pelos entes antidrogas internacionais e de alguns Estados não relatam fielmente toda a produção mundial de cocaína. Segundo este estudo (referido somente à cocaína e não a outras drogas), existe uma discrepância entre a estimativa sobre a produção mundial de cocaína efetuada pela ONU e os dados relativos às apreensões e ao consumo de cocaína somente na América.
Segundo os elaboradores do relatório, com efeito, subtraindo das 937 toneladas de produção, indicada pelas Nações Unidas em 2004, as cerca de 450 consumadas nos Estados Unidos, Canadá, México e em toda a América do Sul e as cerca de 490 toneladas apreendidas em todas as Américas, se chegaria a um saldo negativo de 3 toneladas.
“A este ponto, não se saberia mais de onde subtrair as cerca de 99 toneladas de cocaína apreendidas no “resto do mundo”, afirma o relatório. Fazendo-o, se chegaria ao paradoxal saldo negativo de 102 toneladas de cocaína “não resultantes”, não tendo feito frente ainda à demanda de cocaína no “resto do mundo”, estimada em ao menos 300 toneladas, se chega a calcular uma espécie de buraco negro de aproximadamente 400 toneladas de cocaína não resultantes.
Este buraco negro assume proporções ainda mais macroscópicas, cerca de 700 toneladas, se calculado com base nos dados da Agência antidroga norte-americana.
Apesar dos seus limites, os relatórios dos organismos internacionais de luta contra a droga permanecem frequentemente os únicos instrumentos para analisar o fenômeno do narcotráfico.

A HEROÍNA NA ÁFRICA
A apreensão de opiáceos na África registrou um forte incremento nos últimos anos. Segundo dados da ONU, por exemplo, em 2004 ocorreu um incremento da apreensão de heroína de 60% em relação ao ano precedente.
A maior parte deste incremento é devido à apreensão ocorrida na África central e ocidental, que quase triplicou de 2003 a 2004. A heroína que passa pela África é destinada em primeiro lugar aos mercados europeus e, em segundo lugar, aos da América do Norte. A heroína provém dos países do sudoeste e sudeste da Ásia.
A quantia total dos opiáceos apreendida na África permanece ainda modesto (0,3% do total de apreensões em nível mundial). Porém, deve-se levar em consideração que não existem estatísticas confiáveis e que o nível das apreensões não reflete o verdadeiro fluxo de narcóticos que passa pela África por causa da debilidade da polícia local, que tem dificuldade em interceptar as cargas ilícitas.
No que concerne ao uso de opiáceos na África, segundo os dados do Departamento das Nações Unidas para a luta à criminalidade (UNODC), nota-se um aumento de seu consumo no continente africano, em particular na África oriental e naquela austral e em alguns países da África ocidental. Segundo os especialistas das Nações Unidas, o crescimento do consumo de heroína nessas áreas deriva do fato de que são utilizadas como locais de trânsito dos narcotraficantes, os quais, porém, não desdenham em criar um mercado local.
Na África do Sul, um dos poucos países africanos que dispõe de dados confiáveis, até os primeiros anos do novo milênio, o pedido de tratamentos por abuso de heroína representava somente 1% do total dos pedidos de cura por dependência de substâncias entorpecentes (incluído o álcool). Em 2005, esta porcentagem subiu para 7%.
Segundo o relatório do UNODC sobre o tráfico de entorpecentes de 2007, o mercado da heroína está dividido deste modo: a heroína afegã é destinada aos mercados da Ásia central, da Europa, do Oriente Médio e da África; aquela produzida no chamado “triângulo de ouro” alimenta o mercado chinês e o dos outros países asiáticos e da Oceania; aquela proveniente da América Latina serve o mercado norte-americano.
O relatório nota, porém, que “uma parte pequena, mas em crescimento, da produção de opiáceos afegãos é enviada à América setentrional, seja por meio da África oriental e ocidental, seja por meio da Europa”.
O relatório afirma que a demanda global de heroína permaneceu estável, “apesar de importantes incrementos nos países que se encontram no caminho das principais rotas do narcotráfico”.
Entre esses estão também diversos países africanos, afirma o documento, que destaca os efeitos prejudiciais da difusão da heroína e de outras substâncias entorpecentes nas populações já duramente provadas pela pobreza e pela difusão da AIDS.
Os últimos dados do UNODC mostram um forte incremento do uso de heroína em alguns países africanos como Moçambique, Zâmbia, Quênia, Tanzânia e Costa do Marfim, enquanto outros países tiveram um aumento mais contido. Entre esses, África do Sul, Madagascar, Gana, Libéria e Senegal.

DOS ANDES AO KILIMANJARO: UM FLUXO DE COCAÍNA INVADE A ÁFRICA
O dado mais preocupante, porém, é o da cocaína que transita da África em direção principalmente à Europa e, secundariamente, à América setentrional.
A importância da África, e em particular da África ocidental, como ponto de trânsito da cocaína em direção aos ricos mercados ocidentais é demonstrada pelo nível das apreensões registradas nos últimos anos. As apreensões de cocaína em toda a África aumentaram três vezes entre 2003 e 2004, enquanto no mesmo período as apreensões na África ocidental e central aumentaram seis vezes. As apreensões mais importantes no período 2000-2004 se registraram em Cabo Verde, seguido por África do Sul, Quênia, Gana e Nigéria. Mas as apreensões de cocaína na África representam somente 1% do total mundial das apreensões desta substância entorpecente. Também neste caso, porém, o dado é prejudicado devido à debilidade das polícias locais, incapazes de interceptar a maior parte dos fluxos de cocaína proveniente da América do Sul.
Em 2004, 50% das apreensões de cocaína no continente ocorreram na África ocidental e central. A zona de passagem mais utilizada pelos traficantes de cocaína é o Golfo da Guiné, de onde a substância entorpecente é transportada para a Europa em pequenas quantidades, através dos chamados “mulas”, pessoas que assumem o risco de ingerir óvulos de cocaína com a esperança de superar as alfândegas nos aeroportos de destinação. Nos últimos anos, também na África oriental aumentou a quantia de cocaína apreendida, indicando uma tendência a utilizar em medida crescente esta área como ponto de trânsito para a cocaína destinada à Europa e à Ásia.
Um dos países mais atingidos pelo fenômeno é o Quênia, onde em 2004 foi apreendida uma tonelada de cocaína. Em termos gerais, o crescimento da difusão da cocaína na África é demonstrada pelo fato que dos 32 países africanos que fornecem estatísticas sobre as apreensões de entorpecentes na UNODC, 23 (72%) relataram apreensões de cocaína, contra 34% em 1990.
Os traficantes de cocaína tendem a servir-se da África cada vez mais como ponto de trânsito por dois motivos. O primeiro deriva do melhoramento dos sistemas de inspeção utilizados pelas autoridades locais e por aquelas norte-americanas na área caribenha e centro-americana, tradicional rota utilizada pelos traficantes. Nos últimos anos, por exemplo, surgiram bases de inspeção norte-americanas dos Andes às ilhas caribenhas. Também as autoridades holandesas intensificaram a inspeção com patrulhas aéreas baseadas nas ilhas de Curaçao e Saint Martin.
O segundo fator está ligado à diminuição do consumo de cocaína, que se registrou nos Estados Unidos diante de um aumento da demanda na Europa. Se na América do Norte há o mais alto número de consumidores mundiais (6 milhões e meio, correspondente a cerca da metade do consumo mundial), a tendência é diminuir a demanda.
De 1998 a 2004, de fato, se registrou uma queda de 20% da difusão desta substância. No mesmo período, na Europa ocidental, onde os consumidores de cocaína são 3 milhões e meio (26% do total mundial), se notou um aumento do consumo e da difusão do “pó branco”. Na Espanha e no Reino Unido, este dado é de 2%.
A África, portanto, é uma cômoda e segura rota para alcançar um mercado em crescimento.
Além disso, como efeito colateral criou-se um mercado africano que está registrando nos últimos anos preocupantes aumentos.
A crescente disponibilidade de cocaína se traduz, com efeito, em um aumento do consumo desta substância na África. Segundo os dados do UNODC, no período 1992-2004 o abuso da cocaína na África cresceu em um ritmo mais sustentado do que no restante do mundo. Este incremento é mais remarcado nos países da África meridional e nos da África ocidental.
Se forem analisados os dados das pessoas que recorrem aos tratamentos de desintoxicação, o aumento do consumo de cocaína emerge com evidência. No início dos anos 90, as pessoas em tratamento por abuso de cocaína eram pouquíssimas, no final de 1996 constituíam 1.5% dos casos tratados pelas estruturas de recuperação dos toxicômanos, no biênio 1999-2000 eram 6%. No período 2001-2004, notou-se uma inflexão na porcentagem de pessoas que pediam para ser tratadas da dependência de cocaína (menos de 5%).
A partir do final de 2004, este dado está em crescimento: de 7,5% em 2004 passou-se a 8,5% nos primeiros meses de 2005.

A COCAÍNA NA ÁFRICA OCIDENTAL
O país tradicionalmente mais envolvido no narcotráfico é a Nigéria. Lá, com efeito, em 1993 houve a primeira grande apreensão de cocaína na África e as organizações criminais nigerianas estão perfeitamente inseridas no sistema criminal global e transnacional. A afirmação das máfias nigerianas deriva também da pertença da Nigéria ao Commonwealth, que permitiu abrir estreitas relações comerciais com o subcontinente indiano, produtor de ópio e de heroína, e com o mundo anglo-saxão consumidor.
No final dos anos 80, registrou-se um incremento importante no papel de centro estratégico e, em 1992, as apreensões de cocaína no aeroporto de Lagos foram tão relevantes que as autoridades nigerianas suspenderam os vôos diretos para o Rio de Janeiro. Desde então, os traficantes nigerianos são considerados os principais transportadores da droga, uma verdadeira indústria a serviço do comércio de heroína e da coca. Eles estão presentes em todos os pontos-chaves da produção e do tráfico de drogas. Graças aos compatriotas residentes no exterior, formaram clãs criminais comparáveis aos colombianos, turcos e chineses.
As organizações mafiosas nigerianas, como as outras, se baseiam na solidariedade étnica, de clã e de famílias. Já em 1995 as autoridades norte-americanas estimavam que 50% da heroína circulante em seu país era introduzida pelos nigerianos, os quais usam a Polônia e a Hungria como pontos de trânsito para a cocaína destinada à Europa ocidental.
Um dos países da África ocidental dos quais se têm estatísticas confiáveis sobre o incremento do tráfico de cocaína é Gana. Segundo os dados divulgados pelas autoridades locais, em um único ano as apreensões de cocaína aumentaram 40 vezes, passando dos 15 quilogramas de 2003 aos 617 quilos de 2004. A maior parte da cocaína é destinada ao mercado britânico.
Trata-se de um dado significativo, levando-se em consideração que, em termos porcentuais, as apreensões de cocaína aumentaram 18% em nível mundial e 4.000% em Gana de 2003 a 2004. No mesmo período, na África, as apreensões de cocaína aumentaram 3 vezes, passando das 1,1 tonelada para 3,6 toneladas.
Nos anos sucessivos, emergiram outros fatos que demonstram que Gana se tornou um importante ponto de passagem da cocaína na África ocidental. Em novembro de 2005, a polícia ganense apreendeu 588 quilos no decorrer de uma perquirição em uma habitação em East Lagon. Em abril de 2006, foram descobertos a bordo do navio MV Benjamin, atracado no porto de Tema, 2.310 quilos de cocaína.
Segundo um responsável do UNODC, as organizações de narcotraficantes tendem a fazer transitar a droga por meio da África ocidental porque, até agora, as autoridades alfandegárias européias e norte-americanas controlam com menos atenção as mercadorias e as bagagens provenientes da África em relação àquelas provenientes da América Latina. No caso de Gana, como de outros países da região, o fato de não estar inserido na lista dos países produtores de cocaína significa que as suas mercadorias não são sujeitas a inspeções detalhadas. Mas nos últimos anos, as coisas mudaram e Gana foi inserida na lista dos países “de alta prioridade” de inspeção.
Os traficantes buscam corromper os policiais e a polícia para permitir o trânsito das cargas de entorpecentes. Para investigar casos de corrupção de policiais, o Ministério da Fazenda de Gana criou uma Comissão de investigação, que recebeu o nome da sua Presidenta, Georgina Wood, que desempenhou importantes cargos na polícia e na magistratura local. O “Georgina Wood Committee” nasceu após duas importantes apreensões de cocaína citadas precedentemente, nas quais resultaram envolvidos alguns policiais. Entre as recomendações apresentadas pelo Comitê, está reforçar o patrulhamento das costas do país por meio seja da potenciação dos meios da marinha e da aeronáutica, seja com a criação de um serviço de guarda-costas independente.
A Guiné-Bissau é um outro país que se tornou ponto de trânsito da cocaína da América Latina à Europa, como demonstrado numa recente operação que levou à captura de 674 quilos de cocaína e à detenção de alguns narcotraficantes sul-americanos. Na África ocidental, os países mais envolvidos pelos fluxos de droga, além de Gana, são Costa do Marfim, Senegal e Nigéria.
Os traficantes de cocaína na Guiné-Bissau estão ligados aos que passam através do vizinho Senegal, como emergiu da operação efetuada no final de junho de 2007 pela polícia de Dakar, que levou à apreensão de mais de duas toneladas de cocaína. Parte da droga se encontrava em um veleiro que estava à deriva diante das costas senegalesas, e uma outra em uma habitação na área balneária de Mbour, a sul de Dakar.
No veleiro os investigadores encontraram uma documentação que comprova que os narcotraficantes utilizam a Guiné-Bissau como depósito de trânsito da cocaína proveniente da América Latina e destinada à Europa. Também a nacionalidade dos detidos demonstra o grau de internacionalização das organizações criminais dedicadas ao narcotráfico. Além de três cidadãos sul-americanos (um colombiano, um venezuelano e um equatoriano) e de uma cidadã francesa, a polícia deteve três senegaleses. A partir dos documentos detidos, além disso a polícia senegalesa descobriu que os narcotraficantes efetuaram diversas viagens aos países limítrofes: Serra Leoa, Guiné Conakry, Guiné-Bissau e Gâmbia.
As autoridades senegalesas reiteraram que em seu país não existem depósitos de cocaína, mas admitiram a infiltração de grupos criminais estrangeiros, que utilizam o aeroporto de Dakar para enviar cocaína à Europa. No período de janeiro a junho de 2007, a polícia senegalesa afirma ter apreendido no aeroporto de Dakar 44 quilos de cocaína e detido cerca de 30 “mulas” da droga, a maior parte dos quais nigeriano.
Está em aumento também o número de “mulas” da Guiné-Bissau detidos no momento do embarque para Portugal, onde podem entrar sem visto. Além disso, foram descobertas algumas operações de reciclagem de dinheiro sujo por parte de organizações estrangeiras. A apreensão recorde efetuada pela polícia senegalesa, equivalente ao total de apreensões de cocaína na África ocidental de setembro de 2006 a maio de 2007, é somente o último de uma série efetuada nos primeiros seis meses de 2007 em várias localidades da África ocidental.
Entre essas, há 800 quilos de cocaína recuperados no mar diante das ilhas Canárias, e uma quantia análoga apreendida pela marinha francesa no largo da Costa do Marfim. Além dos navios, as organizações criminais recorrem a aviões para alimentar seus tráficos ilícitos.
Na Venezuela foi bloqueado um avião com 2,5 toneladas de cocaína, que se preparava a partir para Serra Leoa, enquanto em maio de 2007 foram apreendidos 600 quilos de cocaína a bordo de um Cessna, matriculado na Venezuela, que efetuou uma aterrissagem de emergência em Nouadhibou, na Mauritânia.
Segundo um responsável do ONUDC, para a África ocidental o aumento de confiscos das cargas de cocaína na região é devido mais a incidentes de percurso que a uma maior eficácia da polícia.
O funcionário considera que a cada dez expedições de droga em direção à Europa, nove chegam a seu destino sem problemas.

O SAHEL: NOVA FRONTEIRA DO NARCOTRÁFICO?
Das costas da África ocidental as organizações de narcotraficantes estão progressivamente se expandindo aos países do Sahel, cujo papel estratégico entre o Atlântico e o Magreb, e, portanto o Mediterrâneo, é apreciado também pelos traficantes de seres humanos e, provavelmente, pelo terrorismo internacional. Não se pode excluir a priori uma interconexão entre essas realidades criminais, de que são cúmplices a debilidade dos Estados e a vastidão dos territórios a controlar. Um realidade que suscita o alarme dos governos interessados.
Em abril deste ano, depois da apreensão de três caminhões cheios de droga e armas, o Presidente do Níger, Mamadou Tandja, declarou que o exército local pretende aumentar os esforços para impedir que o seu país seja “circundado” pelos traficantes de armas e de droga, que são uma “ameaça real” para o país.
Também Burkina Fasso não foge ao fenômeno. Segundo o Coordenador do Comitê contra os tráficos ilícitos de droga em Burkina Fasso, o volume das cargas de droga interceptadas nos primeiros três meses de 2007 é “incrível”. O funcionário indica a existência de uma nova rota de trânsito da droga no oeste e no sudoeste do país. No início de abril de 2007, 49 quilos de cocaína, num valor de 10 milhões de dólares, foram interceptados pela polícia de Burkina Fasso na fronteira com o Mali, que é um importante ponto de trânsito para o tráfico de seres humanos. Países como Mali e Níger são há milênios atravessados por vias de caravanas, que agora se converteram num uso criminal: para o tráfico de seres humanos, mas também de armas, droga e cigarros de contrabando. “Nos últimos meses notamos um aumento da utilização dos países do Sahel, como Mali e Níger, para o tráfico de cocaína”, disse Antonio Razzitelli, Diretor do departamento do UNODC para a África ocidental.
Segundo o órgão anticrime da ONU, os traficantes importam a droga por meio das cidades costeiras como Conakry, na Guiné, Dakar, no Senegal, e Lomé, no Togo, e depois a transportam para as cidades do interior, como Bamako, no Mali, e Ouagadougou, em Burkina Fasso. Dessas localidades, a cocaína prossegue a sua viagem até a Europa.
Segundo o responsável do Comitê contra os tráficos ilícitos de droga em Burkina Fasso, é preciso coordenar os esforços entre as polícias dos Estados da região. “Há uma necessidade urgente de reunir todos os entes nacionais antidroga da região para encontrar o modo de cooperar entre si, para tentar deter as redes criminais”, disse, destacando que a escassa cooperação entre as fronteiras dos países do Sahel e a falta de meios das polícias locais constituem problemas adjuntos para uma eficaz ação de contraste às redes criminais.

O MERCADO DA CÂNABIS
Enquanto a África permanece, no momento, somente um local de trânsito e um mercado residual para drogas como cocaína e heroína, a principal produção local de substâncias entorpecentes é representada pela cânabis.
O cultivo da cânabis foi introduzido na África oriental pelos mercantes árabes, pérsios e indianos no século XII. De lá se difundiu primeiramente na África austral, no século XV, e depois no Congo e em Angola no século XIX. Somente depois da Segunda Guerra Mundial a cânabis chegou à África ocidental, levada por soldados nigerianos e ganenses que combateram com as tropas britânicas na Birmânia (atual Mianmar), onde adquiriram o hábito de fumar marijuana. Este fato explica porque nos países onde a cânabis é conhecida há mais tempo, ela é utilizada na medicina tradicional, enquanto na África ocidental é usada para fins “recreativos”. Até os anos 80, porém, a produção africana da cânabis permaneceu limitada. A partir daqueles anos, porém, notou-se um incremento notável da superfície cultivada com a cânabis para fins comerciais.
A produção desta substância se divide em três categorias: a erva da cânabis (flores e folhas), resina ou haxixe (secreções emitidas pela planta durante a fase de florescimento) e óleo de haxixe, o menos utilizado. Segundo o World Drug Report 2006, a erva da cânabis é cultivada, sobretudo de modo ilegal, em 176 países em todo o mundo. A África representa 27% da produção mundial e os principais produtores são Marrocos (3.700 toneladas), África do Sul (2.200 toneladas) e Nigéria (2 mil toneladas).
No que concerne ao haxixe, o principal produtor mundial é Marrocos, que fornece os mercados norte-africanos e europeus. Graças ao esforço das autoridades marroquinas nos últimos anos, deu-se a diminuição da produção local da cânabis, à qual corresponde um aumento da produção em outros países, da Ásia ocidental (Afeganistão, Paquistão) à Albânia. O UNODC reconhece que desde 2003 o governo de Rabat conduziu uma campanha para estimar a produção de resina da cânabis no país, em cooperação com a Agência anticrime das Nações Unidas. Segundo uma investigação efetuada em 2003, a produção da cânabis foi de 3.060 toneladas, cultivada em 134 mil hectares de terra na região do Rif (norte do país) por 96.600 famílias de camponeses. A investigação feita em 2004 registrou uma diminuição de 10% das terras cultivas com a cânabis, que passaram a 120.500 hectares, com uma produção estimada de 2.760 toneladas.
Em 2005 notou-se uma ulterior diminuição de 37%, sendo a superfície cultivada com a cânabis de 72.500 hectares, enquanto a produção diminuiu para 1.070 toneladas. Quanto às apreensões da cânabis, nos últimos 12-15 anos se registrou um aumento da porcentagem mundial de apreensões no continente africano desta substância. Enquanto em 1990 16% do total mundial das apreensões da cânabis ocorria na África, em 2002 este dado subiu para 20%, para alcançar 31% em 2004. O aumento das apreensões na África é determinado sobretudo pelo aumento dos controles policiais e alfandegários efetuados pela Nigéria e pela África do Sul.
O principal mercado de consumo da cânabis é a Europa ocidental, e 80% da cânabis consumada na Europa provém do Marrocos, passando pela Espanha e pela Holanda e dali distribuída aos outros países. O terceiro mercado mundial de consumo é representado pelos países do norte da África, onde a cânabis provém principalmente do Marrocos. Parte da cânabis produzida no Afeganistão e Paquistão, além disso, alimenta o mercado dos países da África oriental.
No que concerne às problemáticas sociais ligadas ao consumo da cânabis, é preciso recordar que esta substância é a droga mais difundida e usada em nível mundial. Estima-se que, em 2004, 162 milhões de pessoas a tenham usado, o equivalente a 3,9% da população mundial entre 15 e 64 anos. Em termos relativos (a porcentagem de habitantes que faz uso da cânabis em relação a outras substância entorpecentes), a cânabis é prevalentemente utilizada na Oceania, seguida por América do Norte e África. Desde 1992, na África, notou-se também uma tendência ao aumento do seu consumo, em particular na Argélia, Nigéria e Zâmbia.
É provável que a tendência ao uso desta droga seja subestimada em diversos países da África, que não têm uma capacidade de coleta de dados adequados para seguir o fenômeno. Segundo dados parciais, notou-se nos últimos anos um forte incremento do abuso da cânabis na África ocidental, oriental e no norte da África, em sintonia com a tendência em nível global de uma ulterior expansão do consumo desta substância.
Até os anos 80, porém, a produção africana da cânabis permaneceu limitada. A partir daqueles anos, porém, notou-se um incremento notável da superfície cultivada com a cânabis para fins comerciais.
A produção africana de droga subtraiu terras e recursos à agricultura, isso porque naquele período se registrou uma forte queda dos preços dos produtos agrícolas em todo o mundo. A agricultura africana, já frágil, entrou em crise. Diversos camponeses, portanto, deixaram-se tentar pelo cultivo da cânabis em detrimento do cultivo de produtos lícitos.
Um simples cálculo econômico demonstra o forte poder de atração de uma semelhante produção; já em 1995, na Guiné, um saco de 20-25 quilos de marijuana tinha o valor de aproximadamente a renda anual média de uma famílias de oitos pessoas que se dedica à produção de cultivo lícito. No mercado de Kinshasa, na República Democrática do Congo (RDC), um saco de 25 quilos de marijuana é vendido por mil dólares, enquanto um saco de 80 quilos de mandioca vale somente 10 dólares.
Compreende-se, assim, que o cultivo desta substância entorpecente tem sérias repercussões na auto-suficiência alimentar de diversos países africanos. Segundo a associação de luta à toxicomania de Kinshasa, LIPILDRO, por causa do abandono dos cultivos legais por aqueles da cânabis, até 2010 a maior parte das cidades congolesas será atingida por um crise alimentar.
Além disso, na RDC se verificaram experiências para o cultivo da papoula de ópio (na província do Equador) e da cocaína (na região do Shaba). O mais importante produtor da cânabis na África subsaariana permanece, porém, a África do Sul. Importante produções são sinalizadas também em Lesoto e em Malauí.

DROGAS SINTÉTICAS
A produção de drogas sintéticas é limitada na África, com exceção da África do Sul, onde a fabricação de metanfetaminas e methaqualone aumentou nos últimos anos. Os dados sobre a descoberta de laboratórios clandestinos confirmam esta tendência.
Com efeito, se passou da descoberta à destruição de um laboratório por ano no período 1995-1999, aos 17 no período 2000-2003, até aos 28 destruídos somente em 2004. Um outro dado que demonstra o incremento do uso de drogas sintéticas na África do Sul é o aumento das apreensões de ecstasy: em 2004, houve um incremento de 385% das apreensões em relação ao ano precedente.
Além disso, as drogas sintéticas faziam parte do programa de guerra secreta química e biológica aplicado pelo regime do apartheid. Segundo os testemunhos reunidos durante o processo contra o responsável do programa, doutor Wouter Basson (definido “Doutor Morte” pela imprensa local), no âmbito do chamado “Project Coast”, entre 1992 e 1993 os laboratórios relacionados aos serviços secretos sul-africanos tinham produzido mais de 900 quilos de cristais de ecstasy (correspondente a 73 milhões de pílulas). No ano precedente, uma empresa de serviços do regime do apartheid tinha importado 500 quilos desta substância da Croácia.
Essas quantidades de drogas sintéticas foram importadas e produzidas para serem usadas como agente incapacitador para o controle da multidão (e talvez também para drogar secretamente os líderes da oposição para desacreditá-los, fazendo-os cometer gestos ridículos em público) e para serem distribuídas nas favelas habitadas pela população negra para promover o abuso de droga e a dependência.
O fim do regime do apartheid bloqueou este e outros projetos criminais aplicados no âmbito do “Project Coast”. Antes da queda do regime, porém, o dr. Basson tinha organizado a venda das empresas de cobertura dos serviços secretos sul-africanos, alguns dos quais fabricavam armas químicas e biológicas e drogas sintéticas.
Além disso, desapareceram centenas de quilos de substâncias químicas usadas na produção desses instrumentos de morte.
O dr. Basson é suspeito de ter aberto um empresa privada e, com efeito, quando foi detido em 1997 foi encontrado em posse de pílulas de ecstasy num valor de 20 mil dólares.

ÁFRICA ORIENTAL: UMA SITUAÇÃO PREOCUPANTE
Na África oriental, o Quênia é o principal ponto de trânsito da cocaína. Somente em 2004 foi apreendida 1,1 tonelada de cocaína entre a capital Nairóbi e o centro costeiro de Malindi. No decorrer da operação da polícia, que levou à descoberta desta importante carga de droga, foram detidos diversos funcionários da companhia aérea local (que resultou estranha ao narcotráfico), alguns dos quais foram capturados em Londres.
Das investigações emergiu que a droga que passava pelo Quênia era inserida no mercado britânico com a colaboração de alguns funcionários infiéis da companhia aérea. Além do Quênia, os países da África oriental interessados pelo narcotráfico são Etiópia, Botsuana, Zâmbia e África do Sul. Neste último, segundo o South African Institute of International Affaire, existem 500 mil pessoas que fazem uso de cocaína, enquanto 1/3 dos adolescentes utiliza entorpecentes. Segundo o centro de estudos sul-africano, no país atuam 300 organizações criminais internacionais envolvidas no narcotráfico.
Os países da região se tornaram não somente uma região de trânsito, mas também um novo mercado para os entorpecentes e, em particular, para a cocaína. Na Zâmbia, por exemplo, 80% da cocaína que chega ao país é transferida para a Europa e o restante 20% é consumado localmente.
A Interpol lançou o alarme sobre o crescente consumo de entorpecentes na África. “As drogas não somente transitam nos países, mas permanecem lá”, disse um responsável da organização internacional de polícia diante dos delegados de 150 organismos de polícia de todo o mundo, reunidos para o encontro anual da Interpol no Rio de Janeiro (Brasil). “Já se tornaram habituais as cargas de diversas toneladas de cocaína que passam pela África”, acrescentou.
Segundo um analista presente no seminário, se a tendência ao incremento do uso de entorpecentes continuar avançando, a África deverá enfrentar uma grave crise social derivante da droga.
As condições climáticas da maior parte da África são favoráveis ao cultivo da cânabis. Trata-se de um cultivo que permite um alto lucro para o agricultor e necessita de um trabalho menos intensivo em relação aos outros cultivos.
Inteiras famílias de agricultores podem viver, assim, de modo decente e permitir-se comprar alimento e medicamentos e enviar seus filhos à escola.
A cânabis é cultivada na África principalmente para o mercado local, mas nos últimos anos notou-se um aumento dos tráficos da cânabis originados na África subsaariana. Os maiores cultivos da cânabis se encontram em Comores, Etiópia, Quênia, Madagascar, Tanzânia e Uganda.
No Quênia, o cultivo da cânabis tem uma antiga tradição, mas nos últimos anos se tornou primeiramente uma produção limitada ao mercado local, para depois transformar-se em uma verdadeira empresa comercial ilícita estendida internacionalmente.
A cânabis é cultivada na região ocidental e naquela do Monte Quênia, onde, segundo alguns relatórios, existem cerca de 1.500 hectares cultivados com a cânabis. Os cultivos de droga estão escondidos entre aqueles tradicionais destinados à alimentação, mas há também cultivos menores em algumas áreas protegidas da reserva natural nacional.
Também as regiões costeiras se tornaram produtores da cânabis. Lá, com efeito, se instalaram diversos agricultores provenientes do interior, que lá encontraram áreas férteis e pouco controladas pela polícia, e um mercado constituído pela população local, pelos turistas e pelos residentes estrangeiros que preferem as costas do país.
Quanto ao ópio, no passado foram sinalizados alguns cultivos no Quênia e nas costas de Madagascar. Desde 1993 não foram sinalizados cultivos de opiáceos na África oriental, mas a vastidão do território e os escassos controles das autoridades locais tornam sempre possível uma retomada do cultivo da papoula de ópio.
No que diz respeito à produção local de drogas sintéticas, a África oriental é o ponto de trânsito do methaqualone (Mandrax) proveniente da Índia e destinado ao mercado sul-africano.
Nos últimos anos, a redução do Mandrax proveniente da Índia gerou uma produção local desta substância. Com efeito, foram descobertos laboratórios químicos clandestinos utilizados para a fabricação desta droga sintética em alguns países da África oriental e meridional.
Nos casos dos laboratórios descobertos no Quênia e na Tanzânia, se tratava somente de pequenos centros onde o pó do Mandrax ainda proveniente da Índia era transformado em pílulas, mas em outros casos deparou-se com verdadeiras oficinas para a fabricação do Mandrax com precursores químicos, cuja proveniência permaneceu desconhecida. A este propósito, as substâncias que mais causam preocupação são as efedrinas, as pseudo-efedrinas, o anidrido acético e o ácido N-acetilantranílico (utilizado na fabricação do Mandrax) e o pergamenato de potássio.
O mais famoso cultivo de planta entorpecente local é o khat, que é uma produção legal em diversos países da África oriental. O khat é cultivado na Etiópia e no Quênia e, em medida menos extensa, na Tanzânia, Comores e na parte setentrional de Madagascar. É exportado para os principais mercados da área (Djibuti, Eritréia, Somália e Iêmen), além da Europa e da América setentrional.
O uso do khat continua a expandir-se no Chifre da África e tem um papel-chave na contínua instabilidade da Somália, onde se calcula que a população gasta todos os anos 64 milhões de dólares por ano para comprar o khat. Trata-se de um quantia que é quase o dobro do total das ajudas internacionais doadas ao país. O khat não somente contribui para provocar problemas na sociedade, criando pessoas afetadas pela dependência de entorpecentes, mas tem também um papel na difusão no país de armas leves, frequentemente repassadas em troca de um pouco de droga.
As organizações de narcotraficantes olham com interesse aos países da África oriental e meridional por causa de suas infra-estruturas portuárias e aeroportuárias, dos comprimentos de suas costas e dos fluxos turísticos.
Todos elementos que permitem esconder os tráficos de droga. O Quênia tem o maior porto comercial da região, Mombasa, que serve a maior parte dos países privados de acesso direto ao mar, enquanto o aeroporto de Nairóbi é um dos mais traficados da área. As redes do narcotráfico utilizam também os portos de Dar-es-Salaam (na Tanzânia), Djibuti, Durban (na África do Sul) e Maputo (em Moçambique) e estão expandindo suas atividades também na Etiópia, Mauritius, Tanzânia e Uganda. Esses últimos países são usados como pontos de trânsito para a droga enviada para o Quênia, a África do Sul e a África ocidental e dessas áreas para a Europa e a América do Norte.
A maior parte das substâncias entorpecentes chega à região via mar, escondida nas cargas dos containers transportados pelos navios mercantis que navegam o Oceano Índico. Em alguns casos, os navios dos narcotraficantes se encontram em alto mar com embarcações menores, que levam para a terra a carga ilícita. Grandes quantidades de heroína chegam assim à região, mas se recorre também a carteiros, homens e mulheres, que chegam com vôos comerciais, e ao envio por correio.
Entre os países da África oriental interessados pelo tráfico e pelo consumo de substâncias entorpecentes, está Uganda.
Segundo um recente relatório do UNODC, “Uganda se tornou o país líder no tráfico e no consumo de droga em relação ao restante dos Estados da África oriental”. Entre as drogas presentes no mercado ilícito ugandense, existem a cânabis, a heroína, a cocaína e o mandrax, além do khat. Segundo a agência anticrime da ONU, o aumento do consumo de substâncias entorpecentes é devido a “duas décadas de conflitos armados e à falta de lei, que prejudicaram gravemente a infra-estrutura policial”.
O relatório observa que as condições climáticas de todo o território ugandense são favoráveis ao cultivo da cânabis: “O cultivo ilícito da planta é, porém, relevante em áreas remotas das regiões meridional, ocidental, central, oriental e norte-oriental. As dimensões exatas dos cultivos da cânabis não são conhecidas, mas se notou um aumento da produção da cânabis sobretudo para a exportação”. O aeroporto de Entebbe é, por fim, utilizado como ponto de trânsito para o envio de heroína e de mandrax ao extremo Oriente e à África do Sul.

CONCLUSÕES
A África é um ponto de trânsito sempre mais importante para as organizações de narcotraficantes, apesar de, no momento, a maior parte das apreensões de entorpecentes ocorrer em outras partes do mundo.
Vista a escassa eficiência das polícias africanas e a relativa recente conscientização do problema por parte dos entes locais e internacionais, pode-se supor que a quantidade das apreensões de droga na África não corresponda à entidade efetiva das cargas que transitam pelo continente.
A África, porém, não é mais somente um ponto de passagem da droga proveniente da América Latina e da Ásia em direção à Europa e à América setentrional, mas já se tornou um mercado ainda talvez “residual”, mas em todo caso que não pode ser ignorado pelas redes de narcotraficantes.
Redes nas quais estão presentes africanos, em particular nigerianos, em papéis não somente de gregários, mas também de organizadores. O crescente consumo de drogas por via endovenosa em diversos países africanos, como Tanzânia e Quênia, agrava o problema da difusão da AIDS.
Na Nigéria, por exemplo, um estudo revelou que o consumo de drogas se expande no mesmo ritmo do aumento das pessoas infetadas com o vírus HIV, em cidades como Kano e Port Harcourt.

 
At 9/17/2007 3:08 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

A DROGA NA ÁFRICA: UM PROBLEMA MUNDIAL

A droga já é um problema na África e representa um ulterior obstáculo ao desenvolvimento do continente. É o que afirmam diversos organismos internacionais encarregados da luta ao tráfico de entorpecentes. Já em 2001, um relatório do Órgão Internacional de Controle das Drogas afirmava que “graças à sua experiência no campo do contrabando de haxixe e de heroína, os cartéis da droga da África ocidental buscam novos contatos na América Latina para estender o tráfico de cocaína a toda a região da África subsaariana”.
Trata-se de uma reviravolta fundamental na estratégia do narcotráfico mundial, que vê a África se tornar uma das áreas “fulcro” para a distribuição de drogas em todo o mundo. Até os primeiros anos da década de 90 do século passado, a África era mantida às margens das rotas da droga. A mudança ocorreu em 1993, quando foram apreendidos na Nigéria 300 quilos de heroína provenientes da Tailândia. É o sinal de uma mudança que vê a transformação de tantos pequenos contrabandistas africanos (a maioria nigerianos) de simples transportadores por conta de terceiros a membros de gangues guiadas por africanos, capazes de tratar no mesmo nível com análogas organizações de outros continentes.
A presença dessas organizações criminais, a forte urbanização, a perda dos valores tradicionais africanos e a difusão de uma cultura hedonista são todos fatores que criaram as premissas para um mercado africano da droga. A África, portanto, não é somente um local de trânsito dos entorpecentes, mas terreno “virgem” para o tráfico de droga.

PREMESSA METODOLÓGICA
Os dados apresentados são úteis para analisar a tendência (incremento ou decremento) do tráfico de entorpecentes, apesar de serem muito provavelmente aproximativos.
Segundo um estudo crítico efetuado pela associação ‘Libera’ do pe. Ciotti, com efeito os dados apresentados pelos entes antidrogas internacionais e de alguns Estados não relatam fielmente toda a produção mundial de cocaína. Segundo este estudo (referido somente à cocaína e não a outras drogas), existe uma discrepância entre a estimativa sobre a produção mundial de cocaína efetuada pela ONU e os dados relativos às apreensões e ao consumo de cocaína somente na América.
Segundo os elaboradores do relatório, com efeito, subtraindo das 937 toneladas de produção, indicada pelas Nações Unidas em 2004, as cerca de 450 consumadas nos Estados Unidos, Canadá, México e em toda a América do Sul e as cerca de 490 toneladas apreendidas em todas as Américas, se chegaria a um saldo negativo de 3 toneladas.
“A este ponto, não se saberia mais de onde subtrair as cerca de 99 toneladas de cocaína apreendidas no “resto do mundo”, afirma o relatório. Fazendo-o, se chegaria ao paradoxal saldo negativo de 102 toneladas de cocaína “não resultantes”, não tendo feito frente ainda à demanda de cocaína no “resto do mundo”, estimada em ao menos 300 toneladas, se chega a calcular uma espécie de buraco negro de aproximadamente 400 toneladas de cocaína não resultantes.
Este buraco negro assume proporções ainda mais macroscópicas, cerca de 700 toneladas, se calculado com base nos dados da Agência antidroga norte-americana.
Apesar dos seus limites, os relatórios dos organismos internacionais de luta contra a droga permanecem frequentemente os únicos instrumentos para analisar o fenômeno do narcotráfico.

A HEROÍNA NA ÁFRICA
A apreensão de opiáceos na África registrou um forte incremento nos últimos anos. Segundo dados da ONU, por exemplo, em 2004 ocorreu um incremento da apreensão de heroína de 60% em relação ao ano precedente.
A maior parte deste incremento é devido à apreensão ocorrida na África central e ocidental, que quase triplicou de 2003 a 2004. A heroína que passa pela África é destinada em primeiro lugar aos mercados europeus e, em segundo lugar, aos da América do Norte. A heroína provém dos países do sudoeste e sudeste da Ásia.
A quantia total dos opiáceos apreendida na África permanece ainda modesto (0,3% do total de apreensões em nível mundial). Porém, deve-se levar em consideração que não existem estatísticas confiáveis e que o nível das apreensões não reflete o verdadeiro fluxo de narcóticos que passa pela África por causa da debilidade da polícia local, que tem dificuldade em interceptar as cargas ilícitas.
No que concerne ao uso de opiáceos na África, segundo os dados do Departamento das Nações Unidas para a luta à criminalidade (UNODC), nota-se um aumento de seu consumo no continente africano, em particular na África oriental e naquela austral e em alguns países da África ocidental. Segundo os especialistas das Nações Unidas, o crescimento do consumo de heroína nessas áreas deriva do fato de que são utilizadas como locais de trânsito dos narcotraficantes, os quais, porém, não desdenham em criar um mercado local.
Na África do Sul, um dos poucos países africanos que dispõe de dados confiáveis, até os primeiros anos do novo milênio, o pedido de tratamentos por abuso de heroína representava somente 1% do total dos pedidos de cura por dependência de substâncias entorpecentes (incluído o álcool). Em 2005, esta porcentagem subiu para 7%.
Segundo o relatório do UNODC sobre o tráfico de entorpecentes de 2007, o mercado da heroína está dividido deste modo: a heroína afegã é destinada aos mercados da Ásia central, da Europa, do Oriente Médio e da África; aquela produzida no chamado “triângulo de ouro” alimenta o mercado chinês e o dos outros países asiáticos e da Oceania; aquela proveniente da América Latina serve o mercado norte-americano.
O relatório nota, porém, que “uma parte pequena, mas em crescimento, da produção de opiáceos afegãos é enviada à América setentrional, seja por meio da África oriental e ocidental, seja por meio da Europa”.
O relatório afirma que a demanda global de heroína permaneceu estável, “apesar de importantes incrementos nos países que se encontram no caminho das principais rotas do narcotráfico”.
Entre esses estão também diversos países africanos, afirma o documento, que destaca os efeitos prejudiciais da difusão da heroína e de outras substâncias entorpecentes nas populações já duramente provadas pela pobreza e pela difusão da AIDS.
Os últimos dados do UNODC mostram um forte incremento do uso de heroína em alguns países africanos como Moçambique, Zâmbia, Quênia, Tanzânia e Costa do Marfim, enquanto outros países tiveram um aumento mais contido. Entre esses, África do Sul, Madagascar, Gana, Libéria e Senegal.

DOS ANDES AO KILIMANJARO: UM FLUXO DE COCAÍNA INVADE A ÁFRICA
O dado mais preocupante, porém, é o da cocaína que transita da África em direção principalmente à Europa e, secundariamente, à América setentrional.
A importância da África, e em particular da África ocidental, como ponto de trânsito da cocaína em direção aos ricos mercados ocidentais é demonstrada pelo nível das apreensões registradas nos últimos anos. As apreensões de cocaína em toda a África aumentaram três vezes entre 2003 e 2004, enquanto no mesmo período as apreensões na África ocidental e central aumentaram seis vezes. As apreensões mais importantes no período 2000-2004 se registraram em Cabo Verde, seguido por África do Sul, Quênia, Gana e Nigéria. Mas as apreensões de cocaína na África representam somente 1% do total mundial das apreensões desta substância entorpecente. Também neste caso, porém, o dado é prejudicado devido à debilidade das polícias locais, incapazes de interceptar a maior parte dos fluxos de cocaína proveniente da América do Sul.
Em 2004, 50% das apreensões de cocaína no continente ocorreram na África ocidental e central. A zona de passagem mais utilizada pelos traficantes de cocaína é o Golfo da Guiné, de onde a substância entorpecente é transportada para a Europa em pequenas quantidades, através dos chamados “mulas”, pessoas que assumem o risco de ingerir óvulos de cocaína com a esperança de superar as alfândegas nos aeroportos de destinação. Nos últimos anos, também na África oriental aumentou a quantia de cocaína apreendida, indicando uma tendência a utilizar em medida crescente esta área como ponto de trânsito para a cocaína destinada à Europa e à Ásia.
Um dos países mais atingidos pelo fenômeno é o Quênia, onde em 2004 foi apreendida uma tonelada de cocaína. Em termos gerais, o crescimento da difusão da cocaína na África é demonstrada pelo fato que dos 32 países africanos que fornecem estatísticas sobre as apreensões de entorpecentes na UNODC, 23 (72%) relataram apreensões de cocaína, contra 34% em 1990.
Os traficantes de cocaína tendem a servir-se da África cada vez mais como ponto de trânsito por dois motivos. O primeiro deriva do melhoramento dos sistemas de inspeção utilizados pelas autoridades locais e por aquelas norte-americanas na área caribenha e centro-americana, tradicional rota utilizada pelos traficantes. Nos últimos anos, por exemplo, surgiram bases de inspeção norte-americanas dos Andes às ilhas caribenhas. Também as autoridades holandesas intensificaram a inspeção com patrulhas aéreas baseadas nas ilhas de Curaçao e Saint Martin.
O segundo fator está ligado à diminuição do consumo de cocaína, que se registrou nos Estados Unidos diante de um aumento da demanda na Europa. Se na América do Norte há o mais alto número de consumidores mundiais (6 milhões e meio, correspondente a cerca da metade do consumo mundial), a tendência é diminuir a demanda.
De 1998 a 2004, de fato, se registrou uma queda de 20% da difusão desta substância. No mesmo período, na Europa ocidental, onde os consumidores de cocaína são 3 milhões e meio (26% do total mundial), se notou um aumento do consumo e da difusão do “pó branco”. Na Espanha e no Reino Unido, este dado é de 2%.
A África, portanto, é uma cômoda e segura rota para alcançar um mercado em crescimento.
Além disso, como efeito colateral criou-se um mercado africano que está registrando nos últimos anos preocupantes aumentos.
A crescente disponibilidade de cocaína se traduz, com efeito, em um aumento do consumo desta substância na África. Segundo os dados do UNODC, no período 1992-2004 o abuso da cocaína na África cresceu em um ritmo mais sustentado do que no restante do mundo. Este incremento é mais remarcado nos países da África meridional e nos da África ocidental.
Se forem analisados os dados das pessoas que recorrem aos tratamentos de desintoxicação, o aumento do consumo de cocaína emerge com evidência. No início dos anos 90, as pessoas em tratamento por abuso de cocaína eram pouquíssimas, no final de 1996 constituíam 1.5% dos casos tratados pelas estruturas de recuperação dos toxicômanos, no biênio 1999-2000 eram 6%. No período 2001-2004, notou-se uma inflexão na porcentagem de pessoas que pediam para ser tratadas da dependência de cocaína (menos de 5%).
A partir do final de 2004, este dado está em crescimento: de 7,5% em 2004 passou-se a 8,5% nos primeiros meses de 2005.

A COCAÍNA NA ÁFRICA OCIDENTAL
O país tradicionalmente mais envolvido no narcotráfico é a Nigéria. Lá, com efeito, em 1993 houve a primeira grande apreensão de cocaína na África e as organizações criminais nigerianas estão perfeitamente inseridas no sistema criminal global e transnacional. A afirmação das máfias nigerianas deriva também da pertença da Nigéria ao Commonwealth, que permitiu abrir estreitas relações comerciais com o subcontinente indiano, produtor de ópio e de heroína, e com o mundo anglo-saxão consumidor.
No final dos anos 80, registrou-se um incremento importante no papel de centro estratégico e, em 1992, as apreensões de cocaína no aeroporto de Lagos foram tão relevantes que as autoridades nigerianas suspenderam os vôos diretos para o Rio de Janeiro. Desde então, os traficantes nigerianos são considerados os principais transportadores da droga, uma verdadeira indústria a serviço do comércio de heroína e da coca. Eles estão presentes em todos os pontos-chaves da produção e do tráfico de drogas. Graças aos compatriotas residentes no exterior, formaram clãs criminais comparáveis aos colombianos, turcos e chineses.
As organizações mafiosas nigerianas, como as outras, se baseiam na solidariedade étnica, de clã e de famílias. Já em 1995 as autoridades norte-americanas estimavam que 50% da heroína circulante em seu país era introduzida pelos nigerianos, os quais usam a Polônia e a Hungria como pontos de trânsito para a cocaína destinada à Europa ocidental.
Um dos países da África ocidental dos quais se têm estatísticas confiáveis sobre o incremento do tráfico de cocaína é Gana. Segundo os dados divulgados pelas autoridades locais, em um único ano as apreensões de cocaína aumentaram 40 vezes, passando dos 15 quilogramas de 2003 aos 617 quilos de 2004. A maior parte da cocaína é destinada ao mercado britânico.
Trata-se de um dado significativo, levando-se em consideração que, em termos porcentuais, as apreensões de cocaína aumentaram 18% em nível mundial e 4.000% em Gana de 2003 a 2004. No mesmo período, na África, as apreensões de cocaína aumentaram 3 vezes, passando das 1,1 tonelada para 3,6 toneladas.
Nos anos sucessivos, emergiram outros fatos que demonstram que Gana se tornou um importante ponto de passagem da cocaína na África ocidental. Em novembro de 2005, a polícia ganense apreendeu 588 quilos no decorrer de uma perquirição em uma habitação em East Lagon. Em abril de 2006, foram descobertos a bordo do navio MV Benjamin, atracado no porto de Tema, 2.310 quilos de cocaína.
Segundo um responsável do UNODC, as organizações de narcotraficantes tendem a fazer transitar a droga por meio da África ocidental porque, até agora, as autoridades alfandegárias européias e norte-americanas controlam com menos atenção as mercadorias e as bagagens provenientes da África em relação àquelas provenientes da América Latina. No caso de Gana, como de outros países da região, o fato de não estar inserido na lista dos países produtores de cocaína significa que as suas mercadorias não são sujeitas a inspeções detalhadas. Mas nos últimos anos, as coisas mudaram e Gana foi inserida na lista dos países “de alta prioridade” de inspeção.
Os traficantes buscam corromper os policiais e a polícia para permitir o trânsito das cargas de entorpecentes. Para investigar casos de corrupção de policiais, o Ministério da Fazenda de Gana criou uma Comissão de investigação, que recebeu o nome da sua Presidenta, Georgina Wood, que desempenhou importantes cargos na polícia e na magistratura local. O “Georgina Wood Committee” nasceu após duas importantes apreensões de cocaína citadas precedentemente, nas quais resultaram envolvidos alguns policiais. Entre as recomendações apresentadas pelo Comitê, está reforçar o patrulhamento das costas do país por meio seja da potenciação dos meios da marinha e da aeronáutica, seja com a criação de um serviço de guarda-costas independente.
A Guiné-Bissau é um outro país que se tornou ponto de trânsito da cocaína da América Latina à Europa, como demonstrado numa recente operação que levou à captura de 674 quilos de cocaína e à detenção de alguns narcotraficantes sul-americanos. Na África ocidental, os países mais envolvidos pelos fluxos de droga, além de Gana, são Costa do Marfim, Senegal e Nigéria.
Os traficantes de cocaína na Guiné-Bissau estão ligados aos que passam através do vizinho Senegal, como emergiu da operação efetuada no final de junho de 2007 pela polícia de Dakar, que levou à apreensão de mais de duas toneladas de cocaína. Parte da droga se encontrava em um veleiro que estava à deriva diante das costas senegalesas, e uma outra em uma habitação na área balneária de Mbour, a sul de Dakar.
No veleiro os investigadores encontraram uma documentação que comprova que os narcotraficantes utilizam a Guiné-Bissau como depósito de trânsito da cocaína proveniente da América Latina e destinada à Europa. Também a nacionalidade dos detidos demonstra o grau de internacionalização das organizações criminais dedicadas ao narcotráfico. Além de três cidadãos sul-americanos (um colombiano, um venezuelano e um equatoriano) e de uma cidadã francesa, a polícia deteve três senegaleses. A partir dos documentos detidos, além disso a polícia senegalesa descobriu que os narcotraficantes efetuaram diversas viagens aos países limítrofes: Serra Leoa, Guiné Conakry, Guiné-Bissau e Gâmbia.
As autoridades senegalesas reiteraram que em seu país não existem depósitos de cocaína, mas admitiram a infiltração de grupos criminais estrangeiros, que utilizam o aeroporto de Dakar para enviar cocaína à Europa. No período de janeiro a junho de 2007, a polícia senegalesa afirma ter apreendido no aeroporto de Dakar 44 quilos de cocaína e detido cerca de 30 “mulas” da droga, a maior parte dos quais nigeriano.
Está em aumento também o número de “mulas” da Guiné-Bissau detidos no momento do embarque para Portugal, onde podem entrar sem visto. Além disso, foram descobertas algumas operações de reciclagem de dinheiro sujo por parte de organizações estrangeiras. A apreensão recorde efetuada pela polícia senegalesa, equivalente ao total de apreensões de cocaína na África ocidental de setembro de 2006 a maio de 2007, é somente o último de uma série efetuada nos primeiros seis meses de 2007 em várias localidades da África ocidental.
Entre essas, há 800 quilos de cocaína recuperados no mar diante das ilhas Canárias, e uma quantia análoga apreendida pela marinha francesa no largo da Costa do Marfim. Além dos navios, as organizações criminais recorrem a aviões para alimentar seus tráficos ilícitos.
Na Venezuela foi bloqueado um avião com 2,5 toneladas de cocaína, que se preparava a partir para Serra Leoa, enquanto em maio de 2007 foram apreendidos 600 quilos de cocaína a bordo de um Cessna, matriculado na Venezuela, que efetuou uma aterrissagem de emergência em Nouadhibou, na Mauritânia.
Segundo um responsável do ONUDC, para a África ocidental o aumento de confiscos das cargas de cocaína na região é devido mais a incidentes de percurso que a uma maior eficácia da polícia.
O funcionário considera que a cada dez expedições de droga em direção à Europa, nove chegam a seu destino sem problemas.

O SAHEL: NOVA FRONTEIRA DO NARCOTRÁFICO?
Das costas da África ocidental as organizações de narcotraficantes estão progressivamente se expandindo aos países do Sahel, cujo papel estratégico entre o Atlântico e o Magreb, e, portanto o Mediterrâneo, é apreciado também pelos traficantes de seres humanos e, provavelmente, pelo terrorismo internacional. Não se pode excluir a priori uma interconexão entre essas realidades criminais, de que são cúmplices a debilidade dos Estados e a vastidão dos territórios a controlar. Um realidade que suscita o alarme dos governos interessados.
Em abril deste ano, depois da apreensão de três caminhões cheios de droga e armas, o Presidente do Níger, Mamadou Tandja, declarou que o exército local pretende aumentar os esforços para impedir que o seu país seja “circundado” pelos traficantes de armas e de droga, que são uma “ameaça real” para o país.
Também Burkina Fasso não foge ao fenômeno. Segundo o Coordenador do Comitê contra os tráficos ilícitos de droga em Burkina Fasso, o volume das cargas de droga interceptadas nos primeiros três meses de 2007 é “incrível”. O funcionário indica a existência de uma nova rota de trânsito da droga no oeste e no sudoeste do país. No início de abril de 2007, 49 quilos de cocaína, num valor de 10 milhões de dólares, foram interceptados pela polícia de Burkina Fasso na fronteira com o Mali, que é um importante ponto de trânsito para o tráfico de seres humanos. Países como Mali e Níger são há milênios atravessados por vias de caravanas, que agora se converteram num uso criminal: para o tráfico de seres humanos, mas também de armas, droga e cigarros de contrabando. “Nos últimos meses notamos um aumento da utilização dos países do Sahel, como Mali e Níger, para o tráfico de cocaína”, disse Antonio Razzitelli, Diretor do departamento do UNODC para a África ocidental.
Segundo o órgão anticrime da ONU, os traficantes importam a droga por meio das cidades costeiras como Conakry, na Guiné, Dakar, no Senegal, e Lomé, no Togo, e depois a transportam para as cidades do interior, como Bamako, no Mali, e Ouagadougou, em Burkina Fasso. Dessas localidades, a cocaína prossegue a sua viagem até a Europa.
Segundo o responsável do Comitê contra os tráficos ilícitos de droga em Burkina Fasso, é preciso coordenar os esforços entre as polícias dos Estados da região. “Há uma necessidade urgente de reunir todos os entes nacionais antidroga da região para encontrar o modo de cooperar entre si, para tentar deter as redes criminais”, disse, destacando que a escassa cooperação entre as fronteiras dos países do Sahel e a falta de meios das polícias locais constituem problemas adjuntos para uma eficaz ação de contraste às redes criminais.

O MERCADO DA CÂNABIS
Enquanto a África permanece, no momento, somente um local de trânsito e um mercado residual para drogas como cocaína e heroína, a principal produção local de substâncias entorpecentes é representada pela cânabis.
O cultivo da cânabis foi introduzido na África oriental pelos mercantes árabes, pérsios e indianos no século XII. De lá se difundiu primeiramente na África austral, no século XV, e depois no Congo e em Angola no século XIX. Somente depois da Segunda Guerra Mundial a cânabis chegou à África ocidental, levada por soldados nigerianos e ganenses que combateram com as tropas britânicas na Birmânia (atual Mianmar), onde adquiriram o hábito de fumar marijuana. Este fato explica porque nos países onde a cânabis é conhecida há mais tempo, ela é utilizada na medicina tradicional, enquanto na África ocidental é usada para fins “recreativos”. Até os anos 80, porém, a produção africana da cânabis permaneceu limitada. A partir daqueles anos, porém, notou-se um incremento notável da superfície cultivada com a cânabis para fins comerciais.
A produção desta substância se divide em três categorias: a erva da cânabis (flores e folhas), resina ou haxixe (secreções emitidas pela planta durante a fase de florescimento) e óleo de haxixe, o menos utilizado. Segundo o World Drug Report 2006, a erva da cânabis é cultivada, sobretudo de modo ilegal, em 176 países em todo o mundo. A África representa 27% da produção mundial e os principais produtores são Marrocos (3.700 toneladas), África do Sul (2.200 toneladas) e Nigéria (2 mil toneladas).
No que concerne ao haxixe, o principal produtor mundial é Marrocos, que fornece os mercados norte-africanos e europeus. Graças ao esforço das autoridades marroquinas nos últimos anos, deu-se a diminuição da produção local da cânabis, à qual corresponde um aumento da produção em outros países, da Ásia ocidental (Afeganistão, Paquistão) à Albânia. O UNODC reconhece que desde 2003 o governo de Rabat conduziu uma campanha para estimar a produção de resina da cânabis no país, em cooperação com a Agência anticrime das Nações Unidas. Segundo uma investigação efetuada em 2003, a produção da cânabis foi de 3.060 toneladas, cultivada em 134 mil hectares de terra na região do Rif (norte do país) por 96.600 famílias de camponeses. A investigação feita em 2004 registrou uma diminuição de 10% das terras cultivas com a cânabis, que passaram a 120.500 hectares, com uma produção estimada de 2.760 toneladas.
Em 2005 notou-se uma ulterior diminuição de 37%, sendo a superfície cultivada com a cânabis de 72.500 hectares, enquanto a produção diminuiu para 1.070 toneladas. Quanto às apreensões da cânabis, nos últimos 12-15 anos se registrou um aumento da porcentagem mundial de apreensões no continente africano desta substância. Enquanto em 1990 16% do total mundial das apreensões da cânabis ocorria na África, em 2002 este dado subiu para 20%, para alcançar 31% em 2004. O aumento das apreensões na África é determinado sobretudo pelo aumento dos controles policiais e alfandegários efetuados pela Nigéria e pela África do Sul.
O principal mercado de consumo da cânabis é a Europa ocidental, e 80% da cânabis consumada na Europa provém do Marrocos, passando pela Espanha e pela Holanda e dali distribuída aos outros países. O terceiro mercado mundial de consumo é representado pelos países do norte da África, onde a cânabis provém principalmente do Marrocos. Parte da cânabis produzida no Afeganistão e Paquistão, além disso, alimenta o mercado dos países da África oriental.
No que concerne às problemáticas sociais ligadas ao consumo da cânabis, é preciso recordar que esta substância é a droga mais difundida e usada em nível mundial. Estima-se que, em 2004, 162 milhões de pessoas a tenham usado, o equivalente a 3,9% da população mundial entre 15 e 64 anos. Em termos relativos (a porcentagem de habitantes que faz uso da cânabis em relação a outras substância entorpecentes), a cânabis é prevalentemente utilizada na Oceania, seguida por América do Norte e África. Desde 1992, na África, notou-se também uma tendência ao aumento do seu consumo, em particular na Argélia, Nigéria e Zâmbia.
É provável que a tendência ao uso desta droga seja subestimada em diversos países da África, que não têm uma capacidade de coleta de dados adequados para seguir o fenômeno. Segundo dados parciais, notou-se nos últimos anos um forte incremento do abuso da cânabis na África ocidental, oriental e no norte da África, em sintonia com a tendência em nível global de uma ulterior expansão do consumo desta substância.
Até os anos 80, porém, a produção africana da cânabis permaneceu limitada. A partir daqueles anos, porém, notou-se um incremento notável da superfície cultivada com a cânabis para fins comerciais.
A produção africana de droga subtraiu terras e recursos à agricultura, isso porque naquele período se registrou uma forte queda dos preços dos produtos agrícolas em todo o mundo. A agricultura africana, já frágil, entrou em crise. Diversos camponeses, portanto, deixaram-se tentar pelo cultivo da cânabis em detrimento do cultivo de produtos lícitos.
Um simples cálculo econômico demonstra o forte poder de atração de uma semelhante produção; já em 1995, na Guiné, um saco de 20-25 quilos de marijuana tinha o valor de aproximadamente a renda anual média de uma famílias de oitos pessoas que se dedica à produção de cultivo lícito. No mercado de Kinshasa, na República Democrática do Congo (RDC), um saco de 25 quilos de marijuana é vendido por mil dólares, enquanto um saco de 80 quilos de mandioca vale somente 10 dólares.
Compreende-se, assim, que o cultivo desta substância entorpecente tem sérias repercussões na auto-suficiência alimentar de diversos países africanos. Segundo a associação de luta à toxicomania de Kinshasa, LIPILDRO, por causa do abandono dos cultivos legais por aqueles da cânabis, até 2010 a maior parte das cidades congolesas será atingida por um crise alimentar.
Além disso, na RDC se verificaram experiências para o cultivo da papoula de ópio (na província do Equador) e da cocaína (na região do Shaba). O mais importante produtor da cânabis na África subsaariana permanece, porém, a África do Sul. Importante produções são sinalizadas também em Lesoto e em Malauí.

DROGAS SINTÉTICAS
A produção de drogas sintéticas é limitada na África, com exceção da África do Sul, onde a fabricação de metanfetaminas e methaqualone aumentou nos últimos anos. Os dados sobre a descoberta de laboratórios clandestinos confirmam esta tendência.
Com efeito, se passou da descoberta à destruição de um laboratório por ano no período 1995-1999, aos 17 no período 2000-2003, até aos 28 destruídos somente em 2004. Um outro dado que demonstra o incremento do uso de drogas sintéticas na África do Sul é o aumento das apreensões de ecstasy: em 2004, houve um incremento de 385% das apreensões em relação ao ano precedente.
Além disso, as drogas sintéticas faziam parte do programa de guerra secreta química e biológica aplicado pelo regime do apartheid. Segundo os testemunhos reunidos durante o processo contra o responsável do programa, doutor Wouter Basson (definido “Doutor Morte” pela imprensa local), no âmbito do chamado “Project Coast”, entre 1992 e 1993 os laboratórios relacionados aos serviços secretos sul-africanos tinham produzido mais de 900 quilos de cristais de ecstasy (correspondente a 73 milhões de pílulas). No ano precedente, uma empresa de serviços do regime do apartheid tinha importado 500 quilos desta substância da Croácia.
Essas quantidades de drogas sintéticas foram importadas e produzidas para serem usadas como agente incapacitador para o controle da multidão (e talvez também para drogar secretamente os líderes da oposição para desacreditá-los, fazendo-os cometer gestos ridículos em público) e para serem distribuídas nas favelas habitadas pela população negra para promover o abuso de droga e a dependência.
O fim do regime do apartheid bloqueou este e outros projetos criminais aplicados no âmbito do “Project Coast”. Antes da queda do regime, porém, o dr. Basson tinha organizado a venda das empresas de cobertura dos serviços secretos sul-africanos, alguns dos quais fabricavam armas químicas e biológicas e drogas sintéticas.
Além disso, desapareceram centenas de quilos de substâncias químicas usadas na produção desses instrumentos de morte.
O dr. Basson é suspeito de ter aberto um empresa privada e, com efeito, quando foi detido em 1997 foi encontrado em posse de pílulas de ecstasy num valor de 20 mil dólares.

ÁFRICA ORIENTAL: UMA SITUAÇÃO PREOCUPANTE
Na África oriental, o Quênia é o principal ponto de trânsito da cocaína. Somente em 2004 foi apreendida 1,1 tonelada de cocaína entre a capital Nairóbi e o centro costeiro de Malindi. No decorrer da operação da polícia, que levou à descoberta desta importante carga de droga, foram detidos diversos funcionários da companhia aérea local (que resultou estranha ao narcotráfico), alguns dos quais foram capturados em Londres.
Das investigações emergiu que a droga que passava pelo Quênia era inserida no mercado britânico com a colaboração de alguns funcionários infiéis da companhia aérea. Além do Quênia, os países da África oriental interessados pelo narcotráfico são Etiópia, Botsuana, Zâmbia e África do Sul. Neste último, segundo o South African Institute of International Affaire, existem 500 mil pessoas que fazem uso de cocaína, enquanto 1/3 dos adolescentes utiliza entorpecentes. Segundo o centro de estudos sul-africano, no país atuam 300 organizações criminais internacionais envolvidas no narcotráfico.
Os países da região se tornaram não somente uma região de trânsito, mas também um novo mercado para os entorpecentes e, em particular, para a cocaína. Na Zâmbia, por exemplo, 80% da cocaína que chega ao país é transferida para a Europa e o restante 20% é consumado localmente.
A Interpol lançou o alarme sobre o crescente consumo de entorpecentes na África. “As drogas não somente transitam nos países, mas permanecem lá”, disse um responsável da organização internacional de polícia diante dos delegados de 150 organismos de polícia de todo o mundo, reunidos para o encontro anual da Interpol no Rio de Janeiro (Brasil). “Já se tornaram habituais as cargas de diversas toneladas de cocaína que passam pela África”, acrescentou.
Segundo um analista presente no seminário, se a tendência ao incremento do uso de entorpecentes continuar avançando, a África deverá enfrentar uma grave crise social derivante da droga.
As condições climáticas da maior parte da África são favoráveis ao cultivo da cânabis. Trata-se de um cultivo que permite um alto lucro para o agricultor e necessita de um trabalho menos intensivo em relação aos outros cultivos.
Inteiras famílias de agricultores podem viver, assim, de modo decente e permitir-se comprar alimento e medicamentos e enviar seus filhos à escola.
A cânabis é cultivada na África principalmente para o mercado local, mas nos últimos anos notou-se um aumento dos tráficos da cânabis originados na África subsaariana. Os maiores cultivos da cânabis se encontram em Comores, Etiópia, Quênia, Madagascar, Tanzânia e Uganda.
No Quênia, o cultivo da cânabis tem uma antiga tradição, mas nos últimos anos se tornou primeiramente uma produção limitada ao mercado local, para depois transformar-se em uma verdadeira empresa comercial ilícita estendida internacionalmente.
A cânabis é cultivada na região ocidental e naquela do Monte Quênia, onde, segundo alguns relatórios, existem cerca de 1.500 hectares cultivados com a cânabis. Os cultivos de droga estão escondidos entre aqueles tradicionais destinados à alimentação, mas há também cultivos menores em algumas áreas protegidas da reserva natural nacional.
Também as regiões costeiras se tornaram produtores da cânabis. Lá, com efeito, se instalaram diversos agricultores provenientes do interior, que lá encontraram áreas férteis e pouco controladas pela polícia, e um mercado constituído pela população local, pelos turistas e pelos residentes estrangeiros que preferem as costas do país.
Quanto ao ópio, no passado foram sinalizados alguns cultivos no Quênia e nas costas de Madagascar. Desde 1993 não foram sinalizados cultivos de opiáceos na África oriental, mas a vastidão do território e os escassos controles das autoridades locais tornam sempre possível uma retomada do cultivo da papoula de ópio.
No que diz respeito à produção local de drogas sintéticas, a África oriental é o ponto de trânsito do methaqualone (Mandrax) proveniente da Índia e destinado ao mercado sul-africano.
Nos últimos anos, a redução do Mandrax proveniente da Índia gerou uma produção local desta substância. Com efeito, foram descobertos laboratórios químicos clandestinos utilizados para a fabricação desta droga sintética em alguns países da África oriental e meridional.
Nos casos dos laboratórios descobertos no Quênia e na Tanzânia, se tratava somente de pequenos centros onde o pó do Mandrax ainda proveniente da Índia era transformado em pílulas, mas em outros casos deparou-se com verdadeiras oficinas para a fabricação do Mandrax com precursores químicos, cuja proveniência permaneceu desconhecida. A este propósito, as substâncias que mais causam preocupação são as efedrinas, as pseudo-efedrinas, o anidrido acético e o ácido N-acetilantranílico (utilizado na fabricação do Mandrax) e o pergamenato de potássio.
O mais famoso cultivo de planta entorpecente local é o khat, que é uma produção legal em diversos países da África oriental. O khat é cultivado na Etiópia e no Quênia e, em medida menos extensa, na Tanzânia, Comores e na parte setentrional de Madagascar. É exportado para os principais mercados da área (Djibuti, Eritréia, Somália e Iêmen), além da Europa e da América setentrional.
O uso do khat continua a expandir-se no Chifre da África e tem um papel-chave na contínua instabilidade da Somália, onde se calcula que a população gasta todos os anos 64 milhões de dólares por ano para comprar o khat. Trata-se de um quantia que é quase o dobro do total das ajudas internacionais doadas ao país. O khat não somente contribui para provocar problemas na sociedade, criando pessoas afetadas pela dependência de entorpecentes, mas tem também um papel na difusão no país de armas leves, frequentemente repassadas em troca de um pouco de droga.
As organizações de narcotraficantes olham com interesse aos países da África oriental e meridional por causa de suas infra-estruturas portuárias e aeroportuárias, dos comprimentos de suas costas e dos fluxos turísticos.
Todos elementos que permitem esconder os tráficos de droga. O Quênia tem o maior porto comercial da região, Mombasa, que serve a maior parte dos países privados de acesso direto ao mar, enquanto o aeroporto de Nairóbi é um dos mais traficados da área. As redes do narcotráfico utilizam também os portos de Dar-es-Salaam (na Tanzânia), Djibuti, Durban (na África do Sul) e Maputo (em Moçambique) e estão expandindo suas atividades também na Etiópia, Mauritius, Tanzânia e Uganda. Esses últimos países são usados como pontos de trânsito para a droga enviada para o Quênia, a África do Sul e a África ocidental e dessas áreas para a Europa e a América do Norte.
A maior parte das substâncias entorpecentes chega à região via mar, escondida nas cargas dos containers transportados pelos navios mercantis que navegam o Oceano Índico. Em alguns casos, os navios dos narcotraficantes se encontram em alto mar com embarcações menores, que levam para a terra a carga ilícita. Grandes quantidades de heroína chegam assim à região, mas se recorre também a carteiros, homens e mulheres, que chegam com vôos comerciais, e ao envio por correio.
Entre os países da África oriental interessados pelo tráfico e pelo consumo de substâncias entorpecentes, está Uganda.
Segundo um recente relatório do UNODC, “Uganda se tornou o país líder no tráfico e no consumo de droga em relação ao restante dos Estados da África oriental”. Entre as drogas presentes no mercado ilícito ugandense, existem a cânabis, a heroína, a cocaína e o mandrax, além do khat. Segundo a agência anticrime da ONU, o aumento do consumo de substâncias entorpecentes é devido a “duas décadas de conflitos armados e à falta de lei, que prejudicaram gravemente a infra-estrutura policial”.
O relatório observa que as condições climáticas de todo o território ugandense são favoráveis ao cultivo da cânabis: “O cultivo ilícito da planta é, porém, relevante em áreas remotas das regiões meridional, ocidental, central, oriental e norte-oriental. As dimensões exatas dos cultivos da cânabis não são conhecidas, mas se notou um aumento da produção da cânabis sobretudo para a exportação”. O aeroporto de Entebbe é, por fim, utilizado como ponto de trânsito para o envio de heroína e de mandrax ao extremo Oriente e à África do Sul.

CONCLUSÕES
A África é um ponto de trânsito sempre mais importante para as organizações de narcotraficantes, apesar de, no momento, a maior parte das apreensões de entorpecentes ocorrer em outras partes do mundo.
Vista a escassa eficiência das polícias africanas e a relativa recente conscientização do problema por parte dos entes locais e internacionais, pode-se supor que a quantidade das apreensões de droga na África não corresponda à entidade efetiva das cargas que transitam pelo continente.
A África, porém, não é mais somente um ponto de passagem da droga proveniente da América Latina e da Ásia em direção à Europa e à América setentrional, mas já se tornou um mercado ainda talvez “residual”, mas em todo caso que não pode ser ignorado pelas redes de narcotraficantes.
Redes nas quais estão presentes africanos, em particular nigerianos, em papéis não somente de gregários, mas também de organizadores. O crescente consumo de drogas por via endovenosa em diversos países africanos, como Tanzânia e Quênia, agrava o problema da difusão da AIDS.
Na Nigéria, por exemplo, um estudo revelou que o consumo de drogas se expande no mesmo ritmo do aumento das pessoas infetadas com o vírus HIV, em cidades como Kano e Port Harcourt.

 
At 9/17/2007 3:08 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

A DROGA NA ÁFRICA: UM PROBLEMA MUNDIAL

A droga já é um problema na África e representa um ulterior obstáculo ao desenvolvimento do continente. É o que afirmam diversos organismos internacionais encarregados da luta ao tráfico de entorpecentes. Já em 2001, um relatório do Órgão Internacional de Controle das Drogas afirmava que “graças à sua experiência no campo do contrabando de haxixe e de heroína, os cartéis da droga da África ocidental buscam novos contatos na América Latina para estender o tráfico de cocaína a toda a região da África subsaariana”.
Trata-se de uma reviravolta fundamental na estratégia do narcotráfico mundial, que vê a África se tornar uma das áreas “fulcro” para a distribuição de drogas em todo o mundo. Até os primeiros anos da década de 90 do século passado, a África era mantida às margens das rotas da droga. A mudança ocorreu em 1993, quando foram apreendidos na Nigéria 300 quilos de heroína provenientes da Tailândia. É o sinal de uma mudança que vê a transformação de tantos pequenos contrabandistas africanos (a maioria nigerianos) de simples transportadores por conta de terceiros a membros de gangues guiadas por africanos, capazes de tratar no mesmo nível com análogas organizações de outros continentes.
A presença dessas organizações criminais, a forte urbanização, a perda dos valores tradicionais africanos e a difusão de uma cultura hedonista são todos fatores que criaram as premissas para um mercado africano da droga. A África, portanto, não é somente um local de trânsito dos entorpecentes, mas terreno “virgem” para o tráfico de droga.

PREMESSA METODOLÓGICA
Os dados apresentados são úteis para analisar a tendência (incremento ou decremento) do tráfico de entorpecentes, apesar de serem muito provavelmente aproximativos.
Segundo um estudo crítico efetuado pela associação ‘Libera’ do pe. Ciotti, com efeito os dados apresentados pelos entes antidrogas internacionais e de alguns Estados não relatam fielmente toda a produção mundial de cocaína. Segundo este estudo (referido somente à cocaína e não a outras drogas), existe uma discrepância entre a estimativa sobre a produção mundial de cocaína efetuada pela ONU e os dados relativos às apreensões e ao consumo de cocaína somente na América.
Segundo os elaboradores do relatório, com efeito, subtraindo das 937 toneladas de produção, indicada pelas Nações Unidas em 2004, as cerca de 450 consumadas nos Estados Unidos, Canadá, México e em toda a América do Sul e as cerca de 490 toneladas apreendidas em todas as Américas, se chegaria a um saldo negativo de 3 toneladas.
“A este ponto, não se saberia mais de onde subtrair as cerca de 99 toneladas de cocaína apreendidas no “resto do mundo”, afirma o relatório. Fazendo-o, se chegaria ao paradoxal saldo negativo de 102 toneladas de cocaína “não resultantes”, não tendo feito frente ainda à demanda de cocaína no “resto do mundo”, estimada em ao menos 300 toneladas, se chega a calcular uma espécie de buraco negro de aproximadamente 400 toneladas de cocaína não resultantes.
Este buraco negro assume proporções ainda mais macroscópicas, cerca de 700 toneladas, se calculado com base nos dados da Agência antidroga norte-americana.
Apesar dos seus limites, os relatórios dos organismos internacionais de luta contra a droga permanecem frequentemente os únicos instrumentos para analisar o fenômeno do narcotráfico.

A HEROÍNA NA ÁFRICA
A apreensão de opiáceos na África registrou um forte incremento nos últimos anos. Segundo dados da ONU, por exemplo, em 2004 ocorreu um incremento da apreensão de heroína de 60% em relação ao ano precedente.
A maior parte deste incremento é devido à apreensão ocorrida na África central e ocidental, que quase triplicou de 2003 a 2004. A heroína que passa pela África é destinada em primeiro lugar aos mercados europeus e, em segundo lugar, aos da América do Norte. A heroína provém dos países do sudoeste e sudeste da Ásia.
A quantia total dos opiáceos apreendida na África permanece ainda modesto (0,3% do total de apreensões em nível mundial). Porém, deve-se levar em consideração que não existem estatísticas confiáveis e que o nível das apreensões não reflete o verdadeiro fluxo de narcóticos que passa pela África por causa da debilidade da polícia local, que tem dificuldade em interceptar as cargas ilícitas.
No que concerne ao uso de opiáceos na África, segundo os dados do Departamento das Nações Unidas para a luta à criminalidade (UNODC), nota-se um aumento de seu consumo no continente africano, em particular na África oriental e naquela austral e em alguns países da África ocidental. Segundo os especialistas das Nações Unidas, o crescimento do consumo de heroína nessas áreas deriva do fato de que são utilizadas como locais de trânsito dos narcotraficantes, os quais, porém, não desdenham em criar um mercado local.
Na África do Sul, um dos poucos países africanos que dispõe de dados confiáveis, até os primeiros anos do novo milênio, o pedido de tratamentos por abuso de heroína representava somente 1% do total dos pedidos de cura por dependência de substâncias entorpecentes (incluído o álcool). Em 2005, esta porcentagem subiu para 7%.
Segundo o relatório do UNODC sobre o tráfico de entorpecentes de 2007, o mercado da heroína está dividido deste modo: a heroína afegã é destinada aos mercados da Ásia central, da Europa, do Oriente Médio e da África; aquela produzida no chamado “triângulo de ouro” alimenta o mercado chinês e o dos outros países asiáticos e da Oceania; aquela proveniente da América Latina serve o mercado norte-americano.
O relatório nota, porém, que “uma parte pequena, mas em crescimento, da produção de opiáceos afegãos é enviada à América setentrional, seja por meio da África oriental e ocidental, seja por meio da Europa”.
O relatório afirma que a demanda global de heroína permaneceu estável, “apesar de importantes incrementos nos países que se encontram no caminho das principais rotas do narcotráfico”.
Entre esses estão também diversos países africanos, afirma o documento, que destaca os efeitos prejudiciais da difusão da heroína e de outras substâncias entorpecentes nas populações já duramente provadas pela pobreza e pela difusão da AIDS.
Os últimos dados do UNODC mostram um forte incremento do uso de heroína em alguns países africanos como Moçambique, Zâmbia, Quênia, Tanzânia e Costa do Marfim, enquanto outros países tiveram um aumento mais contido. Entre esses, África do Sul, Madagascar, Gana, Libéria e Senegal.

DOS ANDES AO KILIMANJARO: UM FLUXO DE COCAÍNA INVADE A ÁFRICA
O dado mais preocupante, porém, é o da cocaína que transita da África em direção principalmente à Europa e, secundariamente, à América setentrional.
A importância da África, e em particular da África ocidental, como ponto de trânsito da cocaína em direção aos ricos mercados ocidentais é demonstrada pelo nível das apreensões registradas nos últimos anos. As apreensões de cocaína em toda a África aumentaram três vezes entre 2003 e 2004, enquanto no mesmo período as apreensões na África ocidental e central aumentaram seis vezes. As apreensões mais importantes no período 2000-2004 se registraram em Cabo Verde, seguido por África do Sul, Quênia, Gana e Nigéria. Mas as apreensões de cocaína na África representam somente 1% do total mundial das apreensões desta substância entorpecente. Também neste caso, porém, o dado é prejudicado devido à debilidade das polícias locais, incapazes de interceptar a maior parte dos fluxos de cocaína proveniente da América do Sul.
Em 2004, 50% das apreensões de cocaína no continente ocorreram na África ocidental e central. A zona de passagem mais utilizada pelos traficantes de cocaína é o Golfo da Guiné, de onde a substância entorpecente é transportada para a Europa em pequenas quantidades, através dos chamados “mulas”, pessoas que assumem o risco de ingerir óvulos de cocaína com a esperança de superar as alfândegas nos aeroportos de destinação. Nos últimos anos, também na África oriental aumentou a quantia de cocaína apreendida, indicando uma tendência a utilizar em medida crescente esta área como ponto de trânsito para a cocaína destinada à Europa e à Ásia.
Um dos países mais atingidos pelo fenômeno é o Quênia, onde em 2004 foi apreendida uma tonelada de cocaína. Em termos gerais, o crescimento da difusão da cocaína na África é demonstrada pelo fato que dos 32 países africanos que fornecem estatísticas sobre as apreensões de entorpecentes na UNODC, 23 (72%) relataram apreensões de cocaína, contra 34% em 1990.
Os traficantes de cocaína tendem a servir-se da África cada vez mais como ponto de trânsito por dois motivos. O primeiro deriva do melhoramento dos sistemas de inspeção utilizados pelas autoridades locais e por aquelas norte-americanas na área caribenha e centro-americana, tradicional rota utilizada pelos traficantes. Nos últimos anos, por exemplo, surgiram bases de inspeção norte-americanas dos Andes às ilhas caribenhas. Também as autoridades holandesas intensificaram a inspeção com patrulhas aéreas baseadas nas ilhas de Curaçao e Saint Martin.
O segundo fator está ligado à diminuição do consumo de cocaína, que se registrou nos Estados Unidos diante de um aumento da demanda na Europa. Se na América do Norte há o mais alto número de consumidores mundiais (6 milhões e meio, correspondente a cerca da metade do consumo mundial), a tendência é diminuir a demanda.
De 1998 a 2004, de fato, se registrou uma queda de 20% da difusão desta substância. No mesmo período, na Europa ocidental, onde os consumidores de cocaína são 3 milhões e meio (26% do total mundial), se notou um aumento do consumo e da difusão do “pó branco”. Na Espanha e no Reino Unido, este dado é de 2%.
A África, portanto, é uma cômoda e segura rota para alcançar um mercado em crescimento.
Além disso, como efeito colateral criou-se um mercado africano que está registrando nos últimos anos preocupantes aumentos.
A crescente disponibilidade de cocaína se traduz, com efeito, em um aumento do consumo desta substância na África. Segundo os dados do UNODC, no período 1992-2004 o abuso da cocaína na África cresceu em um ritmo mais sustentado do que no restante do mundo. Este incremento é mais remarcado nos países da África meridional e nos da África ocidental.
Se forem analisados os dados das pessoas que recorrem aos tratamentos de desintoxicação, o aumento do consumo de cocaína emerge com evidência. No início dos anos 90, as pessoas em tratamento por abuso de cocaína eram pouquíssimas, no final de 1996 constituíam 1.5% dos casos tratados pelas estruturas de recuperação dos toxicômanos, no biênio 1999-2000 eram 6%. No período 2001-2004, notou-se uma inflexão na porcentagem de pessoas que pediam para ser tratadas da dependência de cocaína (menos de 5%).
A partir do final de 2004, este dado está em crescimento: de 7,5% em 2004 passou-se a 8,5% nos primeiros meses de 2005.

A COCAÍNA NA ÁFRICA OCIDENTAL
O país tradicionalmente mais envolvido no narcotráfico é a Nigéria. Lá, com efeito, em 1993 houve a primeira grande apreensão de cocaína na África e as organizações criminais nigerianas estão perfeitamente inseridas no sistema criminal global e transnacional. A afirmação das máfias nigerianas deriva também da pertença da Nigéria ao Commonwealth, que permitiu abrir estreitas relações comerciais com o subcontinente indiano, produtor de ópio e de heroína, e com o mundo anglo-saxão consumidor.
No final dos anos 80, registrou-se um incremento importante no papel de centro estratégico e, em 1992, as apreensões de cocaína no aeroporto de Lagos foram tão relevantes que as autoridades nigerianas suspenderam os vôos diretos para o Rio de Janeiro. Desde então, os traficantes nigerianos são considerados os principais transportadores da droga, uma verdadeira indústria a serviço do comércio de heroína e da coca. Eles estão presentes em todos os pontos-chaves da produção e do tráfico de drogas. Graças aos compatriotas residentes no exterior, formaram clãs criminais comparáveis aos colombianos, turcos e chineses.
As organizações mafiosas nigerianas, como as outras, se baseiam na solidariedade étnica, de clã e de famílias. Já em 1995 as autoridades norte-americanas estimavam que 50% da heroína circulante em seu país era introduzida pelos nigerianos, os quais usam a Polônia e a Hungria como pontos de trânsito para a cocaína destinada à Europa ocidental.
Um dos países da África ocidental dos quais se têm estatísticas confiáveis sobre o incremento do tráfico de cocaína é Gana. Segundo os dados divulgados pelas autoridades locais, em um único ano as apreensões de cocaína aumentaram 40 vezes, passando dos 15 quilogramas de 2003 aos 617 quilos de 2004. A maior parte da cocaína é destinada ao mercado britânico.
Trata-se de um dado significativo, levando-se em consideração que, em termos porcentuais, as apreensões de cocaína aumentaram 18% em nível mundial e 4.000% em Gana de 2003 a 2004. No mesmo período, na África, as apreensões de cocaína aumentaram 3 vezes, passando das 1,1 tonelada para 3,6 toneladas.
Nos anos sucessivos, emergiram outros fatos que demonstram que Gana se tornou um importante ponto de passagem da cocaína na África ocidental. Em novembro de 2005, a polícia ganense apreendeu 588 quilos no decorrer de uma perquirição em uma habitação em East Lagon. Em abril de 2006, foram descobertos a bordo do navio MV Benjamin, atracado no porto de Tema, 2.310 quilos de cocaína.
Segundo um responsável do UNODC, as organizações de narcotraficantes tendem a fazer transitar a droga por meio da África ocidental porque, até agora, as autoridades alfandegárias européias e norte-americanas controlam com menos atenção as mercadorias e as bagagens provenientes da África em relação àquelas provenientes da América Latina. No caso de Gana, como de outros países da região, o fato de não estar inserido na lista dos países produtores de cocaína significa que as suas mercadorias não são sujeitas a inspeções detalhadas. Mas nos últimos anos, as coisas mudaram e Gana foi inserida na lista dos países “de alta prioridade” de inspeção.
Os traficantes buscam corromper os policiais e a polícia para permitir o trânsito das cargas de entorpecentes. Para investigar casos de corrupção de policiais, o Ministério da Fazenda de Gana criou uma Comissão de investigação, que recebeu o nome da sua Presidenta, Georgina Wood, que desempenhou importantes cargos na polícia e na magistratura local. O “Georgina Wood Committee” nasceu após duas importantes apreensões de cocaína citadas precedentemente, nas quais resultaram envolvidos alguns policiais. Entre as recomendações apresentadas pelo Comitê, está reforçar o patrulhamento das costas do país por meio seja da potenciação dos meios da marinha e da aeronáutica, seja com a criação de um serviço de guarda-costas independente.
A Guiné-Bissau é um outro país que se tornou ponto de trânsito da cocaína da América Latina à Europa, como demonstrado numa recente operação que levou à captura de 674 quilos de cocaína e à detenção de alguns narcotraficantes sul-americanos. Na África ocidental, os países mais envolvidos pelos fluxos de droga, além de Gana, são Costa do Marfim, Senegal e Nigéria.
Os traficantes de cocaína na Guiné-Bissau estão ligados aos que passam através do vizinho Senegal, como emergiu da operação efetuada no final de junho de 2007 pela polícia de Dakar, que levou à apreensão de mais de duas toneladas de cocaína. Parte da droga se encontrava em um veleiro que estava à deriva diante das costas senegalesas, e uma outra em uma habitação na área balneária de Mbour, a sul de Dakar.
No veleiro os investigadores encontraram uma documentação que comprova que os narcotraficantes utilizam a Guiné-Bissau como depósito de trânsito da cocaína proveniente da América Latina e destinada à Europa. Também a nacionalidade dos detidos demonstra o grau de internacionalização das organizações criminais dedicadas ao narcotráfico. Além de três cidadãos sul-americanos (um colombiano, um venezuelano e um equatoriano) e de uma cidadã francesa, a polícia deteve três senegaleses. A partir dos documentos detidos, além disso a polícia senegalesa descobriu que os narcotraficantes efetuaram diversas viagens aos países limítrofes: Serra Leoa, Guiné Conakry, Guiné-Bissau e Gâmbia.
As autoridades senegalesas reiteraram que em seu país não existem depósitos de cocaína, mas admitiram a infiltração de grupos criminais estrangeiros, que utilizam o aeroporto de Dakar para enviar cocaína à Europa. No período de janeiro a junho de 2007, a polícia senegalesa afirma ter apreendido no aeroporto de Dakar 44 quilos de cocaína e detido cerca de 30 “mulas” da droga, a maior parte dos quais nigeriano.
Está em aumento também o número de “mulas” da Guiné-Bissau detidos no momento do embarque para Portugal, onde podem entrar sem visto. Além disso, foram descobertas algumas operações de reciclagem de dinheiro sujo por parte de organizações estrangeiras. A apreensão recorde efetuada pela polícia senegalesa, equivalente ao total de apreensões de cocaína na África ocidental de setembro de 2006 a maio de 2007, é somente o último de uma série efetuada nos primeiros seis meses de 2007 em várias localidades da África ocidental.
Entre essas, há 800 quilos de cocaína recuperados no mar diante das ilhas Canárias, e uma quantia análoga apreendida pela marinha francesa no largo da Costa do Marfim. Além dos navios, as organizações criminais recorrem a aviões para alimentar seus tráficos ilícitos.
Na Venezuela foi bloqueado um avião com 2,5 toneladas de cocaína, que se preparava a partir para Serra Leoa, enquanto em maio de 2007 foram apreendidos 600 quilos de cocaína a bordo de um Cessna, matriculado na Venezuela, que efetuou uma aterrissagem de emergência em Nouadhibou, na Mauritânia.
Segundo um responsável do ONUDC, para a África ocidental o aumento de confiscos das cargas de cocaína na região é devido mais a incidentes de percurso que a uma maior eficácia da polícia.
O funcionário considera que a cada dez expedições de droga em direção à Europa, nove chegam a seu destino sem problemas.

O SAHEL: NOVA FRONTEIRA DO NARCOTRÁFICO?
Das costas da África ocidental as organizações de narcotraficantes estão progressivamente se expandindo aos países do Sahel, cujo papel estratégico entre o Atlântico e o Magreb, e, portanto o Mediterrâneo, é apreciado também pelos traficantes de seres humanos e, provavelmente, pelo terrorismo internacional. Não se pode excluir a priori uma interconexão entre essas realidades criminais, de que são cúmplices a debilidade dos Estados e a vastidão dos territórios a controlar. Um realidade que suscita o alarme dos governos interessados.
Em abril deste ano, depois da apreensão de três caminhões cheios de droga e armas, o Presidente do Níger, Mamadou Tandja, declarou que o exército local pretende aumentar os esforços para impedir que o seu país seja “circundado” pelos traficantes de armas e de droga, que são uma “ameaça real” para o país.
Também Burkina Fasso não foge ao fenômeno. Segundo o Coordenador do Comitê contra os tráficos ilícitos de droga em Burkina Fasso, o volume das cargas de droga interceptadas nos primeiros três meses de 2007 é “incrível”. O funcionário indica a existência de uma nova rota de trânsito da droga no oeste e no sudoeste do país. No início de abril de 2007, 49 quilos de cocaína, num valor de 10 milhões de dólares, foram interceptados pela polícia de Burkina Fasso na fronteira com o Mali, que é um importante ponto de trânsito para o tráfico de seres humanos. Países como Mali e Níger são há milênios atravessados por vias de caravanas, que agora se converteram num uso criminal: para o tráfico de seres humanos, mas também de armas, droga e cigarros de contrabando. “Nos últimos meses notamos um aumento da utilização dos países do Sahel, como Mali e Níger, para o tráfico de cocaína”, disse Antonio Razzitelli, Diretor do departamento do UNODC para a África ocidental.
Segundo o órgão anticrime da ONU, os traficantes importam a droga por meio das cidades costeiras como Conakry, na Guiné, Dakar, no Senegal, e Lomé, no Togo, e depois a transportam para as cidades do interior, como Bamako, no Mali, e Ouagadougou, em Burkina Fasso. Dessas localidades, a cocaína prossegue a sua viagem até a Europa.
Segundo o responsável do Comitê contra os tráficos ilícitos de droga em Burkina Fasso, é preciso coordenar os esforços entre as polícias dos Estados da região. “Há uma necessidade urgente de reunir todos os entes nacionais antidroga da região para encontrar o modo de cooperar entre si, para tentar deter as redes criminais”, disse, destacando que a escassa cooperação entre as fronteiras dos países do Sahel e a falta de meios das polícias locais constituem problemas adjuntos para uma eficaz ação de contraste às redes criminais.

O MERCADO DA CÂNABIS
Enquanto a África permanece, no momento, somente um local de trânsito e um mercado residual para drogas como cocaína e heroína, a principal produção local de substâncias entorpecentes é representada pela cânabis.
O cultivo da cânabis foi introduzido na África oriental pelos mercantes árabes, pérsios e indianos no século XII. De lá se difundiu primeiramente na África austral, no século XV, e depois no Congo e em Angola no século XIX. Somente depois da Segunda Guerra Mundial a cânabis chegou à África ocidental, levada por soldados nigerianos e ganenses que combateram com as tropas britânicas na Birmânia (atual Mianmar), onde adquiriram o hábito de fumar marijuana. Este fato explica porque nos países onde a cânabis é conhecida há mais tempo, ela é utilizada na medicina tradicional, enquanto na África ocidental é usada para fins “recreativos”. Até os anos 80, porém, a produção africana da cânabis permaneceu limitada. A partir daqueles anos, porém, notou-se um incremento notável da superfície cultivada com a cânabis para fins comerciais.
A produção desta substância se divide em três categorias: a erva da cânabis (flores e folhas), resina ou haxixe (secreções emitidas pela planta durante a fase de florescimento) e óleo de haxixe, o menos utilizado. Segundo o World Drug Report 2006, a erva da cânabis é cultivada, sobretudo de modo ilegal, em 176 países em todo o mundo. A África representa 27% da produção mundial e os principais produtores são Marrocos (3.700 toneladas), África do Sul (2.200 toneladas) e Nigéria (2 mil toneladas).
No que concerne ao haxixe, o principal produtor mundial é Marrocos, que fornece os mercados norte-africanos e europeus. Graças ao esforço das autoridades marroquinas nos últimos anos, deu-se a diminuição da produção local da cânabis, à qual corresponde um aumento da produção em outros países, da Ásia ocidental (Afeganistão, Paquistão) à Albânia. O UNODC reconhece que desde 2003 o governo de Rabat conduziu uma campanha para estimar a produção de resina da cânabis no país, em cooperação com a Agência anticrime das Nações Unidas. Segundo uma investigação efetuada em 2003, a produção da cânabis foi de 3.060 toneladas, cultivada em 134 mil hectares de terra na região do Rif (norte do país) por 96.600 famílias de camponeses. A investigação feita em 2004 registrou uma diminuição de 10% das terras cultivas com a cânabis, que passaram a 120.500 hectares, com uma produção estimada de 2.760 toneladas.
Em 2005 notou-se uma ulterior diminuição de 37%, sendo a superfície cultivada com a cânabis de 72.500 hectares, enquanto a produção diminuiu para 1.070 toneladas. Quanto às apreensões da cânabis, nos últimos 12-15 anos se registrou um aumento da porcentagem mundial de apreensões no continente africano desta substância. Enquanto em 1990 16% do total mundial das apreensões da cânabis ocorria na África, em 2002 este dado subiu para 20%, para alcançar 31% em 2004. O aumento das apreensões na África é determinado sobretudo pelo aumento dos controles policiais e alfandegários efetuados pela Nigéria e pela África do Sul.
O principal mercado de consumo da cânabis é a Europa ocidental, e 80% da cânabis consumada na Europa provém do Marrocos, passando pela Espanha e pela Holanda e dali distribuída aos outros países. O terceiro mercado mundial de consumo é representado pelos países do norte da África, onde a cânabis provém principalmente do Marrocos. Parte da cânabis produzida no Afeganistão e Paquistão, além disso, alimenta o mercado dos países da África oriental.
No que concerne às problemáticas sociais ligadas ao consumo da cânabis, é preciso recordar que esta substância é a droga mais difundida e usada em nível mundial. Estima-se que, em 2004, 162 milhões de pessoas a tenham usado, o equivalente a 3,9% da população mundial entre 15 e 64 anos. Em termos relativos (a porcentagem de habitantes que faz uso da cânabis em relação a outras substância entorpecentes), a cânabis é prevalentemente utilizada na Oceania, seguida por América do Norte e África. Desde 1992, na África, notou-se também uma tendência ao aumento do seu consumo, em particular na Argélia, Nigéria e Zâmbia.
É provável que a tendência ao uso desta droga seja subestimada em diversos países da África, que não têm uma capacidade de coleta de dados adequados para seguir o fenômeno. Segundo dados parciais, notou-se nos últimos anos um forte incremento do abuso da cânabis na África ocidental, oriental e no norte da África, em sintonia com a tendência em nível global de uma ulterior expansão do consumo desta substância.
Até os anos 80, porém, a produção africana da cânabis permaneceu limitada. A partir daqueles anos, porém, notou-se um incremento notável da superfície cultivada com a cânabis para fins comerciais.
A produção africana de droga subtraiu terras e recursos à agricultura, isso porque naquele período se registrou uma forte queda dos preços dos produtos agrícolas em todo o mundo. A agricultura africana, já frágil, entrou em crise. Diversos camponeses, portanto, deixaram-se tentar pelo cultivo da cânabis em detrimento do cultivo de produtos lícitos.
Um simples cálculo econômico demonstra o forte poder de atração de uma semelhante produção; já em 1995, na Guiné, um saco de 20-25 quilos de marijuana tinha o valor de aproximadamente a renda anual média de uma famílias de oitos pessoas que se dedica à produção de cultivo lícito. No mercado de Kinshasa, na República Democrática do Congo (RDC), um saco de 25 quilos de marijuana é vendido por mil dólares, enquanto um saco de 80 quilos de mandioca vale somente 10 dólares.
Compreende-se, assim, que o cultivo desta substância entorpecente tem sérias repercussões na auto-suficiência alimentar de diversos países africanos. Segundo a associação de luta à toxicomania de Kinshasa, LIPILDRO, por causa do abandono dos cultivos legais por aqueles da cânabis, até 2010 a maior parte das cidades congolesas será atingida por um crise alimentar.
Além disso, na RDC se verificaram experiências para o cultivo da papoula de ópio (na província do Equador) e da cocaína (na região do Shaba). O mais importante produtor da cânabis na África subsaariana permanece, porém, a África do Sul. Importante produções são sinalizadas também em Lesoto e em Malauí.

DROGAS SINTÉTICAS
A produção de drogas sintéticas é limitada na África, com exceção da África do Sul, onde a fabricação de metanfetaminas e methaqualone aumentou nos últimos anos. Os dados sobre a descoberta de laboratórios clandestinos confirmam esta tendência.
Com efeito, se passou da descoberta à destruição de um laboratório por ano no período 1995-1999, aos 17 no período 2000-2003, até aos 28 destruídos somente em 2004. Um outro dado que demonstra o incremento do uso de drogas sintéticas na África do Sul é o aumento das apreensões de ecstasy: em 2004, houve um incremento de 385% das apreensões em relação ao ano precedente.
Além disso, as drogas sintéticas faziam parte do programa de guerra secreta química e biológica aplicado pelo regime do apartheid. Segundo os testemunhos reunidos durante o processo contra o responsável do programa, doutor Wouter Basson (definido “Doutor Morte” pela imprensa local), no âmbito do chamado “Project Coast”, entre 1992 e 1993 os laboratórios relacionados aos serviços secretos sul-africanos tinham produzido mais de 900 quilos de cristais de ecstasy (correspondente a 73 milhões de pílulas). No ano precedente, uma empresa de serviços do regime do apartheid tinha importado 500 quilos desta substância da Croácia.
Essas quantidades de drogas sintéticas foram importadas e produzidas para serem usadas como agente incapacitador para o controle da multidão (e talvez também para drogar secretamente os líderes da oposição para desacreditá-los, fazendo-os cometer gestos ridículos em público) e para serem distribuídas nas favelas habitadas pela população negra para promover o abuso de droga e a dependência.
O fim do regime do apartheid bloqueou este e outros projetos criminais aplicados no âmbito do “Project Coast”. Antes da queda do regime, porém, o dr. Basson tinha organizado a venda das empresas de cobertura dos serviços secretos sul-africanos, alguns dos quais fabricavam armas químicas e biológicas e drogas sintéticas.
Além disso, desapareceram centenas de quilos de substâncias químicas usadas na produção desses instrumentos de morte.
O dr. Basson é suspeito de ter aberto um empresa privada e, com efeito, quando foi detido em 1997 foi encontrado em posse de pílulas de ecstasy num valor de 20 mil dólares.

ÁFRICA ORIENTAL: UMA SITUAÇÃO PREOCUPANTE
Na África oriental, o Quênia é o principal ponto de trânsito da cocaína. Somente em 2004 foi apreendida 1,1 tonelada de cocaína entre a capital Nairóbi e o centro costeiro de Malindi. No decorrer da operação da polícia, que levou à descoberta desta importante carga de droga, foram detidos diversos funcionários da companhia aérea local (que resultou estranha ao narcotráfico), alguns dos quais foram capturados em Londres.
Das investigações emergiu que a droga que passava pelo Quênia era inserida no mercado britânico com a colaboração de alguns funcionários infiéis da companhia aérea. Além do Quênia, os países da África oriental interessados pelo narcotráfico são Etiópia, Botsuana, Zâmbia e África do Sul. Neste último, segundo o South African Institute of International Affaire, existem 500 mil pessoas que fazem uso de cocaína, enquanto 1/3 dos adolescentes utiliza entorpecentes. Segundo o centro de estudos sul-africano, no país atuam 300 organizações criminais internacionais envolvidas no narcotráfico.
Os países da região se tornaram não somente uma região de trânsito, mas também um novo mercado para os entorpecentes e, em particular, para a cocaína. Na Zâmbia, por exemplo, 80% da cocaína que chega ao país é transferida para a Europa e o restante 20% é consumado localmente.
A Interpol lançou o alarme sobre o crescente consumo de entorpecentes na África. “As drogas não somente transitam nos países, mas permanecem lá”, disse um responsável da organização internacional de polícia diante dos delegados de 150 organismos de polícia de todo o mundo, reunidos para o encontro anual da Interpol no Rio de Janeiro (Brasil). “Já se tornaram habituais as cargas de diversas toneladas de cocaína que passam pela África”, acrescentou.
Segundo um analista presente no seminário, se a tendência ao incremento do uso de entorpecentes continuar avançando, a África deverá enfrentar uma grave crise social derivante da droga.
As condições climáticas da maior parte da África são favoráveis ao cultivo da cânabis. Trata-se de um cultivo que permite um alto lucro para o agricultor e necessita de um trabalho menos intensivo em relação aos outros cultivos.
Inteiras famílias de agricultores podem viver, assim, de modo decente e permitir-se comprar alimento e medicamentos e enviar seus filhos à escola.
A cânabis é cultivada na África principalmente para o mercado local, mas nos últimos anos notou-se um aumento dos tráficos da cânabis originados na África subsaariana. Os maiores cultivos da cânabis se encontram em Comores, Etiópia, Quênia, Madagascar, Tanzânia e Uganda.
No Quênia, o cultivo da cânabis tem uma antiga tradição, mas nos últimos anos se tornou primeiramente uma produção limitada ao mercado local, para depois transformar-se em uma verdadeira empresa comercial ilícita estendida internacionalmente.
A cânabis é cultivada na região ocidental e naquela do Monte Quênia, onde, segundo alguns relatórios, existem cerca de 1.500 hectares cultivados com a cânabis. Os cultivos de droga estão escondidos entre aqueles tradicionais destinados à alimentação, mas há também cultivos menores em algumas áreas protegidas da reserva natural nacional.
Também as regiões costeiras se tornaram produtores da cânabis. Lá, com efeito, se instalaram diversos agricultores provenientes do interior, que lá encontraram áreas férteis e pouco controladas pela polícia, e um mercado constituído pela população local, pelos turistas e pelos residentes estrangeiros que preferem as costas do país.
Quanto ao ópio, no passado foram sinalizados alguns cultivos no Quênia e nas costas de Madagascar. Desde 1993 não foram sinalizados cultivos de opiáceos na África oriental, mas a vastidão do território e os escassos controles das autoridades locais tornam sempre possível uma retomada do cultivo da papoula de ópio.
No que diz respeito à produção local de drogas sintéticas, a África oriental é o ponto de trânsito do methaqualone (Mandrax) proveniente da Índia e destinado ao mercado sul-africano.
Nos últimos anos, a redução do Mandrax proveniente da Índia gerou uma produção local desta substância. Com efeito, foram descobertos laboratórios químicos clandestinos utilizados para a fabricação desta droga sintética em alguns países da África oriental e meridional.
Nos casos dos laboratórios descobertos no Quênia e na Tanzânia, se tratava somente de pequenos centros onde o pó do Mandrax ainda proveniente da Índia era transformado em pílulas, mas em outros casos deparou-se com verdadeiras oficinas para a fabricação do Mandrax com precursores químicos, cuja proveniência permaneceu desconhecida. A este propósito, as substâncias que mais causam preocupação são as efedrinas, as pseudo-efedrinas, o anidrido acético e o ácido N-acetilantranílico (utilizado na fabricação do Mandrax) e o pergamenato de potássio.
O mais famoso cultivo de planta entorpecente local é o khat, que é uma produção legal em diversos países da África oriental. O khat é cultivado na Etiópia e no Quênia e, em medida menos extensa, na Tanzânia, Comores e na parte setentrional de Madagascar. É exportado para os principais mercados da área (Djibuti, Eritréia, Somália e Iêmen), além da Europa e da América setentrional.
O uso do khat continua a expandir-se no Chifre da África e tem um papel-chave na contínua instabilidade da Somália, onde se calcula que a população gasta todos os anos 64 milhões de dólares por ano para comprar o khat. Trata-se de um quantia que é quase o dobro do total das ajudas internacionais doadas ao país. O khat não somente contribui para provocar problemas na sociedade, criando pessoas afetadas pela dependência de entorpecentes, mas tem também um papel na difusão no país de armas leves, frequentemente repassadas em troca de um pouco de droga.
As organizações de narcotraficantes olham com interesse aos países da África oriental e meridional por causa de suas infra-estruturas portuárias e aeroportuárias, dos comprimentos de suas costas e dos fluxos turísticos.
Todos elementos que permitem esconder os tráficos de droga. O Quênia tem o maior porto comercial da região, Mombasa, que serve a maior parte dos países privados de acesso direto ao mar, enquanto o aeroporto de Nairóbi é um dos mais traficados da área. As redes do narcotráfico utilizam também os portos de Dar-es-Salaam (na Tanzânia), Djibuti, Durban (na África do Sul) e Maputo (em Moçambique) e estão expandindo suas atividades também na Etiópia, Mauritius, Tanzânia e Uganda. Esses últimos países são usados como pontos de trânsito para a droga enviada para o Quênia, a África do Sul e a África ocidental e dessas áreas para a Europa e a América do Norte.
A maior parte das substâncias entorpecentes chega à região via mar, escondida nas cargas dos containers transportados pelos navios mercantis que navegam o Oceano Índico. Em alguns casos, os navios dos narcotraficantes se encontram em alto mar com embarcações menores, que levam para a terra a carga ilícita. Grandes quantidades de heroína chegam assim à região, mas se recorre também a carteiros, homens e mulheres, que chegam com vôos comerciais, e ao envio por correio.
Entre os países da África oriental interessados pelo tráfico e pelo consumo de substâncias entorpecentes, está Uganda.
Segundo um recente relatório do UNODC, “Uganda se tornou o país líder no tráfico e no consumo de droga em relação ao restante dos Estados da África oriental”. Entre as drogas presentes no mercado ilícito ugandense, existem a cânabis, a heroína, a cocaína e o mandrax, além do khat. Segundo a agência anticrime da ONU, o aumento do consumo de substâncias entorpecentes é devido a “duas décadas de conflitos armados e à falta de lei, que prejudicaram gravemente a infra-estrutura policial”.
O relatório observa que as condições climáticas de todo o território ugandense são favoráveis ao cultivo da cânabis: “O cultivo ilícito da planta é, porém, relevante em áreas remotas das regiões meridional, ocidental, central, oriental e norte-oriental. As dimensões exatas dos cultivos da cânabis não são conhecidas, mas se notou um aumento da produção da cânabis sobretudo para a exportação”. O aeroporto de Entebbe é, por fim, utilizado como ponto de trânsito para o envio de heroína e de mandrax ao extremo Oriente e à África do Sul.

CONCLUSÕES
A África é um ponto de trânsito sempre mais importante para as organizações de narcotraficantes, apesar de, no momento, a maior parte das apreensões de entorpecentes ocorrer em outras partes do mundo.
Vista a escassa eficiência das polícias africanas e a relativa recente conscientização do problema por parte dos entes locais e internacionais, pode-se supor que a quantidade das apreensões de droga na África não corresponda à entidade efetiva das cargas que transitam pelo continente.
A África, porém, não é mais somente um ponto de passagem da droga proveniente da América Latina e da Ásia em direção à Europa e à América setentrional, mas já se tornou um mercado ainda talvez “residual”, mas em todo caso que não pode ser ignorado pelas redes de narcotraficantes.
Redes nas quais estão presentes africanos, em particular nigerianos, em papéis não somente de gregários, mas também de organizadores. O crescente consumo de drogas por via endovenosa em diversos países africanos, como Tanzânia e Quênia, agrava o problema da difusão da AIDS.
Na Nigéria, por exemplo, um estudo revelou que o consumo de drogas se expande no mesmo ritmo do aumento das pessoas infetadas com o vírus HIV, em cidades como Kano e Port Harcourt.

 
At 9/17/2007 3:08 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

A DROGA NA ÁFRICA: UM PROBLEMA MUNDIAL

A droga já é um problema na África e representa um ulterior obstáculo ao desenvolvimento do continente. É o que afirmam diversos organismos internacionais encarregados da luta ao tráfico de entorpecentes. Já em 2001, um relatório do Órgão Internacional de Controle das Drogas afirmava que “graças à sua experiência no campo do contrabando de haxixe e de heroína, os cartéis da droga da África ocidental buscam novos contatos na América Latina para estender o tráfico de cocaína a toda a região da África subsaariana”.
Trata-se de uma reviravolta fundamental na estratégia do narcotráfico mundial, que vê a África se tornar uma das áreas “fulcro” para a distribuição de drogas em todo o mundo. Até os primeiros anos da década de 90 do século passado, a África era mantida às margens das rotas da droga. A mudança ocorreu em 1993, quando foram apreendidos na Nigéria 300 quilos de heroína provenientes da Tailândia. É o sinal de uma mudança que vê a transformação de tantos pequenos contrabandistas africanos (a maioria nigerianos) de simples transportadores por conta de terceiros a membros de gangues guiadas por africanos, capazes de tratar no mesmo nível com análogas organizações de outros continentes.
A presença dessas organizações criminais, a forte urbanização, a perda dos valores tradicionais africanos e a difusão de uma cultura hedonista são todos fatores que criaram as premissas para um mercado africano da droga. A África, portanto, não é somente um local de trânsito dos entorpecentes, mas terreno “virgem” para o tráfico de droga.

PREMESSA METODOLÓGICA
Os dados apresentados são úteis para analisar a tendência (incremento ou decremento) do tráfico de entorpecentes, apesar de serem muito provavelmente aproximativos.
Segundo um estudo crítico efetuado pela associação ‘Libera’ do pe. Ciotti, com efeito os dados apresentados pelos entes antidrogas internacionais e de alguns Estados não relatam fielmente toda a produção mundial de cocaína. Segundo este estudo (referido somente à cocaína e não a outras drogas), existe uma discrepância entre a estimativa sobre a produção mundial de cocaína efetuada pela ONU e os dados relativos às apreensões e ao consumo de cocaína somente na América.
Segundo os elaboradores do relatório, com efeito, subtraindo das 937 toneladas de produção, indicada pelas Nações Unidas em 2004, as cerca de 450 consumadas nos Estados Unidos, Canadá, México e em toda a América do Sul e as cerca de 490 toneladas apreendidas em todas as Américas, se chegaria a um saldo negativo de 3 toneladas.
“A este ponto, não se saberia mais de onde subtrair as cerca de 99 toneladas de cocaína apreendidas no “resto do mundo”, afirma o relatório. Fazendo-o, se chegaria ao paradoxal saldo negativo de 102 toneladas de cocaína “não resultantes”, não tendo feito frente ainda à demanda de cocaína no “resto do mundo”, estimada em ao menos 300 toneladas, se chega a calcular uma espécie de buraco negro de aproximadamente 400 toneladas de cocaína não resultantes.
Este buraco negro assume proporções ainda mais macroscópicas, cerca de 700 toneladas, se calculado com base nos dados da Agência antidroga norte-americana.
Apesar dos seus limites, os relatórios dos organismos internacionais de luta contra a droga permanecem frequentemente os únicos instrumentos para analisar o fenômeno do narcotráfico.

A HEROÍNA NA ÁFRICA
A apreensão de opiáceos na África registrou um forte incremento nos últimos anos. Segundo dados da ONU, por exemplo, em 2004 ocorreu um incremento da apreensão de heroína de 60% em relação ao ano precedente.
A maior parte deste incremento é devido à apreensão ocorrida na África central e ocidental, que quase triplicou de 2003 a 2004. A heroína que passa pela África é destinada em primeiro lugar aos mercados europeus e, em segundo lugar, aos da América do Norte. A heroína provém dos países do sudoeste e sudeste da Ásia.
A quantia total dos opiáceos apreendida na África permanece ainda modesto (0,3% do total de apreensões em nível mundial). Porém, deve-se levar em consideração que não existem estatísticas confiáveis e que o nível das apreensões não reflete o verdadeiro fluxo de narcóticos que passa pela África por causa da debilidade da polícia local, que tem dificuldade em interceptar as cargas ilícitas.
No que concerne ao uso de opiáceos na África, segundo os dados do Departamento das Nações Unidas para a luta à criminalidade (UNODC), nota-se um aumento de seu consumo no continente africano, em particular na África oriental e naquela austral e em alguns países da África ocidental. Segundo os especialistas das Nações Unidas, o crescimento do consumo de heroína nessas áreas deriva do fato de que são utilizadas como locais de trânsito dos narcotraficantes, os quais, porém, não desdenham em criar um mercado local.
Na África do Sul, um dos poucos países africanos que dispõe de dados confiáveis, até os primeiros anos do novo milênio, o pedido de tratamentos por abuso de heroína representava somente 1% do total dos pedidos de cura por dependência de substâncias entorpecentes (incluído o álcool). Em 2005, esta porcentagem subiu para 7%.
Segundo o relatório do UNODC sobre o tráfico de entorpecentes de 2007, o mercado da heroína está dividido deste modo: a heroína afegã é destinada aos mercados da Ásia central, da Europa, do Oriente Médio e da África; aquela produzida no chamado “triângulo de ouro” alimenta o mercado chinês e o dos outros países asiáticos e da Oceania; aquela proveniente da América Latina serve o mercado norte-americano.
O relatório nota, porém, que “uma parte pequena, mas em crescimento, da produção de opiáceos afegãos é enviada à América setentrional, seja por meio da África oriental e ocidental, seja por meio da Europa”.
O relatório afirma que a demanda global de heroína permaneceu estável, “apesar de importantes incrementos nos países que se encontram no caminho das principais rotas do narcotráfico”.
Entre esses estão também diversos países africanos, afirma o documento, que destaca os efeitos prejudiciais da difusão da heroína e de outras substâncias entorpecentes nas populações já duramente provadas pela pobreza e pela difusão da AIDS.
Os últimos dados do UNODC mostram um forte incremento do uso de heroína em alguns países africanos como Moçambique, Zâmbia, Quênia, Tanzânia e Costa do Marfim, enquanto outros países tiveram um aumento mais contido. Entre esses, África do Sul, Madagascar, Gana, Libéria e Senegal.

DOS ANDES AO KILIMANJARO: UM FLUXO DE COCAÍNA INVADE A ÁFRICA
O dado mais preocupante, porém, é o da cocaína que transita da África em direção principalmente à Europa e, secundariamente, à América setentrional.
A importância da África, e em particular da África ocidental, como ponto de trânsito da cocaína em direção aos ricos mercados ocidentais é demonstrada pelo nível das apreensões registradas nos últimos anos. As apreensões de cocaína em toda a África aumentaram três vezes entre 2003 e 2004, enquanto no mesmo período as apreensões na África ocidental e central aumentaram seis vezes. As apreensões mais importantes no período 2000-2004 se registraram em Cabo Verde, seguido por África do Sul, Quênia, Gana e Nigéria. Mas as apreensões de cocaína na África representam somente 1% do total mundial das apreensões desta substância entorpecente. Também neste caso, porém, o dado é prejudicado devido à debilidade das polícias locais, incapazes de interceptar a maior parte dos fluxos de cocaína proveniente da América do Sul.
Em 2004, 50% das apreensões de cocaína no continente ocorreram na África ocidental e central. A zona de passagem mais utilizada pelos traficantes de cocaína é o Golfo da Guiné, de onde a substância entorpecente é transportada para a Europa em pequenas quantidades, através dos chamados “mulas”, pessoas que assumem o risco de ingerir óvulos de cocaína com a esperança de superar as alfândegas nos aeroportos de destinação. Nos últimos anos, também na África oriental aumentou a quantia de cocaína apreendida, indicando uma tendência a utilizar em medida crescente esta área como ponto de trânsito para a cocaína destinada à Europa e à Ásia.
Um dos países mais atingidos pelo fenômeno é o Quênia, onde em 2004 foi apreendida uma tonelada de cocaína. Em termos gerais, o crescimento da difusão da cocaína na África é demonstrada pelo fato que dos 32 países africanos que fornecem estatísticas sobre as apreensões de entorpecentes na UNODC, 23 (72%) relataram apreensões de cocaína, contra 34% em 1990.
Os traficantes de cocaína tendem a servir-se da África cada vez mais como ponto de trânsito por dois motivos. O primeiro deriva do melhoramento dos sistemas de inspeção utilizados pelas autoridades locais e por aquelas norte-americanas na área caribenha e centro-americana, tradicional rota utilizada pelos traficantes. Nos últimos anos, por exemplo, surgiram bases de inspeção norte-americanas dos Andes às ilhas caribenhas. Também as autoridades holandesas intensificaram a inspeção com patrulhas aéreas baseadas nas ilhas de Curaçao e Saint Martin.
O segundo fator está ligado à diminuição do consumo de cocaína, que se registrou nos Estados Unidos diante de um aumento da demanda na Europa. Se na América do Norte há o mais alto número de consumidores mundiais (6 milhões e meio, correspondente a cerca da metade do consumo mundial), a tendência é diminuir a demanda.
De 1998 a 2004, de fato, se registrou uma queda de 20% da difusão desta substância. No mesmo período, na Europa ocidental, onde os consumidores de cocaína são 3 milhões e meio (26% do total mundial), se notou um aumento do consumo e da difusão do “pó branco”. Na Espanha e no Reino Unido, este dado é de 2%.
A África, portanto, é uma cômoda e segura rota para alcançar um mercado em crescimento.
Além disso, como efeito colateral criou-se um mercado africano que está registrando nos últimos anos preocupantes aumentos.
A crescente disponibilidade de cocaína se traduz, com efeito, em um aumento do consumo desta substância na África. Segundo os dados do UNODC, no período 1992-2004 o abuso da cocaína na África cresceu em um ritmo mais sustentado do que no restante do mundo. Este incremento é mais remarcado nos países da África meridional e nos da África ocidental.
Se forem analisados os dados das pessoas que recorrem aos tratamentos de desintoxicação, o aumento do consumo de cocaína emerge com evidência. No início dos anos 90, as pessoas em tratamento por abuso de cocaína eram pouquíssimas, no final de 1996 constituíam 1.5% dos casos tratados pelas estruturas de recuperação dos toxicômanos, no biênio 1999-2000 eram 6%. No período 2001-2004, notou-se uma inflexão na porcentagem de pessoas que pediam para ser tratadas da dependência de cocaína (menos de 5%).
A partir do final de 2004, este dado está em crescimento: de 7,5% em 2004 passou-se a 8,5% nos primeiros meses de 2005.

A COCAÍNA NA ÁFRICA OCIDENTAL
O país tradicionalmente mais envolvido no narcotráfico é a Nigéria. Lá, com efeito, em 1993 houve a primeira grande apreensão de cocaína na África e as organizações criminais nigerianas estão perfeitamente inseridas no sistema criminal global e transnacional. A afirmação das máfias nigerianas deriva também da pertença da Nigéria ao Commonwealth, que permitiu abrir estreitas relações comerciais com o subcontinente indiano, produtor de ópio e de heroína, e com o mundo anglo-saxão consumidor.
No final dos anos 80, registrou-se um incremento importante no papel de centro estratégico e, em 1992, as apreensões de cocaína no aeroporto de Lagos foram tão relevantes que as autoridades nigerianas suspenderam os vôos diretos para o Rio de Janeiro. Desde então, os traficantes nigerianos são considerados os principais transportadores da droga, uma verdadeira indústria a serviço do comércio de heroína e da coca. Eles estão presentes em todos os pontos-chaves da produção e do tráfico de drogas. Graças aos compatriotas residentes no exterior, formaram clãs criminais comparáveis aos colombianos, turcos e chineses.
As organizações mafiosas nigerianas, como as outras, se baseiam na solidariedade étnica, de clã e de famílias. Já em 1995 as autoridades norte-americanas estimavam que 50% da heroína circulante em seu país era introduzida pelos nigerianos, os quais usam a Polônia e a Hungria como pontos de trânsito para a cocaína destinada à Europa ocidental.
Um dos países da África ocidental dos quais se têm estatísticas confiáveis sobre o incremento do tráfico de cocaína é Gana. Segundo os dados divulgados pelas autoridades locais, em um único ano as apreensões de cocaína aumentaram 40 vezes, passando dos 15 quilogramas de 2003 aos 617 quilos de 2004. A maior parte da cocaína é destinada ao mercado britânico.
Trata-se de um dado significativo, levando-se em consideração que, em termos porcentuais, as apreensões de cocaína aumentaram 18% em nível mundial e 4.000% em Gana de 2003 a 2004. No mesmo período, na África, as apreensões de cocaína aumentaram 3 vezes, passando das 1,1 tonelada para 3,6 toneladas.
Nos anos sucessivos, emergiram outros fatos que demonstram que Gana se tornou um importante ponto de passagem da cocaína na África ocidental. Em novembro de 2005, a polícia ganense apreendeu 588 quilos no decorrer de uma perquirição em uma habitação em East Lagon. Em abril de 2006, foram descobertos a bordo do navio MV Benjamin, atracado no porto de Tema, 2.310 quilos de cocaína.
Segundo um responsável do UNODC, as organizações de narcotraficantes tendem a fazer transitar a droga por meio da África ocidental porque, até agora, as autoridades alfandegárias européias e norte-americanas controlam com menos atenção as mercadorias e as bagagens provenientes da África em relação àquelas provenientes da América Latina. No caso de Gana, como de outros países da região, o fato de não estar inserido na lista dos países produtores de cocaína significa que as suas mercadorias não são sujeitas a inspeções detalhadas. Mas nos últimos anos, as coisas mudaram e Gana foi inserida na lista dos países “de alta prioridade” de inspeção.
Os traficantes buscam corromper os policiais e a polícia para permitir o trânsito das cargas de entorpecentes. Para investigar casos de corrupção de policiais, o Ministério da Fazenda de Gana criou uma Comissão de investigação, que recebeu o nome da sua Presidenta, Georgina Wood, que desempenhou importantes cargos na polícia e na magistratura local. O “Georgina Wood Committee” nasceu após duas importantes apreensões de cocaína citadas precedentemente, nas quais resultaram envolvidos alguns policiais. Entre as recomendações apresentadas pelo Comitê, está reforçar o patrulhamento das costas do país por meio seja da potenciação dos meios da marinha e da aeronáutica, seja com a criação de um serviço de guarda-costas independente.
A Guiné-Bissau é um outro país que se tornou ponto de trânsito da cocaína da América Latina à Europa, como demonstrado numa recente operação que levou à captura de 674 quilos de cocaína e à detenção de alguns narcotraficantes sul-americanos. Na África ocidental, os países mais envolvidos pelos fluxos de droga, além de Gana, são Costa do Marfim, Senegal e Nigéria.
Os traficantes de cocaína na Guiné-Bissau estão ligados aos que passam através do vizinho Senegal, como emergiu da operação efetuada no final de junho de 2007 pela polícia de Dakar, que levou à apreensão de mais de duas toneladas de cocaína. Parte da droga se encontrava em um veleiro que estava à deriva diante das costas senegalesas, e uma outra em uma habitação na área balneária de Mbour, a sul de Dakar.
No veleiro os investigadores encontraram uma documentação que comprova que os narcotraficantes utilizam a Guiné-Bissau como depósito de trânsito da cocaína proveniente da América Latina e destinada à Europa. Também a nacionalidade dos detidos demonstra o grau de internacionalização das organizações criminais dedicadas ao narcotráfico. Além de três cidadãos sul-americanos (um colombiano, um venezuelano e um equatoriano) e de uma cidadã francesa, a polícia deteve três senegaleses. A partir dos documentos detidos, além disso a polícia senegalesa descobriu que os narcotraficantes efetuaram diversas viagens aos países limítrofes: Serra Leoa, Guiné Conakry, Guiné-Bissau e Gâmbia.
As autoridades senegalesas reiteraram que em seu país não existem depósitos de cocaína, mas admitiram a infiltração de grupos criminais estrangeiros, que utilizam o aeroporto de Dakar para enviar cocaína à Europa. No período de janeiro a junho de 2007, a polícia senegalesa afirma ter apreendido no aeroporto de Dakar 44 quilos de cocaína e detido cerca de 30 “mulas” da droga, a maior parte dos quais nigeriano.
Está em aumento também o número de “mulas” da Guiné-Bissau detidos no momento do embarque para Portugal, onde podem entrar sem visto. Além disso, foram descobertas algumas operações de reciclagem de dinheiro sujo por parte de organizações estrangeiras. A apreensão recorde efetuada pela polícia senegalesa, equivalente ao total de apreensões de cocaína na África ocidental de setembro de 2006 a maio de 2007, é somente o último de uma série efetuada nos primeiros seis meses de 2007 em várias localidades da África ocidental.
Entre essas, há 800 quilos de cocaína recuperados no mar diante das ilhas Canárias, e uma quantia análoga apreendida pela marinha francesa no largo da Costa do Marfim. Além dos navios, as organizações criminais recorrem a aviões para alimentar seus tráficos ilícitos.
Na Venezuela foi bloqueado um avião com 2,5 toneladas de cocaína, que se preparava a partir para Serra Leoa, enquanto em maio de 2007 foram apreendidos 600 quilos de cocaína a bordo de um Cessna, matriculado na Venezuela, que efetuou uma aterrissagem de emergência em Nouadhibou, na Mauritânia.
Segundo um responsável do ONUDC, para a África ocidental o aumento de confiscos das cargas de cocaína na região é devido mais a incidentes de percurso que a uma maior eficácia da polícia.
O funcionário considera que a cada dez expedições de droga em direção à Europa, nove chegam a seu destino sem problemas.

O SAHEL: NOVA FRONTEIRA DO NARCOTRÁFICO?
Das costas da África ocidental as organizações de narcotraficantes estão progressivamente se expandindo aos países do Sahel, cujo papel estratégico entre o Atlântico e o Magreb, e, portanto o Mediterrâneo, é apreciado também pelos traficantes de seres humanos e, provavelmente, pelo terrorismo internacional. Não se pode excluir a priori uma interconexão entre essas realidades criminais, de que são cúmplices a debilidade dos Estados e a vastidão dos territórios a controlar. Um realidade que suscita o alarme dos governos interessados.
Em abril deste ano, depois da apreensão de três caminhões cheios de droga e armas, o Presidente do Níger, Mamadou Tandja, declarou que o exército local pretende aumentar os esforços para impedir que o seu país seja “circundado” pelos traficantes de armas e de droga, que são uma “ameaça real” para o país.
Também Burkina Fasso não foge ao fenômeno. Segundo o Coordenador do Comitê contra os tráficos ilícitos de droga em Burkina Fasso, o volume das cargas de droga interceptadas nos primeiros três meses de 2007 é “incrível”. O funcionário indica a existência de uma nova rota de trânsito da droga no oeste e no sudoeste do país. No início de abril de 2007, 49 quilos de cocaína, num valor de 10 milhões de dólares, foram interceptados pela polícia de Burkina Fasso na fronteira com o Mali, que é um importante ponto de trânsito para o tráfico de seres humanos. Países como Mali e Níger são há milênios atravessados por vias de caravanas, que agora se converteram num uso criminal: para o tráfico de seres humanos, mas também de armas, droga e cigarros de contrabando. “Nos últimos meses notamos um aumento da utilização dos países do Sahel, como Mali e Níger, para o tráfico de cocaína”, disse Antonio Razzitelli, Diretor do departamento do UNODC para a África ocidental.
Segundo o órgão anticrime da ONU, os traficantes importam a droga por meio das cidades costeiras como Conakry, na Guiné, Dakar, no Senegal, e Lomé, no Togo, e depois a transportam para as cidades do interior, como Bamako, no Mali, e Ouagadougou, em Burkina Fasso. Dessas localidades, a cocaína prossegue a sua viagem até a Europa.
Segundo o responsável do Comitê contra os tráficos ilícitos de droga em Burkina Fasso, é preciso coordenar os esforços entre as polícias dos Estados da região. “Há uma necessidade urgente de reunir todos os entes nacionais antidroga da região para encontrar o modo de cooperar entre si, para tentar deter as redes criminais”, disse, destacando que a escassa cooperação entre as fronteiras dos países do Sahel e a falta de meios das polícias locais constituem problemas adjuntos para uma eficaz ação de contraste às redes criminais.

O MERCADO DA CÂNABIS
Enquanto a África permanece, no momento, somente um local de trânsito e um mercado residual para drogas como cocaína e heroína, a principal produção local de substâncias entorpecentes é representada pela cânabis.
O cultivo da cânabis foi introduzido na África oriental pelos mercantes árabes, pérsios e indianos no século XII. De lá se difundiu primeiramente na África austral, no século XV, e depois no Congo e em Angola no século XIX. Somente depois da Segunda Guerra Mundial a cânabis chegou à África ocidental, levada por soldados nigerianos e ganenses que combateram com as tropas britânicas na Birmânia (atual Mianmar), onde adquiriram o hábito de fumar marijuana. Este fato explica porque nos países onde a cânabis é conhecida há mais tempo, ela é utilizada na medicina tradicional, enquanto na África ocidental é usada para fins “recreativos”. Até os anos 80, porém, a produção africana da cânabis permaneceu limitada. A partir daqueles anos, porém, notou-se um incremento notável da superfície cultivada com a cânabis para fins comerciais.
A produção desta substância se divide em três categorias: a erva da cânabis (flores e folhas), resina ou haxixe (secreções emitidas pela planta durante a fase de florescimento) e óleo de haxixe, o menos utilizado. Segundo o World Drug Report 2006, a erva da cânabis é cultivada, sobretudo de modo ilegal, em 176 países em todo o mundo. A África representa 27% da produção mundial e os principais produtores são Marrocos (3.700 toneladas), África do Sul (2.200 toneladas) e Nigéria (2 mil toneladas).
No que concerne ao haxixe, o principal produtor mundial é Marrocos, que fornece os mercados norte-africanos e europeus. Graças ao esforço das autoridades marroquinas nos últimos anos, deu-se a diminuição da produção local da cânabis, à qual corresponde um aumento da produção em outros países, da Ásia ocidental (Afeganistão, Paquistão) à Albânia. O UNODC reconhece que desde 2003 o governo de Rabat conduziu uma campanha para estimar a produção de resina da cânabis no país, em cooperação com a Agência anticrime das Nações Unidas. Segundo uma investigação efetuada em 2003, a produção da cânabis foi de 3.060 toneladas, cultivada em 134 mil hectares de terra na região do Rif (norte do país) por 96.600 famílias de camponeses. A investigação feita em 2004 registrou uma diminuição de 10% das terras cultivas com a cânabis, que passaram a 120.500 hectares, com uma produção estimada de 2.760 toneladas.
Em 2005 notou-se uma ulterior diminuição de 37%, sendo a superfície cultivada com a cânabis de 72.500 hectares, enquanto a produção diminuiu para 1.070 toneladas. Quanto às apreensões da cânabis, nos últimos 12-15 anos se registrou um aumento da porcentagem mundial de apreensões no continente africano desta substância. Enquanto em 1990 16% do total mundial das apreensões da cânabis ocorria na África, em 2002 este dado subiu para 20%, para alcançar 31% em 2004. O aumento das apreensões na África é determinado sobretudo pelo aumento dos controles policiais e alfandegários efetuados pela Nigéria e pela África do Sul.
O principal mercado de consumo da cânabis é a Europa ocidental, e 80% da cânabis consumada na Europa provém do Marrocos, passando pela Espanha e pela Holanda e dali distribuída aos outros países. O terceiro mercado mundial de consumo é representado pelos países do norte da África, onde a cânabis provém principalmente do Marrocos. Parte da cânabis produzida no Afeganistão e Paquistão, além disso, alimenta o mercado dos países da África oriental.
No que concerne às problemáticas sociais ligadas ao consumo da cânabis, é preciso recordar que esta substância é a droga mais difundida e usada em nível mundial. Estima-se que, em 2004, 162 milhões de pessoas a tenham usado, o equivalente a 3,9% da população mundial entre 15 e 64 anos. Em termos relativos (a porcentagem de habitantes que faz uso da cânabis em relação a outras substância entorpecentes), a cânabis é prevalentemente utilizada na Oceania, seguida por América do Norte e África. Desde 1992, na África, notou-se também uma tendência ao aumento do seu consumo, em particular na Argélia, Nigéria e Zâmbia.
É provável que a tendência ao uso desta droga seja subestimada em diversos países da África, que não têm uma capacidade de coleta de dados adequados para seguir o fenômeno. Segundo dados parciais, notou-se nos últimos anos um forte incremento do abuso da cânabis na África ocidental, oriental e no norte da África, em sintonia com a tendência em nível global de uma ulterior expansão do consumo desta substância.
Até os anos 80, porém, a produção africana da cânabis permaneceu limitada. A partir daqueles anos, porém, notou-se um incremento notável da superfície cultivada com a cânabis para fins comerciais.
A produção africana de droga subtraiu terras e recursos à agricultura, isso porque naquele período se registrou uma forte queda dos preços dos produtos agrícolas em todo o mundo. A agricultura africana, já frágil, entrou em crise. Diversos camponeses, portanto, deixaram-se tentar pelo cultivo da cânabis em detrimento do cultivo de produtos lícitos.
Um simples cálculo econômico demonstra o forte poder de atração de uma semelhante produção; já em 1995, na Guiné, um saco de 20-25 quilos de marijuana tinha o valor de aproximadamente a renda anual média de uma famílias de oitos pessoas que se dedica à produção de cultivo lícito. No mercado de Kinshasa, na República Democrática do Congo (RDC), um saco de 25 quilos de marijuana é vendido por mil dólares, enquanto um saco de 80 quilos de mandioca vale somente 10 dólares.
Compreende-se, assim, que o cultivo desta substância entorpecente tem sérias repercussões na auto-suficiência alimentar de diversos países africanos. Segundo a associação de luta à toxicomania de Kinshasa, LIPILDRO, por causa do abandono dos cultivos legais por aqueles da cânabis, até 2010 a maior parte das cidades congolesas será atingida por um crise alimentar.
Além disso, na RDC se verificaram experiências para o cultivo da papoula de ópio (na província do Equador) e da cocaína (na região do Shaba). O mais importante produtor da cânabis na África subsaariana permanece, porém, a África do Sul. Importante produções são sinalizadas também em Lesoto e em Malauí.

DROGAS SINTÉTICAS
A produção de drogas sintéticas é limitada na África, com exceção da África do Sul, onde a fabricação de metanfetaminas e methaqualone aumentou nos últimos anos. Os dados sobre a descoberta de laboratórios clandestinos confirmam esta tendência.
Com efeito, se passou da descoberta à destruição de um laboratório por ano no período 1995-1999, aos 17 no período 2000-2003, até aos 28 destruídos somente em 2004. Um outro dado que demonstra o incremento do uso de drogas sintéticas na África do Sul é o aumento das apreensões de ecstasy: em 2004, houve um incremento de 385% das apreensões em relação ao ano precedente.
Além disso, as drogas sintéticas faziam parte do programa de guerra secreta química e biológica aplicado pelo regime do apartheid. Segundo os testemunhos reunidos durante o processo contra o responsável do programa, doutor Wouter Basson (definido “Doutor Morte” pela imprensa local), no âmbito do chamado “Project Coast”, entre 1992 e 1993 os laboratórios relacionados aos serviços secretos sul-africanos tinham produzido mais de 900 quilos de cristais de ecstasy (correspondente a 73 milhões de pílulas). No ano precedente, uma empresa de serviços do regime do apartheid tinha importado 500 quilos desta substância da Croácia.
Essas quantidades de drogas sintéticas foram importadas e produzidas para serem usadas como agente incapacitador para o controle da multidão (e talvez também para drogar secretamente os líderes da oposição para desacreditá-los, fazendo-os cometer gestos ridículos em público) e para serem distribuídas nas favelas habitadas pela população negra para promover o abuso de droga e a dependência.
O fim do regime do apartheid bloqueou este e outros projetos criminais aplicados no âmbito do “Project Coast”. Antes da queda do regime, porém, o dr. Basson tinha organizado a venda das empresas de cobertura dos serviços secretos sul-africanos, alguns dos quais fabricavam armas químicas e biológicas e drogas sintéticas.
Além disso, desapareceram centenas de quilos de substâncias químicas usadas na produção desses instrumentos de morte.
O dr. Basson é suspeito de ter aberto um empresa privada e, com efeito, quando foi detido em 1997 foi encontrado em posse de pílulas de ecstasy num valor de 20 mil dólares.

ÁFRICA ORIENTAL: UMA SITUAÇÃO PREOCUPANTE
Na África oriental, o Quênia é o principal ponto de trânsito da cocaína. Somente em 2004 foi apreendida 1,1 tonelada de cocaína entre a capital Nairóbi e o centro costeiro de Malindi. No decorrer da operação da polícia, que levou à descoberta desta importante carga de droga, foram detidos diversos funcionários da companhia aérea local (que resultou estranha ao narcotráfico), alguns dos quais foram capturados em Londres.
Das investigações emergiu que a droga que passava pelo Quênia era inserida no mercado britânico com a colaboração de alguns funcionários infiéis da companhia aérea. Além do Quênia, os países da África oriental interessados pelo narcotráfico são Etiópia, Botsuana, Zâmbia e África do Sul. Neste último, segundo o South African Institute of International Affaire, existem 500 mil pessoas que fazem uso de cocaína, enquanto 1/3 dos adolescentes utiliza entorpecentes. Segundo o centro de estudos sul-africano, no país atuam 300 organizações criminais internacionais envolvidas no narcotráfico.
Os países da região se tornaram não somente uma região de trânsito, mas também um novo mercado para os entorpecentes e, em particular, para a cocaína. Na Zâmbia, por exemplo, 80% da cocaína que chega ao país é transferida para a Europa e o restante 20% é consumado localmente.
A Interpol lançou o alarme sobre o crescente consumo de entorpecentes na África. “As drogas não somente transitam nos países, mas permanecem lá”, disse um responsável da organização internacional de polícia diante dos delegados de 150 organismos de polícia de todo o mundo, reunidos para o encontro anual da Interpol no Rio de Janeiro (Brasil). “Já se tornaram habituais as cargas de diversas toneladas de cocaína que passam pela África”, acrescentou.
Segundo um analista presente no seminário, se a tendência ao incremento do uso de entorpecentes continuar avançando, a África deverá enfrentar uma grave crise social derivante da droga.
As condições climáticas da maior parte da África são favoráveis ao cultivo da cânabis. Trata-se de um cultivo que permite um alto lucro para o agricultor e necessita de um trabalho menos intensivo em relação aos outros cultivos.
Inteiras famílias de agricultores podem viver, assim, de modo decente e permitir-se comprar alimento e medicamentos e enviar seus filhos à escola.
A cânabis é cultivada na África principalmente para o mercado local, mas nos últimos anos notou-se um aumento dos tráficos da cânabis originados na África subsaariana. Os maiores cultivos da cânabis se encontram em Comores, Etiópia, Quênia, Madagascar, Tanzânia e Uganda.
No Quênia, o cultivo da cânabis tem uma antiga tradição, mas nos últimos anos se tornou primeiramente uma produção limitada ao mercado local, para depois transformar-se em uma verdadeira empresa comercial ilícita estendida internacionalmente.
A cânabis é cultivada na região ocidental e naquela do Monte Quênia, onde, segundo alguns relatórios, existem cerca de 1.500 hectares cultivados com a cânabis. Os cultivos de droga estão escondidos entre aqueles tradicionais destinados à alimentação, mas há também cultivos menores em algumas áreas protegidas da reserva natural nacional.
Também as regiões costeiras se tornaram produtores da cânabis. Lá, com efeito, se instalaram diversos agricultores provenientes do interior, que lá encontraram áreas férteis e pouco controladas pela polícia, e um mercado constituído pela população local, pelos turistas e pelos residentes estrangeiros que preferem as costas do país.
Quanto ao ópio, no passado foram sinalizados alguns cultivos no Quênia e nas costas de Madagascar. Desde 1993 não foram sinalizados cultivos de opiáceos na África oriental, mas a vastidão do território e os escassos controles das autoridades locais tornam sempre possível uma retomada do cultivo da papoula de ópio.
No que diz respeito à produção local de drogas sintéticas, a África oriental é o ponto de trânsito do methaqualone (Mandrax) proveniente da Índia e destinado ao mercado sul-africano.
Nos últimos anos, a redução do Mandrax proveniente da Índia gerou uma produção local desta substância. Com efeito, foram descobertos laboratórios químicos clandestinos utilizados para a fabricação desta droga sintética em alguns países da África oriental e meridional.
Nos casos dos laboratórios descobertos no Quênia e na Tanzânia, se tratava somente de pequenos centros onde o pó do Mandrax ainda proveniente da Índia era transformado em pílulas, mas em outros casos deparou-se com verdadeiras oficinas para a fabricação do Mandrax com precursores químicos, cuja proveniência permaneceu desconhecida. A este propósito, as substâncias que mais causam preocupação são as efedrinas, as pseudo-efedrinas, o anidrido acético e o ácido N-acetilantranílico (utilizado na fabricação do Mandrax) e o pergamenato de potássio.
O mais famoso cultivo de planta entorpecente local é o khat, que é uma produção legal em diversos países da África oriental. O khat é cultivado na Etiópia e no Quênia e, em medida menos extensa, na Tanzânia, Comores e na parte setentrional de Madagascar. É exportado para os principais mercados da área (Djibuti, Eritréia, Somália e Iêmen), além da Europa e da América setentrional.
O uso do khat continua a expandir-se no Chifre da África e tem um papel-chave na contínua instabilidade da Somália, onde se calcula que a população gasta todos os anos 64 milhões de dólares por ano para comprar o khat. Trata-se de um quantia que é quase o dobro do total das ajudas internacionais doadas ao país. O khat não somente contribui para provocar problemas na sociedade, criando pessoas afetadas pela dependência de entorpecentes, mas tem também um papel na difusão no país de armas leves, frequentemente repassadas em troca de um pouco de droga.
As organizações de narcotraficantes olham com interesse aos países da África oriental e meridional por causa de suas infra-estruturas portuárias e aeroportuárias, dos comprimentos de suas costas e dos fluxos turísticos.
Todos elementos que permitem esconder os tráficos de droga. O Quênia tem o maior porto comercial da região, Mombasa, que serve a maior parte dos países privados de acesso direto ao mar, enquanto o aeroporto de Nairóbi é um dos mais traficados da área. As redes do narcotráfico utilizam também os portos de Dar-es-Salaam (na Tanzânia), Djibuti, Durban (na África do Sul) e Maputo (em Moçambique) e estão expandindo suas atividades também na Etiópia, Mauritius, Tanzânia e Uganda. Esses últimos países são usados como pontos de trânsito para a droga enviada para o Quênia, a África do Sul e a África ocidental e dessas áreas para a Europa e a América do Norte.
A maior parte das substâncias entorpecentes chega à região via mar, escondida nas cargas dos containers transportados pelos navios mercantis que navegam o Oceano Índico. Em alguns casos, os navios dos narcotraficantes se encontram em alto mar com embarcações menores, que levam para a terra a carga ilícita. Grandes quantidades de heroína chegam assim à região, mas se recorre também a carteiros, homens e mulheres, que chegam com vôos comerciais, e ao envio por correio.
Entre os países da África oriental interessados pelo tráfico e pelo consumo de substâncias entorpecentes, está Uganda.
Segundo um recente relatório do UNODC, “Uganda se tornou o país líder no tráfico e no consumo de droga em relação ao restante dos Estados da África oriental”. Entre as drogas presentes no mercado ilícito ugandense, existem a cânabis, a heroína, a cocaína e o mandrax, além do khat. Segundo a agência anticrime da ONU, o aumento do consumo de substâncias entorpecentes é devido a “duas décadas de conflitos armados e à falta de lei, que prejudicaram gravemente a infra-estrutura policial”.
O relatório observa que as condições climáticas de todo o território ugandense são favoráveis ao cultivo da cânabis: “O cultivo ilícito da planta é, porém, relevante em áreas remotas das regiões meridional, ocidental, central, oriental e norte-oriental. As dimensões exatas dos cultivos da cânabis não são conhecidas, mas se notou um aumento da produção da cânabis sobretudo para a exportação”. O aeroporto de Entebbe é, por fim, utilizado como ponto de trânsito para o envio de heroína e de mandrax ao extremo Oriente e à África do Sul.

CONCLUSÕES
A África é um ponto de trânsito sempre mais importante para as organizações de narcotraficantes, apesar de, no momento, a maior parte das apreensões de entorpecentes ocorrer em outras partes do mundo.
Vista a escassa eficiência das polícias africanas e a relativa recente conscientização do problema por parte dos entes locais e internacionais, pode-se supor que a quantidade das apreensões de droga na África não corresponda à entidade efetiva das cargas que transitam pelo continente.
A África, porém, não é mais somente um ponto de passagem da droga proveniente da América Latina e da Ásia em direção à Europa e à América setentrional, mas já se tornou um mercado ainda talvez “residual”, mas em todo caso que não pode ser ignorado pelas redes de narcotraficantes.
Redes nas quais estão presentes africanos, em particular nigerianos, em papéis não somente de gregários, mas também de organizadores. O crescente consumo de drogas por via endovenosa em diversos países africanos, como Tanzânia e Quênia, agrava o problema da difusão da AIDS.
Na Nigéria, por exemplo, um estudo revelou que o consumo de drogas se expande no mesmo ritmo do aumento das pessoas infetadas com o vírus HIV, em cidades como Kano e Port Harcourt.

 
At 9/17/2007 3:09 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

A DROGA NA ÁFRICA: UM PROBLEMA MUNDIAL

A droga já é um problema na África e representa um ulterior obstáculo ao desenvolvimento do continente. É o que afirmam diversos organismos internacionais encarregados da luta ao tráfico de entorpecentes. Já em 2001, um relatório do Órgão Internacional de Controle das Drogas afirmava que “graças à sua experiência no campo do contrabando de haxixe e de heroína, os cartéis da droga da África ocidental buscam novos contatos na América Latina para estender o tráfico de cocaína a toda a região da África subsaariana”.
Trata-se de uma reviravolta fundamental na estratégia do narcotráfico mundial, que vê a África se tornar uma das áreas “fulcro” para a distribuição de drogas em todo o mundo. Até os primeiros anos da década de 90 do século passado, a África era mantida às margens das rotas da droga. A mudança ocorreu em 1993, quando foram apreendidos na Nigéria 300 quilos de heroína provenientes da Tailândia. É o sinal de uma mudança que vê a transformação de tantos pequenos contrabandistas africanos (a maioria nigerianos) de simples transportadores por conta de terceiros a membros de gangues guiadas por africanos, capazes de tratar no mesmo nível com análogas organizações de outros continentes.
A presença dessas organizações criminais, a forte urbanização, a perda dos valores tradicionais africanos e a difusão de uma cultura hedonista são todos fatores que criaram as premissas para um mercado africano da droga. A África, portanto, não é somente um local de trânsito dos entorpecentes, mas terreno “virgem” para o tráfico de droga.

PREMESSA METODOLÓGICA
Os dados apresentados são úteis para analisar a tendência (incremento ou decremento) do tráfico de entorpecentes, apesar de serem muito provavelmente aproximativos.
Segundo um estudo crítico efetuado pela associação ‘Libera’ do pe. Ciotti, com efeito os dados apresentados pelos entes antidrogas internacionais e de alguns Estados não relatam fielmente toda a produção mundial de cocaína. Segundo este estudo (referido somente à cocaína e não a outras drogas), existe uma discrepância entre a estimativa sobre a produção mundial de cocaína efetuada pela ONU e os dados relativos às apreensões e ao consumo de cocaína somente na América.
Segundo os elaboradores do relatório, com efeito, subtraindo das 937 toneladas de produção, indicada pelas Nações Unidas em 2004, as cerca de 450 consumadas nos Estados Unidos, Canadá, México e em toda a América do Sul e as cerca de 490 toneladas apreendidas em todas as Américas, se chegaria a um saldo negativo de 3 toneladas.
“A este ponto, não se saberia mais de onde subtrair as cerca de 99 toneladas de cocaína apreendidas no “resto do mundo”, afirma o relatório. Fazendo-o, se chegaria ao paradoxal saldo negativo de 102 toneladas de cocaína “não resultantes”, não tendo feito frente ainda à demanda de cocaína no “resto do mundo”, estimada em ao menos 300 toneladas, se chega a calcular uma espécie de buraco negro de aproximadamente 400 toneladas de cocaína não resultantes.
Este buraco negro assume proporções ainda mais macroscópicas, cerca de 700 toneladas, se calculado com base nos dados da Agência antidroga norte-americana.
Apesar dos seus limites, os relatórios dos organismos internacionais de luta contra a droga permanecem frequentemente os únicos instrumentos para analisar o fenômeno do narcotráfico.

A HEROÍNA NA ÁFRICA
A apreensão de opiáceos na África registrou um forte incremento nos últimos anos. Segundo dados da ONU, por exemplo, em 2004 ocorreu um incremento da apreensão de heroína de 60% em relação ao ano precedente.
A maior parte deste incremento é devido à apreensão ocorrida na África central e ocidental, que quase triplicou de 2003 a 2004. A heroína que passa pela África é destinada em primeiro lugar aos mercados europeus e, em segundo lugar, aos da América do Norte. A heroína provém dos países do sudoeste e sudeste da Ásia.
A quantia total dos opiáceos apreendida na África permanece ainda modesto (0,3% do total de apreensões em nível mundial). Porém, deve-se levar em consideração que não existem estatísticas confiáveis e que o nível das apreensões não reflete o verdadeiro fluxo de narcóticos que passa pela África por causa da debilidade da polícia local, que tem dificuldade em interceptar as cargas ilícitas.
No que concerne ao uso de opiáceos na África, segundo os dados do Departamento das Nações Unidas para a luta à criminalidade (UNODC), nota-se um aumento de seu consumo no continente africano, em particular na África oriental e naquela austral e em alguns países da África ocidental. Segundo os especialistas das Nações Unidas, o crescimento do consumo de heroína nessas áreas deriva do fato de que são utilizadas como locais de trânsito dos narcotraficantes, os quais, porém, não desdenham em criar um mercado local.
Na África do Sul, um dos poucos países africanos que dispõe de dados confiáveis, até os primeiros anos do novo milênio, o pedido de tratamentos por abuso de heroína representava somente 1% do total dos pedidos de cura por dependência de substâncias entorpecentes (incluído o álcool). Em 2005, esta porcentagem subiu para 7%.
Segundo o relatório do UNODC sobre o tráfico de entorpecentes de 2007, o mercado da heroína está dividido deste modo: a heroína afegã é destinada aos mercados da Ásia central, da Europa, do Oriente Médio e da África; aquela produzida no chamado “triângulo de ouro” alimenta o mercado chinês e o dos outros países asiáticos e da Oceania; aquela proveniente da América Latina serve o mercado norte-americano.
O relatório nota, porém, que “uma parte pequena, mas em crescimento, da produção de opiáceos afegãos é enviada à América setentrional, seja por meio da África oriental e ocidental, seja por meio da Europa”.
O relatório afirma que a demanda global de heroína permaneceu estável, “apesar de importantes incrementos nos países que se encontram no caminho das principais rotas do narcotráfico”.
Entre esses estão também diversos países africanos, afirma o documento, que destaca os efeitos prejudiciais da difusão da heroína e de outras substâncias entorpecentes nas populações já duramente provadas pela pobreza e pela difusão da AIDS.
Os últimos dados do UNODC mostram um forte incremento do uso de heroína em alguns países africanos como Moçambique, Zâmbia, Quênia, Tanzânia e Costa do Marfim, enquanto outros países tiveram um aumento mais contido. Entre esses, África do Sul, Madagascar, Gana, Libéria e Senegal.

DOS ANDES AO KILIMANJARO: UM FLUXO DE COCAÍNA INVADE A ÁFRICA
O dado mais preocupante, porém, é o da cocaína que transita da África em direção principalmente à Europa e, secundariamente, à América setentrional.
A importância da África, e em particular da África ocidental, como ponto de trânsito da cocaína em direção aos ricos mercados ocidentais é demonstrada pelo nível das apreensões registradas nos últimos anos. As apreensões de cocaína em toda a África aumentaram três vezes entre 2003 e 2004, enquanto no mesmo período as apreensões na África ocidental e central aumentaram seis vezes. As apreensões mais importantes no período 2000-2004 se registraram em Cabo Verde, seguido por África do Sul, Quênia, Gana e Nigéria. Mas as apreensões de cocaína na África representam somente 1% do total mundial das apreensões desta substância entorpecente. Também neste caso, porém, o dado é prejudicado devido à debilidade das polícias locais, incapazes de interceptar a maior parte dos fluxos de cocaína proveniente da América do Sul.
Em 2004, 50% das apreensões de cocaína no continente ocorreram na África ocidental e central. A zona de passagem mais utilizada pelos traficantes de cocaína é o Golfo da Guiné, de onde a substância entorpecente é transportada para a Europa em pequenas quantidades, através dos chamados “mulas”, pessoas que assumem o risco de ingerir óvulos de cocaína com a esperança de superar as alfândegas nos aeroportos de destinação. Nos últimos anos, também na África oriental aumentou a quantia de cocaína apreendida, indicando uma tendência a utilizar em medida crescente esta área como ponto de trânsito para a cocaína destinada à Europa e à Ásia.
Um dos países mais atingidos pelo fenômeno é o Quênia, onde em 2004 foi apreendida uma tonelada de cocaína. Em termos gerais, o crescimento da difusão da cocaína na África é demonstrada pelo fato que dos 32 países africanos que fornecem estatísticas sobre as apreensões de entorpecentes na UNODC, 23 (72%) relataram apreensões de cocaína, contra 34% em 1990.
Os traficantes de cocaína tendem a servir-se da África cada vez mais como ponto de trânsito por dois motivos. O primeiro deriva do melhoramento dos sistemas de inspeção utilizados pelas autoridades locais e por aquelas norte-americanas na área caribenha e centro-americana, tradicional rota utilizada pelos traficantes. Nos últimos anos, por exemplo, surgiram bases de inspeção norte-americanas dos Andes às ilhas caribenhas. Também as autoridades holandesas intensificaram a inspeção com patrulhas aéreas baseadas nas ilhas de Curaçao e Saint Martin.
O segundo fator está ligado à diminuição do consumo de cocaína, que se registrou nos Estados Unidos diante de um aumento da demanda na Europa. Se na América do Norte há o mais alto número de consumidores mundiais (6 milhões e meio, correspondente a cerca da metade do consumo mundial), a tendência é diminuir a demanda.
De 1998 a 2004, de fato, se registrou uma queda de 20% da difusão desta substância. No mesmo período, na Europa ocidental, onde os consumidores de cocaína são 3 milhões e meio (26% do total mundial), se notou um aumento do consumo e da difusão do “pó branco”. Na Espanha e no Reino Unido, este dado é de 2%.
A África, portanto, é uma cômoda e segura rota para alcançar um mercado em crescimento.
Além disso, como efeito colateral criou-se um mercado africano que está registrando nos últimos anos preocupantes aumentos.
A crescente disponibilidade de cocaína se traduz, com efeito, em um aumento do consumo desta substância na África. Segundo os dados do UNODC, no período 1992-2004 o abuso da cocaína na África cresceu em um ritmo mais sustentado do que no restante do mundo. Este incremento é mais remarcado nos países da África meridional e nos da África ocidental.
Se forem analisados os dados das pessoas que recorrem aos tratamentos de desintoxicação, o aumento do consumo de cocaína emerge com evidência. No início dos anos 90, as pessoas em tratamento por abuso de cocaína eram pouquíssimas, no final de 1996 constituíam 1.5% dos casos tratados pelas estruturas de recuperação dos toxicômanos, no biênio 1999-2000 eram 6%. No período 2001-2004, notou-se uma inflexão na porcentagem de pessoas que pediam para ser tratadas da dependência de cocaína (menos de 5%).
A partir do final de 2004, este dado está em crescimento: de 7,5% em 2004 passou-se a 8,5% nos primeiros meses de 2005.

A COCAÍNA NA ÁFRICA OCIDENTAL
O país tradicionalmente mais envolvido no narcotráfico é a Nigéria. Lá, com efeito, em 1993 houve a primeira grande apreensão de cocaína na África e as organizações criminais nigerianas estão perfeitamente inseridas no sistema criminal global e transnacional. A afirmação das máfias nigerianas deriva também da pertença da Nigéria ao Commonwealth, que permitiu abrir estreitas relações comerciais com o subcontinente indiano, produtor de ópio e de heroína, e com o mundo anglo-saxão consumidor.
No final dos anos 80, registrou-se um incremento importante no papel de centro estratégico e, em 1992, as apreensões de cocaína no aeroporto de Lagos foram tão relevantes que as autoridades nigerianas suspenderam os vôos diretos para o Rio de Janeiro. Desde então, os traficantes nigerianos são considerados os principais transportadores da droga, uma verdadeira indústria a serviço do comércio de heroína e da coca. Eles estão presentes em todos os pontos-chaves da produção e do tráfico de drogas. Graças aos compatriotas residentes no exterior, formaram clãs criminais comparáveis aos colombianos, turcos e chineses.
As organizações mafiosas nigerianas, como as outras, se baseiam na solidariedade étnica, de clã e de famílias. Já em 1995 as autoridades norte-americanas estimavam que 50% da heroína circulante em seu país era introduzida pelos nigerianos, os quais usam a Polônia e a Hungria como pontos de trânsito para a cocaína destinada à Europa ocidental.
Um dos países da África ocidental dos quais se têm estatísticas confiáveis sobre o incremento do tráfico de cocaína é Gana. Segundo os dados divulgados pelas autoridades locais, em um único ano as apreensões de cocaína aumentaram 40 vezes, passando dos 15 quilogramas de 2003 aos 617 quilos de 2004. A maior parte da cocaína é destinada ao mercado britânico.
Trata-se de um dado significativo, levando-se em consideração que, em termos porcentuais, as apreensões de cocaína aumentaram 18% em nível mundial e 4.000% em Gana de 2003 a 2004. No mesmo período, na África, as apreensões de cocaína aumentaram 3 vezes, passando das 1,1 tonelada para 3,6 toneladas.
Nos anos sucessivos, emergiram outros fatos que demonstram que Gana se tornou um importante ponto de passagem da cocaína na África ocidental. Em novembro de 2005, a polícia ganense apreendeu 588 quilos no decorrer de uma perquirição em uma habitação em East Lagon. Em abril de 2006, foram descobertos a bordo do navio MV Benjamin, atracado no porto de Tema, 2.310 quilos de cocaína.
Segundo um responsável do UNODC, as organizações de narcotraficantes tendem a fazer transitar a droga por meio da África ocidental porque, até agora, as autoridades alfandegárias européias e norte-americanas controlam com menos atenção as mercadorias e as bagagens provenientes da África em relação àquelas provenientes da América Latina. No caso de Gana, como de outros países da região, o fato de não estar inserido na lista dos países produtores de cocaína significa que as suas mercadorias não são sujeitas a inspeções detalhadas. Mas nos últimos anos, as coisas mudaram e Gana foi inserida na lista dos países “de alta prioridade” de inspeção.
Os traficantes buscam corromper os policiais e a polícia para permitir o trânsito das cargas de entorpecentes. Para investigar casos de corrupção de policiais, o Ministério da Fazenda de Gana criou uma Comissão de investigação, que recebeu o nome da sua Presidenta, Georgina Wood, que desempenhou importantes cargos na polícia e na magistratura local. O “Georgina Wood Committee” nasceu após duas importantes apreensões de cocaína citadas precedentemente, nas quais resultaram envolvidos alguns policiais. Entre as recomendações apresentadas pelo Comitê, está reforçar o patrulhamento das costas do país por meio seja da potenciação dos meios da marinha e da aeronáutica, seja com a criação de um serviço de guarda-costas independente.
A Guiné-Bissau é um outro país que se tornou ponto de trânsito da cocaína da América Latina à Europa, como demonstrado numa recente operação que levou à captura de 674 quilos de cocaína e à detenção de alguns narcotraficantes sul-americanos. Na África ocidental, os países mais envolvidos pelos fluxos de droga, além de Gana, são Costa do Marfim, Senegal e Nigéria.
Os traficantes de cocaína na Guiné-Bissau estão ligados aos que passam através do vizinho Senegal, como emergiu da operação efetuada no final de junho de 2007 pela polícia de Dakar, que levou à apreensão de mais de duas toneladas de cocaína. Parte da droga se encontrava em um veleiro que estava à deriva diante das costas senegalesas, e uma outra em uma habitação na área balneária de Mbour, a sul de Dakar.
No veleiro os investigadores encontraram uma documentação que comprova que os narcotraficantes utilizam a Guiné-Bissau como depósito de trânsito da cocaína proveniente da América Latina e destinada à Europa. Também a nacionalidade dos detidos demonstra o grau de internacionalização das organizações criminais dedicadas ao narcotráfico. Além de três cidadãos sul-americanos (um colombiano, um venezuelano e um equatoriano) e de uma cidadã francesa, a polícia deteve três senegaleses. A partir dos documentos detidos, além disso a polícia senegalesa descobriu que os narcotraficantes efetuaram diversas viagens aos países limítrofes: Serra Leoa, Guiné Conakry, Guiné-Bissau e Gâmbia.
As autoridades senegalesas reiteraram que em seu país não existem depósitos de cocaína, mas admitiram a infiltração de grupos criminais estrangeiros, que utilizam o aeroporto de Dakar para enviar cocaína à Europa. No período de janeiro a junho de 2007, a polícia senegalesa afirma ter apreendido no aeroporto de Dakar 44 quilos de cocaína e detido cerca de 30 “mulas” da droga, a maior parte dos quais nigeriano.
Está em aumento também o número de “mulas” da Guiné-Bissau detidos no momento do embarque para Portugal, onde podem entrar sem visto. Além disso, foram descobertas algumas operações de reciclagem de dinheiro sujo por parte de organizações estrangeiras. A apreensão recorde efetuada pela polícia senegalesa, equivalente ao total de apreensões de cocaína na África ocidental de setembro de 2006 a maio de 2007, é somente o último de uma série efetuada nos primeiros seis meses de 2007 em várias localidades da África ocidental.
Entre essas, há 800 quilos de cocaína recuperados no mar diante das ilhas Canárias, e uma quantia análoga apreendida pela marinha francesa no largo da Costa do Marfim. Além dos navios, as organizações criminais recorrem a aviões para alimentar seus tráficos ilícitos.
Na Venezuela foi bloqueado um avião com 2,5 toneladas de cocaína, que se preparava a partir para Serra Leoa, enquanto em maio de 2007 foram apreendidos 600 quilos de cocaína a bordo de um Cessna, matriculado na Venezuela, que efetuou uma aterrissagem de emergência em Nouadhibou, na Mauritânia.
Segundo um responsável do ONUDC, para a África ocidental o aumento de confiscos das cargas de cocaína na região é devido mais a incidentes de percurso que a uma maior eficácia da polícia.
O funcionário considera que a cada dez expedições de droga em direção à Europa, nove chegam a seu destino sem problemas.

O SAHEL: NOVA FRONTEIRA DO NARCOTRÁFICO?
Das costas da África ocidental as organizações de narcotraficantes estão progressivamente se expandindo aos países do Sahel, cujo papel estratégico entre o Atlântico e o Magreb, e, portanto o Mediterrâneo, é apreciado também pelos traficantes de seres humanos e, provavelmente, pelo terrorismo internacional. Não se pode excluir a priori uma interconexão entre essas realidades criminais, de que são cúmplices a debilidade dos Estados e a vastidão dos territórios a controlar. Um realidade que suscita o alarme dos governos interessados.
Em abril deste ano, depois da apreensão de três caminhões cheios de droga e armas, o Presidente do Níger, Mamadou Tandja, declarou que o exército local pretende aumentar os esforços para impedir que o seu país seja “circundado” pelos traficantes de armas e de droga, que são uma “ameaça real” para o país.
Também Burkina Fasso não foge ao fenômeno. Segundo o Coordenador do Comitê contra os tráficos ilícitos de droga em Burkina Fasso, o volume das cargas de droga interceptadas nos primeiros três meses de 2007 é “incrível”. O funcionário indica a existência de uma nova rota de trânsito da droga no oeste e no sudoeste do país. No início de abril de 2007, 49 quilos de cocaína, num valor de 10 milhões de dólares, foram interceptados pela polícia de Burkina Fasso na fronteira com o Mali, que é um importante ponto de trânsito para o tráfico de seres humanos. Países como Mali e Níger são há milênios atravessados por vias de caravanas, que agora se converteram num uso criminal: para o tráfico de seres humanos, mas também de armas, droga e cigarros de contrabando. “Nos últimos meses notamos um aumento da utilização dos países do Sahel, como Mali e Níger, para o tráfico de cocaína”, disse Antonio Razzitelli, Diretor do departamento do UNODC para a África ocidental.
Segundo o órgão anticrime da ONU, os traficantes importam a droga por meio das cidades costeiras como Conakry, na Guiné, Dakar, no Senegal, e Lomé, no Togo, e depois a transportam para as cidades do interior, como Bamako, no Mali, e Ouagadougou, em Burkina Fasso. Dessas localidades, a cocaína prossegue a sua viagem até a Europa.
Segundo o responsável do Comitê contra os tráficos ilícitos de droga em Burkina Fasso, é preciso coordenar os esforços entre as polícias dos Estados da região. “Há uma necessidade urgente de reunir todos os entes nacionais antidroga da região para encontrar o modo de cooperar entre si, para tentar deter as redes criminais”, disse, destacando que a escassa cooperação entre as fronteiras dos países do Sahel e a falta de meios das polícias locais constituem problemas adjuntos para uma eficaz ação de contraste às redes criminais.

O MERCADO DA CÂNABIS
Enquanto a África permanece, no momento, somente um local de trânsito e um mercado residual para drogas como cocaína e heroína, a principal produção local de substâncias entorpecentes é representada pela cânabis.
O cultivo da cânabis foi introduzido na África oriental pelos mercantes árabes, pérsios e indianos no século XII. De lá se difundiu primeiramente na África austral, no século XV, e depois no Congo e em Angola no século XIX. Somente depois da Segunda Guerra Mundial a cânabis chegou à África ocidental, levada por soldados nigerianos e ganenses que combateram com as tropas britânicas na Birmânia (atual Mianmar), onde adquiriram o hábito de fumar marijuana. Este fato explica porque nos países onde a cânabis é conhecida há mais tempo, ela é utilizada na medicina tradicional, enquanto na África ocidental é usada para fins “recreativos”. Até os anos 80, porém, a produção africana da cânabis permaneceu limitada. A partir daqueles anos, porém, notou-se um incremento notável da superfície cultivada com a cânabis para fins comerciais.
A produção desta substância se divide em três categorias: a erva da cânabis (flores e folhas), resina ou haxixe (secreções emitidas pela planta durante a fase de florescimento) e óleo de haxixe, o menos utilizado. Segundo o World Drug Report 2006, a erva da cânabis é cultivada, sobretudo de modo ilegal, em 176 países em todo o mundo. A África representa 27% da produção mundial e os principais produtores são Marrocos (3.700 toneladas), África do Sul (2.200 toneladas) e Nigéria (2 mil toneladas).
No que concerne ao haxixe, o principal produtor mundial é Marrocos, que fornece os mercados norte-africanos e europeus. Graças ao esforço das autoridades marroquinas nos últimos anos, deu-se a diminuição da produção local da cânabis, à qual corresponde um aumento da produção em outros países, da Ásia ocidental (Afeganistão, Paquistão) à Albânia. O UNODC reconhece que desde 2003 o governo de Rabat conduziu uma campanha para estimar a produção de resina da cânabis no país, em cooperação com a Agência anticrime das Nações Unidas. Segundo uma investigação efetuada em 2003, a produção da cânabis foi de 3.060 toneladas, cultivada em 134 mil hectares de terra na região do Rif (norte do país) por 96.600 famílias de camponeses. A investigação feita em 2004 registrou uma diminuição de 10% das terras cultivas com a cânabis, que passaram a 120.500 hectares, com uma produção estimada de 2.760 toneladas.
Em 2005 notou-se uma ulterior diminuição de 37%, sendo a superfície cultivada com a cânabis de 72.500 hectares, enquanto a produção diminuiu para 1.070 toneladas. Quanto às apreensões da cânabis, nos últimos 12-15 anos se registrou um aumento da porcentagem mundial de apreensões no continente africano desta substância. Enquanto em 1990 16% do total mundial das apreensões da cânabis ocorria na África, em 2002 este dado subiu para 20%, para alcançar 31% em 2004. O aumento das apreensões na África é determinado sobretudo pelo aumento dos controles policiais e alfandegários efetuados pela Nigéria e pela África do Sul.
O principal mercado de consumo da cânabis é a Europa ocidental, e 80% da cânabis consumada na Europa provém do Marrocos, passando pela Espanha e pela Holanda e dali distribuída aos outros países. O terceiro mercado mundial de consumo é representado pelos países do norte da África, onde a cânabis provém principalmente do Marrocos. Parte da cânabis produzida no Afeganistão e Paquistão, além disso, alimenta o mercado dos países da África oriental.
No que concerne às problemáticas sociais ligadas ao consumo da cânabis, é preciso recordar que esta substância é a droga mais difundida e usada em nível mundial. Estima-se que, em 2004, 162 milhões de pessoas a tenham usado, o equivalente a 3,9% da população mundial entre 15 e 64 anos. Em termos relativos (a porcentagem de habitantes que faz uso da cânabis em relação a outras substância entorpecentes), a cânabis é prevalentemente utilizada na Oceania, seguida por América do Norte e África. Desde 1992, na África, notou-se também uma tendência ao aumento do seu consumo, em particular na Argélia, Nigéria e Zâmbia.
É provável que a tendência ao uso desta droga seja subestimada em diversos países da África, que não têm uma capacidade de coleta de dados adequados para seguir o fenômeno. Segundo dados parciais, notou-se nos últimos anos um forte incremento do abuso da cânabis na África ocidental, oriental e no norte da África, em sintonia com a tendência em nível global de uma ulterior expansão do consumo desta substância.
Até os anos 80, porém, a produção africana da cânabis permaneceu limitada. A partir daqueles anos, porém, notou-se um incremento notável da superfície cultivada com a cânabis para fins comerciais.
A produção africana de droga subtraiu terras e recursos à agricultura, isso porque naquele período se registrou uma forte queda dos preços dos produtos agrícolas em todo o mundo. A agricultura africana, já frágil, entrou em crise. Diversos camponeses, portanto, deixaram-se tentar pelo cultivo da cânabis em detrimento do cultivo de produtos lícitos.
Um simples cálculo econômico demonstra o forte poder de atração de uma semelhante produção; já em 1995, na Guiné, um saco de 20-25 quilos de marijuana tinha o valor de aproximadamente a renda anual média de uma famílias de oitos pessoas que se dedica à produção de cultivo lícito. No mercado de Kinshasa, na República Democrática do Congo (RDC), um saco de 25 quilos de marijuana é vendido por mil dólares, enquanto um saco de 80 quilos de mandioca vale somente 10 dólares.
Compreende-se, assim, que o cultivo desta substância entorpecente tem sérias repercussões na auto-suficiência alimentar de diversos países africanos. Segundo a associação de luta à toxicomania de Kinshasa, LIPILDRO, por causa do abandono dos cultivos legais por aqueles da cânabis, até 2010 a maior parte das cidades congolesas será atingida por um crise alimentar.
Além disso, na RDC se verificaram experiências para o cultivo da papoula de ópio (na província do Equador) e da cocaína (na região do Shaba). O mais importante produtor da cânabis na África subsaariana permanece, porém, a África do Sul. Importante produções são sinalizadas também em Lesoto e em Malauí.

DROGAS SINTÉTICAS
A produção de drogas sintéticas é limitada na África, com exceção da África do Sul, onde a fabricação de metanfetaminas e methaqualone aumentou nos últimos anos. Os dados sobre a descoberta de laboratórios clandestinos confirmam esta tendência.
Com efeito, se passou da descoberta à destruição de um laboratório por ano no período 1995-1999, aos 17 no período 2000-2003, até aos 28 destruídos somente em 2004. Um outro dado que demonstra o incremento do uso de drogas sintéticas na África do Sul é o aumento das apreensões de ecstasy: em 2004, houve um incremento de 385% das apreensões em relação ao ano precedente.
Além disso, as drogas sintéticas faziam parte do programa de guerra secreta química e biológica aplicado pelo regime do apartheid. Segundo os testemunhos reunidos durante o processo contra o responsável do programa, doutor Wouter Basson (definido “Doutor Morte” pela imprensa local), no âmbito do chamado “Project Coast”, entre 1992 e 1993 os laboratórios relacionados aos serviços secretos sul-africanos tinham produzido mais de 900 quilos de cristais de ecstasy (correspondente a 73 milhões de pílulas). No ano precedente, uma empresa de serviços do regime do apartheid tinha importado 500 quilos desta substância da Croácia.
Essas quantidades de drogas sintéticas foram importadas e produzidas para serem usadas como agente incapacitador para o controle da multidão (e talvez também para drogar secretamente os líderes da oposição para desacreditá-los, fazendo-os cometer gestos ridículos em público) e para serem distribuídas nas favelas habitadas pela população negra para promover o abuso de droga e a dependência.
O fim do regime do apartheid bloqueou este e outros projetos criminais aplicados no âmbito do “Project Coast”. Antes da queda do regime, porém, o dr. Basson tinha organizado a venda das empresas de cobertura dos serviços secretos sul-africanos, alguns dos quais fabricavam armas químicas e biológicas e drogas sintéticas.
Além disso, desapareceram centenas de quilos de substâncias químicas usadas na produção desses instrumentos de morte.
O dr. Basson é suspeito de ter aberto um empresa privada e, com efeito, quando foi detido em 1997 foi encontrado em posse de pílulas de ecstasy num valor de 20 mil dólares.

ÁFRICA ORIENTAL: UMA SITUAÇÃO PREOCUPANTE
Na África oriental, o Quênia é o principal ponto de trânsito da cocaína. Somente em 2004 foi apreendida 1,1 tonelada de cocaína entre a capital Nairóbi e o centro costeiro de Malindi. No decorrer da operação da polícia, que levou à descoberta desta importante carga de droga, foram detidos diversos funcionários da companhia aérea local (que resultou estranha ao narcotráfico), alguns dos quais foram capturados em Londres.
Das investigações emergiu que a droga que passava pelo Quênia era inserida no mercado britânico com a colaboração de alguns funcionários infiéis da companhia aérea. Além do Quênia, os países da África oriental interessados pelo narcotráfico são Etiópia, Botsuana, Zâmbia e África do Sul. Neste último, segundo o South African Institute of International Affaire, existem 500 mil pessoas que fazem uso de cocaína, enquanto 1/3 dos adolescentes utiliza entorpecentes. Segundo o centro de estudos sul-africano, no país atuam 300 organizações criminais internacionais envolvidas no narcotráfico.
Os países da região se tornaram não somente uma região de trânsito, mas também um novo mercado para os entorpecentes e, em particular, para a cocaína. Na Zâmbia, por exemplo, 80% da cocaína que chega ao país é transferida para a Europa e o restante 20% é consumado localmente.
A Interpol lançou o alarme sobre o crescente consumo de entorpecentes na África. “As drogas não somente transitam nos países, mas permanecem lá”, disse um responsável da organização internacional de polícia diante dos delegados de 150 organismos de polícia de todo o mundo, reunidos para o encontro anual da Interpol no Rio de Janeiro (Brasil). “Já se tornaram habituais as cargas de diversas toneladas de cocaína que passam pela África”, acrescentou.
Segundo um analista presente no seminário, se a tendência ao incremento do uso de entorpecentes continuar avançando, a África deverá enfrentar uma grave crise social derivante da droga.
As condições climáticas da maior parte da África são favoráveis ao cultivo da cânabis. Trata-se de um cultivo que permite um alto lucro para o agricultor e necessita de um trabalho menos intensivo em relação aos outros cultivos.
Inteiras famílias de agricultores podem viver, assim, de modo decente e permitir-se comprar alimento e medicamentos e enviar seus filhos à escola.
A cânabis é cultivada na África principalmente para o mercado local, mas nos últimos anos notou-se um aumento dos tráficos da cânabis originados na África subsaariana. Os maiores cultivos da cânabis se encontram em Comores, Etiópia, Quênia, Madagascar, Tanzânia e Uganda.
No Quênia, o cultivo da cânabis tem uma antiga tradição, mas nos últimos anos se tornou primeiramente uma produção limitada ao mercado local, para depois transformar-se em uma verdadeira empresa comercial ilícita estendida internacionalmente.
A cânabis é cultivada na região ocidental e naquela do Monte Quênia, onde, segundo alguns relatórios, existem cerca de 1.500 hectares cultivados com a cânabis. Os cultivos de droga estão escondidos entre aqueles tradicionais destinados à alimentação, mas há também cultivos menores em algumas áreas protegidas da reserva natural nacional.
Também as regiões costeiras se tornaram produtores da cânabis. Lá, com efeito, se instalaram diversos agricultores provenientes do interior, que lá encontraram áreas férteis e pouco controladas pela polícia, e um mercado constituído pela população local, pelos turistas e pelos residentes estrangeiros que preferem as costas do país.
Quanto ao ópio, no passado foram sinalizados alguns cultivos no Quênia e nas costas de Madagascar. Desde 1993 não foram sinalizados cultivos de opiáceos na África oriental, mas a vastidão do território e os escassos controles das autoridades locais tornam sempre possível uma retomada do cultivo da papoula de ópio.
No que diz respeito à produção local de drogas sintéticas, a África oriental é o ponto de trânsito do methaqualone (Mandrax) proveniente da Índia e destinado ao mercado sul-africano.
Nos últimos anos, a redução do Mandrax proveniente da Índia gerou uma produção local desta substância. Com efeito, foram descobertos laboratórios químicos clandestinos utilizados para a fabricação desta droga sintética em alguns países da África oriental e meridional.
Nos casos dos laboratórios descobertos no Quênia e na Tanzânia, se tratava somente de pequenos centros onde o pó do Mandrax ainda proveniente da Índia era transformado em pílulas, mas em outros casos deparou-se com verdadeiras oficinas para a fabricação do Mandrax com precursores químicos, cuja proveniência permaneceu desconhecida. A este propósito, as substâncias que mais causam preocupação são as efedrinas, as pseudo-efedrinas, o anidrido acético e o ácido N-acetilantranílico (utilizado na fabricação do Mandrax) e o pergamenato de potássio.
O mais famoso cultivo de planta entorpecente local é o khat, que é uma produção legal em diversos países da África oriental. O khat é cultivado na Etiópia e no Quênia e, em medida menos extensa, na Tanzânia, Comores e na parte setentrional de Madagascar. É exportado para os principais mercados da área (Djibuti, Eritréia, Somália e Iêmen), além da Europa e da América setentrional.
O uso do khat continua a expandir-se no Chifre da África e tem um papel-chave na contínua instabilidade da Somália, onde se calcula que a população gasta todos os anos 64 milhões de dólares por ano para comprar o khat. Trata-se de um quantia que é quase o dobro do total das ajudas internacionais doadas ao país. O khat não somente contribui para provocar problemas na sociedade, criando pessoas afetadas pela dependência de entorpecentes, mas tem também um papel na difusão no país de armas leves, frequentemente repassadas em troca de um pouco de droga.
As organizações de narcotraficantes olham com interesse aos países da África oriental e meridional por causa de suas infra-estruturas portuárias e aeroportuárias, dos comprimentos de suas costas e dos fluxos turísticos.
Todos elementos que permitem esconder os tráficos de droga. O Quênia tem o maior porto comercial da região, Mombasa, que serve a maior parte dos países privados de acesso direto ao mar, enquanto o aeroporto de Nairóbi é um dos mais traficados da área. As redes do narcotráfico utilizam também os portos de Dar-es-Salaam (na Tanzânia), Djibuti, Durban (na África do Sul) e Maputo (em Moçambique) e estão expandindo suas atividades também na Etiópia, Mauritius, Tanzânia e Uganda. Esses últimos países são usados como pontos de trânsito para a droga enviada para o Quênia, a África do Sul e a África ocidental e dessas áreas para a Europa e a América do Norte.
A maior parte das substâncias entorpecentes chega à região via mar, escondida nas cargas dos containers transportados pelos navios mercantis que navegam o Oceano Índico. Em alguns casos, os navios dos narcotraficantes se encontram em alto mar com embarcações menores, que levam para a terra a carga ilícita. Grandes quantidades de heroína chegam assim à região, mas se recorre também a carteiros, homens e mulheres, que chegam com vôos comerciais, e ao envio por correio.
Entre os países da África oriental interessados pelo tráfico e pelo consumo de substâncias entorpecentes, está Uganda.
Segundo um recente relatório do UNODC, “Uganda se tornou o país líder no tráfico e no consumo de droga em relação ao restante dos Estados da África oriental”. Entre as drogas presentes no mercado ilícito ugandense, existem a cânabis, a heroína, a cocaína e o mandrax, além do khat. Segundo a agência anticrime da ONU, o aumento do consumo de substâncias entorpecentes é devido a “duas décadas de conflitos armados e à falta de lei, que prejudicaram gravemente a infra-estrutura policial”.
O relatório observa que as condições climáticas de todo o território ugandense são favoráveis ao cultivo da cânabis: “O cultivo ilícito da planta é, porém, relevante em áreas remotas das regiões meridional, ocidental, central, oriental e norte-oriental. As dimensões exatas dos cultivos da cânabis não são conhecidas, mas se notou um aumento da produção da cânabis sobretudo para a exportação”. O aeroporto de Entebbe é, por fim, utilizado como ponto de trânsito para o envio de heroína e de mandrax ao extremo Oriente e à África do Sul.

CONCLUSÕES
A África é um ponto de trânsito sempre mais importante para as organizações de narcotraficantes, apesar de, no momento, a maior parte das apreensões de entorpecentes ocorrer em outras partes do mundo.
Vista a escassa eficiência das polícias africanas e a relativa recente conscientização do problema por parte dos entes locais e internacionais, pode-se supor que a quantidade das apreensões de droga na África não corresponda à entidade efetiva das cargas que transitam pelo continente.
A África, porém, não é mais somente um ponto de passagem da droga proveniente da América Latina e da Ásia em direção à Europa e à América setentrional, mas já se tornou um mercado ainda talvez “residual”, mas em todo caso que não pode ser ignorado pelas redes de narcotraficantes.
Redes nas quais estão presentes africanos, em particular nigerianos, em papéis não somente de gregários, mas também de organizadores. O crescente consumo de drogas por via endovenosa em diversos países africanos, como Tanzânia e Quênia, agrava o problema da difusão da AIDS.
Na Nigéria, por exemplo, um estudo revelou que o consumo de drogas se expande no mesmo ritmo do aumento das pessoas infetadas com o vírus HIV, em cidades como Kano e Port Harcourt.

 
At 9/17/2007 3:09 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

A DROGA NA ÁFRICA: UM PROBLEMA MUNDIAL

A droga já é um problema na África e representa um ulterior obstáculo ao desenvolvimento do continente. É o que afirmam diversos organismos internacionais encarregados da luta ao tráfico de entorpecentes. Já em 2001, um relatório do Órgão Internacional de Controle das Drogas afirmava que “graças à sua experiência no campo do contrabando de haxixe e de heroína, os cartéis da droga da África ocidental buscam novos contatos na América Latina para estender o tráfico de cocaína a toda a região da África subsaariana”.
Trata-se de uma reviravolta fundamental na estratégia do narcotráfico mundial, que vê a África se tornar uma das áreas “fulcro” para a distribuição de drogas em todo o mundo. Até os primeiros anos da década de 90 do século passado, a África era mantida às margens das rotas da droga. A mudança ocorreu em 1993, quando foram apreendidos na Nigéria 300 quilos de heroína provenientes da Tailândia. É o sinal de uma mudança que vê a transformação de tantos pequenos contrabandistas africanos (a maioria nigerianos) de simples transportadores por conta de terceiros a membros de gangues guiadas por africanos, capazes de tratar no mesmo nível com análogas organizações de outros continentes.
A presença dessas organizações criminais, a forte urbanização, a perda dos valores tradicionais africanos e a difusão de uma cultura hedonista são todos fatores que criaram as premissas para um mercado africano da droga. A África, portanto, não é somente um local de trânsito dos entorpecentes, mas terreno “virgem” para o tráfico de droga.

PREMESSA METODOLÓGICA
Os dados apresentados são úteis para analisar a tendência (incremento ou decremento) do tráfico de entorpecentes, apesar de serem muito provavelmente aproximativos.
Segundo um estudo crítico efetuado pela associação ‘Libera’ do pe. Ciotti, com efeito os dados apresentados pelos entes antidrogas internacionais e de alguns Estados não relatam fielmente toda a produção mundial de cocaína. Segundo este estudo (referido somente à cocaína e não a outras drogas), existe uma discrepância entre a estimativa sobre a produção mundial de cocaína efetuada pela ONU e os dados relativos às apreensões e ao consumo de cocaína somente na América.
Segundo os elaboradores do relatório, com efeito, subtraindo das 937 toneladas de produção, indicada pelas Nações Unidas em 2004, as cerca de 450 consumadas nos Estados Unidos, Canadá, México e em toda a América do Sul e as cerca de 490 toneladas apreendidas em todas as Américas, se chegaria a um saldo negativo de 3 toneladas.
“A este ponto, não se saberia mais de onde subtrair as cerca de 99 toneladas de cocaína apreendidas no “resto do mundo”, afirma o relatório. Fazendo-o, se chegaria ao paradoxal saldo negativo de 102 toneladas de cocaína “não resultantes”, não tendo feito frente ainda à demanda de cocaína no “resto do mundo”, estimada em ao menos 300 toneladas, se chega a calcular uma espécie de buraco negro de aproximadamente 400 toneladas de cocaína não resultantes.
Este buraco negro assume proporções ainda mais macroscópicas, cerca de 700 toneladas, se calculado com base nos dados da Agência antidroga norte-americana.
Apesar dos seus limites, os relatórios dos organismos internacionais de luta contra a droga permanecem frequentemente os únicos instrumentos para analisar o fenômeno do narcotráfico.

A HEROÍNA NA ÁFRICA
A apreensão de opiáceos na África registrou um forte incremento nos últimos anos. Segundo dados da ONU, por exemplo, em 2004 ocorreu um incremento da apreensão de heroína de 60% em relação ao ano precedente.
A maior parte deste incremento é devido à apreensão ocorrida na África central e ocidental, que quase triplicou de 2003 a 2004. A heroína que passa pela África é destinada em primeiro lugar aos mercados europeus e, em segundo lugar, aos da América do Norte. A heroína provém dos países do sudoeste e sudeste da Ásia.
A quantia total dos opiáceos apreendida na África permanece ainda modesto (0,3% do total de apreensões em nível mundial). Porém, deve-se levar em consideração que não existem estatísticas confiáveis e que o nível das apreensões não reflete o verdadeiro fluxo de narcóticos que passa pela África por causa da debilidade da polícia local, que tem dificuldade em interceptar as cargas ilícitas.
No que concerne ao uso de opiáceos na África, segundo os dados do Departamento das Nações Unidas para a luta à criminalidade (UNODC), nota-se um aumento de seu consumo no continente africano, em particular na África oriental e naquela austral e em alguns países da África ocidental. Segundo os especialistas das Nações Unidas, o crescimento do consumo de heroína nessas áreas deriva do fato de que são utilizadas como locais de trânsito dos narcotraficantes, os quais, porém, não desdenham em criar um mercado local.
Na África do Sul, um dos poucos países africanos que dispõe de dados confiáveis, até os primeiros anos do novo milênio, o pedido de tratamentos por abuso de heroína representava somente 1% do total dos pedidos de cura por dependência de substâncias entorpecentes (incluído o álcool). Em 2005, esta porcentagem subiu para 7%.
Segundo o relatório do UNODC sobre o tráfico de entorpecentes de 2007, o mercado da heroína está dividido deste modo: a heroína afegã é destinada aos mercados da Ásia central, da Europa, do Oriente Médio e da África; aquela produzida no chamado “triângulo de ouro” alimenta o mercado chinês e o dos outros países asiáticos e da Oceania; aquela proveniente da América Latina serve o mercado norte-americano.
O relatório nota, porém, que “uma parte pequena, mas em crescimento, da produção de opiáceos afegãos é enviada à América setentrional, seja por meio da África oriental e ocidental, seja por meio da Europa”.
O relatório afirma que a demanda global de heroína permaneceu estável, “apesar de importantes incrementos nos países que se encontram no caminho das principais rotas do narcotráfico”.
Entre esses estão também diversos países africanos, afirma o documento, que destaca os efeitos prejudiciais da difusão da heroína e de outras substâncias entorpecentes nas populações já duramente provadas pela pobreza e pela difusão da AIDS.
Os últimos dados do UNODC mostram um forte incremento do uso de heroína em alguns países africanos como Moçambique, Zâmbia, Quênia, Tanzânia e Costa do Marfim, enquanto outros países tiveram um aumento mais contido. Entre esses, África do Sul, Madagascar, Gana, Libéria e Senegal.

DOS ANDES AO KILIMANJARO: UM FLUXO DE COCAÍNA INVADE A ÁFRICA
O dado mais preocupante, porém, é o da cocaína que transita da África em direção principalmente à Europa e, secundariamente, à América setentrional.
A importância da África, e em particular da África ocidental, como ponto de trânsito da cocaína em direção aos ricos mercados ocidentais é demonstrada pelo nível das apreensões registradas nos últimos anos. As apreensões de cocaína em toda a África aumentaram três vezes entre 2003 e 2004, enquanto no mesmo período as apreensões na África ocidental e central aumentaram seis vezes. As apreensões mais importantes no período 2000-2004 se registraram em Cabo Verde, seguido por África do Sul, Quênia, Gana e Nigéria. Mas as apreensões de cocaína na África representam somente 1% do total mundial das apreensões desta substância entorpecente. Também neste caso, porém, o dado é prejudicado devido à debilidade das polícias locais, incapazes de interceptar a maior parte dos fluxos de cocaína proveniente da América do Sul.
Em 2004, 50% das apreensões de cocaína no continente ocorreram na África ocidental e central. A zona de passagem mais utilizada pelos traficantes de cocaína é o Golfo da Guiné, de onde a substância entorpecente é transportada para a Europa em pequenas quantidades, através dos chamados “mulas”, pessoas que assumem o risco de ingerir óvulos de cocaína com a esperança de superar as alfândegas nos aeroportos de destinação. Nos últimos anos, também na África oriental aumentou a quantia de cocaína apreendida, indicando uma tendência a utilizar em medida crescente esta área como ponto de trânsito para a cocaína destinada à Europa e à Ásia.
Um dos países mais atingidos pelo fenômeno é o Quênia, onde em 2004 foi apreendida uma tonelada de cocaína. Em termos gerais, o crescimento da difusão da cocaína na África é demonstrada pelo fato que dos 32 países africanos que fornecem estatísticas sobre as apreensões de entorpecentes na UNODC, 23 (72%) relataram apreensões de cocaína, contra 34% em 1990.
Os traficantes de cocaína tendem a servir-se da África cada vez mais como ponto de trânsito por dois motivos. O primeiro deriva do melhoramento dos sistemas de inspeção utilizados pelas autoridades locais e por aquelas norte-americanas na área caribenha e centro-americana, tradicional rota utilizada pelos traficantes. Nos últimos anos, por exemplo, surgiram bases de inspeção norte-americanas dos Andes às ilhas caribenhas. Também as autoridades holandesas intensificaram a inspeção com patrulhas aéreas baseadas nas ilhas de Curaçao e Saint Martin.
O segundo fator está ligado à diminuição do consumo de cocaína, que se registrou nos Estados Unidos diante de um aumento da demanda na Europa. Se na América do Norte há o mais alto número de consumidores mundiais (6 milhões e meio, correspondente a cerca da metade do consumo mundial), a tendência é diminuir a demanda.
De 1998 a 2004, de fato, se registrou uma queda de 20% da difusão desta substância. No mesmo período, na Europa ocidental, onde os consumidores de cocaína são 3 milhões e meio (26% do total mundial), se notou um aumento do consumo e da difusão do “pó branco”. Na Espanha e no Reino Unido, este dado é de 2%.
A África, portanto, é uma cômoda e segura rota para alcançar um mercado em crescimento.
Além disso, como efeito colateral criou-se um mercado africano que está registrando nos últimos anos preocupantes aumentos.
A crescente disponibilidade de cocaína se traduz, com efeito, em um aumento do consumo desta substância na África. Segundo os dados do UNODC, no período 1992-2004 o abuso da cocaína na África cresceu em um ritmo mais sustentado do que no restante do mundo. Este incremento é mais remarcado nos países da África meridional e nos da África ocidental.
Se forem analisados os dados das pessoas que recorrem aos tratamentos de desintoxicação, o aumento do consumo de cocaína emerge com evidência. No início dos anos 90, as pessoas em tratamento por abuso de cocaína eram pouquíssimas, no final de 1996 constituíam 1.5% dos casos tratados pelas estruturas de recuperação dos toxicômanos, no biênio 1999-2000 eram 6%. No período 2001-2004, notou-se uma inflexão na porcentagem de pessoas que pediam para ser tratadas da dependência de cocaína (menos de 5%).
A partir do final de 2004, este dado está em crescimento: de 7,5% em 2004 passou-se a 8,5% nos primeiros meses de 2005.

A COCAÍNA NA ÁFRICA OCIDENTAL
O país tradicionalmente mais envolvido no narcotráfico é a Nigéria. Lá, com efeito, em 1993 houve a primeira grande apreensão de cocaína na África e as organizações criminais nigerianas estão perfeitamente inseridas no sistema criminal global e transnacional. A afirmação das máfias nigerianas deriva também da pertença da Nigéria ao Commonwealth, que permitiu abrir estreitas relações comerciais com o subcontinente indiano, produtor de ópio e de heroína, e com o mundo anglo-saxão consumidor.
No final dos anos 80, registrou-se um incremento importante no papel de centro estratégico e, em 1992, as apreensões de cocaína no aeroporto de Lagos foram tão relevantes que as autoridades nigerianas suspenderam os vôos diretos para o Rio de Janeiro. Desde então, os traficantes nigerianos são considerados os principais transportadores da droga, uma verdadeira indústria a serviço do comércio de heroína e da coca. Eles estão presentes em todos os pontos-chaves da produção e do tráfico de drogas. Graças aos compatriotas residentes no exterior, formaram clãs criminais comparáveis aos colombianos, turcos e chineses.
As organizações mafiosas nigerianas, como as outras, se baseiam na solidariedade étnica, de clã e de famílias. Já em 1995 as autoridades norte-americanas estimavam que 50% da heroína circulante em seu país era introduzida pelos nigerianos, os quais usam a Polônia e a Hungria como pontos de trânsito para a cocaína destinada à Europa ocidental.
Um dos países da África ocidental dos quais se têm estatísticas confiáveis sobre o incremento do tráfico de cocaína é Gana. Segundo os dados divulgados pelas autoridades locais, em um único ano as apreensões de cocaína aumentaram 40 vezes, passando dos 15 quilogramas de 2003 aos 617 quilos de 2004. A maior parte da cocaína é destinada ao mercado britânico.
Trata-se de um dado significativo, levando-se em consideração que, em termos porcentuais, as apreensões de cocaína aumentaram 18% em nível mundial e 4.000% em Gana de 2003 a 2004. No mesmo período, na África, as apreensões de cocaína aumentaram 3 vezes, passando das 1,1 tonelada para 3,6 toneladas.
Nos anos sucessivos, emergiram outros fatos que demonstram que Gana se tornou um importante ponto de passagem da cocaína na África ocidental. Em novembro de 2005, a polícia ganense apreendeu 588 quilos no decorrer de uma perquirição em uma habitação em East Lagon. Em abril de 2006, foram descobertos a bordo do navio MV Benjamin, atracado no porto de Tema, 2.310 quilos de cocaína.
Segundo um responsável do UNODC, as organizações de narcotraficantes tendem a fazer transitar a droga por meio da África ocidental porque, até agora, as autoridades alfandegárias européias e norte-americanas controlam com menos atenção as mercadorias e as bagagens provenientes da África em relação àquelas provenientes da América Latina. No caso de Gana, como de outros países da região, o fato de não estar inserido na lista dos países produtores de cocaína significa que as suas mercadorias não são sujeitas a inspeções detalhadas. Mas nos últimos anos, as coisas mudaram e Gana foi inserida na lista dos países “de alta prioridade” de inspeção.
Os traficantes buscam corromper os policiais e a polícia para permitir o trânsito das cargas de entorpecentes. Para investigar casos de corrupção de policiais, o Ministério da Fazenda de Gana criou uma Comissão de investigação, que recebeu o nome da sua Presidenta, Georgina Wood, que desempenhou importantes cargos na polícia e na magistratura local. O “Georgina Wood Committee” nasceu após duas importantes apreensões de cocaína citadas precedentemente, nas quais resultaram envolvidos alguns policiais. Entre as recomendações apresentadas pelo Comitê, está reforçar o patrulhamento das costas do país por meio seja da potenciação dos meios da marinha e da aeronáutica, seja com a criação de um serviço de guarda-costas independente.
A Guiné-Bissau é um outro país que se tornou ponto de trânsito da cocaína da América Latina à Europa, como demonstrado numa recente operação que levou à captura de 674 quilos de cocaína e à detenção de alguns narcotraficantes sul-americanos. Na África ocidental, os países mais envolvidos pelos fluxos de droga, além de Gana, são Costa do Marfim, Senegal e Nigéria.
Os traficantes de cocaína na Guiné-Bissau estão ligados aos que passam através do vizinho Senegal, como emergiu da operação efetuada no final de junho de 2007 pela polícia de Dakar, que levou à apreensão de mais de duas toneladas de cocaína. Parte da droga se encontrava em um veleiro que estava à deriva diante das costas senegalesas, e uma outra em uma habitação na área balneária de Mbour, a sul de Dakar.
No veleiro os investigadores encontraram uma documentação que comprova que os narcotraficantes utilizam a Guiné-Bissau como depósito de trânsito da cocaína proveniente da América Latina e destinada à Europa. Também a nacionalidade dos detidos demonstra o grau de internacionalização das organizações criminais dedicadas ao narcotráfico. Além de três cidadãos sul-americanos (um colombiano, um venezuelano e um equatoriano) e de uma cidadã francesa, a polícia deteve três senegaleses. A partir dos documentos detidos, além disso a polícia senegalesa descobriu que os narcotraficantes efetuaram diversas viagens aos países limítrofes: Serra Leoa, Guiné Conakry, Guiné-Bissau e Gâmbia.
As autoridades senegalesas reiteraram que em seu país não existem depósitos de cocaína, mas admitiram a infiltração de grupos criminais estrangeiros, que utilizam o aeroporto de Dakar para enviar cocaína à Europa. No período de janeiro a junho de 2007, a polícia senegalesa afirma ter apreendido no aeroporto de Dakar 44 quilos de cocaína e detido cerca de 30 “mulas” da droga, a maior parte dos quais nigeriano.
Está em aumento também o número de “mulas” da Guiné-Bissau detidos no momento do embarque para Portugal, onde podem entrar sem visto. Além disso, foram descobertas algumas operações de reciclagem de dinheiro sujo por parte de organizações estrangeiras. A apreensão recorde efetuada pela polícia senegalesa, equivalente ao total de apreensões de cocaína na África ocidental de setembro de 2006 a maio de 2007, é somente o último de uma série efetuada nos primeiros seis meses de 2007 em várias localidades da África ocidental.
Entre essas, há 800 quilos de cocaína recuperados no mar diante das ilhas Canárias, e uma quantia análoga apreendida pela marinha francesa no largo da Costa do Marfim. Além dos navios, as organizações criminais recorrem a aviões para alimentar seus tráficos ilícitos.
Na Venezuela foi bloqueado um avião com 2,5 toneladas de cocaína, que se preparava a partir para Serra Leoa, enquanto em maio de 2007 foram apreendidos 600 quilos de cocaína a bordo de um Cessna, matriculado na Venezuela, que efetuou uma aterrissagem de emergência em Nouadhibou, na Mauritânia.
Segundo um responsável do ONUDC, para a África ocidental o aumento de confiscos das cargas de cocaína na região é devido mais a incidentes de percurso que a uma maior eficácia da polícia.
O funcionário considera que a cada dez expedições de droga em direção à Europa, nove chegam a seu destino sem problemas.

O SAHEL: NOVA FRONTEIRA DO NARCOTRÁFICO?
Das costas da África ocidental as organizações de narcotraficantes estão progressivamente se expandindo aos países do Sahel, cujo papel estratégico entre o Atlântico e o Magreb, e, portanto o Mediterrâneo, é apreciado também pelos traficantes de seres humanos e, provavelmente, pelo terrorismo internacional. Não se pode excluir a priori uma interconexão entre essas realidades criminais, de que são cúmplices a debilidade dos Estados e a vastidão dos territórios a controlar. Um realidade que suscita o alarme dos governos interessados.
Em abril deste ano, depois da apreensão de três caminhões cheios de droga e armas, o Presidente do Níger, Mamadou Tandja, declarou que o exército local pretende aumentar os esforços para impedir que o seu país seja “circundado” pelos traficantes de armas e de droga, que são uma “ameaça real” para o país.
Também Burkina Fasso não foge ao fenômeno. Segundo o Coordenador do Comitê contra os tráficos ilícitos de droga em Burkina Fasso, o volume das cargas de droga interceptadas nos primeiros três meses de 2007 é “incrível”. O funcionário indica a existência de uma nova rota de trânsito da droga no oeste e no sudoeste do país. No início de abril de 2007, 49 quilos de cocaína, num valor de 10 milhões de dólares, foram interceptados pela polícia de Burkina Fasso na fronteira com o Mali, que é um importante ponto de trânsito para o tráfico de seres humanos. Países como Mali e Níger são há milênios atravessados por vias de caravanas, que agora se converteram num uso criminal: para o tráfico de seres humanos, mas também de armas, droga e cigarros de contrabando. “Nos últimos meses notamos um aumento da utilização dos países do Sahel, como Mali e Níger, para o tráfico de cocaína”, disse Antonio Razzitelli, Diretor do departamento do UNODC para a África ocidental.
Segundo o órgão anticrime da ONU, os traficantes importam a droga por meio das cidades costeiras como Conakry, na Guiné, Dakar, no Senegal, e Lomé, no Togo, e depois a transportam para as cidades do interior, como Bamako, no Mali, e Ouagadougou, em Burkina Fasso. Dessas localidades, a cocaína prossegue a sua viagem até a Europa.
Segundo o responsável do Comitê contra os tráficos ilícitos de droga em Burkina Fasso, é preciso coordenar os esforços entre as polícias dos Estados da região. “Há uma necessidade urgente de reunir todos os entes nacionais antidroga da região para encontrar o modo de cooperar entre si, para tentar deter as redes criminais”, disse, destacando que a escassa cooperação entre as fronteiras dos países do Sahel e a falta de meios das polícias locais constituem problemas adjuntos para uma eficaz ação de contraste às redes criminais.

O MERCADO DA CÂNABIS
Enquanto a África permanece, no momento, somente um local de trânsito e um mercado residual para drogas como cocaína e heroína, a principal produção local de substâncias entorpecentes é representada pela cânabis.
O cultivo da cânabis foi introduzido na África oriental pelos mercantes árabes, pérsios e indianos no século XII. De lá se difundiu primeiramente na África austral, no século XV, e depois no Congo e em Angola no século XIX. Somente depois da Segunda Guerra Mundial a cânabis chegou à África ocidental, levada por soldados nigerianos e ganenses que combateram com as tropas britânicas na Birmânia (atual Mianmar), onde adquiriram o hábito de fumar marijuana. Este fato explica porque nos países onde a cânabis é conhecida há mais tempo, ela é utilizada na medicina tradicional, enquanto na África ocidental é usada para fins “recreativos”. Até os anos 80, porém, a produção africana da cânabis permaneceu limitada. A partir daqueles anos, porém, notou-se um incremento notável da superfície cultivada com a cânabis para fins comerciais.
A produção desta substância se divide em três categorias: a erva da cânabis (flores e folhas), resina ou haxixe (secreções emitidas pela planta durante a fase de florescimento) e óleo de haxixe, o menos utilizado. Segundo o World Drug Report 2006, a erva da cânabis é cultivada, sobretudo de modo ilegal, em 176 países em todo o mundo. A África representa 27% da produção mundial e os principais produtores são Marrocos (3.700 toneladas), África do Sul (2.200 toneladas) e Nigéria (2 mil toneladas).
No que concerne ao haxixe, o principal produtor mundial é Marrocos, que fornece os mercados norte-africanos e europeus. Graças ao esforço das autoridades marroquinas nos últimos anos, deu-se a diminuição da produção local da cânabis, à qual corresponde um aumento da produção em outros países, da Ásia ocidental (Afeganistão, Paquistão) à Albânia. O UNODC reconhece que desde 2003 o governo de Rabat conduziu uma campanha para estimar a produção de resina da cânabis no país, em cooperação com a Agência anticrime das Nações Unidas. Segundo uma investigação efetuada em 2003, a produção da cânabis foi de 3.060 toneladas, cultivada em 134 mil hectares de terra na região do Rif (norte do país) por 96.600 famílias de camponeses. A investigação feita em 2004 registrou uma diminuição de 10% das terras cultivas com a cânabis, que passaram a 120.500 hectares, com uma produção estimada de 2.760 toneladas.
Em 2005 notou-se uma ulterior diminuição de 37%, sendo a superfície cultivada com a cânabis de 72.500 hectares, enquanto a produção diminuiu para 1.070 toneladas. Quanto às apreensões da cânabis, nos últimos 12-15 anos se registrou um aumento da porcentagem mundial de apreensões no continente africano desta substância. Enquanto em 1990 16% do total mundial das apreensões da cânabis ocorria na África, em 2002 este dado subiu para 20%, para alcançar 31% em 2004. O aumento das apreensões na África é determinado sobretudo pelo aumento dos controles policiais e alfandegários efetuados pela Nigéria e pela África do Sul.
O principal mercado de consumo da cânabis é a Europa ocidental, e 80% da cânabis consumada na Europa provém do Marrocos, passando pela Espanha e pela Holanda e dali distribuída aos outros países. O terceiro mercado mundial de consumo é representado pelos países do norte da África, onde a cânabis provém principalmente do Marrocos. Parte da cânabis produzida no Afeganistão e Paquistão, além disso, alimenta o mercado dos países da África oriental.
No que concerne às problemáticas sociais ligadas ao consumo da cânabis, é preciso recordar que esta substância é a droga mais difundida e usada em nível mundial. Estima-se que, em 2004, 162 milhões de pessoas a tenham usado, o equivalente a 3,9% da população mundial entre 15 e 64 anos. Em termos relativos (a porcentagem de habitantes que faz uso da cânabis em relação a outras substância entorpecentes), a cânabis é prevalentemente utilizada na Oceania, seguida por América do Norte e África. Desde 1992, na África, notou-se também uma tendência ao aumento do seu consumo, em particular na Argélia, Nigéria e Zâmbia.
É provável que a tendência ao uso desta droga seja subestimada em diversos países da África, que não têm uma capacidade de coleta de dados adequados para seguir o fenômeno. Segundo dados parciais, notou-se nos últimos anos um forte incremento do abuso da cânabis na África ocidental, oriental e no norte da África, em sintonia com a tendência em nível global de uma ulterior expansão do consumo desta substância.
Até os anos 80, porém, a produção africana da cânabis permaneceu limitada. A partir daqueles anos, porém, notou-se um incremento notável da superfície cultivada com a cânabis para fins comerciais.
A produção africana de droga subtraiu terras e recursos à agricultura, isso porque naquele período se registrou uma forte queda dos preços dos produtos agrícolas em todo o mundo. A agricultura africana, já frágil, entrou em crise. Diversos camponeses, portanto, deixaram-se tentar pelo cultivo da cânabis em detrimento do cultivo de produtos lícitos.
Um simples cálculo econômico demonstra o forte poder de atração de uma semelhante produção; já em 1995, na Guiné, um saco de 20-25 quilos de marijuana tinha o valor de aproximadamente a renda anual média de uma famílias de oitos pessoas que se dedica à produção de cultivo lícito. No mercado de Kinshasa, na República Democrática do Congo (RDC), um saco de 25 quilos de marijuana é vendido por mil dólares, enquanto um saco de 80 quilos de mandioca vale somente 10 dólares.
Compreende-se, assim, que o cultivo desta substância entorpecente tem sérias repercussões na auto-suficiência alimentar de diversos países africanos. Segundo a associação de luta à toxicomania de Kinshasa, LIPILDRO, por causa do abandono dos cultivos legais por aqueles da cânabis, até 2010 a maior parte das cidades congolesas será atingida por um crise alimentar.
Além disso, na RDC se verificaram experiências para o cultivo da papoula de ópio (na província do Equador) e da cocaína (na região do Shaba). O mais importante produtor da cânabis na África subsaariana permanece, porém, a África do Sul. Importante produções são sinalizadas também em Lesoto e em Malauí.

DROGAS SINTÉTICAS
A produção de drogas sintéticas é limitada na África, com exceção da África do Sul, onde a fabricação de metanfetaminas e methaqualone aumentou nos últimos anos. Os dados sobre a descoberta de laboratórios clandestinos confirmam esta tendência.
Com efeito, se passou da descoberta à destruição de um laboratório por ano no período 1995-1999, aos 17 no período 2000-2003, até aos 28 destruídos somente em 2004. Um outro dado que demonstra o incremento do uso de drogas sintéticas na África do Sul é o aumento das apreensões de ecstasy: em 2004, houve um incremento de 385% das apreensões em relação ao ano precedente.
Além disso, as drogas sintéticas faziam parte do programa de guerra secreta química e biológica aplicado pelo regime do apartheid. Segundo os testemunhos reunidos durante o processo contra o responsável do programa, doutor Wouter Basson (definido “Doutor Morte” pela imprensa local), no âmbito do chamado “Project Coast”, entre 1992 e 1993 os laboratórios relacionados aos serviços secretos sul-africanos tinham produzido mais de 900 quilos de cristais de ecstasy (correspondente a 73 milhões de pílulas). No ano precedente, uma empresa de serviços do regime do apartheid tinha importado 500 quilos desta substância da Croácia.
Essas quantidades de drogas sintéticas foram importadas e produzidas para serem usadas como agente incapacitador para o controle da multidão (e talvez também para drogar secretamente os líderes da oposição para desacreditá-los, fazendo-os cometer gestos ridículos em público) e para serem distribuídas nas favelas habitadas pela população negra para promover o abuso de droga e a dependência.
O fim do regime do apartheid bloqueou este e outros projetos criminais aplicados no âmbito do “Project Coast”. Antes da queda do regime, porém, o dr. Basson tinha organizado a venda das empresas de cobertura dos serviços secretos sul-africanos, alguns dos quais fabricavam armas químicas e biológicas e drogas sintéticas.
Além disso, desapareceram centenas de quilos de substâncias químicas usadas na produção desses instrumentos de morte.
O dr. Basson é suspeito de ter aberto um empresa privada e, com efeito, quando foi detido em 1997 foi encontrado em posse de pílulas de ecstasy num valor de 20 mil dólares.

ÁFRICA ORIENTAL: UMA SITUAÇÃO PREOCUPANTE
Na África oriental, o Quênia é o principal ponto de trânsito da cocaína. Somente em 2004 foi apreendida 1,1 tonelada de cocaína entre a capital Nairóbi e o centro costeiro de Malindi. No decorrer da operação da polícia, que levou à descoberta desta importante carga de droga, foram detidos diversos funcionários da companhia aérea local (que resultou estranha ao narcotráfico), alguns dos quais foram capturados em Londres.
Das investigações emergiu que a droga que passava pelo Quênia era inserida no mercado britânico com a colaboração de alguns funcionários infiéis da companhia aérea. Além do Quênia, os países da África oriental interessados pelo narcotráfico são Etiópia, Botsuana, Zâmbia e África do Sul. Neste último, segundo o South African Institute of International Affaire, existem 500 mil pessoas que fazem uso de cocaína, enquanto 1/3 dos adolescentes utiliza entorpecentes. Segundo o centro de estudos sul-africano, no país atuam 300 organizações criminais internacionais envolvidas no narcotráfico.
Os países da região se tornaram não somente uma região de trânsito, mas também um novo mercado para os entorpecentes e, em particular, para a cocaína. Na Zâmbia, por exemplo, 80% da cocaína que chega ao país é transferida para a Europa e o restante 20% é consumado localmente.
A Interpol lançou o alarme sobre o crescente consumo de entorpecentes na África. “As drogas não somente transitam nos países, mas permanecem lá”, disse um responsável da organização internacional de polícia diante dos delegados de 150 organismos de polícia de todo o mundo, reunidos para o encontro anual da Interpol no Rio de Janeiro (Brasil). “Já se tornaram habituais as cargas de diversas toneladas de cocaína que passam pela África”, acrescentou.
Segundo um analista presente no seminário, se a tendência ao incremento do uso de entorpecentes continuar avançando, a África deverá enfrentar uma grave crise social derivante da droga.
As condições climáticas da maior parte da África são favoráveis ao cultivo da cânabis. Trata-se de um cultivo que permite um alto lucro para o agricultor e necessita de um trabalho menos intensivo em relação aos outros cultivos.
Inteiras famílias de agricultores podem viver, assim, de modo decente e permitir-se comprar alimento e medicamentos e enviar seus filhos à escola.
A cânabis é cultivada na África principalmente para o mercado local, mas nos últimos anos notou-se um aumento dos tráficos da cânabis originados na África subsaariana. Os maiores cultivos da cânabis se encontram em Comores, Etiópia, Quênia, Madagascar, Tanzânia e Uganda.
No Quênia, o cultivo da cânabis tem uma antiga tradição, mas nos últimos anos se tornou primeiramente uma produção limitada ao mercado local, para depois transformar-se em uma verdadeira empresa comercial ilícita estendida internacionalmente.
A cânabis é cultivada na região ocidental e naquela do Monte Quênia, onde, segundo alguns relatórios, existem cerca de 1.500 hectares cultivados com a cânabis. Os cultivos de droga estão escondidos entre aqueles tradicionais destinados à alimentação, mas há também cultivos menores em algumas áreas protegidas da reserva natural nacional.
Também as regiões costeiras se tornaram produtores da cânabis. Lá, com efeito, se instalaram diversos agricultores provenientes do interior, que lá encontraram áreas férteis e pouco controladas pela polícia, e um mercado constituído pela população local, pelos turistas e pelos residentes estrangeiros que preferem as costas do país.
Quanto ao ópio, no passado foram sinalizados alguns cultivos no Quênia e nas costas de Madagascar. Desde 1993 não foram sinalizados cultivos de opiáceos na África oriental, mas a vastidão do território e os escassos controles das autoridades locais tornam sempre possível uma retomada do cultivo da papoula de ópio.
No que diz respeito à produção local de drogas sintéticas, a África oriental é o ponto de trânsito do methaqualone (Mandrax) proveniente da Índia e destinado ao mercado sul-africano.
Nos últimos anos, a redução do Mandrax proveniente da Índia gerou uma produção local desta substância. Com efeito, foram descobertos laboratórios químicos clandestinos utilizados para a fabricação desta droga sintética em alguns países da África oriental e meridional.
Nos casos dos laboratórios descobertos no Quênia e na Tanzânia, se tratava somente de pequenos centros onde o pó do Mandrax ainda proveniente da Índia era transformado em pílulas, mas em outros casos deparou-se com verdadeiras oficinas para a fabricação do Mandrax com precursores químicos, cuja proveniência permaneceu desconhecida. A este propósito, as substâncias que mais causam preocupação são as efedrinas, as pseudo-efedrinas, o anidrido acético e o ácido N-acetilantranílico (utilizado na fabricação do Mandrax) e o pergamenato de potássio.
O mais famoso cultivo de planta entorpecente local é o khat, que é uma produção legal em diversos países da África oriental. O khat é cultivado na Etiópia e no Quênia e, em medida menos extensa, na Tanzânia, Comores e na parte setentrional de Madagascar. É exportado para os principais mercados da área (Djibuti, Eritréia, Somália e Iêmen), além da Europa e da América setentrional.
O uso do khat continua a expandir-se no Chifre da África e tem um papel-chave na contínua instabilidade da Somália, onde se calcula que a população gasta todos os anos 64 milhões de dólares por ano para comprar o khat. Trata-se de um quantia que é quase o dobro do total das ajudas internacionais doadas ao país. O khat não somente contribui para provocar problemas na sociedade, criando pessoas afetadas pela dependência de entorpecentes, mas tem também um papel na difusão no país de armas leves, frequentemente repassadas em troca de um pouco de droga.
As organizações de narcotraficantes olham com interesse aos países da África oriental e meridional por causa de suas infra-estruturas portuárias e aeroportuárias, dos comprimentos de suas costas e dos fluxos turísticos.
Todos elementos que permitem esconder os tráficos de droga. O Quênia tem o maior porto comercial da região, Mombasa, que serve a maior parte dos países privados de acesso direto ao mar, enquanto o aeroporto de Nairóbi é um dos mais traficados da área. As redes do narcotráfico utilizam também os portos de Dar-es-Salaam (na Tanzânia), Djibuti, Durban (na África do Sul) e Maputo (em Moçambique) e estão expandindo suas atividades também na Etiópia, Mauritius, Tanzânia e Uganda. Esses últimos países são usados como pontos de trânsito para a droga enviada para o Quênia, a África do Sul e a África ocidental e dessas áreas para a Europa e a América do Norte.
A maior parte das substâncias entorpecentes chega à região via mar, escondida nas cargas dos containers transportados pelos navios mercantis que navegam o Oceano Índico. Em alguns casos, os navios dos narcotraficantes se encontram em alto mar com embarcações menores, que levam para a terra a carga ilícita. Grandes quantidades de heroína chegam assim à região, mas se recorre também a carteiros, homens e mulheres, que chegam com vôos comerciais, e ao envio por correio.
Entre os países da África oriental interessados pelo tráfico e pelo consumo de substâncias entorpecentes, está Uganda.
Segundo um recente relatório do UNODC, “Uganda se tornou o país líder no tráfico e no consumo de droga em relação ao restante dos Estados da África oriental”. Entre as drogas presentes no mercado ilícito ugandense, existem a cânabis, a heroína, a cocaína e o mandrax, além do khat. Segundo a agência anticrime da ONU, o aumento do consumo de substâncias entorpecentes é devido a “duas décadas de conflitos armados e à falta de lei, que prejudicaram gravemente a infra-estrutura policial”.
O relatório observa que as condições climáticas de todo o território ugandense são favoráveis ao cultivo da cânabis: “O cultivo ilícito da planta é, porém, relevante em áreas remotas das regiões meridional, ocidental, central, oriental e norte-oriental. As dimensões exatas dos cultivos da cânabis não são conhecidas, mas se notou um aumento da produção da cânabis sobretudo para a exportação”. O aeroporto de Entebbe é, por fim, utilizado como ponto de trânsito para o envio de heroína e de mandrax ao extremo Oriente e à África do Sul.

CONCLUSÕES
A África é um ponto de trânsito sempre mais importante para as organizações de narcotraficantes, apesar de, no momento, a maior parte das apreensões de entorpecentes ocorrer em outras partes do mundo.
Vista a escassa eficiência das polícias africanas e a relativa recente conscientização do problema por parte dos entes locais e internacionais, pode-se supor que a quantidade das apreensões de droga na África não corresponda à entidade efetiva das cargas que transitam pelo continente.
A África, porém, não é mais somente um ponto de passagem da droga proveniente da América Latina e da Ásia em direção à Europa e à América setentrional, mas já se tornou um mercado ainda talvez “residual”, mas em todo caso que não pode ser ignorado pelas redes de narcotraficantes.
Redes nas quais estão presentes africanos, em particular nigerianos, em papéis não somente de gregários, mas também de organizadores. O crescente consumo de drogas por via endovenosa em diversos países africanos, como Tanzânia e Quênia, agrava o problema da difusão da AIDS.
Na Nigéria, por exemplo, um estudo revelou que o consumo de drogas se expande no mesmo ritmo do aumento das pessoas infetadas com o vírus HIV, em cidades como Kano e Port Harcourt.

 
At 9/17/2007 3:09 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

A DROGA NA ÁFRICA: UM PROBLEMA MUNDIAL

A droga já é um problema na África e representa um ulterior obstáculo ao desenvolvimento do continente. É o que afirmam diversos organismos internacionais encarregados da luta ao tráfico de entorpecentes. Já em 2001, um relatório do Órgão Internacional de Controle das Drogas afirmava que “graças à sua experiência no campo do contrabando de haxixe e de heroína, os cartéis da droga da África ocidental buscam novos contatos na América Latina para estender o tráfico de cocaína a toda a região da África subsaariana”.
Trata-se de uma reviravolta fundamental na estratégia do narcotráfico mundial, que vê a África se tornar uma das áreas “fulcro” para a distribuição de drogas em todo o mundo. Até os primeiros anos da década de 90 do século passado, a África era mantida às margens das rotas da droga. A mudança ocorreu em 1993, quando foram apreendidos na Nigéria 300 quilos de heroína provenientes da Tailândia. É o sinal de uma mudança que vê a transformação de tantos pequenos contrabandistas africanos (a maioria nigerianos) de simples transportadores por conta de terceiros a membros de gangues guiadas por africanos, capazes de tratar no mesmo nível com análogas organizações de outros continentes.
A presença dessas organizações criminais, a forte urbanização, a perda dos valores tradicionais africanos e a difusão de uma cultura hedonista são todos fatores que criaram as premissas para um mercado africano da droga. A África, portanto, não é somente um local de trânsito dos entorpecentes, mas terreno “virgem” para o tráfico de droga.

PREMESSA METODOLÓGICA
Os dados apresentados são úteis para analisar a tendência (incremento ou decremento) do tráfico de entorpecentes, apesar de serem muito provavelmente aproximativos.
Segundo um estudo crítico efetuado pela associação ‘Libera’ do pe. Ciotti, com efeito os dados apresentados pelos entes antidrogas internacionais e de alguns Estados não relatam fielmente toda a produção mundial de cocaína. Segundo este estudo (referido somente à cocaína e não a outras drogas), existe uma discrepância entre a estimativa sobre a produção mundial de cocaína efetuada pela ONU e os dados relativos às apreensões e ao consumo de cocaína somente na América.
Segundo os elaboradores do relatório, com efeito, subtraindo das 937 toneladas de produção, indicada pelas Nações Unidas em 2004, as cerca de 450 consumadas nos Estados Unidos, Canadá, México e em toda a América do Sul e as cerca de 490 toneladas apreendidas em todas as Américas, se chegaria a um saldo negativo de 3 toneladas.
“A este ponto, não se saberia mais de onde subtrair as cerca de 99 toneladas de cocaína apreendidas no “resto do mundo”, afirma o relatório. Fazendo-o, se chegaria ao paradoxal saldo negativo de 102 toneladas de cocaína “não resultantes”, não tendo feito frente ainda à demanda de cocaína no “resto do mundo”, estimada em ao menos 300 toneladas, se chega a calcular uma espécie de buraco negro de aproximadamente 400 toneladas de cocaína não resultantes.
Este buraco negro assume proporções ainda mais macroscópicas, cerca de 700 toneladas, se calculado com base nos dados da Agência antidroga norte-americana.
Apesar dos seus limites, os relatórios dos organismos internacionais de luta contra a droga permanecem frequentemente os únicos instrumentos para analisar o fenômeno do narcotráfico.

A HEROÍNA NA ÁFRICA
A apreensão de opiáceos na África registrou um forte incremento nos últimos anos. Segundo dados da ONU, por exemplo, em 2004 ocorreu um incremento da apreensão de heroína de 60% em relação ao ano precedente.
A maior parte deste incremento é devido à apreensão ocorrida na África central e ocidental, que quase triplicou de 2003 a 2004. A heroína que passa pela África é destinada em primeiro lugar aos mercados europeus e, em segundo lugar, aos da América do Norte. A heroína provém dos países do sudoeste e sudeste da Ásia.
A quantia total dos opiáceos apreendida na África permanece ainda modesto (0,3% do total de apreensões em nível mundial). Porém, deve-se levar em consideração que não existem estatísticas confiáveis e que o nível das apreensões não reflete o verdadeiro fluxo de narcóticos que passa pela África por causa da debilidade da polícia local, que tem dificuldade em interceptar as cargas ilícitas.
No que concerne ao uso de opiáceos na África, segundo os dados do Departamento das Nações Unidas para a luta à criminalidade (UNODC), nota-se um aumento de seu consumo no continente africano, em particular na África oriental e naquela austral e em alguns países da África ocidental. Segundo os especialistas das Nações Unidas, o crescimento do consumo de heroína nessas áreas deriva do fato de que são utilizadas como locais de trânsito dos narcotraficantes, os quais, porém, não desdenham em criar um mercado local.
Na África do Sul, um dos poucos países africanos que dispõe de dados confiáveis, até os primeiros anos do novo milênio, o pedido de tratamentos por abuso de heroína representava somente 1% do total dos pedidos de cura por dependência de substâncias entorpecentes (incluído o álcool). Em 2005, esta porcentagem subiu para 7%.
Segundo o relatório do UNODC sobre o tráfico de entorpecentes de 2007, o mercado da heroína está dividido deste modo: a heroína afegã é destinada aos mercados da Ásia central, da Europa, do Oriente Médio e da África; aquela produzida no chamado “triângulo de ouro” alimenta o mercado chinês e o dos outros países asiáticos e da Oceania; aquela proveniente da América Latina serve o mercado norte-americano.
O relatório nota, porém, que “uma parte pequena, mas em crescimento, da produção de opiáceos afegãos é enviada à América setentrional, seja por meio da África oriental e ocidental, seja por meio da Europa”.
O relatório afirma que a demanda global de heroína permaneceu estável, “apesar de importantes incrementos nos países que se encontram no caminho das principais rotas do narcotráfico”.
Entre esses estão também diversos países africanos, afirma o documento, que destaca os efeitos prejudiciais da difusão da heroína e de outras substâncias entorpecentes nas populações já duramente provadas pela pobreza e pela difusão da AIDS.
Os últimos dados do UNODC mostram um forte incremento do uso de heroína em alguns países africanos como Moçambique, Zâmbia, Quênia, Tanzânia e Costa do Marfim, enquanto outros países tiveram um aumento mais contido. Entre esses, África do Sul, Madagascar, Gana, Libéria e Senegal.

DOS ANDES AO KILIMANJARO: UM FLUXO DE COCAÍNA INVADE A ÁFRICA
O dado mais preocupante, porém, é o da cocaína que transita da África em direção principalmente à Europa e, secundariamente, à América setentrional.
A importância da África, e em particular da África ocidental, como ponto de trânsito da cocaína em direção aos ricos mercados ocidentais é demonstrada pelo nível das apreensões registradas nos últimos anos. As apreensões de cocaína em toda a África aumentaram três vezes entre 2003 e 2004, enquanto no mesmo período as apreensões na África ocidental e central aumentaram seis vezes. As apreensões mais importantes no período 2000-2004 se registraram em Cabo Verde, seguido por África do Sul, Quênia, Gana e Nigéria. Mas as apreensões de cocaína na África representam somente 1% do total mundial das apreensões desta substância entorpecente. Também neste caso, porém, o dado é prejudicado devido à debilidade das polícias locais, incapazes de interceptar a maior parte dos fluxos de cocaína proveniente da América do Sul.
Em 2004, 50% das apreensões de cocaína no continente ocorreram na África ocidental e central. A zona de passagem mais utilizada pelos traficantes de cocaína é o Golfo da Guiné, de onde a substância entorpecente é transportada para a Europa em pequenas quantidades, através dos chamados “mulas”, pessoas que assumem o risco de ingerir óvulos de cocaína com a esperança de superar as alfândegas nos aeroportos de destinação. Nos últimos anos, também na África oriental aumentou a quantia de cocaína apreendida, indicando uma tendência a utilizar em medida crescente esta área como ponto de trânsito para a cocaína destinada à Europa e à Ásia.
Um dos países mais atingidos pelo fenômeno é o Quênia, onde em 2004 foi apreendida uma tonelada de cocaína. Em termos gerais, o crescimento da difusão da cocaína na África é demonstrada pelo fato que dos 32 países africanos que fornecem estatísticas sobre as apreensões de entorpecentes na UNODC, 23 (72%) relataram apreensões de cocaína, contra 34% em 1990.
Os traficantes de cocaína tendem a servir-se da África cada vez mais como ponto de trânsito por dois motivos. O primeiro deriva do melhoramento dos sistemas de inspeção utilizados pelas autoridades locais e por aquelas norte-americanas na área caribenha e centro-americana, tradicional rota utilizada pelos traficantes. Nos últimos anos, por exemplo, surgiram bases de inspeção norte-americanas dos Andes às ilhas caribenhas. Também as autoridades holandesas intensificaram a inspeção com patrulhas aéreas baseadas nas ilhas de Curaçao e Saint Martin.
O segundo fator está ligado à diminuição do consumo de cocaína, que se registrou nos Estados Unidos diante de um aumento da demanda na Europa. Se na América do Norte há o mais alto número de consumidores mundiais (6 milhões e meio, correspondente a cerca da metade do consumo mundial), a tendência é diminuir a demanda.
De 1998 a 2004, de fato, se registrou uma queda de 20% da difusão desta substância. No mesmo período, na Europa ocidental, onde os consumidores de cocaína são 3 milhões e meio (26% do total mundial), se notou um aumento do consumo e da difusão do “pó branco”. Na Espanha e no Reino Unido, este dado é de 2%.
A África, portanto, é uma cômoda e segura rota para alcançar um mercado em crescimento.
Além disso, como efeito colateral criou-se um mercado africano que está registrando nos últimos anos preocupantes aumentos.
A crescente disponibilidade de cocaína se traduz, com efeito, em um aumento do consumo desta substância na África. Segundo os dados do UNODC, no período 1992-2004 o abuso da cocaína na África cresceu em um ritmo mais sustentado do que no restante do mundo. Este incremento é mais remarcado nos países da África meridional e nos da África ocidental.
Se forem analisados os dados das pessoas que recorrem aos tratamentos de desintoxicação, o aumento do consumo de cocaína emerge com evidência. No início dos anos 90, as pessoas em tratamento por abuso de cocaína eram pouquíssimas, no final de 1996 constituíam 1.5% dos casos tratados pelas estruturas de recuperação dos toxicômanos, no biênio 1999-2000 eram 6%. No período 2001-2004, notou-se uma inflexão na porcentagem de pessoas que pediam para ser tratadas da dependência de cocaína (menos de 5%).
A partir do final de 2004, este dado está em crescimento: de 7,5% em 2004 passou-se a 8,5% nos primeiros meses de 2005.

A COCAÍNA NA ÁFRICA OCIDENTAL
O país tradicionalmente mais envolvido no narcotráfico é a Nigéria. Lá, com efeito, em 1993 houve a primeira grande apreensão de cocaína na África e as organizações criminais nigerianas estão perfeitamente inseridas no sistema criminal global e transnacional. A afirmação das máfias nigerianas deriva também da pertença da Nigéria ao Commonwealth, que permitiu abrir estreitas relações comerciais com o subcontinente indiano, produtor de ópio e de heroína, e com o mundo anglo-saxão consumidor.
No final dos anos 80, registrou-se um incremento importante no papel de centro estratégico e, em 1992, as apreensões de cocaína no aeroporto de Lagos foram tão relevantes que as autoridades nigerianas suspenderam os vôos diretos para o Rio de Janeiro. Desde então, os traficantes nigerianos são considerados os principais transportadores da droga, uma verdadeira indústria a serviço do comércio de heroína e da coca. Eles estão presentes em todos os pontos-chaves da produção e do tráfico de drogas. Graças aos compatriotas residentes no exterior, formaram clãs criminais comparáveis aos colombianos, turcos e chineses.
As organizações mafiosas nigerianas, como as outras, se baseiam na solidariedade étnica, de clã e de famílias. Já em 1995 as autoridades norte-americanas estimavam que 50% da heroína circulante em seu país era introduzida pelos nigerianos, os quais usam a Polônia e a Hungria como pontos de trânsito para a cocaína destinada à Europa ocidental.
Um dos países da África ocidental dos quais se têm estatísticas confiáveis sobre o incremento do tráfico de cocaína é Gana. Segundo os dados divulgados pelas autoridades locais, em um único ano as apreensões de cocaína aumentaram 40 vezes, passando dos 15 quilogramas de 2003 aos 617 quilos de 2004. A maior parte da cocaína é destinada ao mercado britânico.
Trata-se de um dado significativo, levando-se em consideração que, em termos porcentuais, as apreensões de cocaína aumentaram 18% em nível mundial e 4.000% em Gana de 2003 a 2004. No mesmo período, na África, as apreensões de cocaína aumentaram 3 vezes, passando das 1,1 tonelada para 3,6 toneladas.
Nos anos sucessivos, emergiram outros fatos que demonstram que Gana se tornou um importante ponto de passagem da cocaína na África ocidental. Em novembro de 2005, a polícia ganense apreendeu 588 quilos no decorrer de uma perquirição em uma habitação em East Lagon. Em abril de 2006, foram descobertos a bordo do navio MV Benjamin, atracado no porto de Tema, 2.310 quilos de cocaína.
Segundo um responsável do UNODC, as organizações de narcotraficantes tendem a fazer transitar a droga por meio da África ocidental porque, até agora, as autoridades alfandegárias européias e norte-americanas controlam com menos atenção as mercadorias e as bagagens provenientes da África em relação àquelas provenientes da América Latina. No caso de Gana, como de outros países da região, o fato de não estar inserido na lista dos países produtores de cocaína significa que as suas mercadorias não são sujeitas a inspeções detalhadas. Mas nos últimos anos, as coisas mudaram e Gana foi inserida na lista dos países “de alta prioridade” de inspeção.
Os traficantes buscam corromper os policiais e a polícia para permitir o trânsito das cargas de entorpecentes. Para investigar casos de corrupção de policiais, o Ministério da Fazenda de Gana criou uma Comissão de investigação, que recebeu o nome da sua Presidenta, Georgina Wood, que desempenhou importantes cargos na polícia e na magistratura local. O “Georgina Wood Committee” nasceu após duas importantes apreensões de cocaína citadas precedentemente, nas quais resultaram envolvidos alguns policiais. Entre as recomendações apresentadas pelo Comitê, está reforçar o patrulhamento das costas do país por meio seja da potenciação dos meios da marinha e da aeronáutica, seja com a criação de um serviço de guarda-costas independente.
A Guiné-Bissau é um outro país que se tornou ponto de trânsito da cocaína da América Latina à Europa, como demonstrado numa recente operação que levou à captura de 674 quilos de cocaína e à detenção de alguns narcotraficantes sul-americanos. Na África ocidental, os países mais envolvidos pelos fluxos de droga, além de Gana, são Costa do Marfim, Senegal e Nigéria.
Os traficantes de cocaína na Guiné-Bissau estão ligados aos que passam através do vizinho Senegal, como emergiu da operação efetuada no final de junho de 2007 pela polícia de Dakar, que levou à apreensão de mais de duas toneladas de cocaína. Parte da droga se encontrava em um veleiro que estava à deriva diante das costas senegalesas, e uma outra em uma habitação na área balneária de Mbour, a sul de Dakar.
No veleiro os investigadores encontraram uma documentação que comprova que os narcotraficantes utilizam a Guiné-Bissau como depósito de trânsito da cocaína proveniente da América Latina e destinada à Europa. Também a nacionalidade dos detidos demonstra o grau de internacionalização das organizações criminais dedicadas ao narcotráfico. Além de três cidadãos sul-americanos (um colombiano, um venezuelano e um equatoriano) e de uma cidadã francesa, a polícia deteve três senegaleses. A partir dos documentos detidos, além disso a polícia senegalesa descobriu que os narcotraficantes efetuaram diversas viagens aos países limítrofes: Serra Leoa, Guiné Conakry, Guiné-Bissau e Gâmbia.
As autoridades senegalesas reiteraram que em seu país não existem depósitos de cocaína, mas admitiram a infiltração de grupos criminais estrangeiros, que utilizam o aeroporto de Dakar para enviar cocaína à Europa. No período de janeiro a junho de 2007, a polícia senegalesa afirma ter apreendido no aeroporto de Dakar 44 quilos de cocaína e detido cerca de 30 “mulas” da droga, a maior parte dos quais nigeriano.
Está em aumento também o número de “mulas” da Guiné-Bissau detidos no momento do embarque para Portugal, onde podem entrar sem visto. Além disso, foram descobertas algumas operações de reciclagem de dinheiro sujo por parte de organizações estrangeiras. A apreensão recorde efetuada pela polícia senegalesa, equivalente ao total de apreensões de cocaína na África ocidental de setembro de 2006 a maio de 2007, é somente o último de uma série efetuada nos primeiros seis meses de 2007 em várias localidades da África ocidental.
Entre essas, há 800 quilos de cocaína recuperados no mar diante das ilhas Canárias, e uma quantia análoga apreendida pela marinha francesa no largo da Costa do Marfim. Além dos navios, as organizações criminais recorrem a aviões para alimentar seus tráficos ilícitos.
Na Venezuela foi bloqueado um avião com 2,5 toneladas de cocaína, que se preparava a partir para Serra Leoa, enquanto em maio de 2007 foram apreendidos 600 quilos de cocaína a bordo de um Cessna, matriculado na Venezuela, que efetuou uma aterrissagem de emergência em Nouadhibou, na Mauritânia.
Segundo um responsável do ONUDC, para a África ocidental o aumento de confiscos das cargas de cocaína na região é devido mais a incidentes de percurso que a uma maior eficácia da polícia.
O funcionário considera que a cada dez expedições de droga em direção à Europa, nove chegam a seu destino sem problemas.

O SAHEL: NOVA FRONTEIRA DO NARCOTRÁFICO?
Das costas da África ocidental as organizações de narcotraficantes estão progressivamente se expandindo aos países do Sahel, cujo papel estratégico entre o Atlântico e o Magreb, e, portanto o Mediterrâneo, é apreciado também pelos traficantes de seres humanos e, provavelmente, pelo terrorismo internacional. Não se pode excluir a priori uma interconexão entre essas realidades criminais, de que são cúmplices a debilidade dos Estados e a vastidão dos territórios a controlar. Um realidade que suscita o alarme dos governos interessados.
Em abril deste ano, depois da apreensão de três caminhões cheios de droga e armas, o Presidente do Níger, Mamadou Tandja, declarou que o exército local pretende aumentar os esforços para impedir que o seu país seja “circundado” pelos traficantes de armas e de droga, que são uma “ameaça real” para o país.
Também Burkina Fasso não foge ao fenômeno. Segundo o Coordenador do Comitê contra os tráficos ilícitos de droga em Burkina Fasso, o volume das cargas de droga interceptadas nos primeiros três meses de 2007 é “incrível”. O funcionário indica a existência de uma nova rota de trânsito da droga no oeste e no sudoeste do país. No início de abril de 2007, 49 quilos de cocaína, num valor de 10 milhões de dólares, foram interceptados pela polícia de Burkina Fasso na fronteira com o Mali, que é um importante ponto de trânsito para o tráfico de seres humanos. Países como Mali e Níger são há milênios atravessados por vias de caravanas, que agora se converteram num uso criminal: para o tráfico de seres humanos, mas também de armas, droga e cigarros de contrabando. “Nos últimos meses notamos um aumento da utilização dos países do Sahel, como Mali e Níger, para o tráfico de cocaína”, disse Antonio Razzitelli, Diretor do departamento do UNODC para a África ocidental.
Segundo o órgão anticrime da ONU, os traficantes importam a droga por meio das cidades costeiras como Conakry, na Guiné, Dakar, no Senegal, e Lomé, no Togo, e depois a transportam para as cidades do interior, como Bamako, no Mali, e Ouagadougou, em Burkina Fasso. Dessas localidades, a cocaína prossegue a sua viagem até a Europa.
Segundo o responsável do Comitê contra os tráficos ilícitos de droga em Burkina Fasso, é preciso coordenar os esforços entre as polícias dos Estados da região. “Há uma necessidade urgente de reunir todos os entes nacionais antidroga da região para encontrar o modo de cooperar entre si, para tentar deter as redes criminais”, disse, destacando que a escassa cooperação entre as fronteiras dos países do Sahel e a falta de meios das polícias locais constituem problemas adjuntos para uma eficaz ação de contraste às redes criminais.

O MERCADO DA CÂNABIS
Enquanto a África permanece, no momento, somente um local de trânsito e um mercado residual para drogas como cocaína e heroína, a principal produção local de substâncias entorpecentes é representada pela cânabis.
O cultivo da cânabis foi introduzido na África oriental pelos mercantes árabes, pérsios e indianos no século XII. De lá se difundiu primeiramente na África austral, no século XV, e depois no Congo e em Angola no século XIX. Somente depois da Segunda Guerra Mundial a cânabis chegou à África ocidental, levada por soldados nigerianos e ganenses que combateram com as tropas britânicas na Birmânia (atual Mianmar), onde adquiriram o hábito de fumar marijuana. Este fato explica porque nos países onde a cânabis é conhecida há mais tempo, ela é utilizada na medicina tradicional, enquanto na África ocidental é usada para fins “recreativos”. Até os anos 80, porém, a produção africana da cânabis permaneceu limitada. A partir daqueles anos, porém, notou-se um incremento notável da superfície cultivada com a cânabis para fins comerciais.
A produção desta substância se divide em três categorias: a erva da cânabis (flores e folhas), resina ou haxixe (secreções emitidas pela planta durante a fase de florescimento) e óleo de haxixe, o menos utilizado. Segundo o World Drug Report 2006, a erva da cânabis é cultivada, sobretudo de modo ilegal, em 176 países em todo o mundo. A África representa 27% da produção mundial e os principais produtores são Marrocos (3.700 toneladas), África do Sul (2.200 toneladas) e Nigéria (2 mil toneladas).
No que concerne ao haxixe, o principal produtor mundial é Marrocos, que fornece os mercados norte-africanos e europeus. Graças ao esforço das autoridades marroquinas nos últimos anos, deu-se a diminuição da produção local da cânabis, à qual corresponde um aumento da produção em outros países, da Ásia ocidental (Afeganistão, Paquistão) à Albânia. O UNODC reconhece que desde 2003 o governo de Rabat conduziu uma campanha para estimar a produção de resina da cânabis no país, em cooperação com a Agência anticrime das Nações Unidas. Segundo uma investigação efetuada em 2003, a produção da cânabis foi de 3.060 toneladas, cultivada em 134 mil hectares de terra na região do Rif (norte do país) por 96.600 famílias de camponeses. A investigação feita em 2004 registrou uma diminuição de 10% das terras cultivas com a cânabis, que passaram a 120.500 hectares, com uma produção estimada de 2.760 toneladas.
Em 2005 notou-se uma ulterior diminuição de 37%, sendo a superfície cultivada com a cânabis de 72.500 hectares, enquanto a produção diminuiu para 1.070 toneladas. Quanto às apreensões da cânabis, nos últimos 12-15 anos se registrou um aumento da porcentagem mundial de apreensões no continente africano desta substância. Enquanto em 1990 16% do total mundial das apreensões da cânabis ocorria na África, em 2002 este dado subiu para 20%, para alcançar 31% em 2004. O aumento das apreensões na África é determinado sobretudo pelo aumento dos controles policiais e alfandegários efetuados pela Nigéria e pela África do Sul.
O principal mercado de consumo da cânabis é a Europa ocidental, e 80% da cânabis consumada na Europa provém do Marrocos, passando pela Espanha e pela Holanda e dali distribuída aos outros países. O terceiro mercado mundial de consumo é representado pelos países do norte da África, onde a cânabis provém principalmente do Marrocos. Parte da cânabis produzida no Afeganistão e Paquistão, além disso, alimenta o mercado dos países da África oriental.
No que concerne às problemáticas sociais ligadas ao consumo da cânabis, é preciso recordar que esta substância é a droga mais difundida e usada em nível mundial. Estima-se que, em 2004, 162 milhões de pessoas a tenham usado, o equivalente a 3,9% da população mundial entre 15 e 64 anos. Em termos relativos (a porcentagem de habitantes que faz uso da cânabis em relação a outras substância entorpecentes), a cânabis é prevalentemente utilizada na Oceania, seguida por América do Norte e África. Desde 1992, na África, notou-se também uma tendência ao aumento do seu consumo, em particular na Argélia, Nigéria e Zâmbia.
É provável que a tendência ao uso desta droga seja subestimada em diversos países da África, que não têm uma capacidade de coleta de dados adequados para seguir o fenômeno. Segundo dados parciais, notou-se nos últimos anos um forte incremento do abuso da cânabis na África ocidental, oriental e no norte da África, em sintonia com a tendência em nível global de uma ulterior expansão do consumo desta substância.
Até os anos 80, porém, a produção africana da cânabis permaneceu limitada. A partir daqueles anos, porém, notou-se um incremento notável da superfície cultivada com a cânabis para fins comerciais.
A produção africana de droga subtraiu terras e recursos à agricultura, isso porque naquele período se registrou uma forte queda dos preços dos produtos agrícolas em todo o mundo. A agricultura africana, já frágil, entrou em crise. Diversos camponeses, portanto, deixaram-se tentar pelo cultivo da cânabis em detrimento do cultivo de produtos lícitos.
Um simples cálculo econômico demonstra o forte poder de atração de uma semelhante produção; já em 1995, na Guiné, um saco de 20-25 quilos de marijuana tinha o valor de aproximadamente a renda anual média de uma famílias de oitos pessoas que se dedica à produção de cultivo lícito. No mercado de Kinshasa, na República Democrática do Congo (RDC), um saco de 25 quilos de marijuana é vendido por mil dólares, enquanto um saco de 80 quilos de mandioca vale somente 10 dólares.
Compreende-se, assim, que o cultivo desta substância entorpecente tem sérias repercussões na auto-suficiência alimentar de diversos países africanos. Segundo a associação de luta à toxicomania de Kinshasa, LIPILDRO, por causa do abandono dos cultivos legais por aqueles da cânabis, até 2010 a maior parte das cidades congolesas será atingida por um crise alimentar.
Além disso, na RDC se verificaram experiências para o cultivo da papoula de ópio (na província do Equador) e da cocaína (na região do Shaba). O mais importante produtor da cânabis na África subsaariana permanece, porém, a África do Sul. Importante produções são sinalizadas também em Lesoto e em Malauí.

DROGAS SINTÉTICAS
A produção de drogas sintéticas é limitada na África, com exceção da África do Sul, onde a fabricação de metanfetaminas e methaqualone aumentou nos últimos anos. Os dados sobre a descoberta de laboratórios clandestinos confirmam esta tendência.
Com efeito, se passou da descoberta à destruição de um laboratório por ano no período 1995-1999, aos 17 no período 2000-2003, até aos 28 destruídos somente em 2004. Um outro dado que demonstra o incremento do uso de drogas sintéticas na África do Sul é o aumento das apreensões de ecstasy: em 2004, houve um incremento de 385% das apreensões em relação ao ano precedente.
Além disso, as drogas sintéticas faziam parte do programa de guerra secreta química e biológica aplicado pelo regime do apartheid. Segundo os testemunhos reunidos durante o processo contra o responsável do programa, doutor Wouter Basson (definido “Doutor Morte” pela imprensa local), no âmbito do chamado “Project Coast”, entre 1992 e 1993 os laboratórios relacionados aos serviços secretos sul-africanos tinham produzido mais de 900 quilos de cristais de ecstasy (correspondente a 73 milhões de pílulas). No ano precedente, uma empresa de serviços do regime do apartheid tinha importado 500 quilos desta substância da Croácia.
Essas quantidades de drogas sintéticas foram importadas e produzidas para serem usadas como agente incapacitador para o controle da multidão (e talvez também para drogar secretamente os líderes da oposição para desacreditá-los, fazendo-os cometer gestos ridículos em público) e para serem distribuídas nas favelas habitadas pela população negra para promover o abuso de droga e a dependência.
O fim do regime do apartheid bloqueou este e outros projetos criminais aplicados no âmbito do “Project Coast”. Antes da queda do regime, porém, o dr. Basson tinha organizado a venda das empresas de cobertura dos serviços secretos sul-africanos, alguns dos quais fabricavam armas químicas e biológicas e drogas sintéticas.
Além disso, desapareceram centenas de quilos de substâncias químicas usadas na produção desses instrumentos de morte.
O dr. Basson é suspeito de ter aberto um empresa privada e, com efeito, quando foi detido em 1997 foi encontrado em posse de pílulas de ecstasy num valor de 20 mil dólares.

ÁFRICA ORIENTAL: UMA SITUAÇÃO PREOCUPANTE
Na África oriental, o Quênia é o principal ponto de trânsito da cocaína. Somente em 2004 foi apreendida 1,1 tonelada de cocaína entre a capital Nairóbi e o centro costeiro de Malindi. No decorrer da operação da polícia, que levou à descoberta desta importante carga de droga, foram detidos diversos funcionários da companhia aérea local (que resultou estranha ao narcotráfico), alguns dos quais foram capturados em Londres.
Das investigações emergiu que a droga que passava pelo Quênia era inserida no mercado britânico com a colaboração de alguns funcionários infiéis da companhia aérea. Além do Quênia, os países da África oriental interessados pelo narcotráfico são Etiópia, Botsuana, Zâmbia e África do Sul. Neste último, segundo o South African Institute of International Affaire, existem 500 mil pessoas que fazem uso de cocaína, enquanto 1/3 dos adolescentes utiliza entorpecentes. Segundo o centro de estudos sul-africano, no país atuam 300 organizações criminais internacionais envolvidas no narcotráfico.
Os países da região se tornaram não somente uma região de trânsito, mas também um novo mercado para os entorpecentes e, em particular, para a cocaína. Na Zâmbia, por exemplo, 80% da cocaína que chega ao país é transferida para a Europa e o restante 20% é consumado localmente.
A Interpol lançou o alarme sobre o crescente consumo de entorpecentes na África. “As drogas não somente transitam nos países, mas permanecem lá”, disse um responsável da organização internacional de polícia diante dos delegados de 150 organismos de polícia de todo o mundo, reunidos para o encontro anual da Interpol no Rio de Janeiro (Brasil). “Já se tornaram habituais as cargas de diversas toneladas de cocaína que passam pela África”, acrescentou.
Segundo um analista presente no seminário, se a tendência ao incremento do uso de entorpecentes continuar avançando, a África deverá enfrentar uma grave crise social derivante da droga.
As condições climáticas da maior parte da África são favoráveis ao cultivo da cânabis. Trata-se de um cultivo que permite um alto lucro para o agricultor e necessita de um trabalho menos intensivo em relação aos outros cultivos.
Inteiras famílias de agricultores podem viver, assim, de modo decente e permitir-se comprar alimento e medicamentos e enviar seus filhos à escola.
A cânabis é cultivada na África principalmente para o mercado local, mas nos últimos anos notou-se um aumento dos tráficos da cânabis originados na África subsaariana. Os maiores cultivos da cânabis se encontram em Comores, Etiópia, Quênia, Madagascar, Tanzânia e Uganda.
No Quênia, o cultivo da cânabis tem uma antiga tradição, mas nos últimos anos se tornou primeiramente uma produção limitada ao mercado local, para depois transformar-se em uma verdadeira empresa comercial ilícita estendida internacionalmente.
A cânabis é cultivada na região ocidental e naquela do Monte Quênia, onde, segundo alguns relatórios, existem cerca de 1.500 hectares cultivados com a cânabis. Os cultivos de droga estão escondidos entre aqueles tradicionais destinados à alimentação, mas há também cultivos menores em algumas áreas protegidas da reserva natural nacional.
Também as regiões costeiras se tornaram produtores da cânabis. Lá, com efeito, se instalaram diversos agricultores provenientes do interior, que lá encontraram áreas férteis e pouco controladas pela polícia, e um mercado constituído pela população local, pelos turistas e pelos residentes estrangeiros que preferem as costas do país.
Quanto ao ópio, no passado foram sinalizados alguns cultivos no Quênia e nas costas de Madagascar. Desde 1993 não foram sinalizados cultivos de opiáceos na África oriental, mas a vastidão do território e os escassos controles das autoridades locais tornam sempre possível uma retomada do cultivo da papoula de ópio.
No que diz respeito à produção local de drogas sintéticas, a África oriental é o ponto de trânsito do methaqualone (Mandrax) proveniente da Índia e destinado ao mercado sul-africano.
Nos últimos anos, a redução do Mandrax proveniente da Índia gerou uma produção local desta substância. Com efeito, foram descobertos laboratórios químicos clandestinos utilizados para a fabricação desta droga sintética em alguns países da África oriental e meridional.
Nos casos dos laboratórios descobertos no Quênia e na Tanzânia, se tratava somente de pequenos centros onde o pó do Mandrax ainda proveniente da Índia era transformado em pílulas, mas em outros casos deparou-se com verdadeiras oficinas para a fabricação do Mandrax com precursores químicos, cuja proveniência permaneceu desconhecida. A este propósito, as substâncias que mais causam preocupação são as efedrinas, as pseudo-efedrinas, o anidrido acético e o ácido N-acetilantranílico (utilizado na fabricação do Mandrax) e o pergamenato de potássio.
O mais famoso cultivo de planta entorpecente local é o khat, que é uma produção legal em diversos países da África oriental. O khat é cultivado na Etiópia e no Quênia e, em medida menos extensa, na Tanzânia, Comores e na parte setentrional de Madagascar. É exportado para os principais mercados da área (Djibuti, Eritréia, Somália e Iêmen), além da Europa e da América setentrional.
O uso do khat continua a expandir-se no Chifre da África e tem um papel-chave na contínua instabilidade da Somália, onde se calcula que a população gasta todos os anos 64 milhões de dólares por ano para comprar o khat. Trata-se de um quantia que é quase o dobro do total das ajudas internacionais doadas ao país. O khat não somente contribui para provocar problemas na sociedade, criando pessoas afetadas pela dependência de entorpecentes, mas tem também um papel na difusão no país de armas leves, frequentemente repassadas em troca de um pouco de droga.
As organizações de narcotraficantes olham com interesse aos países da África oriental e meridional por causa de suas infra-estruturas portuárias e aeroportuárias, dos comprimentos de suas costas e dos fluxos turísticos.
Todos elementos que permitem esconder os tráficos de droga. O Quênia tem o maior porto comercial da região, Mombasa, que serve a maior parte dos países privados de acesso direto ao mar, enquanto o aeroporto de Nairóbi é um dos mais traficados da área. As redes do narcotráfico utilizam também os portos de Dar-es-Salaam (na Tanzânia), Djibuti, Durban (na África do Sul) e Maputo (em Moçambique) e estão expandindo suas atividades também na Etiópia, Mauritius, Tanzânia e Uganda. Esses últimos países são usados como pontos de trânsito para a droga enviada para o Quênia, a África do Sul e a África ocidental e dessas áreas para a Europa e a América do Norte.
A maior parte das substâncias entorpecentes chega à região via mar, escondida nas cargas dos containers transportados pelos navios mercantis que navegam o Oceano Índico. Em alguns casos, os navios dos narcotraficantes se encontram em alto mar com embarcações menores, que levam para a terra a carga ilícita. Grandes quantidades de heroína chegam assim à região, mas se recorre também a carteiros, homens e mulheres, que chegam com vôos comerciais, e ao envio por correio.
Entre os países da África oriental interessados pelo tráfico e pelo consumo de substâncias entorpecentes, está Uganda.
Segundo um recente relatório do UNODC, “Uganda se tornou o país líder no tráfico e no consumo de droga em relação ao restante dos Estados da África oriental”. Entre as drogas presentes no mercado ilícito ugandense, existem a cânabis, a heroína, a cocaína e o mandrax, além do khat. Segundo a agência anticrime da ONU, o aumento do consumo de substâncias entorpecentes é devido a “duas décadas de conflitos armados e à falta de lei, que prejudicaram gravemente a infra-estrutura policial”.
O relatório observa que as condições climáticas de todo o território ugandense são favoráveis ao cultivo da cânabis: “O cultivo ilícito da planta é, porém, relevante em áreas remotas das regiões meridional, ocidental, central, oriental e norte-oriental. As dimensões exatas dos cultivos da cânabis não são conhecidas, mas se notou um aumento da produção da cânabis sobretudo para a exportação”. O aeroporto de Entebbe é, por fim, utilizado como ponto de trânsito para o envio de heroína e de mandrax ao extremo Oriente e à África do Sul.

CONCLUSÕES
A África é um ponto de trânsito sempre mais importante para as organizações de narcotraficantes, apesar de, no momento, a maior parte das apreensões de entorpecentes ocorrer em outras partes do mundo.
Vista a escassa eficiência das polícias africanas e a relativa recente conscientização do problema por parte dos entes locais e internacionais, pode-se supor que a quantidade das apreensões de droga na África não corresponda à entidade efetiva das cargas que transitam pelo continente.
A África, porém, não é mais somente um ponto de passagem da droga proveniente da América Latina e da Ásia em direção à Europa e à América setentrional, mas já se tornou um mercado ainda talvez “residual”, mas em todo caso que não pode ser ignorado pelas redes de narcotraficantes.
Redes nas quais estão presentes africanos, em particular nigerianos, em papéis não somente de gregários, mas também de organizadores. O crescente consumo de drogas por via endovenosa em diversos países africanos, como Tanzânia e Quênia, agrava o problema da difusão da AIDS.
Na Nigéria, por exemplo, um estudo revelou que o consumo de drogas se expande no mesmo ritmo do aumento das pessoas infetadas com o vírus HIV, em cidades como Kano e Port Harcourt.

 
At 9/17/2007 3:09 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

A DROGA NA ÁFRICA: UM PROBLEMA MUNDIAL

A droga já é um problema na África e representa um ulterior obstáculo ao desenvolvimento do continente. É o que afirmam diversos organismos internacionais encarregados da luta ao tráfico de entorpecentes. Já em 2001, um relatório do Órgão Internacional de Controle das Drogas afirmava que “graças à sua experiência no campo do contrabando de haxixe e de heroína, os cartéis da droga da África ocidental buscam novos contatos na América Latina para estender o tráfico de cocaína a toda a região da África subsaariana”.
Trata-se de uma reviravolta fundamental na estratégia do narcotráfico mundial, que vê a África se tornar uma das áreas “fulcro” para a distribuição de drogas em todo o mundo. Até os primeiros anos da década de 90 do século passado, a África era mantida às margens das rotas da droga. A mudança ocorreu em 1993, quando foram apreendidos na Nigéria 300 quilos de heroína provenientes da Tailândia. É o sinal de uma mudança que vê a transformação de tantos pequenos contrabandistas africanos (a maioria nigerianos) de simples transportadores por conta de terceiros a membros de gangues guiadas por africanos, capazes de tratar no mesmo nível com análogas organizações de outros continentes.
A presença dessas organizações criminais, a forte urbanização, a perda dos valores tradicionais africanos e a difusão de uma cultura hedonista são todos fatores que criaram as premissas para um mercado africano da droga. A África, portanto, não é somente um local de trânsito dos entorpecentes, mas terreno “virgem” para o tráfico de droga.

PREMESSA METODOLÓGICA
Os dados apresentados são úteis para analisar a tendência (incremento ou decremento) do tráfico de entorpecentes, apesar de serem muito provavelmente aproximativos.
Segundo um estudo crítico efetuado pela associação ‘Libera’ do pe. Ciotti, com efeito os dados apresentados pelos entes antidrogas internacionais e de alguns Estados não relatam fielmente toda a produção mundial de cocaína. Segundo este estudo (referido somente à cocaína e não a outras drogas), existe uma discrepância entre a estimativa sobre a produção mundial de cocaína efetuada pela ONU e os dados relativos às apreensões e ao consumo de cocaína somente na América.
Segundo os elaboradores do relatório, com efeito, subtraindo das 937 toneladas de produção, indicada pelas Nações Unidas em 2004, as cerca de 450 consumadas nos Estados Unidos, Canadá, México e em toda a América do Sul e as cerca de 490 toneladas apreendidas em todas as Américas, se chegaria a um saldo negativo de 3 toneladas.
“A este ponto, não se saberia mais de onde subtrair as cerca de 99 toneladas de cocaína apreendidas no “resto do mundo”, afirma o relatório. Fazendo-o, se chegaria ao paradoxal saldo negativo de 102 toneladas de cocaína “não resultantes”, não tendo feito frente ainda à demanda de cocaína no “resto do mundo”, estimada em ao menos 300 toneladas, se chega a calcular uma espécie de buraco negro de aproximadamente 400 toneladas de cocaína não resultantes.
Este buraco negro assume proporções ainda mais macroscópicas, cerca de 700 toneladas, se calculado com base nos dados da Agência antidroga norte-americana.
Apesar dos seus limites, os relatórios dos organismos internacionais de luta contra a droga permanecem frequentemente os únicos instrumentos para analisar o fenômeno do narcotráfico.

A HEROÍNA NA ÁFRICA
A apreensão de opiáceos na África registrou um forte incremento nos últimos anos. Segundo dados da ONU, por exemplo, em 2004 ocorreu um incremento da apreensão de heroína de 60% em relação ao ano precedente.
A maior parte deste incremento é devido à apreensão ocorrida na África central e ocidental, que quase triplicou de 2003 a 2004. A heroína que passa pela África é destinada em primeiro lugar aos mercados europeus e, em segundo lugar, aos da América do Norte. A heroína provém dos países do sudoeste e sudeste da Ásia.
A quantia total dos opiáceos apreendida na África permanece ainda modesto (0,3% do total de apreensões em nível mundial). Porém, deve-se levar em consideração que não existem estatísticas confiáveis e que o nível das apreensões não reflete o verdadeiro fluxo de narcóticos que passa pela África por causa da debilidade da polícia local, que tem dificuldade em interceptar as cargas ilícitas.
No que concerne ao uso de opiáceos na África, segundo os dados do Departamento das Nações Unidas para a luta à criminalidade (UNODC), nota-se um aumento de seu consumo no continente africano, em particular na África oriental e naquela austral e em alguns países da África ocidental. Segundo os especialistas das Nações Unidas, o crescimento do consumo de heroína nessas áreas deriva do fato de que são utilizadas como locais de trânsito dos narcotraficantes, os quais, porém, não desdenham em criar um mercado local.
Na África do Sul, um dos poucos países africanos que dispõe de dados confiáveis, até os primeiros anos do novo milênio, o pedido de tratamentos por abuso de heroína representava somente 1% do total dos pedidos de cura por dependência de substâncias entorpecentes (incluído o álcool). Em 2005, esta porcentagem subiu para 7%.
Segundo o relatório do UNODC sobre o tráfico de entorpecentes de 2007, o mercado da heroína está dividido deste modo: a heroína afegã é destinada aos mercados da Ásia central, da Europa, do Oriente Médio e da África; aquela produzida no chamado “triângulo de ouro” alimenta o mercado chinês e o dos outros países asiáticos e da Oceania; aquela proveniente da América Latina serve o mercado norte-americano.
O relatório nota, porém, que “uma parte pequena, mas em crescimento, da produção de opiáceos afegãos é enviada à América setentrional, seja por meio da África oriental e ocidental, seja por meio da Europa”.
O relatório afirma que a demanda global de heroína permaneceu estável, “apesar de importantes incrementos nos países que se encontram no caminho das principais rotas do narcotráfico”.
Entre esses estão também diversos países africanos, afirma o documento, que destaca os efeitos prejudiciais da difusão da heroína e de outras substâncias entorpecentes nas populações já duramente provadas pela pobreza e pela difusão da AIDS.
Os últimos dados do UNODC mostram um forte incremento do uso de heroína em alguns países africanos como Moçambique, Zâmbia, Quênia, Tanzânia e Costa do Marfim, enquanto outros países tiveram um aumento mais contido. Entre esses, África do Sul, Madagascar, Gana, Libéria e Senegal.

DOS ANDES AO KILIMANJARO: UM FLUXO DE COCAÍNA INVADE A ÁFRICA
O dado mais preocupante, porém, é o da cocaína que transita da África em direção principalmente à Europa e, secundariamente, à América setentrional.
A importância da África, e em particular da África ocidental, como ponto de trânsito da cocaína em direção aos ricos mercados ocidentais é demonstrada pelo nível das apreensões registradas nos últimos anos. As apreensões de cocaína em toda a África aumentaram três vezes entre 2003 e 2004, enquanto no mesmo período as apreensões na África ocidental e central aumentaram seis vezes. As apreensões mais importantes no período 2000-2004 se registraram em Cabo Verde, seguido por África do Sul, Quênia, Gana e Nigéria. Mas as apreensões de cocaína na África representam somente 1% do total mundial das apreensões desta substância entorpecente. Também neste caso, porém, o dado é prejudicado devido à debilidade das polícias locais, incapazes de interceptar a maior parte dos fluxos de cocaína proveniente da América do Sul.
Em 2004, 50% das apreensões de cocaína no continente ocorreram na África ocidental e central. A zona de passagem mais utilizada pelos traficantes de cocaína é o Golfo da Guiné, de onde a substância entorpecente é transportada para a Europa em pequenas quantidades, através dos chamados “mulas”, pessoas que assumem o risco de ingerir óvulos de cocaína com a esperança de superar as alfândegas nos aeroportos de destinação. Nos últimos anos, também na África oriental aumentou a quantia de cocaína apreendida, indicando uma tendência a utilizar em medida crescente esta área como ponto de trânsito para a cocaína destinada à Europa e à Ásia.
Um dos países mais atingidos pelo fenômeno é o Quênia, onde em 2004 foi apreendida uma tonelada de cocaína. Em termos gerais, o crescimento da difusão da cocaína na África é demonstrada pelo fato que dos 32 países africanos que fornecem estatísticas sobre as apreensões de entorpecentes na UNODC, 23 (72%) relataram apreensões de cocaína, contra 34% em 1990.
Os traficantes de cocaína tendem a servir-se da África cada vez mais como ponto de trânsito por dois motivos. O primeiro deriva do melhoramento dos sistemas de inspeção utilizados pelas autoridades locais e por aquelas norte-americanas na área caribenha e centro-americana, tradicional rota utilizada pelos traficantes. Nos últimos anos, por exemplo, surgiram bases de inspeção norte-americanas dos Andes às ilhas caribenhas. Também as autoridades holandesas intensificaram a inspeção com patrulhas aéreas baseadas nas ilhas de Curaçao e Saint Martin.
O segundo fator está ligado à diminuição do consumo de cocaína, que se registrou nos Estados Unidos diante de um aumento da demanda na Europa. Se na América do Norte há o mais alto número de consumidores mundiais (6 milhões e meio, correspondente a cerca da metade do consumo mundial), a tendência é diminuir a demanda.
De 1998 a 2004, de fato, se registrou uma queda de 20% da difusão desta substância. No mesmo período, na Europa ocidental, onde os consumidores de cocaína são 3 milhões e meio (26% do total mundial), se notou um aumento do consumo e da difusão do “pó branco”. Na Espanha e no Reino Unido, este dado é de 2%.
A África, portanto, é uma cômoda e segura rota para alcançar um mercado em crescimento.
Além disso, como efeito colateral criou-se um mercado africano que está registrando nos últimos anos preocupantes aumentos.
A crescente disponibilidade de cocaína se traduz, com efeito, em um aumento do consumo desta substância na África. Segundo os dados do UNODC, no período 1992-2004 o abuso da cocaína na África cresceu em um ritmo mais sustentado do que no restante do mundo. Este incremento é mais remarcado nos países da África meridional e nos da África ocidental.
Se forem analisados os dados das pessoas que recorrem aos tratamentos de desintoxicação, o aumento do consumo de cocaína emerge com evidência. No início dos anos 90, as pessoas em tratamento por abuso de cocaína eram pouquíssimas, no final de 1996 constituíam 1.5% dos casos tratados pelas estruturas de recuperação dos toxicômanos, no biênio 1999-2000 eram 6%. No período 2001-2004, notou-se uma inflexão na porcentagem de pessoas que pediam para ser tratadas da dependência de cocaína (menos de 5%).
A partir do final de 2004, este dado está em crescimento: de 7,5% em 2004 passou-se a 8,5% nos primeiros meses de 2005.

A COCAÍNA NA ÁFRICA OCIDENTAL
O país tradicionalmente mais envolvido no narcotráfico é a Nigéria. Lá, com efeito, em 1993 houve a primeira grande apreensão de cocaína na África e as organizações criminais nigerianas estão perfeitamente inseridas no sistema criminal global e transnacional. A afirmação das máfias nigerianas deriva também da pertença da Nigéria ao Commonwealth, que permitiu abrir estreitas relações comerciais com o subcontinente indiano, produtor de ópio e de heroína, e com o mundo anglo-saxão consumidor.
No final dos anos 80, registrou-se um incremento importante no papel de centro estratégico e, em 1992, as apreensões de cocaína no aeroporto de Lagos foram tão relevantes que as autoridades nigerianas suspenderam os vôos diretos para o Rio de Janeiro. Desde então, os traficantes nigerianos são considerados os principais transportadores da droga, uma verdadeira indústria a serviço do comércio de heroína e da coca. Eles estão presentes em todos os pontos-chaves da produção e do tráfico de drogas. Graças aos compatriotas residentes no exterior, formaram clãs criminais comparáveis aos colombianos, turcos e chineses.
As organizações mafiosas nigerianas, como as outras, se baseiam na solidariedade étnica, de clã e de famílias. Já em 1995 as autoridades norte-americanas estimavam que 50% da heroína circulante em seu país era introduzida pelos nigerianos, os quais usam a Polônia e a Hungria como pontos de trânsito para a cocaína destinada à Europa ocidental.
Um dos países da África ocidental dos quais se têm estatísticas confiáveis sobre o incremento do tráfico de cocaína é Gana. Segundo os dados divulgados pelas autoridades locais, em um único ano as apreensões de cocaína aumentaram 40 vezes, passando dos 15 quilogramas de 2003 aos 617 quilos de 2004. A maior parte da cocaína é destinada ao mercado britânico.
Trata-se de um dado significativo, levando-se em consideração que, em termos porcentuais, as apreensões de cocaína aumentaram 18% em nível mundial e 4.000% em Gana de 2003 a 2004. No mesmo período, na África, as apreensões de cocaína aumentaram 3 vezes, passando das 1,1 tonelada para 3,6 toneladas.
Nos anos sucessivos, emergiram outros fatos que demonstram que Gana se tornou um importante ponto de passagem da cocaína na África ocidental. Em novembro de 2005, a polícia ganense apreendeu 588 quilos no decorrer de uma perquirição em uma habitação em East Lagon. Em abril de 2006, foram descobertos a bordo do navio MV Benjamin, atracado no porto de Tema, 2.310 quilos de cocaína.
Segundo um responsável do UNODC, as organizações de narcotraficantes tendem a fazer transitar a droga por meio da África ocidental porque, até agora, as autoridades alfandegárias européias e norte-americanas controlam com menos atenção as mercadorias e as bagagens provenientes da África em relação àquelas provenientes da América Latina. No caso de Gana, como de outros países da região, o fato de não estar inserido na lista dos países produtores de cocaína significa que as suas mercadorias não são sujeitas a inspeções detalhadas. Mas nos últimos anos, as coisas mudaram e Gana foi inserida na lista dos países “de alta prioridade” de inspeção.
Os traficantes buscam corromper os policiais e a polícia para permitir o trânsito das cargas de entorpecentes. Para investigar casos de corrupção de policiais, o Ministério da Fazenda de Gana criou uma Comissão de investigação, que recebeu o nome da sua Presidenta, Georgina Wood, que desempenhou importantes cargos na polícia e na magistratura local. O “Georgina Wood Committee” nasceu após duas importantes apreensões de cocaína citadas precedentemente, nas quais resultaram envolvidos alguns policiais. Entre as recomendações apresentadas pelo Comitê, está reforçar o patrulhamento das costas do país por meio seja da potenciação dos meios da marinha e da aeronáutica, seja com a criação de um serviço de guarda-costas independente.
A Guiné-Bissau é um outro país que se tornou ponto de trânsito da cocaína da América Latina à Europa, como demonstrado numa recente operação que levou à captura de 674 quilos de cocaína e à detenção de alguns narcotraficantes sul-americanos. Na África ocidental, os países mais envolvidos pelos fluxos de droga, além de Gana, são Costa do Marfim, Senegal e Nigéria.
Os traficantes de cocaína na Guiné-Bissau estão ligados aos que passam através do vizinho Senegal, como emergiu da operação efetuada no final de junho de 2007 pela polícia de Dakar, que levou à apreensão de mais de duas toneladas de cocaína. Parte da droga se encontrava em um veleiro que estava à deriva diante das costas senegalesas, e uma outra em uma habitação na área balneária de Mbour, a sul de Dakar.
No veleiro os investigadores encontraram uma documentação que comprova que os narcotraficantes utilizam a Guiné-Bissau como depósito de trânsito da cocaína proveniente da América Latina e destinada à Europa. Também a nacionalidade dos detidos demonstra o grau de internacionalização das organizações criminais dedicadas ao narcotráfico. Além de três cidadãos sul-americanos (um colombiano, um venezuelano e um equatoriano) e de uma cidadã francesa, a polícia deteve três senegaleses. A partir dos documentos detidos, além disso a polícia senegalesa descobriu que os narcotraficantes efetuaram diversas viagens aos países limítrofes: Serra Leoa, Guiné Conakry, Guiné-Bissau e Gâmbia.
As autoridades senegalesas reiteraram que em seu país não existem depósitos de cocaína, mas admitiram a infiltração de grupos criminais estrangeiros, que utilizam o aeroporto de Dakar para enviar cocaína à Europa. No período de janeiro a junho de 2007, a polícia senegalesa afirma ter apreendido no aeroporto de Dakar 44 quilos de cocaína e detido cerca de 30 “mulas” da droga, a maior parte dos quais nigeriano.
Está em aumento também o número de “mulas” da Guiné-Bissau detidos no momento do embarque para Portugal, onde podem entrar sem visto. Além disso, foram descobertas algumas operações de reciclagem de dinheiro sujo por parte de organizações estrangeiras. A apreensão recorde efetuada pela polícia senegalesa, equivalente ao total de apreensões de cocaína na África ocidental de setembro de 2006 a maio de 2007, é somente o último de uma série efetuada nos primeiros seis meses de 2007 em várias localidades da África ocidental.
Entre essas, há 800 quilos de cocaína recuperados no mar diante das ilhas Canárias, e uma quantia análoga apreendida pela marinha francesa no largo da Costa do Marfim. Além dos navios, as organizações criminais recorrem a aviões para alimentar seus tráficos ilícitos.
Na Venezuela foi bloqueado um avião com 2,5 toneladas de cocaína, que se preparava a partir para Serra Leoa, enquanto em maio de 2007 foram apreendidos 600 quilos de cocaína a bordo de um Cessna, matriculado na Venezuela, que efetuou uma aterrissagem de emergência em Nouadhibou, na Mauritânia.
Segundo um responsável do ONUDC, para a África ocidental o aumento de confiscos das cargas de cocaína na região é devido mais a incidentes de percurso que a uma maior eficácia da polícia.
O funcionário considera que a cada dez expedições de droga em direção à Europa, nove chegam a seu destino sem problemas.

O SAHEL: NOVA FRONTEIRA DO NARCOTRÁFICO?
Das costas da África ocidental as organizações de narcotraficantes estão progressivamente se expandindo aos países do Sahel, cujo papel estratégico entre o Atlântico e o Magreb, e, portanto o Mediterrâneo, é apreciado também pelos traficantes de seres humanos e, provavelmente, pelo terrorismo internacional. Não se pode excluir a priori uma interconexão entre essas realidades criminais, de que são cúmplices a debilidade dos Estados e a vastidão dos territórios a controlar. Um realidade que suscita o alarme dos governos interessados.
Em abril deste ano, depois da apreensão de três caminhões cheios de droga e armas, o Presidente do Níger, Mamadou Tandja, declarou que o exército local pretende aumentar os esforços para impedir que o seu país seja “circundado” pelos traficantes de armas e de droga, que são uma “ameaça real” para o país.
Também Burkina Fasso não foge ao fenômeno. Segundo o Coordenador do Comitê contra os tráficos ilícitos de droga em Burkina Fasso, o volume das cargas de droga interceptadas nos primeiros três meses de 2007 é “incrível”. O funcionário indica a existência de uma nova rota de trânsito da droga no oeste e no sudoeste do país. No início de abril de 2007, 49 quilos de cocaína, num valor de 10 milhões de dólares, foram interceptados pela polícia de Burkina Fasso na fronteira com o Mali, que é um importante ponto de trânsito para o tráfico de seres humanos. Países como Mali e Níger são há milênios atravessados por vias de caravanas, que agora se converteram num uso criminal: para o tráfico de seres humanos, mas também de armas, droga e cigarros de contrabando. “Nos últimos meses notamos um aumento da utilização dos países do Sahel, como Mali e Níger, para o tráfico de cocaína”, disse Antonio Razzitelli, Diretor do departamento do UNODC para a África ocidental.
Segundo o órgão anticrime da ONU, os traficantes importam a droga por meio das cidades costeiras como Conakry, na Guiné, Dakar, no Senegal, e Lomé, no Togo, e depois a transportam para as cidades do interior, como Bamako, no Mali, e Ouagadougou, em Burkina Fasso. Dessas localidades, a cocaína prossegue a sua viagem até a Europa.
Segundo o responsável do Comitê contra os tráficos ilícitos de droga em Burkina Fasso, é preciso coordenar os esforços entre as polícias dos Estados da região. “Há uma necessidade urgente de reunir todos os entes nacionais antidroga da região para encontrar o modo de cooperar entre si, para tentar deter as redes criminais”, disse, destacando que a escassa cooperação entre as fronteiras dos países do Sahel e a falta de meios das polícias locais constituem problemas adjuntos para uma eficaz ação de contraste às redes criminais.

O MERCADO DA CÂNABIS
Enquanto a África permanece, no momento, somente um local de trânsito e um mercado residual para drogas como cocaína e heroína, a principal produção local de substâncias entorpecentes é representada pela cânabis.
O cultivo da cânabis foi introduzido na África oriental pelos mercantes árabes, pérsios e indianos no século XII. De lá se difundiu primeiramente na África austral, no século XV, e depois no Congo e em Angola no século XIX. Somente depois da Segunda Guerra Mundial a cânabis chegou à África ocidental, levada por soldados nigerianos e ganenses que combateram com as tropas britânicas na Birmânia (atual Mianmar), onde adquiriram o hábito de fumar marijuana. Este fato explica porque nos países onde a cânabis é conhecida há mais tempo, ela é utilizada na medicina tradicional, enquanto na África ocidental é usada para fins “recreativos”. Até os anos 80, porém, a produção africana da cânabis permaneceu limitada. A partir daqueles anos, porém, notou-se um incremento notável da superfície cultivada com a cânabis para fins comerciais.
A produção desta substância se divide em três categorias: a erva da cânabis (flores e folhas), resina ou haxixe (secreções emitidas pela planta durante a fase de florescimento) e óleo de haxixe, o menos utilizado. Segundo o World Drug Report 2006, a erva da cânabis é cultivada, sobretudo de modo ilegal, em 176 países em todo o mundo. A África representa 27% da produção mundial e os principais produtores são Marrocos (3.700 toneladas), África do Sul (2.200 toneladas) e Nigéria (2 mil toneladas).
No que concerne ao haxixe, o principal produtor mundial é Marrocos, que fornece os mercados norte-africanos e europeus. Graças ao esforço das autoridades marroquinas nos últimos anos, deu-se a diminuição da produção local da cânabis, à qual corresponde um aumento da produção em outros países, da Ásia ocidental (Afeganistão, Paquistão) à Albânia. O UNODC reconhece que desde 2003 o governo de Rabat conduziu uma campanha para estimar a produção de resina da cânabis no país, em cooperação com a Agência anticrime das Nações Unidas. Segundo uma investigação efetuada em 2003, a produção da cânabis foi de 3.060 toneladas, cultivada em 134 mil hectares de terra na região do Rif (norte do país) por 96.600 famílias de camponeses. A investigação feita em 2004 registrou uma diminuição de 10% das terras cultivas com a cânabis, que passaram a 120.500 hectares, com uma produção estimada de 2.760 toneladas.
Em 2005 notou-se uma ulterior diminuição de 37%, sendo a superfície cultivada com a cânabis de 72.500 hectares, enquanto a produção diminuiu para 1.070 toneladas. Quanto às apreensões da cânabis, nos últimos 12-15 anos se registrou um aumento da porcentagem mundial de apreensões no continente africano desta substância. Enquanto em 1990 16% do total mundial das apreensões da cânabis ocorria na África, em 2002 este dado subiu para 20%, para alcançar 31% em 2004. O aumento das apreensões na África é determinado sobretudo pelo aumento dos controles policiais e alfandegários efetuados pela Nigéria e pela África do Sul.
O principal mercado de consumo da cânabis é a Europa ocidental, e 80% da cânabis consumada na Europa provém do Marrocos, passando pela Espanha e pela Holanda e dali distribuída aos outros países. O terceiro mercado mundial de consumo é representado pelos países do norte da África, onde a cânabis provém principalmente do Marrocos. Parte da cânabis produzida no Afeganistão e Paquistão, além disso, alimenta o mercado dos países da África oriental.
No que concerne às problemáticas sociais ligadas ao consumo da cânabis, é preciso recordar que esta substância é a droga mais difundida e usada em nível mundial. Estima-se que, em 2004, 162 milhões de pessoas a tenham usado, o equivalente a 3,9% da população mundial entre 15 e 64 anos. Em termos relativos (a porcentagem de habitantes que faz uso da cânabis em relação a outras substância entorpecentes), a cânabis é prevalentemente utilizada na Oceania, seguida por América do Norte e África. Desde 1992, na África, notou-se também uma tendência ao aumento do seu consumo, em particular na Argélia, Nigéria e Zâmbia.
É provável que a tendência ao uso desta droga seja subestimada em diversos países da África, que não têm uma capacidade de coleta de dados adequados para seguir o fenômeno. Segundo dados parciais, notou-se nos últimos anos um forte incremento do abuso da cânabis na África ocidental, oriental e no norte da África, em sintonia com a tendência em nível global de uma ulterior expansão do consumo desta substância.
Até os anos 80, porém, a produção africana da cânabis permaneceu limitada. A partir daqueles anos, porém, notou-se um incremento notável da superfície cultivada com a cânabis para fins comerciais.
A produção africana de droga subtraiu terras e recursos à agricultura, isso porque naquele período se registrou uma forte queda dos preços dos produtos agrícolas em todo o mundo. A agricultura africana, já frágil, entrou em crise. Diversos camponeses, portanto, deixaram-se tentar pelo cultivo da cânabis em detrimento do cultivo de produtos lícitos.
Um simples cálculo econômico demonstra o forte poder de atração de uma semelhante produção; já em 1995, na Guiné, um saco de 20-25 quilos de marijuana tinha o valor de aproximadamente a renda anual média de uma famílias de oitos pessoas que se dedica à produção de cultivo lícito. No mercado de Kinshasa, na República Democrática do Congo (RDC), um saco de 25 quilos de marijuana é vendido por mil dólares, enquanto um saco de 80 quilos de mandioca vale somente 10 dólares.
Compreende-se, assim, que o cultivo desta substância entorpecente tem sérias repercussões na auto-suficiência alimentar de diversos países africanos. Segundo a associação de luta à toxicomania de Kinshasa, LIPILDRO, por causa do abandono dos cultivos legais por aqueles da cânabis, até 2010 a maior parte das cidades congolesas será atingida por um crise alimentar.
Além disso, na RDC se verificaram experiências para o cultivo da papoula de ópio (na província do Equador) e da cocaína (na região do Shaba). O mais importante produtor da cânabis na África subsaariana permanece, porém, a África do Sul. Importante produções são sinalizadas também em Lesoto e em Malauí.

DROGAS SINTÉTICAS
A produção de drogas sintéticas é limitada na África, com exceção da África do Sul, onde a fabricação de metanfetaminas e methaqualone aumentou nos últimos anos. Os dados sobre a descoberta de laboratórios clandestinos confirmam esta tendência.
Com efeito, se passou da descoberta à destruição de um laboratório por ano no período 1995-1999, aos 17 no período 2000-2003, até aos 28 destruídos somente em 2004. Um outro dado que demonstra o incremento do uso de drogas sintéticas na África do Sul é o aumento das apreensões de ecstasy: em 2004, houve um incremento de 385% das apreensões em relação ao ano precedente.
Além disso, as drogas sintéticas faziam parte do programa de guerra secreta química e biológica aplicado pelo regime do apartheid. Segundo os testemunhos reunidos durante o processo contra o responsável do programa, doutor Wouter Basson (definido “Doutor Morte” pela imprensa local), no âmbito do chamado “Project Coast”, entre 1992 e 1993 os laboratórios relacionados aos serviços secretos sul-africanos tinham produzido mais de 900 quilos de cristais de ecstasy (correspondente a 73 milhões de pílulas). No ano precedente, uma empresa de serviços do regime do apartheid tinha importado 500 quilos desta substância da Croácia.
Essas quantidades de drogas sintéticas foram importadas e produzidas para serem usadas como agente incapacitador para o controle da multidão (e talvez também para drogar secretamente os líderes da oposição para desacreditá-los, fazendo-os cometer gestos ridículos em público) e para serem distribuídas nas favelas habitadas pela população negra para promover o abuso de droga e a dependência.
O fim do regime do apartheid bloqueou este e outros projetos criminais aplicados no âmbito do “Project Coast”. Antes da queda do regime, porém, o dr. Basson tinha organizado a venda das empresas de cobertura dos serviços secretos sul-africanos, alguns dos quais fabricavam armas químicas e biológicas e drogas sintéticas.
Além disso, desapareceram centenas de quilos de substâncias químicas usadas na produção desses instrumentos de morte.
O dr. Basson é suspeito de ter aberto um empresa privada e, com efeito, quando foi detido em 1997 foi encontrado em posse de pílulas de ecstasy num valor de 20 mil dólares.

ÁFRICA ORIENTAL: UMA SITUAÇÃO PREOCUPANTE
Na África oriental, o Quênia é o principal ponto de trânsito da cocaína. Somente em 2004 foi apreendida 1,1 tonelada de cocaína entre a capital Nairóbi e o centro costeiro de Malindi. No decorrer da operação da polícia, que levou à descoberta desta importante carga de droga, foram detidos diversos funcionários da companhia aérea local (que resultou estranha ao narcotráfico), alguns dos quais foram capturados em Londres.
Das investigações emergiu que a droga que passava pelo Quênia era inserida no mercado britânico com a colaboração de alguns funcionários infiéis da companhia aérea. Além do Quênia, os países da África oriental interessados pelo narcotráfico são Etiópia, Botsuana, Zâmbia e África do Sul. Neste último, segundo o South African Institute of International Affaire, existem 500 mil pessoas que fazem uso de cocaína, enquanto 1/3 dos adolescentes utiliza entorpecentes. Segundo o centro de estudos sul-africano, no país atuam 300 organizações criminais internacionais envolvidas no narcotráfico.
Os países da região se tornaram não somente uma região de trânsito, mas também um novo mercado para os entorpecentes e, em particular, para a cocaína. Na Zâmbia, por exemplo, 80% da cocaína que chega ao país é transferida para a Europa e o restante 20% é consumado localmente.
A Interpol lançou o alarme sobre o crescente consumo de entorpecentes na África. “As drogas não somente transitam nos países, mas permanecem lá”, disse um responsável da organização internacional de polícia diante dos delegados de 150 organismos de polícia de todo o mundo, reunidos para o encontro anual da Interpol no Rio de Janeiro (Brasil). “Já se tornaram habituais as cargas de diversas toneladas de cocaína que passam pela África”, acrescentou.
Segundo um analista presente no seminário, se a tendência ao incremento do uso de entorpecentes continuar avançando, a África deverá enfrentar uma grave crise social derivante da droga.
As condições climáticas da maior parte da África são favoráveis ao cultivo da cânabis. Trata-se de um cultivo que permite um alto lucro para o agricultor e necessita de um trabalho menos intensivo em relação aos outros cultivos.
Inteiras famílias de agricultores podem viver, assim, de modo decente e permitir-se comprar alimento e medicamentos e enviar seus filhos à escola.
A cânabis é cultivada na África principalmente para o mercado local, mas nos últimos anos notou-se um aumento dos tráficos da cânabis originados na África subsaariana. Os maiores cultivos da cânabis se encontram em Comores, Etiópia, Quênia, Madagascar, Tanzânia e Uganda.
No Quênia, o cultivo da cânabis tem uma antiga tradição, mas nos últimos anos se tornou primeiramente uma produção limitada ao mercado local, para depois transformar-se em uma verdadeira empresa comercial ilícita estendida internacionalmente.
A cânabis é cultivada na região ocidental e naquela do Monte Quênia, onde, segundo alguns relatórios, existem cerca de 1.500 hectares cultivados com a cânabis. Os cultivos de droga estão escondidos entre aqueles tradicionais destinados à alimentação, mas há também cultivos menores em algumas áreas protegidas da reserva natural nacional.
Também as regiões costeiras se tornaram produtores da cânabis. Lá, com efeito, se instalaram diversos agricultores provenientes do interior, que lá encontraram áreas férteis e pouco controladas pela polícia, e um mercado constituído pela população local, pelos turistas e pelos residentes estrangeiros que preferem as costas do país.
Quanto ao ópio, no passado foram sinalizados alguns cultivos no Quênia e nas costas de Madagascar. Desde 1993 não foram sinalizados cultivos de opiáceos na África oriental, mas a vastidão do território e os escassos controles das autoridades locais tornam sempre possível uma retomada do cultivo da papoula de ópio.
No que diz respeito à produção local de drogas sintéticas, a África oriental é o ponto de trânsito do methaqualone (Mandrax) proveniente da Índia e destinado ao mercado sul-africano.
Nos últimos anos, a redução do Mandrax proveniente da Índia gerou uma produção local desta substância. Com efeito, foram descobertos laboratórios químicos clandestinos utilizados para a fabricação desta droga sintética em alguns países da África oriental e meridional.
Nos casos dos laboratórios descobertos no Quênia e na Tanzânia, se tratava somente de pequenos centros onde o pó do Mandrax ainda proveniente da Índia era transformado em pílulas, mas em outros casos deparou-se com verdadeiras oficinas para a fabricação do Mandrax com precursores químicos, cuja proveniência permaneceu desconhecida. A este propósito, as substâncias que mais causam preocupação são as efedrinas, as pseudo-efedrinas, o anidrido acético e o ácido N-acetilantranílico (utilizado na fabricação do Mandrax) e o pergamenato de potássio.
O mais famoso cultivo de planta entorpecente local é o khat, que é uma produção legal em diversos países da África oriental. O khat é cultivado na Etiópia e no Quênia e, em medida menos extensa, na Tanzânia, Comores e na parte setentrional de Madagascar. É exportado para os principais mercados da área (Djibuti, Eritréia, Somália e Iêmen), além da Europa e da América setentrional.
O uso do khat continua a expandir-se no Chifre da África e tem um papel-chave na contínua instabilidade da Somália, onde se calcula que a população gasta todos os anos 64 milhões de dólares por ano para comprar o khat. Trata-se de um quantia que é quase o dobro do total das ajudas internacionais doadas ao país. O khat não somente contribui para provocar problemas na sociedade, criando pessoas afetadas pela dependência de entorpecentes, mas tem também um papel na difusão no país de armas leves, frequentemente repassadas em troca de um pouco de droga.
As organizações de narcotraficantes olham com interesse aos países da África oriental e meridional por causa de suas infra-estruturas portuárias e aeroportuárias, dos comprimentos de suas costas e dos fluxos turísticos.
Todos elementos que permitem esconder os tráficos de droga. O Quênia tem o maior porto comercial da região, Mombasa, que serve a maior parte dos países privados de acesso direto ao mar, enquanto o aeroporto de Nairóbi é um dos mais traficados da área. As redes do narcotráfico utilizam também os portos de Dar-es-Salaam (na Tanzânia), Djibuti, Durban (na África do Sul) e Maputo (em Moçambique) e estão expandindo suas atividades também na Etiópia, Mauritius, Tanzânia e Uganda. Esses últimos países são usados como pontos de trânsito para a droga enviada para o Quênia, a África do Sul e a África ocidental e dessas áreas para a Europa e a América do Norte.
A maior parte das substâncias entorpecentes chega à região via mar, escondida nas cargas dos containers transportados pelos navios mercantis que navegam o Oceano Índico. Em alguns casos, os navios dos narcotraficantes se encontram em alto mar com embarcações menores, que levam para a terra a carga ilícita. Grandes quantidades de heroína chegam assim à região, mas se recorre também a carteiros, homens e mulheres, que chegam com vôos comerciais, e ao envio por correio.
Entre os países da África oriental interessados pelo tráfico e pelo consumo de substâncias entorpecentes, está Uganda.
Segundo um recente relatório do UNODC, “Uganda se tornou o país líder no tráfico e no consumo de droga em relação ao restante dos Estados da África oriental”. Entre as drogas presentes no mercado ilícito ugandense, existem a cânabis, a heroína, a cocaína e o mandrax, além do khat. Segundo a agência anticrime da ONU, o aumento do consumo de substâncias entorpecentes é devido a “duas décadas de conflitos armados e à falta de lei, que prejudicaram gravemente a infra-estrutura policial”.
O relatório observa que as condições climáticas de todo o território ugandense são favoráveis ao cultivo da cânabis: “O cultivo ilícito da planta é, porém, relevante em áreas remotas das regiões meridional, ocidental, central, oriental e norte-oriental. As dimensões exatas dos cultivos da cânabis não são conhecidas, mas se notou um aumento da produção da cânabis sobretudo para a exportação”. O aeroporto de Entebbe é, por fim, utilizado como ponto de trânsito para o envio de heroína e de mandrax ao extremo Oriente e à África do Sul.

CONCLUSÕES
A África é um ponto de trânsito sempre mais importante para as organizações de narcotraficantes, apesar de, no momento, a maior parte das apreensões de entorpecentes ocorrer em outras partes do mundo.
Vista a escassa eficiência das polícias africanas e a relativa recente conscientização do problema por parte dos entes locais e internacionais, pode-se supor que a quantidade das apreensões de droga na África não corresponda à entidade efetiva das cargas que transitam pelo continente.
A África, porém, não é mais somente um ponto de passagem da droga proveniente da América Latina e da Ásia em direção à Europa e à América setentrional, mas já se tornou um mercado ainda talvez “residual”, mas em todo caso que não pode ser ignorado pelas redes de narcotraficantes.
Redes nas quais estão presentes africanos, em particular nigerianos, em papéis não somente de gregários, mas também de organizadores. O crescente consumo de drogas por via endovenosa em diversos países africanos, como Tanzânia e Quênia, agrava o problema da difusão da AIDS.
Na Nigéria, por exemplo, um estudo revelou que o consumo de drogas se expande no mesmo ritmo do aumento das pessoas infetadas com o vírus HIV, em cidades como Kano e Port Harcourt.

 
At 9/17/2007 3:10 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

A DROGA NA ÁFRICA: UM PROBLEMA MUNDIAL

A droga já é um problema na África e representa um ulterior obstáculo ao desenvolvimento do continente. É o que afirmam diversos organismos internacionais encarregados da luta ao tráfico de entorpecentes. Já em 2001, um relatório do Órgão Internacional de Controle das Drogas afirmava que “graças à sua experiência no campo do contrabando de haxixe e de heroína, os cartéis da droga da África ocidental buscam novos contatos na América Latina para estender o tráfico de cocaína a toda a região da África subsaariana”.
Trata-se de uma reviravolta fundamental na estratégia do narcotráfico mundial, que vê a África se tornar uma das áreas “fulcro” para a distribuição de drogas em todo o mundo. Até os primeiros anos da década de 90 do século passado, a África era mantida às margens das rotas da droga. A mudança ocorreu em 1993, quando foram apreendidos na Nigéria 300 quilos de heroína provenientes da Tailândia. É o sinal de uma mudança que vê a transformação de tantos pequenos contrabandistas africanos (a maioria nigerianos) de simples transportadores por conta de terceiros a membros de gangues guiadas por africanos, capazes de tratar no mesmo nível com análogas organizações de outros continentes.
A presença dessas organizações criminais, a forte urbanização, a perda dos valores tradicionais africanos e a difusão de uma cultura hedonista são todos fatores que criaram as premissas para um mercado africano da droga. A África, portanto, não é somente um local de trânsito dos entorpecentes, mas terreno “virgem” para o tráfico de droga.

PREMESSA METODOLÓGICA
Os dados apresentados são úteis para analisar a tendência (incremento ou decremento) do tráfico de entorpecentes, apesar de serem muito provavelmente aproximativos.
Segundo um estudo crítico efetuado pela associação ‘Libera’ do pe. Ciotti, com efeito os dados apresentados pelos entes antidrogas internacionais e de alguns Estados não relatam fielmente toda a produção mundial de cocaína. Segundo este estudo (referido somente à cocaína e não a outras drogas), existe uma discrepância entre a estimativa sobre a produção mundial de cocaína efetuada pela ONU e os dados relativos às apreensões e ao consumo de cocaína somente na América.
Segundo os elaboradores do relatório, com efeito, subtraindo das 937 toneladas de produção, indicada pelas Nações Unidas em 2004, as cerca de 450 consumadas nos Estados Unidos, Canadá, México e em toda a América do Sul e as cerca de 490 toneladas apreendidas em todas as Américas, se chegaria a um saldo negativo de 3 toneladas.
“A este ponto, não se saberia mais de onde subtrair as cerca de 99 toneladas de cocaína apreendidas no “resto do mundo”, afirma o relatório. Fazendo-o, se chegaria ao paradoxal saldo negativo de 102 toneladas de cocaína “não resultantes”, não tendo feito frente ainda à demanda de cocaína no “resto do mundo”, estimada em ao menos 300 toneladas, se chega a calcular uma espécie de buraco negro de aproximadamente 400 toneladas de cocaína não resultantes.
Este buraco negro assume proporções ainda mais macroscópicas, cerca de 700 toneladas, se calculado com base nos dados da Agência antidroga norte-americana.
Apesar dos seus limites, os relatórios dos organismos internacionais de luta contra a droga permanecem frequentemente os únicos instrumentos para analisar o fenômeno do narcotráfico.

A HEROÍNA NA ÁFRICA
A apreensão de opiáceos na África registrou um forte incremento nos últimos anos. Segundo dados da ONU, por exemplo, em 2004 ocorreu um incremento da apreensão de heroína de 60% em relação ao ano precedente.
A maior parte deste incremento é devido à apreensão ocorrida na África central e ocidental, que quase triplicou de 2003 a 2004. A heroína que passa pela África é destinada em primeiro lugar aos mercados europeus e, em segundo lugar, aos da América do Norte. A heroína provém dos países do sudoeste e sudeste da Ásia.
A quantia total dos opiáceos apreendida na África permanece ainda modesto (0,3% do total de apreensões em nível mundial). Porém, deve-se levar em consideração que não existem estatísticas confiáveis e que o nível das apreensões não reflete o verdadeiro fluxo de narcóticos que passa pela África por causa da debilidade da polícia local, que tem dificuldade em interceptar as cargas ilícitas.
No que concerne ao uso de opiáceos na África, segundo os dados do Departamento das Nações Unidas para a luta à criminalidade (UNODC), nota-se um aumento de seu consumo no continente africano, em particular na África oriental e naquela austral e em alguns países da África ocidental. Segundo os especialistas das Nações Unidas, o crescimento do consumo de heroína nessas áreas deriva do fato de que são utilizadas como locais de trânsito dos narcotraficantes, os quais, porém, não desdenham em criar um mercado local.
Na África do Sul, um dos poucos países africanos que dispõe de dados confiáveis, até os primeiros anos do novo milênio, o pedido de tratamentos por abuso de heroína representava somente 1% do total dos pedidos de cura por dependência de substâncias entorpecentes (incluído o álcool). Em 2005, esta porcentagem subiu para 7%.
Segundo o relatório do UNODC sobre o tráfico de entorpecentes de 2007, o mercado da heroína está dividido deste modo: a heroína afegã é destinada aos mercados da Ásia central, da Europa, do Oriente Médio e da África; aquela produzida no chamado “triângulo de ouro” alimenta o mercado chinês e o dos outros países asiáticos e da Oceania; aquela proveniente da América Latina serve o mercado norte-americano.
O relatório nota, porém, que “uma parte pequena, mas em crescimento, da produção de opiáceos afegãos é enviada à América setentrional, seja por meio da África oriental e ocidental, seja por meio da Europa”.
O relatório afirma que a demanda global de heroína permaneceu estável, “apesar de importantes incrementos nos países que se encontram no caminho das principais rotas do narcotráfico”.
Entre esses estão também diversos países africanos, afirma o documento, que destaca os efeitos prejudiciais da difusão da heroína e de outras substâncias entorpecentes nas populações já duramente provadas pela pobreza e pela difusão da AIDS.
Os últimos dados do UNODC mostram um forte incremento do uso de heroína em alguns países africanos como Moçambique, Zâmbia, Quênia, Tanzânia e Costa do Marfim, enquanto outros países tiveram um aumento mais contido. Entre esses, África do Sul, Madagascar, Gana, Libéria e Senegal.

DOS ANDES AO KILIMANJARO: UM FLUXO DE COCAÍNA INVADE A ÁFRICA
O dado mais preocupante, porém, é o da cocaína que transita da África em direção principalmente à Europa e, secundariamente, à América setentrional.
A importância da África, e em particular da África ocidental, como ponto de trânsito da cocaína em direção aos ricos mercados ocidentais é demonstrada pelo nível das apreensões registradas nos últimos anos. As apreensões de cocaína em toda a África aumentaram três vezes entre 2003 e 2004, enquanto no mesmo período as apreensões na África ocidental e central aumentaram seis vezes. As apreensões mais importantes no período 2000-2004 se registraram em Cabo Verde, seguido por África do Sul, Quênia, Gana e Nigéria. Mas as apreensões de cocaína na África representam somente 1% do total mundial das apreensões desta substância entorpecente. Também neste caso, porém, o dado é prejudicado devido à debilidade das polícias locais, incapazes de interceptar a maior parte dos fluxos de cocaína proveniente da América do Sul.
Em 2004, 50% das apreensões de cocaína no continente ocorreram na África ocidental e central. A zona de passagem mais utilizada pelos traficantes de cocaína é o Golfo da Guiné, de onde a substância entorpecente é transportada para a Europa em pequenas quantidades, através dos chamados “mulas”, pessoas que assumem o risco de ingerir óvulos de cocaína com a esperança de superar as alfândegas nos aeroportos de destinação. Nos últimos anos, também na África oriental aumentou a quantia de cocaína apreendida, indicando uma tendência a utilizar em medida crescente esta área como ponto de trânsito para a cocaína destinada à Europa e à Ásia.
Um dos países mais atingidos pelo fenômeno é o Quênia, onde em 2004 foi apreendida uma tonelada de cocaína. Em termos gerais, o crescimento da difusão da cocaína na África é demonstrada pelo fato que dos 32 países africanos que fornecem estatísticas sobre as apreensões de entorpecentes na UNODC, 23 (72%) relataram apreensões de cocaína, contra 34% em 1990.
Os traficantes de cocaína tendem a servir-se da África cada vez mais como ponto de trânsito por dois motivos. O primeiro deriva do melhoramento dos sistemas de inspeção utilizados pelas autoridades locais e por aquelas norte-americanas na área caribenha e centro-americana, tradicional rota utilizada pelos traficantes. Nos últimos anos, por exemplo, surgiram bases de inspeção norte-americanas dos Andes às ilhas caribenhas. Também as autoridades holandesas intensificaram a inspeção com patrulhas aéreas baseadas nas ilhas de Curaçao e Saint Martin.
O segundo fator está ligado à diminuição do consumo de cocaína, que se registrou nos Estados Unidos diante de um aumento da demanda na Europa. Se na América do Norte há o mais alto número de consumidores mundiais (6 milhões e meio, correspondente a cerca da metade do consumo mundial), a tendência é diminuir a demanda.
De 1998 a 2004, de fato, se registrou uma queda de 20% da difusão desta substância. No mesmo período, na Europa ocidental, onde os consumidores de cocaína são 3 milhões e meio (26% do total mundial), se notou um aumento do consumo e da difusão do “pó branco”. Na Espanha e no Reino Unido, este dado é de 2%.
A África, portanto, é uma cômoda e segura rota para alcançar um mercado em crescimento.
Além disso, como efeito colateral criou-se um mercado africano que está registrando nos últimos anos preocupantes aumentos.
A crescente disponibilidade de cocaína se traduz, com efeito, em um aumento do consumo desta substância na África. Segundo os dados do UNODC, no período 1992-2004 o abuso da cocaína na África cresceu em um ritmo mais sustentado do que no restante do mundo. Este incremento é mais remarcado nos países da África meridional e nos da África ocidental.
Se forem analisados os dados das pessoas que recorrem aos tratamentos de desintoxicação, o aumento do consumo de cocaína emerge com evidência. No início dos anos 90, as pessoas em tratamento por abuso de cocaína eram pouquíssimas, no final de 1996 constituíam 1.5% dos casos tratados pelas estruturas de recuperação dos toxicômanos, no biênio 1999-2000 eram 6%. No período 2001-2004, notou-se uma inflexão na porcentagem de pessoas que pediam para ser tratadas da dependência de cocaína (menos de 5%).
A partir do final de 2004, este dado está em crescimento: de 7,5% em 2004 passou-se a 8,5% nos primeiros meses de 2005.

A COCAÍNA NA ÁFRICA OCIDENTAL
O país tradicionalmente mais envolvido no narcotráfico é a Nigéria. Lá, com efeito, em 1993 houve a primeira grande apreensão de cocaína na África e as organizações criminais nigerianas estão perfeitamente inseridas no sistema criminal global e transnacional. A afirmação das máfias nigerianas deriva também da pertença da Nigéria ao Commonwealth, que permitiu abrir estreitas relações comerciais com o subcontinente indiano, produtor de ópio e de heroína, e com o mundo anglo-saxão consumidor.
No final dos anos 80, registrou-se um incremento importante no papel de centro estratégico e, em 1992, as apreensões de cocaína no aeroporto de Lagos foram tão relevantes que as autoridades nigerianas suspenderam os vôos diretos para o Rio de Janeiro. Desde então, os traficantes nigerianos são considerados os principais transportadores da droga, uma verdadeira indústria a serviço do comércio de heroína e da coca. Eles estão presentes em todos os pontos-chaves da produção e do tráfico de drogas. Graças aos compatriotas residentes no exterior, formaram clãs criminais comparáveis aos colombianos, turcos e chineses.
As organizações mafiosas nigerianas, como as outras, se baseiam na solidariedade étnica, de clã e de famílias. Já em 1995 as autoridades norte-americanas estimavam que 50% da heroína circulante em seu país era introduzida pelos nigerianos, os quais usam a Polônia e a Hungria como pontos de trânsito para a cocaína destinada à Europa ocidental.
Um dos países da África ocidental dos quais se têm estatísticas confiáveis sobre o incremento do tráfico de cocaína é Gana. Segundo os dados divulgados pelas autoridades locais, em um único ano as apreensões de cocaína aumentaram 40 vezes, passando dos 15 quilogramas de 2003 aos 617 quilos de 2004. A maior parte da cocaína é destinada ao mercado britânico.
Trata-se de um dado significativo, levando-se em consideração que, em termos porcentuais, as apreensões de cocaína aumentaram 18% em nível mundial e 4.000% em Gana de 2003 a 2004. No mesmo período, na África, as apreensões de cocaína aumentaram 3 vezes, passando das 1,1 tonelada para 3,6 toneladas.
Nos anos sucessivos, emergiram outros fatos que demonstram que Gana se tornou um importante ponto de passagem da cocaína na África ocidental. Em novembro de 2005, a polícia ganense apreendeu 588 quilos no decorrer de uma perquirição em uma habitação em East Lagon. Em abril de 2006, foram descobertos a bordo do navio MV Benjamin, atracado no porto de Tema, 2.310 quilos de cocaína.
Segundo um responsável do UNODC, as organizações de narcotraficantes tendem a fazer transitar a droga por meio da África ocidental porque, até agora, as autoridades alfandegárias européias e norte-americanas controlam com menos atenção as mercadorias e as bagagens provenientes da África em relação àquelas provenientes da América Latina. No caso de Gana, como de outros países da região, o fato de não estar inserido na lista dos países produtores de cocaína significa que as suas mercadorias não são sujeitas a inspeções detalhadas. Mas nos últimos anos, as coisas mudaram e Gana foi inserida na lista dos países “de alta prioridade” de inspeção.
Os traficantes buscam corromper os policiais e a polícia para permitir o trânsito das cargas de entorpecentes. Para investigar casos de corrupção de policiais, o Ministério da Fazenda de Gana criou uma Comissão de investigação, que recebeu o nome da sua Presidenta, Georgina Wood, que desempenhou importantes cargos na polícia e na magistratura local. O “Georgina Wood Committee” nasceu após duas importantes apreensões de cocaína citadas precedentemente, nas quais resultaram envolvidos alguns policiais. Entre as recomendações apresentadas pelo Comitê, está reforçar o patrulhamento das costas do país por meio seja da potenciação dos meios da marinha e da aeronáutica, seja com a criação de um serviço de guarda-costas independente.
A Guiné-Bissau é um outro país que se tornou ponto de trânsito da cocaína da América Latina à Europa, como demonstrado numa recente operação que levou à captura de 674 quilos de cocaína e à detenção de alguns narcotraficantes sul-americanos. Na África ocidental, os países mais envolvidos pelos fluxos de droga, além de Gana, são Costa do Marfim, Senegal e Nigéria.
Os traficantes de cocaína na Guiné-Bissau estão ligados aos que passam através do vizinho Senegal, como emergiu da operação efetuada no final de junho de 2007 pela polícia de Dakar, que levou à apreensão de mais de duas toneladas de cocaína. Parte da droga se encontrava em um veleiro que estava à deriva diante das costas senegalesas, e uma outra em uma habitação na área balneária de Mbour, a sul de Dakar.
No veleiro os investigadores encontraram uma documentação que comprova que os narcotraficantes utilizam a Guiné-Bissau como depósito de trânsito da cocaína proveniente da América Latina e destinada à Europa. Também a nacionalidade dos detidos demonstra o grau de internacionalização das organizações criminais dedicadas ao narcotráfico. Além de três cidadãos sul-americanos (um colombiano, um venezuelano e um equatoriano) e de uma cidadã francesa, a polícia deteve três senegaleses. A partir dos documentos detidos, além disso a polícia senegalesa descobriu que os narcotraficantes efetuaram diversas viagens aos países limítrofes: Serra Leoa, Guiné Conakry, Guiné-Bissau e Gâmbia.
As autoridades senegalesas reiteraram que em seu país não existem depósitos de cocaína, mas admitiram a infiltração de grupos criminais estrangeiros, que utilizam o aeroporto de Dakar para enviar cocaína à Europa. No período de janeiro a junho de 2007, a polícia senegalesa afirma ter apreendido no aeroporto de Dakar 44 quilos de cocaína e detido cerca de 30 “mulas” da droga, a maior parte dos quais nigeriano.
Está em aumento também o número de “mulas” da Guiné-Bissau detidos no momento do embarque para Portugal, onde podem entrar sem visto. Além disso, foram descobertas algumas operações de reciclagem de dinheiro sujo por parte de organizações estrangeiras. A apreensão recorde efetuada pela polícia senegalesa, equivalente ao total de apreensões de cocaína na África ocidental de setembro de 2006 a maio de 2007, é somente o último de uma série efetuada nos primeiros seis meses de 2007 em várias localidades da África ocidental.
Entre essas, há 800 quilos de cocaína recuperados no mar diante das ilhas Canárias, e uma quantia análoga apreendida pela marinha francesa no largo da Costa do Marfim. Além dos navios, as organizações criminais recorrem a aviões para alimentar seus tráficos ilícitos.
Na Venezuela foi bloqueado um avião com 2,5 toneladas de cocaína, que se preparava a partir para Serra Leoa, enquanto em maio de 2007 foram apreendidos 600 quilos de cocaína a bordo de um Cessna, matriculado na Venezuela, que efetuou uma aterrissagem de emergência em Nouadhibou, na Mauritânia.
Segundo um responsável do ONUDC, para a África ocidental o aumento de confiscos das cargas de cocaína na região é devido mais a incidentes de percurso que a uma maior eficácia da polícia.
O funcionário considera que a cada dez expedições de droga em direção à Europa, nove chegam a seu destino sem problemas.

O SAHEL: NOVA FRONTEIRA DO NARCOTRÁFICO?
Das costas da África ocidental as organizações de narcotraficantes estão progressivamente se expandindo aos países do Sahel, cujo papel estratégico entre o Atlântico e o Magreb, e, portanto o Mediterrâneo, é apreciado também pelos traficantes de seres humanos e, provavelmente, pelo terrorismo internacional. Não se pode excluir a priori uma interconexão entre essas realidades criminais, de que são cúmplices a debilidade dos Estados e a vastidão dos territórios a controlar. Um realidade que suscita o alarme dos governos interessados.
Em abril deste ano, depois da apreensão de três caminhões cheios de droga e armas, o Presidente do Níger, Mamadou Tandja, declarou que o exército local pretende aumentar os esforços para impedir que o seu país seja “circundado” pelos traficantes de armas e de droga, que são uma “ameaça real” para o país.
Também Burkina Fasso não foge ao fenômeno. Segundo o Coordenador do Comitê contra os tráficos ilícitos de droga em Burkina Fasso, o volume das cargas de droga interceptadas nos primeiros três meses de 2007 é “incrível”. O funcionário indica a existência de uma nova rota de trânsito da droga no oeste e no sudoeste do país. No início de abril de 2007, 49 quilos de cocaína, num valor de 10 milhões de dólares, foram interceptados pela polícia de Burkina Fasso na fronteira com o Mali, que é um importante ponto de trânsito para o tráfico de seres humanos. Países como Mali e Níger são há milênios atravessados por vias de caravanas, que agora se converteram num uso criminal: para o tráfico de seres humanos, mas também de armas, droga e cigarros de contrabando. “Nos últimos meses notamos um aumento da utilização dos países do Sahel, como Mali e Níger, para o tráfico de cocaína”, disse Antonio Razzitelli, Diretor do departamento do UNODC para a África ocidental.
Segundo o órgão anticrime da ONU, os traficantes importam a droga por meio das cidades costeiras como Conakry, na Guiné, Dakar, no Senegal, e Lomé, no Togo, e depois a transportam para as cidades do interior, como Bamako, no Mali, e Ouagadougou, em Burkina Fasso. Dessas localidades, a cocaína prossegue a sua viagem até a Europa.
Segundo o responsável do Comitê contra os tráficos ilícitos de droga em Burkina Fasso, é preciso coordenar os esforços entre as polícias dos Estados da região. “Há uma necessidade urgente de reunir todos os entes nacionais antidroga da região para encontrar o modo de cooperar entre si, para tentar deter as redes criminais”, disse, destacando que a escassa cooperação entre as fronteiras dos países do Sahel e a falta de meios das polícias locais constituem problemas adjuntos para uma eficaz ação de contraste às redes criminais.

O MERCADO DA CÂNABIS
Enquanto a África permanece, no momento, somente um local de trânsito e um mercado residual para drogas como cocaína e heroína, a principal produção local de substâncias entorpecentes é representada pela cânabis.
O cultivo da cânabis foi introduzido na África oriental pelos mercantes árabes, pérsios e indianos no século XII. De lá se difundiu primeiramente na África austral, no século XV, e depois no Congo e em Angola no século XIX. Somente depois da Segunda Guerra Mundial a cânabis chegou à África ocidental, levada por soldados nigerianos e ganenses que combateram com as tropas britânicas na Birmânia (atual Mianmar), onde adquiriram o hábito de fumar marijuana. Este fato explica porque nos países onde a cânabis é conhecida há mais tempo, ela é utilizada na medicina tradicional, enquanto na África ocidental é usada para fins “recreativos”. Até os anos 80, porém, a produção africana da cânabis permaneceu limitada. A partir daqueles anos, porém, notou-se um incremento notável da superfície cultivada com a cânabis para fins comerciais.
A produção desta substância se divide em três categorias: a erva da cânabis (flores e folhas), resina ou haxixe (secreções emitidas pela planta durante a fase de florescimento) e óleo de haxixe, o menos utilizado. Segundo o World Drug Report 2006, a erva da cânabis é cultivada, sobretudo de modo ilegal, em 176 países em todo o mundo. A África representa 27% da produção mundial e os principais produtores são Marrocos (3.700 toneladas), África do Sul (2.200 toneladas) e Nigéria (2 mil toneladas).
No que concerne ao haxixe, o principal produtor mundial é Marrocos, que fornece os mercados norte-africanos e europeus. Graças ao esforço das autoridades marroquinas nos últimos anos, deu-se a diminuição da produção local da cânabis, à qual corresponde um aumento da produção em outros países, da Ásia ocidental (Afeganistão, Paquistão) à Albânia. O UNODC reconhece que desde 2003 o governo de Rabat conduziu uma campanha para estimar a produção de resina da cânabis no país, em cooperação com a Agência anticrime das Nações Unidas. Segundo uma investigação efetuada em 2003, a produção da cânabis foi de 3.060 toneladas, cultivada em 134 mil hectares de terra na região do Rif (norte do país) por 96.600 famílias de camponeses. A investigação feita em 2004 registrou uma diminuição de 10% das terras cultivas com a cânabis, que passaram a 120.500 hectares, com uma produção estimada de 2.760 toneladas.
Em 2005 notou-se uma ulterior diminuição de 37%, sendo a superfície cultivada com a cânabis de 72.500 hectares, enquanto a produção diminuiu para 1.070 toneladas. Quanto às apreensões da cânabis, nos últimos 12-15 anos se registrou um aumento da porcentagem mundial de apreensões no continente africano desta substância. Enquanto em 1990 16% do total mundial das apreensões da cânabis ocorria na África, em 2002 este dado subiu para 20%, para alcançar 31% em 2004. O aumento das apreensões na África é determinado sobretudo pelo aumento dos controles policiais e alfandegários efetuados pela Nigéria e pela África do Sul.
O principal mercado de consumo da cânabis é a Europa ocidental, e 80% da cânabis consumada na Europa provém do Marrocos, passando pela Espanha e pela Holanda e dali distribuída aos outros países. O terceiro mercado mundial de consumo é representado pelos países do norte da África, onde a cânabis provém principalmente do Marrocos. Parte da cânabis produzida no Afeganistão e Paquistão, além disso, alimenta o mercado dos países da África oriental.
No que concerne às problemáticas sociais ligadas ao consumo da cânabis, é preciso recordar que esta substância é a droga mais difundida e usada em nível mundial. Estima-se que, em 2004, 162 milhões de pessoas a tenham usado, o equivalente a 3,9% da população mundial entre 15 e 64 anos. Em termos relativos (a porcentagem de habitantes que faz uso da cânabis em relação a outras substância entorpecentes), a cânabis é prevalentemente utilizada na Oceania, seguida por América do Norte e África. Desde 1992, na África, notou-se também uma tendência ao aumento do seu consumo, em particular na Argélia, Nigéria e Zâmbia.
É provável que a tendência ao uso desta droga seja subestimada em diversos países da África, que não têm uma capacidade de coleta de dados adequados para seguir o fenômeno. Segundo dados parciais, notou-se nos últimos anos um forte incremento do abuso da cânabis na África ocidental, oriental e no norte da África, em sintonia com a tendência em nível global de uma ulterior expansão do consumo desta substância.
Até os anos 80, porém, a produção africana da cânabis permaneceu limitada. A partir daqueles anos, porém, notou-se um incremento notável da superfície cultivada com a cânabis para fins comerciais.
A produção africana de droga subtraiu terras e recursos à agricultura, isso porque naquele período se registrou uma forte queda dos preços dos produtos agrícolas em todo o mundo. A agricultura africana, já frágil, entrou em crise. Diversos camponeses, portanto, deixaram-se tentar pelo cultivo da cânabis em detrimento do cultivo de produtos lícitos.
Um simples cálculo econômico demonstra o forte poder de atração de uma semelhante produção; já em 1995, na Guiné, um saco de 20-25 quilos de marijuana tinha o valor de aproximadamente a renda anual média de uma famílias de oitos pessoas que se dedica à produção de cultivo lícito. No mercado de Kinshasa, na República Democrática do Congo (RDC), um saco de 25 quilos de marijuana é vendido por mil dólares, enquanto um saco de 80 quilos de mandioca vale somente 10 dólares.
Compreende-se, assim, que o cultivo desta substância entorpecente tem sérias repercussões na auto-suficiência alimentar de diversos países africanos. Segundo a associação de luta à toxicomania de Kinshasa, LIPILDRO, por causa do abandono dos cultivos legais por aqueles da cânabis, até 2010 a maior parte das cidades congolesas será atingida por um crise alimentar.
Além disso, na RDC se verificaram experiências para o cultivo da papoula de ópio (na província do Equador) e da cocaína (na região do Shaba). O mais importante produtor da cânabis na África subsaariana permanece, porém, a África do Sul. Importante produções são sinalizadas também em Lesoto e em Malauí.

DROGAS SINTÉTICAS
A produção de drogas sintéticas é limitada na África, com exceção da África do Sul, onde a fabricação de metanfetaminas e methaqualone aumentou nos últimos anos. Os dados sobre a descoberta de laboratórios clandestinos confirmam esta tendência.
Com efeito, se passou da descoberta à destruição de um laboratório por ano no período 1995-1999, aos 17 no período 2000-2003, até aos 28 destruídos somente em 2004. Um outro dado que demonstra o incremento do uso de drogas sintéticas na África do Sul é o aumento das apreensões de ecstasy: em 2004, houve um incremento de 385% das apreensões em relação ao ano precedente.
Além disso, as drogas sintéticas faziam parte do programa de guerra secreta química e biológica aplicado pelo regime do apartheid. Segundo os testemunhos reunidos durante o processo contra o responsável do programa, doutor Wouter Basson (definido “Doutor Morte” pela imprensa local), no âmbito do chamado “Project Coast”, entre 1992 e 1993 os laboratórios relacionados aos serviços secretos sul-africanos tinham produzido mais de 900 quilos de cristais de ecstasy (correspondente a 73 milhões de pílulas). No ano precedente, uma empresa de serviços do regime do apartheid tinha importado 500 quilos desta substância da Croácia.
Essas quantidades de drogas sintéticas foram importadas e produzidas para serem usadas como agente incapacitador para o controle da multidão (e talvez também para drogar secretamente os líderes da oposição para desacreditá-los, fazendo-os cometer gestos ridículos em público) e para serem distribuídas nas favelas habitadas pela população negra para promover o abuso de droga e a dependência.
O fim do regime do apartheid bloqueou este e outros projetos criminais aplicados no âmbito do “Project Coast”. Antes da queda do regime, porém, o dr. Basson tinha organizado a venda das empresas de cobertura dos serviços secretos sul-africanos, alguns dos quais fabricavam armas químicas e biológicas e drogas sintéticas.
Além disso, desapareceram centenas de quilos de substâncias químicas usadas na produção desses instrumentos de morte.
O dr. Basson é suspeito de ter aberto um empresa privada e, com efeito, quando foi detido em 1997 foi encontrado em posse de pílulas de ecstasy num valor de 20 mil dólares.

ÁFRICA ORIENTAL: UMA SITUAÇÃO PREOCUPANTE
Na África oriental, o Quênia é o principal ponto de trânsito da cocaína. Somente em 2004 foi apreendida 1,1 tonelada de cocaína entre a capital Nairóbi e o centro costeiro de Malindi. No decorrer da operação da polícia, que levou à descoberta desta importante carga de droga, foram detidos diversos funcionários da companhia aérea local (que resultou estranha ao narcotráfico), alguns dos quais foram capturados em Londres.
Das investigações emergiu que a droga que passava pelo Quênia era inserida no mercado britânico com a colaboração de alguns funcionários infiéis da companhia aérea. Além do Quênia, os países da África oriental interessados pelo narcotráfico são Etiópia, Botsuana, Zâmbia e África do Sul. Neste último, segundo o South African Institute of International Affaire, existem 500 mil pessoas que fazem uso de cocaína, enquanto 1/3 dos adolescentes utiliza entorpecentes. Segundo o centro de estudos sul-africano, no país atuam 300 organizações criminais internacionais envolvidas no narcotráfico.
Os países da região se tornaram não somente uma região de trânsito, mas também um novo mercado para os entorpecentes e, em particular, para a cocaína. Na Zâmbia, por exemplo, 80% da cocaína que chega ao país é transferida para a Europa e o restante 20% é consumado localmente.
A Interpol lançou o alarme sobre o crescente consumo de entorpecentes na África. “As drogas não somente transitam nos países, mas permanecem lá”, disse um responsável da organização internacional de polícia diante dos delegados de 150 organismos de polícia de todo o mundo, reunidos para o encontro anual da Interpol no Rio de Janeiro (Brasil). “Já se tornaram habituais as cargas de diversas toneladas de cocaína que passam pela África”, acrescentou.
Segundo um analista presente no seminário, se a tendência ao incremento do uso de entorpecentes continuar avançando, a África deverá enfrentar uma grave crise social derivante da droga.
As condições climáticas da maior parte da África são favoráveis ao cultivo da cânabis. Trata-se de um cultivo que permite um alto lucro para o agricultor e necessita de um trabalho menos intensivo em relação aos outros cultivos.
Inteiras famílias de agricultores podem viver, assim, de modo decente e permitir-se comprar alimento e medicamentos e enviar seus filhos à escola.
A cânabis é cultivada na África principalmente para o mercado local, mas nos últimos anos notou-se um aumento dos tráficos da cânabis originados na África subsaariana. Os maiores cultivos da cânabis se encontram em Comores, Etiópia, Quênia, Madagascar, Tanzânia e Uganda.
No Quênia, o cultivo da cânabis tem uma antiga tradição, mas nos últimos anos se tornou primeiramente uma produção limitada ao mercado local, para depois transformar-se em uma verdadeira empresa comercial ilícita estendida internacionalmente.
A cânabis é cultivada na região ocidental e naquela do Monte Quênia, onde, segundo alguns relatórios, existem cerca de 1.500 hectares cultivados com a cânabis. Os cultivos de droga estão escondidos entre aqueles tradicionais destinados à alimentação, mas há também cultivos menores em algumas áreas protegidas da reserva natural nacional.
Também as regiões costeiras se tornaram produtores da cânabis. Lá, com efeito, se instalaram diversos agricultores provenientes do interior, que lá encontraram áreas férteis e pouco controladas pela polícia, e um mercado constituído pela população local, pelos turistas e pelos residentes estrangeiros que preferem as costas do país.
Quanto ao ópio, no passado foram sinalizados alguns cultivos no Quênia e nas costas de Madagascar. Desde 1993 não foram sinalizados cultivos de opiáceos na África oriental, mas a vastidão do território e os escassos controles das autoridades locais tornam sempre possível uma retomada do cultivo da papoula de ópio.
No que diz respeito à produção local de drogas sintéticas, a África oriental é o ponto de trânsito do methaqualone (Mandrax) proveniente da Índia e destinado ao mercado sul-africano.
Nos últimos anos, a redução do Mandrax proveniente da Índia gerou uma produção local desta substância. Com efeito, foram descobertos laboratórios químicos clandestinos utilizados para a fabricação desta droga sintética em alguns países da África oriental e meridional.
Nos casos dos laboratórios descobertos no Quênia e na Tanzânia, se tratava somente de pequenos centros onde o pó do Mandrax ainda proveniente da Índia era transformado em pílulas, mas em outros casos deparou-se com verdadeiras oficinas para a fabricação do Mandrax com precursores químicos, cuja proveniência permaneceu desconhecida. A este propósito, as substâncias que mais causam preocupação são as efedrinas, as pseudo-efedrinas, o anidrido acético e o ácido N-acetilantranílico (utilizado na fabricação do Mandrax) e o pergamenato de potássio.
O mais famoso cultivo de planta entorpecente local é o khat, que é uma produção legal em diversos países da África oriental. O khat é cultivado na Etiópia e no Quênia e, em medida menos extensa, na Tanzânia, Comores e na parte setentrional de Madagascar. É exportado para os principais mercados da área (Djibuti, Eritréia, Somália e Iêmen), além da Europa e da América setentrional.
O uso do khat continua a expandir-se no Chifre da África e tem um papel-chave na contínua instabilidade da Somália, onde se calcula que a população gasta todos os anos 64 milhões de dólares por ano para comprar o khat. Trata-se de um quantia que é quase o dobro do total das ajudas internacionais doadas ao país. O khat não somente contribui para provocar problemas na sociedade, criando pessoas afetadas pela dependência de entorpecentes, mas tem também um papel na difusão no país de armas leves, frequentemente repassadas em troca de um pouco de droga.
As organizações de narcotraficantes olham com interesse aos países da África oriental e meridional por causa de suas infra-estruturas portuárias e aeroportuárias, dos comprimentos de suas costas e dos fluxos turísticos.
Todos elementos que permitem esconder os tráficos de droga. O Quênia tem o maior porto comercial da região, Mombasa, que serve a maior parte dos países privados de acesso direto ao mar, enquanto o aeroporto de Nairóbi é um dos mais traficados da área. As redes do narcotráfico utilizam também os portos de Dar-es-Salaam (na Tanzânia), Djibuti, Durban (na África do Sul) e Maputo (em Moçambique) e estão expandindo suas atividades também na Etiópia, Mauritius, Tanzânia e Uganda. Esses últimos países são usados como pontos de trânsito para a droga enviada para o Quênia, a África do Sul e a África ocidental e dessas áreas para a Europa e a América do Norte.
A maior parte das substâncias entorpecentes chega à região via mar, escondida nas cargas dos containers transportados pelos navios mercantis que navegam o Oceano Índico. Em alguns casos, os navios dos narcotraficantes se encontram em alto mar com embarcações menores, que levam para a terra a carga ilícita. Grandes quantidades de heroína chegam assim à região, mas se recorre também a carteiros, homens e mulheres, que chegam com vôos comerciais, e ao envio por correio.
Entre os países da África oriental interessados pelo tráfico e pelo consumo de substâncias entorpecentes, está Uganda.
Segundo um recente relatório do UNODC, “Uganda se tornou o país líder no tráfico e no consumo de droga em relação ao restante dos Estados da África oriental”. Entre as drogas presentes no mercado ilícito ugandense, existem a cânabis, a heroína, a cocaína e o mandrax, além do khat. Segundo a agência anticrime da ONU, o aumento do consumo de substâncias entorpecentes é devido a “duas décadas de conflitos armados e à falta de lei, que prejudicaram gravemente a infra-estrutura policial”.
O relatório observa que as condições climáticas de todo o território ugandense são favoráveis ao cultivo da cânabis: “O cultivo ilícito da planta é, porém, relevante em áreas remotas das regiões meridional, ocidental, central, oriental e norte-oriental. As dimensões exatas dos cultivos da cânabis não são conhecidas, mas se notou um aumento da produção da cânabis sobretudo para a exportação”. O aeroporto de Entebbe é, por fim, utilizado como ponto de trânsito para o envio de heroína e de mandrax ao extremo Oriente e à África do Sul.

CONCLUSÕES
A África é um ponto de trânsito sempre mais importante para as organizações de narcotraficantes, apesar de, no momento, a maior parte das apreensões de entorpecentes ocorrer em outras partes do mundo.
Vista a escassa eficiência das polícias africanas e a relativa recente conscientização do problema por parte dos entes locais e internacionais, pode-se supor que a quantidade das apreensões de droga na África não corresponda à entidade efetiva das cargas que transitam pelo continente.
A África, porém, não é mais somente um ponto de passagem da droga proveniente da América Latina e da Ásia em direção à Europa e à América setentrional, mas já se tornou um mercado ainda talvez “residual”, mas em todo caso que não pode ser ignorado pelas redes de narcotraficantes.
Redes nas quais estão presentes africanos, em particular nigerianos, em papéis não somente de gregários, mas também de organizadores. O crescente consumo de drogas por via endovenosa em diversos países africanos, como Tanzânia e Quênia, agrava o problema da difusão da AIDS.
Na Nigéria, por exemplo, um estudo revelou que o consumo de drogas se expande no mesmo ritmo do aumento das pessoas infetadas com o vírus HIV, em cidades como Kano e Port Harcourt.

 
At 9/17/2007 3:10 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

A DROGA NA ÁFRICA: UM PROBLEMA MUNDIAL

A droga já é um problema na África e representa um ulterior obstáculo ao desenvolvimento do continente. É o que afirmam diversos organismos internacionais encarregados da luta ao tráfico de entorpecentes. Já em 2001, um relatório do Órgão Internacional de Controle das Drogas afirmava que “graças à sua experiência no campo do contrabando de haxixe e de heroína, os cartéis da droga da África ocidental buscam novos contatos na América Latina para estender o tráfico de cocaína a toda a região da África subsaariana”.
Trata-se de uma reviravolta fundamental na estratégia do narcotráfico mundial, que vê a África se tornar uma das áreas “fulcro” para a distribuição de drogas em todo o mundo. Até os primeiros anos da década de 90 do século passado, a África era mantida às margens das rotas da droga. A mudança ocorreu em 1993, quando foram apreendidos na Nigéria 300 quilos de heroína provenientes da Tailândia. É o sinal de uma mudança que vê a transformação de tantos pequenos contrabandistas africanos (a maioria nigerianos) de simples transportadores por conta de terceiros a membros de gangues guiadas por africanos, capazes de tratar no mesmo nível com análogas organizações de outros continentes.
A presença dessas organizações criminais, a forte urbanização, a perda dos valores tradicionais africanos e a difusão de uma cultura hedonista são todos fatores que criaram as premissas para um mercado africano da droga. A África, portanto, não é somente um local de trânsito dos entorpecentes, mas terreno “virgem” para o tráfico de droga.

PREMESSA METODOLÓGICA
Os dados apresentados são úteis para analisar a tendência (incremento ou decremento) do tráfico de entorpecentes, apesar de serem muito provavelmente aproximativos.
Segundo um estudo crítico efetuado pela associação ‘Libera’ do pe. Ciotti, com efeito os dados apresentados pelos entes antidrogas internacionais e de alguns Estados não relatam fielmente toda a produção mundial de cocaína. Segundo este estudo (referido somente à cocaína e não a outras drogas), existe uma discrepância entre a estimativa sobre a produção mundial de cocaína efetuada pela ONU e os dados relativos às apreensões e ao consumo de cocaína somente na América.
Segundo os elaboradores do relatório, com efeito, subtraindo das 937 toneladas de produção, indicada pelas Nações Unidas em 2004, as cerca de 450 consumadas nos Estados Unidos, Canadá, México e em toda a América do Sul e as cerca de 490 toneladas apreendidas em todas as Américas, se chegaria a um saldo negativo de 3 toneladas.
“A este ponto, não se saberia mais de onde subtrair as cerca de 99 toneladas de cocaína apreendidas no “resto do mundo”, afirma o relatório. Fazendo-o, se chegaria ao paradoxal saldo negativo de 102 toneladas de cocaína “não resultantes”, não tendo feito frente ainda à demanda de cocaína no “resto do mundo”, estimada em ao menos 300 toneladas, se chega a calcular uma espécie de buraco negro de aproximadamente 400 toneladas de cocaína não resultantes.
Este buraco negro assume proporções ainda mais macroscópicas, cerca de 700 toneladas, se calculado com base nos dados da Agência antidroga norte-americana.
Apesar dos seus limites, os relatórios dos organismos internacionais de luta contra a droga permanecem frequentemente os únicos instrumentos para analisar o fenômeno do narcotráfico.

A HEROÍNA NA ÁFRICA
A apreensão de opiáceos na África registrou um forte incremento nos últimos anos. Segundo dados da ONU, por exemplo, em 2004 ocorreu um incremento da apreensão de heroína de 60% em relação ao ano precedente.
A maior parte deste incremento é devido à apreensão ocorrida na África central e ocidental, que quase triplicou de 2003 a 2004. A heroína que passa pela África é destinada em primeiro lugar aos mercados europeus e, em segundo lugar, aos da América do Norte. A heroína provém dos países do sudoeste e sudeste da Ásia.
A quantia total dos opiáceos apreendida na África permanece ainda modesto (0,3% do total de apreensões em nível mundial). Porém, deve-se levar em consideração que não existem estatísticas confiáveis e que o nível das apreensões não reflete o verdadeiro fluxo de narcóticos que passa pela África por causa da debilidade da polícia local, que tem dificuldade em interceptar as cargas ilícitas.
No que concerne ao uso de opiáceos na África, segundo os dados do Departamento das Nações Unidas para a luta à criminalidade (UNODC), nota-se um aumento de seu consumo no continente africano, em particular na África oriental e naquela austral e em alguns países da África ocidental. Segundo os especialistas das Nações Unidas, o crescimento do consumo de heroína nessas áreas deriva do fato de que são utilizadas como locais de trânsito dos narcotraficantes, os quais, porém, não desdenham em criar um mercado local.
Na África do Sul, um dos poucos países africanos que dispõe de dados confiáveis, até os primeiros anos do novo milênio, o pedido de tratamentos por abuso de heroína representava somente 1% do total dos pedidos de cura por dependência de substâncias entorpecentes (incluído o álcool). Em 2005, esta porcentagem subiu para 7%.
Segundo o relatório do UNODC sobre o tráfico de entorpecentes de 2007, o mercado da heroína está dividido deste modo: a heroína afegã é destinada aos mercados da Ásia central, da Europa, do Oriente Médio e da África; aquela produzida no chamado “triângulo de ouro” alimenta o mercado chinês e o dos outros países asiáticos e da Oceania; aquela proveniente da América Latina serve o mercado norte-americano.
O relatório nota, porém, que “uma parte pequena, mas em crescimento, da produção de opiáceos afegãos é enviada à América setentrional, seja por meio da África oriental e ocidental, seja por meio da Europa”.
O relatório afirma que a demanda global de heroína permaneceu estável, “apesar de importantes incrementos nos países que se encontram no caminho das principais rotas do narcotráfico”.
Entre esses estão também diversos países africanos, afirma o documento, que destaca os efeitos prejudiciais da difusão da heroína e de outras substâncias entorpecentes nas populações já duramente provadas pela pobreza e pela difusão da AIDS.
Os últimos dados do UNODC mostram um forte incremento do uso de heroína em alguns países africanos como Moçambique, Zâmbia, Quênia, Tanzânia e Costa do Marfim, enquanto outros países tiveram um aumento mais contido. Entre esses, África do Sul, Madagascar, Gana, Libéria e Senegal.

DOS ANDES AO KILIMANJARO: UM FLUXO DE COCAÍNA INVADE A ÁFRICA
O dado mais preocupante, porém, é o da cocaína que transita da África em direção principalmente à Europa e, secundariamente, à América setentrional.
A importância da África, e em particular da África ocidental, como ponto de trânsito da cocaína em direção aos ricos mercados ocidentais é demonstrada pelo nível das apreensões registradas nos últimos anos. As apreensões de cocaína em toda a África aumentaram três vezes entre 2003 e 2004, enquanto no mesmo período as apreensões na África ocidental e central aumentaram seis vezes. As apreensões mais importantes no período 2000-2004 se registraram em Cabo Verde, seguido por África do Sul, Quênia, Gana e Nigéria. Mas as apreensões de cocaína na África representam somente 1% do total mundial das apreensões desta substância entorpecente. Também neste caso, porém, o dado é prejudicado devido à debilidade das polícias locais, incapazes de interceptar a maior parte dos fluxos de cocaína proveniente da América do Sul.
Em 2004, 50% das apreensões de cocaína no continente ocorreram na África ocidental e central. A zona de passagem mais utilizada pelos traficantes de cocaína é o Golfo da Guiné, de onde a substância entorpecente é transportada para a Europa em pequenas quantidades, através dos chamados “mulas”, pessoas que assumem o risco de ingerir óvulos de cocaína com a esperança de superar as alfândegas nos aeroportos de destinação. Nos últimos anos, também na África oriental aumentou a quantia de cocaína apreendida, indicando uma tendência a utilizar em medida crescente esta área como ponto de trânsito para a cocaína destinada à Europa e à Ásia.
Um dos países mais atingidos pelo fenômeno é o Quênia, onde em 2004 foi apreendida uma tonelada de cocaína. Em termos gerais, o crescimento da difusão da cocaína na África é demonstrada pelo fato que dos 32 países africanos que fornecem estatísticas sobre as apreensões de entorpecentes na UNODC, 23 (72%) relataram apreensões de cocaína, contra 34% em 1990.
Os traficantes de cocaína tendem a servir-se da África cada vez mais como ponto de trânsito por dois motivos. O primeiro deriva do melhoramento dos sistemas de inspeção utilizados pelas autoridades locais e por aquelas norte-americanas na área caribenha e centro-americana, tradicional rota utilizada pelos traficantes. Nos últimos anos, por exemplo, surgiram bases de inspeção norte-americanas dos Andes às ilhas caribenhas. Também as autoridades holandesas intensificaram a inspeção com patrulhas aéreas baseadas nas ilhas de Curaçao e Saint Martin.
O segundo fator está ligado à diminuição do consumo de cocaína, que se registrou nos Estados Unidos diante de um aumento da demanda na Europa. Se na América do Norte há o mais alto número de consumidores mundiais (6 milhões e meio, correspondente a cerca da metade do consumo mundial), a tendência é diminuir a demanda.
De 1998 a 2004, de fato, se registrou uma queda de 20% da difusão desta substância. No mesmo período, na Europa ocidental, onde os consumidores de cocaína são 3 milhões e meio (26% do total mundial), se notou um aumento do consumo e da difusão do “pó branco”. Na Espanha e no Reino Unido, este dado é de 2%.
A África, portanto, é uma cômoda e segura rota para alcançar um mercado em crescimento.
Além disso, como efeito colateral criou-se um mercado africano que está registrando nos últimos anos preocupantes aumentos.
A crescente disponibilidade de cocaína se traduz, com efeito, em um aumento do consumo desta substância na África. Segundo os dados do UNODC, no período 1992-2004 o abuso da cocaína na África cresceu em um ritmo mais sustentado do que no restante do mundo. Este incremento é mais remarcado nos países da África meridional e nos da África ocidental.
Se forem analisados os dados das pessoas que recorrem aos tratamentos de desintoxicação, o aumento do consumo de cocaína emerge com evidência. No início dos anos 90, as pessoas em tratamento por abuso de cocaína eram pouquíssimas, no final de 1996 constituíam 1.5% dos casos tratados pelas estruturas de recuperação dos toxicômanos, no biênio 1999-2000 eram 6%. No período 2001-2004, notou-se uma inflexão na porcentagem de pessoas que pediam para ser tratadas da dependência de cocaína (menos de 5%).
A partir do final de 2004, este dado está em crescimento: de 7,5% em 2004 passou-se a 8,5% nos primeiros meses de 2005.

A COCAÍNA NA ÁFRICA OCIDENTAL
O país tradicionalmente mais envolvido no narcotráfico é a Nigéria. Lá, com efeito, em 1993 houve a primeira grande apreensão de cocaína na África e as organizações criminais nigerianas estão perfeitamente inseridas no sistema criminal global e transnacional. A afirmação das máfias nigerianas deriva também da pertença da Nigéria ao Commonwealth, que permitiu abrir estreitas relações comerciais com o subcontinente indiano, produtor de ópio e de heroína, e com o mundo anglo-saxão consumidor.
No final dos anos 80, registrou-se um incremento importante no papel de centro estratégico e, em 1992, as apreensões de cocaína no aeroporto de Lagos foram tão relevantes que as autoridades nigerianas suspenderam os vôos diretos para o Rio de Janeiro. Desde então, os traficantes nigerianos são considerados os principais transportadores da droga, uma verdadeira indústria a serviço do comércio de heroína e da coca. Eles estão presentes em todos os pontos-chaves da produção e do tráfico de drogas. Graças aos compatriotas residentes no exterior, formaram clãs criminais comparáveis aos colombianos, turcos e chineses.
As organizações mafiosas nigerianas, como as outras, se baseiam na solidariedade étnica, de clã e de famílias. Já em 1995 as autoridades norte-americanas estimavam que 50% da heroína circulante em seu país era introduzida pelos nigerianos, os quais usam a Polônia e a Hungria como pontos de trânsito para a cocaína destinada à Europa ocidental.
Um dos países da África ocidental dos quais se têm estatísticas confiáveis sobre o incremento do tráfico de cocaína é Gana. Segundo os dados divulgados pelas autoridades locais, em um único ano as apreensões de cocaína aumentaram 40 vezes, passando dos 15 quilogramas de 2003 aos 617 quilos de 2004. A maior parte da cocaína é destinada ao mercado britânico.
Trata-se de um dado significativo, levando-se em consideração que, em termos porcentuais, as apreensões de cocaína aumentaram 18% em nível mundial e 4.000% em Gana de 2003 a 2004. No mesmo período, na África, as apreensões de cocaína aumentaram 3 vezes, passando das 1,1 tonelada para 3,6 toneladas.
Nos anos sucessivos, emergiram outros fatos que demonstram que Gana se tornou um importante ponto de passagem da cocaína na África ocidental. Em novembro de 2005, a polícia ganense apreendeu 588 quilos no decorrer de uma perquirição em uma habitação em East Lagon. Em abril de 2006, foram descobertos a bordo do navio MV Benjamin, atracado no porto de Tema, 2.310 quilos de cocaína.
Segundo um responsável do UNODC, as organizações de narcotraficantes tendem a fazer transitar a droga por meio da África ocidental porque, até agora, as autoridades alfandegárias européias e norte-americanas controlam com menos atenção as mercadorias e as bagagens provenientes da África em relação àquelas provenientes da América Latina. No caso de Gana, como de outros países da região, o fato de não estar inserido na lista dos países produtores de cocaína significa que as suas mercadorias não são sujeitas a inspeções detalhadas. Mas nos últimos anos, as coisas mudaram e Gana foi inserida na lista dos países “de alta prioridade” de inspeção.
Os traficantes buscam corromper os policiais e a polícia para permitir o trânsito das cargas de entorpecentes. Para investigar casos de corrupção de policiais, o Ministério da Fazenda de Gana criou uma Comissão de investigação, que recebeu o nome da sua Presidenta, Georgina Wood, que desempenhou importantes cargos na polícia e na magistratura local. O “Georgina Wood Committee” nasceu após duas importantes apreensões de cocaína citadas precedentemente, nas quais resultaram envolvidos alguns policiais. Entre as recomendações apresentadas pelo Comitê, está reforçar o patrulhamento das costas do país por meio seja da potenciação dos meios da marinha e da aeronáutica, seja com a criação de um serviço de guarda-costas independente.
A Guiné-Bissau é um outro país que se tornou ponto de trânsito da cocaína da América Latina à Europa, como demonstrado numa recente operação que levou à captura de 674 quilos de cocaína e à detenção de alguns narcotraficantes sul-americanos. Na África ocidental, os países mais envolvidos pelos fluxos de droga, além de Gana, são Costa do Marfim, Senegal e Nigéria.
Os traficantes de cocaína na Guiné-Bissau estão ligados aos que passam através do vizinho Senegal, como emergiu da operação efetuada no final de junho de 2007 pela polícia de Dakar, que levou à apreensão de mais de duas toneladas de cocaína. Parte da droga se encontrava em um veleiro que estava à deriva diante das costas senegalesas, e uma outra em uma habitação na área balneária de Mbour, a sul de Dakar.
No veleiro os investigadores encontraram uma documentação que comprova que os narcotraficantes utilizam a Guiné-Bissau como depósito de trânsito da cocaína proveniente da América Latina e destinada à Europa. Também a nacionalidade dos detidos demonstra o grau de internacionalização das organizações criminais dedicadas ao narcotráfico. Além de três cidadãos sul-americanos (um colombiano, um venezuelano e um equatoriano) e de uma cidadã francesa, a polícia deteve três senegaleses. A partir dos documentos detidos, além disso a polícia senegalesa descobriu que os narcotraficantes efetuaram diversas viagens aos países limítrofes: Serra Leoa, Guiné Conakry, Guiné-Bissau e Gâmbia.
As autoridades senegalesas reiteraram que em seu país não existem depósitos de cocaína, mas admitiram a infiltração de grupos criminais estrangeiros, que utilizam o aeroporto de Dakar para enviar cocaína à Europa. No período de janeiro a junho de 2007, a polícia senegalesa afirma ter apreendido no aeroporto de Dakar 44 quilos de cocaína e detido cerca de 30 “mulas” da droga, a maior parte dos quais nigeriano.
Está em aumento também o número de “mulas” da Guiné-Bissau detidos no momento do embarque para Portugal, onde podem entrar sem visto. Além disso, foram descobertas algumas operações de reciclagem de dinheiro sujo por parte de organizações estrangeiras. A apreensão recorde efetuada pela polícia senegalesa, equivalente ao total de apreensões de cocaína na África ocidental de setembro de 2006 a maio de 2007, é somente o último de uma série efetuada nos primeiros seis meses de 2007 em várias localidades da África ocidental.
Entre essas, há 800 quilos de cocaína recuperados no mar diante das ilhas Canárias, e uma quantia análoga apreendida pela marinha francesa no largo da Costa do Marfim. Além dos navios, as organizações criminais recorrem a aviões para alimentar seus tráficos ilícitos.
Na Venezuela foi bloqueado um avião com 2,5 toneladas de cocaína, que se preparava a partir para Serra Leoa, enquanto em maio de 2007 foram apreendidos 600 quilos de cocaína a bordo de um Cessna, matriculado na Venezuela, que efetuou uma aterrissagem de emergência em Nouadhibou, na Mauritânia.
Segundo um responsável do ONUDC, para a África ocidental o aumento de confiscos das cargas de cocaína na região é devido mais a incidentes de percurso que a uma maior eficácia da polícia.
O funcionário considera que a cada dez expedições de droga em direção à Europa, nove chegam a seu destino sem problemas.

O SAHEL: NOVA FRONTEIRA DO NARCOTRÁFICO?
Das costas da África ocidental as organizações de narcotraficantes estão progressivamente se expandindo aos países do Sahel, cujo papel estratégico entre o Atlântico e o Magreb, e, portanto o Mediterrâneo, é apreciado também pelos traficantes de seres humanos e, provavelmente, pelo terrorismo internacional. Não se pode excluir a priori uma interconexão entre essas realidades criminais, de que são cúmplices a debilidade dos Estados e a vastidão dos territórios a controlar. Um realidade que suscita o alarme dos governos interessados.
Em abril deste ano, depois da apreensão de três caminhões cheios de droga e armas, o Presidente do Níger, Mamadou Tandja, declarou que o exército local pretende aumentar os esforços para impedir que o seu país seja “circundado” pelos traficantes de armas e de droga, que são uma “ameaça real” para o país.
Também Burkina Fasso não foge ao fenômeno. Segundo o Coordenador do Comitê contra os tráficos ilícitos de droga em Burkina Fasso, o volume das cargas de droga interceptadas nos primeiros três meses de 2007 é “incrível”. O funcionário indica a existência de uma nova rota de trânsito da droga no oeste e no sudoeste do país. No início de abril de 2007, 49 quilos de cocaína, num valor de 10 milhões de dólares, foram interceptados pela polícia de Burkina Fasso na fronteira com o Mali, que é um importante ponto de trânsito para o tráfico de seres humanos. Países como Mali e Níger são há milênios atravessados por vias de caravanas, que agora se converteram num uso criminal: para o tráfico de seres humanos, mas também de armas, droga e cigarros de contrabando. “Nos últimos meses notamos um aumento da utilização dos países do Sahel, como Mali e Níger, para o tráfico de cocaína”, disse Antonio Razzitelli, Diretor do departamento do UNODC para a África ocidental.
Segundo o órgão anticrime da ONU, os traficantes importam a droga por meio das cidades costeiras como Conakry, na Guiné, Dakar, no Senegal, e Lomé, no Togo, e depois a transportam para as cidades do interior, como Bamako, no Mali, e Ouagadougou, em Burkina Fasso. Dessas localidades, a cocaína prossegue a sua viagem até a Europa.
Segundo o responsável do Comitê contra os tráficos ilícitos de droga em Burkina Fasso, é preciso coordenar os esforços entre as polícias dos Estados da região. “Há uma necessidade urgente de reunir todos os entes nacionais antidroga da região para encontrar o modo de cooperar entre si, para tentar deter as redes criminais”, disse, destacando que a escassa cooperação entre as fronteiras dos países do Sahel e a falta de meios das polícias locais constituem problemas adjuntos para uma eficaz ação de contraste às redes criminais.

O MERCADO DA CÂNABIS
Enquanto a África permanece, no momento, somente um local de trânsito e um mercado residual para drogas como cocaína e heroína, a principal produção local de substâncias entorpecentes é representada pela cânabis.
O cultivo da cânabis foi introduzido na África oriental pelos mercantes árabes, pérsios e indianos no século XII. De lá se difundiu primeiramente na África austral, no século XV, e depois no Congo e em Angola no século XIX. Somente depois da Segunda Guerra Mundial a cânabis chegou à África ocidental, levada por soldados nigerianos e ganenses que combateram com as tropas britânicas na Birmânia (atual Mianmar), onde adquiriram o hábito de fumar marijuana. Este fato explica porque nos países onde a cânabis é conhecida há mais tempo, ela é utilizada na medicina tradicional, enquanto na África ocidental é usada para fins “recreativos”. Até os anos 80, porém, a produção africana da cânabis permaneceu limitada. A partir daqueles anos, porém, notou-se um incremento notável da superfície cultivada com a cânabis para fins comerciais.
A produção desta substância se divide em três categorias: a erva da cânabis (flores e folhas), resina ou haxixe (secreções emitidas pela planta durante a fase de florescimento) e óleo de haxixe, o menos utilizado. Segundo o World Drug Report 2006, a erva da cânabis é cultivada, sobretudo de modo ilegal, em 176 países em todo o mundo. A África representa 27% da produção mundial e os principais produtores são Marrocos (3.700 toneladas), África do Sul (2.200 toneladas) e Nigéria (2 mil toneladas).
No que concerne ao haxixe, o principal produtor mundial é Marrocos, que fornece os mercados norte-africanos e europeus. Graças ao esforço das autoridades marroquinas nos últimos anos, deu-se a diminuição da produção local da cânabis, à qual corresponde um aumento da produção em outros países, da Ásia ocidental (Afeganistão, Paquistão) à Albânia. O UNODC reconhece que desde 2003 o governo de Rabat conduziu uma campanha para estimar a produção de resina da cânabis no país, em cooperação com a Agência anticrime das Nações Unidas. Segundo uma investigação efetuada em 2003, a produção da cânabis foi de 3.060 toneladas, cultivada em 134 mil hectares de terra na região do Rif (norte do país) por 96.600 famílias de camponeses. A investigação feita em 2004 registrou uma diminuição de 10% das terras cultivas com a cânabis, que passaram a 120.500 hectares, com uma produção estimada de 2.760 toneladas.
Em 2005 notou-se uma ulterior diminuição de 37%, sendo a superfície cultivada com a cânabis de 72.500 hectares, enquanto a produção diminuiu para 1.070 toneladas. Quanto às apreensões da cânabis, nos últimos 12-15 anos se registrou um aumento da porcentagem mundial de apreensões no continente africano desta substância. Enquanto em 1990 16% do total mundial das apreensões da cânabis ocorria na África, em 2002 este dado subiu para 20%, para alcançar 31% em 2004. O aumento das apreensões na África é determinado sobretudo pelo aumento dos controles policiais e alfandegários efetuados pela Nigéria e pela África do Sul.
O principal mercado de consumo da cânabis é a Europa ocidental, e 80% da cânabis consumada na Europa provém do Marrocos, passando pela Espanha e pela Holanda e dali distribuída aos outros países. O terceiro mercado mundial de consumo é representado pelos países do norte da África, onde a cânabis provém principalmente do Marrocos. Parte da cânabis produzida no Afeganistão e Paquistão, além disso, alimenta o mercado dos países da África oriental.
No que concerne às problemáticas sociais ligadas ao consumo da cânabis, é preciso recordar que esta substância é a droga mais difundida e usada em nível mundial. Estima-se que, em 2004, 162 milhões de pessoas a tenham usado, o equivalente a 3,9% da população mundial entre 15 e 64 anos. Em termos relativos (a porcentagem de habitantes que faz uso da cânabis em relação a outras substância entorpecentes), a cânabis é prevalentemente utilizada na Oceania, seguida por América do Norte e África. Desde 1992, na África, notou-se também uma tendência ao aumento do seu consumo, em particular na Argélia, Nigéria e Zâmbia.
É provável que a tendência ao uso desta droga seja subestimada em diversos países da África, que não têm uma capacidade de coleta de dados adequados para seguir o fenômeno. Segundo dados parciais, notou-se nos últimos anos um forte incremento do abuso da cânabis na África ocidental, oriental e no norte da África, em sintonia com a tendência em nível global de uma ulterior expansão do consumo desta substância.
Até os anos 80, porém, a produção africana da cânabis permaneceu limitada. A partir daqueles anos, porém, notou-se um incremento notável da superfície cultivada com a cânabis para fins comerciais.
A produção africana de droga subtraiu terras e recursos à agricultura, isso porque naquele período se registrou uma forte queda dos preços dos produtos agrícolas em todo o mundo. A agricultura africana, já frágil, entrou em crise. Diversos camponeses, portanto, deixaram-se tentar pelo cultivo da cânabis em detrimento do cultivo de produtos lícitos.
Um simples cálculo econômico demonstra o forte poder de atração de uma semelhante produção; já em 1995, na Guiné, um saco de 20-25 quilos de marijuana tinha o valor de aproximadamente a renda anual média de uma famílias de oitos pessoas que se dedica à produção de cultivo lícito. No mercado de Kinshasa, na República Democrática do Congo (RDC), um saco de 25 quilos de marijuana é vendido por mil dólares, enquanto um saco de 80 quilos de mandioca vale somente 10 dólares.
Compreende-se, assim, que o cultivo desta substância entorpecente tem sérias repercussões na auto-suficiência alimentar de diversos países africanos. Segundo a associação de luta à toxicomania de Kinshasa, LIPILDRO, por causa do abandono dos cultivos legais por aqueles da cânabis, até 2010 a maior parte das cidades congolesas será atingida por um crise alimentar.
Além disso, na RDC se verificaram experiências para o cultivo da papoula de ópio (na província do Equador) e da cocaína (na região do Shaba). O mais importante produtor da cânabis na África subsaariana permanece, porém, a África do Sul. Importante produções são sinalizadas também em Lesoto e em Malauí.

DROGAS SINTÉTICAS
A produção de drogas sintéticas é limitada na África, com exceção da África do Sul, onde a fabricação de metanfetaminas e methaqualone aumentou nos últimos anos. Os dados sobre a descoberta de laboratórios clandestinos confirmam esta tendência.
Com efeito, se passou da descoberta à destruição de um laboratório por ano no período 1995-1999, aos 17 no período 2000-2003, até aos 28 destruídos somente em 2004. Um outro dado que demonstra o incremento do uso de drogas sintéticas na África do Sul é o aumento das apreensões de ecstasy: em 2004, houve um incremento de 385% das apreensões em relação ao ano precedente.
Além disso, as drogas sintéticas faziam parte do programa de guerra secreta química e biológica aplicado pelo regime do apartheid. Segundo os testemunhos reunidos durante o processo contra o responsável do programa, doutor Wouter Basson (definido “Doutor Morte” pela imprensa local), no âmbito do chamado “Project Coast”, entre 1992 e 1993 os laboratórios relacionados aos serviços secretos sul-africanos tinham produzido mais de 900 quilos de cristais de ecstasy (correspondente a 73 milhões de pílulas). No ano precedente, uma empresa de serviços do regime do apartheid tinha importado 500 quilos desta substância da Croácia.
Essas quantidades de drogas sintéticas foram importadas e produzidas para serem usadas como agente incapacitador para o controle da multidão (e talvez também para drogar secretamente os líderes da oposição para desacreditá-los, fazendo-os cometer gestos ridículos em público) e para serem distribuídas nas favelas habitadas pela população negra para promover o abuso de droga e a dependência.
O fim do regime do apartheid bloqueou este e outros projetos criminais aplicados no âmbito do “Project Coast”. Antes da queda do regime, porém, o dr. Basson tinha organizado a venda das empresas de cobertura dos serviços secretos sul-africanos, alguns dos quais fabricavam armas químicas e biológicas e drogas sintéticas.
Além disso, desapareceram centenas de quilos de substâncias químicas usadas na produção desses instrumentos de morte.
O dr. Basson é suspeito de ter aberto um empresa privada e, com efeito, quando foi detido em 1997 foi encontrado em posse de pílulas de ecstasy num valor de 20 mil dólares.

ÁFRICA ORIENTAL: UMA SITUAÇÃO PREOCUPANTE
Na África oriental, o Quênia é o principal ponto de trânsito da cocaína. Somente em 2004 foi apreendida 1,1 tonelada de cocaína entre a capital Nairóbi e o centro costeiro de Malindi. No decorrer da operação da polícia, que levou à descoberta desta importante carga de droga, foram detidos diversos funcionários da companhia aérea local (que resultou estranha ao narcotráfico), alguns dos quais foram capturados em Londres.
Das investigações emergiu que a droga que passava pelo Quênia era inserida no mercado britânico com a colaboração de alguns funcionários infiéis da companhia aérea. Além do Quênia, os países da África oriental interessados pelo narcotráfico são Etiópia, Botsuana, Zâmbia e África do Sul. Neste último, segundo o South African Institute of International Affaire, existem 500 mil pessoas que fazem uso de cocaína, enquanto 1/3 dos adolescentes utiliza entorpecentes. Segundo o centro de estudos sul-africano, no país atuam 300 organizações criminais internacionais envolvidas no narcotráfico.
Os países da região se tornaram não somente uma região de trânsito, mas também um novo mercado para os entorpecentes e, em particular, para a cocaína. Na Zâmbia, por exemplo, 80% da cocaína que chega ao país é transferida para a Europa e o restante 20% é consumado localmente.
A Interpol lançou o alarme sobre o crescente consumo de entorpecentes na África. “As drogas não somente transitam nos países, mas permanecem lá”, disse um responsável da organização internacional de polícia diante dos delegados de 150 organismos de polícia de todo o mundo, reunidos para o encontro anual da Interpol no Rio de Janeiro (Brasil). “Já se tornaram habituais as cargas de diversas toneladas de cocaína que passam pela África”, acrescentou.
Segundo um analista presente no seminário, se a tendência ao incremento do uso de entorpecentes continuar avançando, a África deverá enfrentar uma grave crise social derivante da droga.
As condições climáticas da maior parte da África são favoráveis ao cultivo da cânabis. Trata-se de um cultivo que permite um alto lucro para o agricultor e necessita de um trabalho menos intensivo em relação aos outros cultivos.
Inteiras famílias de agricultores podem viver, assim, de modo decente e permitir-se comprar alimento e medicamentos e enviar seus filhos à escola.
A cânabis é cultivada na África principalmente para o mercado local, mas nos últimos anos notou-se um aumento dos tráficos da cânabis originados na África subsaariana. Os maiores cultivos da cânabis se encontram em Comores, Etiópia, Quênia, Madagascar, Tanzânia e Uganda.
No Quênia, o cultivo da cânabis tem uma antiga tradição, mas nos últimos anos se tornou primeiramente uma produção limitada ao mercado local, para depois transformar-se em uma verdadeira empresa comercial ilícita estendida internacionalmente.
A cânabis é cultivada na região ocidental e naquela do Monte Quênia, onde, segundo alguns relatórios, existem cerca de 1.500 hectares cultivados com a cânabis. Os cultivos de droga estão escondidos entre aqueles tradicionais destinados à alimentação, mas há também cultivos menores em algumas áreas protegidas da reserva natural nacional.
Também as regiões costeiras se tornaram produtores da cânabis. Lá, com efeito, se instalaram diversos agricultores provenientes do interior, que lá encontraram áreas férteis e pouco controladas pela polícia, e um mercado constituído pela população local, pelos turistas e pelos residentes estrangeiros que preferem as costas do país.
Quanto ao ópio, no passado foram sinalizados alguns cultivos no Quênia e nas costas de Madagascar. Desde 1993 não foram sinalizados cultivos de opiáceos na África oriental, mas a vastidão do território e os escassos controles das autoridades locais tornam sempre possível uma retomada do cultivo da papoula de ópio.
No que diz respeito à produção local de drogas sintéticas, a África oriental é o ponto de trânsito do methaqualone (Mandrax) proveniente da Índia e destinado ao mercado sul-africano.
Nos últimos anos, a redução do Mandrax proveniente da Índia gerou uma produção local desta substância. Com efeito, foram descobertos laboratórios químicos clandestinos utilizados para a fabricação desta droga sintética em alguns países da África oriental e meridional.
Nos casos dos laboratórios descobertos no Quênia e na Tanzânia, se tratava somente de pequenos centros onde o pó do Mandrax ainda proveniente da Índia era transformado em pílulas, mas em outros casos deparou-se com verdadeiras oficinas para a fabricação do Mandrax com precursores químicos, cuja proveniência permaneceu desconhecida. A este propósito, as substâncias que mais causam preocupação são as efedrinas, as pseudo-efedrinas, o anidrido acético e o ácido N-acetilantranílico (utilizado na fabricação do Mandrax) e o pergamenato de potássio.
O mais famoso cultivo de planta entorpecente local é o khat, que é uma produção legal em diversos países da África oriental. O khat é cultivado na Etiópia e no Quênia e, em medida menos extensa, na Tanzânia, Comores e na parte setentrional de Madagascar. É exportado para os principais mercados da área (Djibuti, Eritréia, Somália e Iêmen), além da Europa e da América setentrional.
O uso do khat continua a expandir-se no Chifre da África e tem um papel-chave na contínua instabilidade da Somália, onde se calcula que a população gasta todos os anos 64 milhões de dólares por ano para comprar o khat. Trata-se de um quantia que é quase o dobro do total das ajudas internacionais doadas ao país. O khat não somente contribui para provocar problemas na sociedade, criando pessoas afetadas pela dependência de entorpecentes, mas tem também um papel na difusão no país de armas leves, frequentemente repassadas em troca de um pouco de droga.
As organizações de narcotraficantes olham com interesse aos países da África oriental e meridional por causa de suas infra-estruturas portuárias e aeroportuárias, dos comprimentos de suas costas e dos fluxos turísticos.
Todos elementos que permitem esconder os tráficos de droga. O Quênia tem o maior porto comercial da região, Mombasa, que serve a maior parte dos países privados de acesso direto ao mar, enquanto o aeroporto de Nairóbi é um dos mais traficados da área. As redes do narcotráfico utilizam também os portos de Dar-es-Salaam (na Tanzânia), Djibuti, Durban (na África do Sul) e Maputo (em Moçambique) e estão expandindo suas atividades também na Etiópia, Mauritius, Tanzânia e Uganda. Esses últimos países são usados como pontos de trânsito para a droga enviada para o Quênia, a África do Sul e a África ocidental e dessas áreas para a Europa e a América do Norte.
A maior parte das substâncias entorpecentes chega à região via mar, escondida nas cargas dos containers transportados pelos navios mercantis que navegam o Oceano Índico. Em alguns casos, os navios dos narcotraficantes se encontram em alto mar com embarcações menores, que levam para a terra a carga ilícita. Grandes quantidades de heroína chegam assim à região, mas se recorre também a carteiros, homens e mulheres, que chegam com vôos comerciais, e ao envio por correio.
Entre os países da África oriental interessados pelo tráfico e pelo consumo de substâncias entorpecentes, está Uganda.
Segundo um recente relatório do UNODC, “Uganda se tornou o país líder no tráfico e no consumo de droga em relação ao restante dos Estados da África oriental”. Entre as drogas presentes no mercado ilícito ugandense, existem a cânabis, a heroína, a cocaína e o mandrax, além do khat. Segundo a agência anticrime da ONU, o aumento do consumo de substâncias entorpecentes é devido a “duas décadas de conflitos armados e à falta de lei, que prejudicaram gravemente a infra-estrutura policial”.
O relatório observa que as condições climáticas de todo o território ugandense são favoráveis ao cultivo da cânabis: “O cultivo ilícito da planta é, porém, relevante em áreas remotas das regiões meridional, ocidental, central, oriental e norte-oriental. As dimensões exatas dos cultivos da cânabis não são conhecidas, mas se notou um aumento da produção da cânabis sobretudo para a exportação”. O aeroporto de Entebbe é, por fim, utilizado como ponto de trânsito para o envio de heroína e de mandrax ao extremo Oriente e à África do Sul.

CONCLUSÕES
A África é um ponto de trânsito sempre mais importante para as organizações de narcotraficantes, apesar de, no momento, a maior parte das apreensões de entorpecentes ocorrer em outras partes do mundo.
Vista a escassa eficiência das polícias africanas e a relativa recente conscientização do problema por parte dos entes locais e internacionais, pode-se supor que a quantidade das apreensões de droga na África não corresponda à entidade efetiva das cargas que transitam pelo continente.
A África, porém, não é mais somente um ponto de passagem da droga proveniente da América Latina e da Ásia em direção à Europa e à América setentrional, mas já se tornou um mercado ainda talvez “residual”, mas em todo caso que não pode ser ignorado pelas redes de narcotraficantes.
Redes nas quais estão presentes africanos, em particular nigerianos, em papéis não somente de gregários, mas também de organizadores. O crescente consumo de drogas por via endovenosa em diversos países africanos, como Tanzânia e Quênia, agrava o problema da difusão da AIDS.
Na Nigéria, por exemplo, um estudo revelou que o consumo de drogas se expande no mesmo ritmo do aumento das pessoas infetadas com o vírus HIV, em cidades como Kano e Port Harcourt.

 
At 9/17/2007 3:10 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

A DROGA NA ÁFRICA: UM PROBLEMA MUNDIAL

A droga já é um problema na África e representa um ulterior obstáculo ao desenvolvimento do continente. É o que afirmam diversos organismos internacionais encarregados da luta ao tráfico de entorpecentes. Já em 2001, um relatório do Órgão Internacional de Controle das Drogas afirmava que “graças à sua experiência no campo do contrabando de haxixe e de heroína, os cartéis da droga da África ocidental buscam novos contatos na América Latina para estender o tráfico de cocaína a toda a região da África subsaariana”.
Trata-se de uma reviravolta fundamental na estratégia do narcotráfico mundial, que vê a África se tornar uma das áreas “fulcro” para a distribuição de drogas em todo o mundo. Até os primeiros anos da década de 90 do século passado, a África era mantida às margens das rotas da droga. A mudança ocorreu em 1993, quando foram apreendidos na Nigéria 300 quilos de heroína provenientes da Tailândia. É o sinal de uma mudança que vê a transformação de tantos pequenos contrabandistas africanos (a maioria nigerianos) de simples transportadores por conta de terceiros a membros de gangues guiadas por africanos, capazes de tratar no mesmo nível com análogas organizações de outros continentes.
A presença dessas organizações criminais, a forte urbanização, a perda dos valores tradicionais africanos e a difusão de uma cultura hedonista são todos fatores que criaram as premissas para um mercado africano da droga. A África, portanto, não é somente um local de trânsito dos entorpecentes, mas terreno “virgem” para o tráfico de droga.

PREMESSA METODOLÓGICA
Os dados apresentados são úteis para analisar a tendência (incremento ou decremento) do tráfico de entorpecentes, apesar de serem muito provavelmente aproximativos.
Segundo um estudo crítico efetuado pela associação ‘Libera’ do pe. Ciotti, com efeito os dados apresentados pelos entes antidrogas internacionais e de alguns Estados não relatam fielmente toda a produção mundial de cocaína. Segundo este estudo (referido somente à cocaína e não a outras drogas), existe uma discrepância entre a estimativa sobre a produção mundial de cocaína efetuada pela ONU e os dados relativos às apreensões e ao consumo de cocaína somente na América.
Segundo os elaboradores do relatório, com efeito, subtraindo das 937 toneladas de produção, indicada pelas Nações Unidas em 2004, as cerca de 450 consumadas nos Estados Unidos, Canadá, México e em toda a América do Sul e as cerca de 490 toneladas apreendidas em todas as Américas, se chegaria a um saldo negativo de 3 toneladas.
“A este ponto, não se saberia mais de onde subtrair as cerca de 99 toneladas de cocaína apreendidas no “resto do mundo”, afirma o relatório. Fazendo-o, se chegaria ao paradoxal saldo negativo de 102 toneladas de cocaína “não resultantes”, não tendo feito frente ainda à demanda de cocaína no “resto do mundo”, estimada em ao menos 300 toneladas, se chega a calcular uma espécie de buraco negro de aproximadamente 400 toneladas de cocaína não resultantes.
Este buraco negro assume proporções ainda mais macroscópicas, cerca de 700 toneladas, se calculado com base nos dados da Agência antidroga norte-americana.
Apesar dos seus limites, os relatórios dos organismos internacionais de luta contra a droga permanecem frequentemente os únicos instrumentos para analisar o fenômeno do narcotráfico.

A HEROÍNA NA ÁFRICA
A apreensão de opiáceos na África registrou um forte incremento nos últimos anos. Segundo dados da ONU, por exemplo, em 2004 ocorreu um incremento da apreensão de heroína de 60% em relação ao ano precedente.
A maior parte deste incremento é devido à apreensão ocorrida na África central e ocidental, que quase triplicou de 2003 a 2004. A heroína que passa pela África é destinada em primeiro lugar aos mercados europeus e, em segundo lugar, aos da América do Norte. A heroína provém dos países do sudoeste e sudeste da Ásia.
A quantia total dos opiáceos apreendida na África permanece ainda modesto (0,3% do total de apreensões em nível mundial). Porém, deve-se levar em consideração que não existem estatísticas confiáveis e que o nível das apreensões não reflete o verdadeiro fluxo de narcóticos que passa pela África por causa da debilidade da polícia local, que tem dificuldade em interceptar as cargas ilícitas.
No que concerne ao uso de opiáceos na África, segundo os dados do Departamento das Nações Unidas para a luta à criminalidade (UNODC), nota-se um aumento de seu consumo no continente africano, em particular na África oriental e naquela austral e em alguns países da África ocidental. Segundo os especialistas das Nações Unidas, o crescimento do consumo de heroína nessas áreas deriva do fato de que são utilizadas como locais de trânsito dos narcotraficantes, os quais, porém, não desdenham em criar um mercado local.
Na África do Sul, um dos poucos países africanos que dispõe de dados confiáveis, até os primeiros anos do novo milênio, o pedido de tratamentos por abuso de heroína representava somente 1% do total dos pedidos de cura por dependência de substâncias entorpecentes (incluído o álcool). Em 2005, esta porcentagem subiu para 7%.
Segundo o relatório do UNODC sobre o tráfico de entorpecentes de 2007, o mercado da heroína está dividido deste modo: a heroína afegã é destinada aos mercados da Ásia central, da Europa, do Oriente Médio e da África; aquela produzida no chamado “triângulo de ouro” alimenta o mercado chinês e o dos outros países asiáticos e da Oceania; aquela proveniente da América Latina serve o mercado norte-americano.
O relatório nota, porém, que “uma parte pequena, mas em crescimento, da produção de opiáceos afegãos é enviada à América setentrional, seja por meio da África oriental e ocidental, seja por meio da Europa”.
O relatório afirma que a demanda global de heroína permaneceu estável, “apesar de importantes incrementos nos países que se encontram no caminho das principais rotas do narcotráfico”.
Entre esses estão também diversos países africanos, afirma o documento, que destaca os efeitos prejudiciais da difusão da heroína e de outras substâncias entorpecentes nas populações já duramente provadas pela pobreza e pela difusão da AIDS.
Os últimos dados do UNODC mostram um forte incremento do uso de heroína em alguns países africanos como Moçambique, Zâmbia, Quênia, Tanzânia e Costa do Marfim, enquanto outros países tiveram um aumento mais contido. Entre esses, África do Sul, Madagascar, Gana, Libéria e Senegal.

DOS ANDES AO KILIMANJARO: UM FLUXO DE COCAÍNA INVADE A ÁFRICA
O dado mais preocupante, porém, é o da cocaína que transita da África em direção principalmente à Europa e, secundariamente, à América setentrional.
A importância da África, e em particular da África ocidental, como ponto de trânsito da cocaína em direção aos ricos mercados ocidentais é demonstrada pelo nível das apreensões registradas nos últimos anos. As apreensões de cocaína em toda a África aumentaram três vezes entre 2003 e 2004, enquanto no mesmo período as apreensões na África ocidental e central aumentaram seis vezes. As apreensões mais importantes no período 2000-2004 se registraram em Cabo Verde, seguido por África do Sul, Quênia, Gana e Nigéria. Mas as apreensões de cocaína na África representam somente 1% do total mundial das apreensões desta substância entorpecente. Também neste caso, porém, o dado é prejudicado devido à debilidade das polícias locais, incapazes de interceptar a maior parte dos fluxos de cocaína proveniente da América do Sul.
Em 2004, 50% das apreensões de cocaína no continente ocorreram na África ocidental e central. A zona de passagem mais utilizada pelos traficantes de cocaína é o Golfo da Guiné, de onde a substância entorpecente é transportada para a Europa em pequenas quantidades, através dos chamados “mulas”, pessoas que assumem o risco de ingerir óvulos de cocaína com a esperança de superar as alfândegas nos aeroportos de destinação. Nos últimos anos, também na África oriental aumentou a quantia de cocaína apreendida, indicando uma tendência a utilizar em medida crescente esta área como ponto de trânsito para a cocaína destinada à Europa e à Ásia.
Um dos países mais atingidos pelo fenômeno é o Quênia, onde em 2004 foi apreendida uma tonelada de cocaína. Em termos gerais, o crescimento da difusão da cocaína na África é demonstrada pelo fato que dos 32 países africanos que fornecem estatísticas sobre as apreensões de entorpecentes na UNODC, 23 (72%) relataram apreensões de cocaína, contra 34% em 1990.
Os traficantes de cocaína tendem a servir-se da África cada vez mais como ponto de trânsito por dois motivos. O primeiro deriva do melhoramento dos sistemas de inspeção utilizados pelas autoridades locais e por aquelas norte-americanas na área caribenha e centro-americana, tradicional rota utilizada pelos traficantes. Nos últimos anos, por exemplo, surgiram bases de inspeção norte-americanas dos Andes às ilhas caribenhas. Também as autoridades holandesas intensificaram a inspeção com patrulhas aéreas baseadas nas ilhas de Curaçao e Saint Martin.
O segundo fator está ligado à diminuição do consumo de cocaína, que se registrou nos Estados Unidos diante de um aumento da demanda na Europa. Se na América do Norte há o mais alto número de consumidores mundiais (6 milhões e meio, correspondente a cerca da metade do consumo mundial), a tendência é diminuir a demanda.
De 1998 a 2004, de fato, se registrou uma queda de 20% da difusão desta substância. No mesmo período, na Europa ocidental, onde os consumidores de cocaína são 3 milhões e meio (26% do total mundial), se notou um aumento do consumo e da difusão do “pó branco”. Na Espanha e no Reino Unido, este dado é de 2%.
A África, portanto, é uma cômoda e segura rota para alcançar um mercado em crescimento.
Além disso, como efeito colateral criou-se um mercado africano que está registrando nos últimos anos preocupantes aumentos.
A crescente disponibilidade de cocaína se traduz, com efeito, em um aumento do consumo desta substância na África. Segundo os dados do UNODC, no período 1992-2004 o abuso da cocaína na África cresceu em um ritmo mais sustentado do que no restante do mundo. Este incremento é mais remarcado nos países da África meridional e nos da África ocidental.
Se forem analisados os dados das pessoas que recorrem aos tratamentos de desintoxicação, o aumento do consumo de cocaína emerge com evidência. No início dos anos 90, as pessoas em tratamento por abuso de cocaína eram pouquíssimas, no final de 1996 constituíam 1.5% dos casos tratados pelas estruturas de recuperação dos toxicômanos, no biênio 1999-2000 eram 6%. No período 2001-2004, notou-se uma inflexão na porcentagem de pessoas que pediam para ser tratadas da dependência de cocaína (menos de 5%).
A partir do final de 2004, este dado está em crescimento: de 7,5% em 2004 passou-se a 8,5% nos primeiros meses de 2005.

A COCAÍNA NA ÁFRICA OCIDENTAL
O país tradicionalmente mais envolvido no narcotráfico é a Nigéria. Lá, com efeito, em 1993 houve a primeira grande apreensão de cocaína na África e as organizações criminais nigerianas estão perfeitamente inseridas no sistema criminal global e transnacional. A afirmação das máfias nigerianas deriva também da pertença da Nigéria ao Commonwealth, que permitiu abrir estreitas relações comerciais com o subcontinente indiano, produtor de ópio e de heroína, e com o mundo anglo-saxão consumidor.
No final dos anos 80, registrou-se um incremento importante no papel de centro estratégico e, em 1992, as apreensões de cocaína no aeroporto de Lagos foram tão relevantes que as autoridades nigerianas suspenderam os vôos diretos para o Rio de Janeiro. Desde então, os traficantes nigerianos são considerados os principais transportadores da droga, uma verdadeira indústria a serviço do comércio de heroína e da coca. Eles estão presentes em todos os pontos-chaves da produção e do tráfico de drogas. Graças aos compatriotas residentes no exterior, formaram clãs criminais comparáveis aos colombianos, turcos e chineses.
As organizações mafiosas nigerianas, como as outras, se baseiam na solidariedade étnica, de clã e de famílias. Já em 1995 as autoridades norte-americanas estimavam que 50% da heroína circulante em seu país era introduzida pelos nigerianos, os quais usam a Polônia e a Hungria como pontos de trânsito para a cocaína destinada à Europa ocidental.
Um dos países da África ocidental dos quais se têm estatísticas confiáveis sobre o incremento do tráfico de cocaína é Gana. Segundo os dados divulgados pelas autoridades locais, em um único ano as apreensões de cocaína aumentaram 40 vezes, passando dos 15 quilogramas de 2003 aos 617 quilos de 2004. A maior parte da cocaína é destinada ao mercado britânico.
Trata-se de um dado significativo, levando-se em consideração que, em termos porcentuais, as apreensões de cocaína aumentaram 18% em nível mundial e 4.000% em Gana de 2003 a 2004. No mesmo período, na África, as apreensões de cocaína aumentaram 3 vezes, passando das 1,1 tonelada para 3,6 toneladas.
Nos anos sucessivos, emergiram outros fatos que demonstram que Gana se tornou um importante ponto de passagem da cocaína na África ocidental. Em novembro de 2005, a polícia ganense apreendeu 588 quilos no decorrer de uma perquirição em uma habitação em East Lagon. Em abril de 2006, foram descobertos a bordo do navio MV Benjamin, atracado no porto de Tema, 2.310 quilos de cocaína.
Segundo um responsável do UNODC, as organizações de narcotraficantes tendem a fazer transitar a droga por meio da África ocidental porque, até agora, as autoridades alfandegárias européias e norte-americanas controlam com menos atenção as mercadorias e as bagagens provenientes da África em relação àquelas provenientes da América Latina. No caso de Gana, como de outros países da região, o fato de não estar inserido na lista dos países produtores de cocaína significa que as suas mercadorias não são sujeitas a inspeções detalhadas. Mas nos últimos anos, as coisas mudaram e Gana foi inserida na lista dos países “de alta prioridade” de inspeção.
Os traficantes buscam corromper os policiais e a polícia para permitir o trânsito das cargas de entorpecentes. Para investigar casos de corrupção de policiais, o Ministério da Fazenda de Gana criou uma Comissão de investigação, que recebeu o nome da sua Presidenta, Georgina Wood, que desempenhou importantes cargos na polícia e na magistratura local. O “Georgina Wood Committee” nasceu após duas importantes apreensões de cocaína citadas precedentemente, nas quais resultaram envolvidos alguns policiais. Entre as recomendações apresentadas pelo Comitê, está reforçar o patrulhamento das costas do país por meio seja da potenciação dos meios da marinha e da aeronáutica, seja com a criação de um serviço de guarda-costas independente.
A Guiné-Bissau é um outro país que se tornou ponto de trânsito da cocaína da América Latina à Europa, como demonstrado numa recente operação que levou à captura de 674 quilos de cocaína e à detenção de alguns narcotraficantes sul-americanos. Na África ocidental, os países mais envolvidos pelos fluxos de droga, além de Gana, são Costa do Marfim, Senegal e Nigéria.
Os traficantes de cocaína na Guiné-Bissau estão ligados aos que passam através do vizinho Senegal, como emergiu da operação efetuada no final de junho de 2007 pela polícia de Dakar, que levou à apreensão de mais de duas toneladas de cocaína. Parte da droga se encontrava em um veleiro que estava à deriva diante das costas senegalesas, e uma outra em uma habitação na área balneária de Mbour, a sul de Dakar.
No veleiro os investigadores encontraram uma documentação que comprova que os narcotraficantes utilizam a Guiné-Bissau como depósito de trânsito da cocaína proveniente da América Latina e destinada à Europa. Também a nacionalidade dos detidos demonstra o grau de internacionalização das organizações criminais dedicadas ao narcotráfico. Além de três cidadãos sul-americanos (um colombiano, um venezuelano e um equatoriano) e de uma cidadã francesa, a polícia deteve três senegaleses. A partir dos documentos detidos, além disso a polícia senegalesa descobriu que os narcotraficantes efetuaram diversas viagens aos países limítrofes: Serra Leoa, Guiné Conakry, Guiné-Bissau e Gâmbia.
As autoridades senegalesas reiteraram que em seu país não existem depósitos de cocaína, mas admitiram a infiltração de grupos criminais estrangeiros, que utilizam o aeroporto de Dakar para enviar cocaína à Europa. No período de janeiro a junho de 2007, a polícia senegalesa afirma ter apreendido no aeroporto de Dakar 44 quilos de cocaína e detido cerca de 30 “mulas” da droga, a maior parte dos quais nigeriano.
Está em aumento também o número de “mulas” da Guiné-Bissau detidos no momento do embarque para Portugal, onde podem entrar sem visto. Além disso, foram descobertas algumas operações de reciclagem de dinheiro sujo por parte de organizações estrangeiras. A apreensão recorde efetuada pela polícia senegalesa, equivalente ao total de apreensões de cocaína na África ocidental de setembro de 2006 a maio de 2007, é somente o último de uma série efetuada nos primeiros seis meses de 2007 em várias localidades da África ocidental.
Entre essas, há 800 quilos de cocaína recuperados no mar diante das ilhas Canárias, e uma quantia análoga apreendida pela marinha francesa no largo da Costa do Marfim. Além dos navios, as organizações criminais recorrem a aviões para alimentar seus tráficos ilícitos.
Na Venezuela foi bloqueado um avião com 2,5 toneladas de cocaína, que se preparava a partir para Serra Leoa, enquanto em maio de 2007 foram apreendidos 600 quilos de cocaína a bordo de um Cessna, matriculado na Venezuela, que efetuou uma aterrissagem de emergência em Nouadhibou, na Mauritânia.
Segundo um responsável do ONUDC, para a África ocidental o aumento de confiscos das cargas de cocaína na região é devido mais a incidentes de percurso que a uma maior eficácia da polícia.
O funcionário considera que a cada dez expedições de droga em direção à Europa, nove chegam a seu destino sem problemas.

O SAHEL: NOVA FRONTEIRA DO NARCOTRÁFICO?
Das costas da África ocidental as organizações de narcotraficantes estão progressivamente se expandindo aos países do Sahel, cujo papel estratégico entre o Atlântico e o Magreb, e, portanto o Mediterrâneo, é apreciado também pelos traficantes de seres humanos e, provavelmente, pelo terrorismo internacional. Não se pode excluir a priori uma interconexão entre essas realidades criminais, de que são cúmplices a debilidade dos Estados e a vastidão dos territórios a controlar. Um realidade que suscita o alarme dos governos interessados.
Em abril deste ano, depois da apreensão de três caminhões cheios de droga e armas, o Presidente do Níger, Mamadou Tandja, declarou que o exército local pretende aumentar os esforços para impedir que o seu país seja “circundado” pelos traficantes de armas e de droga, que são uma “ameaça real” para o país.
Também Burkina Fasso não foge ao fenômeno. Segundo o Coordenador do Comitê contra os tráficos ilícitos de droga em Burkina Fasso, o volume das cargas de droga interceptadas nos primeiros três meses de 2007 é “incrível”. O funcionário indica a existência de uma nova rota de trânsito da droga no oeste e no sudoeste do país. No início de abril de 2007, 49 quilos de cocaína, num valor de 10 milhões de dólares, foram interceptados pela polícia de Burkina Fasso na fronteira com o Mali, que é um importante ponto de trânsito para o tráfico de seres humanos. Países como Mali e Níger são há milênios atravessados por vias de caravanas, que agora se converteram num uso criminal: para o tráfico de seres humanos, mas também de armas, droga e cigarros de contrabando. “Nos últimos meses notamos um aumento da utilização dos países do Sahel, como Mali e Níger, para o tráfico de cocaína”, disse Antonio Razzitelli, Diretor do departamento do UNODC para a África ocidental.
Segundo o órgão anticrime da ONU, os traficantes importam a droga por meio das cidades costeiras como Conakry, na Guiné, Dakar, no Senegal, e Lomé, no Togo, e depois a transportam para as cidades do interior, como Bamako, no Mali, e Ouagadougou, em Burkina Fasso. Dessas localidades, a cocaína prossegue a sua viagem até a Europa.
Segundo o responsável do Comitê contra os tráficos ilícitos de droga em Burkina Fasso, é preciso coordenar os esforços entre as polícias dos Estados da região. “Há uma necessidade urgente de reunir todos os entes nacionais antidroga da região para encontrar o modo de cooperar entre si, para tentar deter as redes criminais”, disse, destacando que a escassa cooperação entre as fronteiras dos países do Sahel e a falta de meios das polícias locais constituem problemas adjuntos para uma eficaz ação de contraste às redes criminais.

O MERCADO DA CÂNABIS
Enquanto a África permanece, no momento, somente um local de trânsito e um mercado residual para drogas como cocaína e heroína, a principal produção local de substâncias entorpecentes é representada pela cânabis.
O cultivo da cânabis foi introduzido na África oriental pelos mercantes árabes, pérsios e indianos no século XII. De lá se difundiu primeiramente na África austral, no século XV, e depois no Congo e em Angola no século XIX. Somente depois da Segunda Guerra Mundial a cânabis chegou à África ocidental, levada por soldados nigerianos e ganenses que combateram com as tropas britânicas na Birmânia (atual Mianmar), onde adquiriram o hábito de fumar marijuana. Este fato explica porque nos países onde a cânabis é conhecida há mais tempo, ela é utilizada na medicina tradicional, enquanto na África ocidental é usada para fins “recreativos”. Até os anos 80, porém, a produção africana da cânabis permaneceu limitada. A partir daqueles anos, porém, notou-se um incremento notável da superfície cultivada com a cânabis para fins comerciais.
A produção desta substância se divide em três categorias: a erva da cânabis (flores e folhas), resina ou haxixe (secreções emitidas pela planta durante a fase de florescimento) e óleo de haxixe, o menos utilizado. Segundo o World Drug Report 2006, a erva da cânabis é cultivada, sobretudo de modo ilegal, em 176 países em todo o mundo. A África representa 27% da produção mundial e os principais produtores são Marrocos (3.700 toneladas), África do Sul (2.200 toneladas) e Nigéria (2 mil toneladas).
No que concerne ao haxixe, o principal produtor mundial é Marrocos, que fornece os mercados norte-africanos e europeus. Graças ao esforço das autoridades marroquinas nos últimos anos, deu-se a diminuição da produção local da cânabis, à qual corresponde um aumento da produção em outros países, da Ásia ocidental (Afeganistão, Paquistão) à Albânia. O UNODC reconhece que desde 2003 o governo de Rabat conduziu uma campanha para estimar a produção de resina da cânabis no país, em cooperação com a Agência anticrime das Nações Unidas. Segundo uma investigação efetuada em 2003, a produção da cânabis foi de 3.060 toneladas, cultivada em 134 mil hectares de terra na região do Rif (norte do país) por 96.600 famílias de camponeses. A investigação feita em 2004 registrou uma diminuição de 10% das terras cultivas com a cânabis, que passaram a 120.500 hectares, com uma produção estimada de 2.760 toneladas.
Em 2005 notou-se uma ulterior diminuição de 37%, sendo a superfície cultivada com a cânabis de 72.500 hectares, enquanto a produção diminuiu para 1.070 toneladas. Quanto às apreensões da cânabis, nos últimos 12-15 anos se registrou um aumento da porcentagem mundial de apreensões no continente africano desta substância. Enquanto em 1990 16% do total mundial das apreensões da cânabis ocorria na África, em 2002 este dado subiu para 20%, para alcançar 31% em 2004. O aumento das apreensões na África é determinado sobretudo pelo aumento dos controles policiais e alfandegários efetuados pela Nigéria e pela África do Sul.
O principal mercado de consumo da cânabis é a Europa ocidental, e 80% da cânabis consumada na Europa provém do Marrocos, passando pela Espanha e pela Holanda e dali distribuída aos outros países. O terceiro mercado mundial de consumo é representado pelos países do norte da África, onde a cânabis provém principalmente do Marrocos. Parte da cânabis produzida no Afeganistão e Paquistão, além disso, alimenta o mercado dos países da África oriental.
No que concerne às problemáticas sociais ligadas ao consumo da cânabis, é preciso recordar que esta substância é a droga mais difundida e usada em nível mundial. Estima-se que, em 2004, 162 milhões de pessoas a tenham usado, o equivalente a 3,9% da população mundial entre 15 e 64 anos. Em termos relativos (a porcentagem de habitantes que faz uso da cânabis em relação a outras substância entorpecentes), a cânabis é prevalentemente utilizada na Oceania, seguida por América do Norte e África. Desde 1992, na África, notou-se também uma tendência ao aumento do seu consumo, em particular na Argélia, Nigéria e Zâmbia.
É provável que a tendência ao uso desta droga seja subestimada em diversos países da África, que não têm uma capacidade de coleta de dados adequados para seguir o fenômeno. Segundo dados parciais, notou-se nos últimos anos um forte incremento do abuso da cânabis na África ocidental, oriental e no norte da África, em sintonia com a tendência em nível global de uma ulterior expansão do consumo desta substância.
Até os anos 80, porém, a produção africana da cânabis permaneceu limitada. A partir daqueles anos, porém, notou-se um incremento notável da superfície cultivada com a cânabis para fins comerciais.
A produção africana de droga subtraiu terras e recursos à agricultura, isso porque naquele período se registrou uma forte queda dos preços dos produtos agrícolas em todo o mundo. A agricultura africana, já frágil, entrou em crise. Diversos camponeses, portanto, deixaram-se tentar pelo cultivo da cânabis em detrimento do cultivo de produtos lícitos.
Um simples cálculo econômico demonstra o forte poder de atração de uma semelhante produção; já em 1995, na Guiné, um saco de 20-25 quilos de marijuana tinha o valor de aproximadamente a renda anual média de uma famílias de oitos pessoas que se dedica à produção de cultivo lícito. No mercado de Kinshasa, na República Democrática do Congo (RDC), um saco de 25 quilos de marijuana é vendido por mil dólares, enquanto um saco de 80 quilos de mandioca vale somente 10 dólares.
Compreende-se, assim, que o cultivo desta substância entorpecente tem sérias repercussões na auto-suficiência alimentar de diversos países africanos. Segundo a associação de luta à toxicomania de Kinshasa, LIPILDRO, por causa do abandono dos cultivos legais por aqueles da cânabis, até 2010 a maior parte das cidades congolesas será atingida por um crise alimentar.
Além disso, na RDC se verificaram experiências para o cultivo da papoula de ópio (na província do Equador) e da cocaína (na região do Shaba). O mais importante produtor da cânabis na África subsaariana permanece, porém, a África do Sul. Importante produções são sinalizadas também em Lesoto e em Malauí.

DROGAS SINTÉTICAS
A produção de drogas sintéticas é limitada na África, com exceção da África do Sul, onde a fabricação de metanfetaminas e methaqualone aumentou nos últimos anos. Os dados sobre a descoberta de laboratórios clandestinos confirmam esta tendência.
Com efeito, se passou da descoberta à destruição de um laboratório por ano no período 1995-1999, aos 17 no período 2000-2003, até aos 28 destruídos somente em 2004. Um outro dado que demonstra o incremento do uso de drogas sintéticas na África do Sul é o aumento das apreensões de ecstasy: em 2004, houve um incremento de 385% das apreensões em relação ao ano precedente.
Além disso, as drogas sintéticas faziam parte do programa de guerra secreta química e biológica aplicado pelo regime do apartheid. Segundo os testemunhos reunidos durante o processo contra o responsável do programa, doutor Wouter Basson (definido “Doutor Morte” pela imprensa local), no âmbito do chamado “Project Coast”, entre 1992 e 1993 os laboratórios relacionados aos serviços secretos sul-africanos tinham produzido mais de 900 quilos de cristais de ecstasy (correspondente a 73 milhões de pílulas). No ano precedente, uma empresa de serviços do regime do apartheid tinha importado 500 quilos desta substância da Croácia.
Essas quantidades de drogas sintéticas foram importadas e produzidas para serem usadas como agente incapacitador para o controle da multidão (e talvez também para drogar secretamente os líderes da oposição para desacreditá-los, fazendo-os cometer gestos ridículos em público) e para serem distribuídas nas favelas habitadas pela população negra para promover o abuso de droga e a dependência.
O fim do regime do apartheid bloqueou este e outros projetos criminais aplicados no âmbito do “Project Coast”. Antes da queda do regime, porém, o dr. Basson tinha organizado a venda das empresas de cobertura dos serviços secretos sul-africanos, alguns dos quais fabricavam armas químicas e biológicas e drogas sintéticas.
Além disso, desapareceram centenas de quilos de substâncias químicas usadas na produção desses instrumentos de morte.
O dr. Basson é suspeito de ter aberto um empresa privada e, com efeito, quando foi detido em 1997 foi encontrado em posse de pílulas de ecstasy num valor de 20 mil dólares.

ÁFRICA ORIENTAL: UMA SITUAÇÃO PREOCUPANTE
Na África oriental, o Quênia é o principal ponto de trânsito da cocaína. Somente em 2004 foi apreendida 1,1 tonelada de cocaína entre a capital Nairóbi e o centro costeiro de Malindi. No decorrer da operação da polícia, que levou à descoberta desta importante carga de droga, foram detidos diversos funcionários da companhia aérea local (que resultou estranha ao narcotráfico), alguns dos quais foram capturados em Londres.
Das investigações emergiu que a droga que passava pelo Quênia era inserida no mercado britânico com a colaboração de alguns funcionários infiéis da companhia aérea. Além do Quênia, os países da África oriental interessados pelo narcotráfico são Etiópia, Botsuana, Zâmbia e África do Sul. Neste último, segundo o South African Institute of International Affaire, existem 500 mil pessoas que fazem uso de cocaína, enquanto 1/3 dos adolescentes utiliza entorpecentes. Segundo o centro de estudos sul-africano, no país atuam 300 organizações criminais internacionais envolvidas no narcotráfico.
Os países da região se tornaram não somente uma região de trânsito, mas também um novo mercado para os entorpecentes e, em particular, para a cocaína. Na Zâmbia, por exemplo, 80% da cocaína que chega ao país é transferida para a Europa e o restante 20% é consumado localmente.
A Interpol lançou o alarme sobre o crescente consumo de entorpecentes na África. “As drogas não somente transitam nos países, mas permanecem lá”, disse um responsável da organização internacional de polícia diante dos delegados de 150 organismos de polícia de todo o mundo, reunidos para o encontro anual da Interpol no Rio de Janeiro (Brasil). “Já se tornaram habituais as cargas de diversas toneladas de cocaína que passam pela África”, acrescentou.
Segundo um analista presente no seminário, se a tendência ao incremento do uso de entorpecentes continuar avançando, a África deverá enfrentar uma grave crise social derivante da droga.
As condições climáticas da maior parte da África são favoráveis ao cultivo da cânabis. Trata-se de um cultivo que permite um alto lucro para o agricultor e necessita de um trabalho menos intensivo em relação aos outros cultivos.
Inteiras famílias de agricultores podem viver, assim, de modo decente e permitir-se comprar alimento e medicamentos e enviar seus filhos à escola.
A cânabis é cultivada na África principalmente para o mercado local, mas nos últimos anos notou-se um aumento dos tráficos da cânabis originados na África subsaariana. Os maiores cultivos da cânabis se encontram em Comores, Etiópia, Quênia, Madagascar, Tanzânia e Uganda.
No Quênia, o cultivo da cânabis tem uma antiga tradição, mas nos últimos anos se tornou primeiramente uma produção limitada ao mercado local, para depois transformar-se em uma verdadeira empresa comercial ilícita estendida internacionalmente.
A cânabis é cultivada na região ocidental e naquela do Monte Quênia, onde, segundo alguns relatórios, existem cerca de 1.500 hectares cultivados com a cânabis. Os cultivos de droga estão escondidos entre aqueles tradicionais destinados à alimentação, mas há também cultivos menores em algumas áreas protegidas da reserva natural nacional.
Também as regiões costeiras se tornaram produtores da cânabis. Lá, com efeito, se instalaram diversos agricultores provenientes do interior, que lá encontraram áreas férteis e pouco controladas pela polícia, e um mercado constituído pela população local, pelos turistas e pelos residentes estrangeiros que preferem as costas do país.
Quanto ao ópio, no passado foram sinalizados alguns cultivos no Quênia e nas costas de Madagascar. Desde 1993 não foram sinalizados cultivos de opiáceos na África oriental, mas a vastidão do território e os escassos controles das autoridades locais tornam sempre possível uma retomada do cultivo da papoula de ópio.
No que diz respeito à produção local de drogas sintéticas, a África oriental é o ponto de trânsito do methaqualone (Mandrax) proveniente da Índia e destinado ao mercado sul-africano.
Nos últimos anos, a redução do Mandrax proveniente da Índia gerou uma produção local desta substância. Com efeito, foram descobertos laboratórios químicos clandestinos utilizados para a fabricação desta droga sintética em alguns países da África oriental e meridional.
Nos casos dos laboratórios descobertos no Quênia e na Tanzânia, se tratava somente de pequenos centros onde o pó do Mandrax ainda proveniente da Índia era transformado em pílulas, mas em outros casos deparou-se com verdadeiras oficinas para a fabricação do Mandrax com precursores químicos, cuja proveniência permaneceu desconhecida. A este propósito, as substâncias que mais causam preocupação são as efedrinas, as pseudo-efedrinas, o anidrido acético e o ácido N-acetilantranílico (utilizado na fabricação do Mandrax) e o pergamenato de potássio.
O mais famoso cultivo de planta entorpecente local é o khat, que é uma produção legal em diversos países da África oriental. O khat é cultivado na Etiópia e no Quênia e, em medida menos extensa, na Tanzânia, Comores e na parte setentrional de Madagascar. É exportado para os principais mercados da área (Djibuti, Eritréia, Somália e Iêmen), além da Europa e da América setentrional.
O uso do khat continua a expandir-se no Chifre da África e tem um papel-chave na contínua instabilidade da Somália, onde se calcula que a população gasta todos os anos 64 milhões de dólares por ano para comprar o khat. Trata-se de um quantia que é quase o dobro do total das ajudas internacionais doadas ao país. O khat não somente contribui para provocar problemas na sociedade, criando pessoas afetadas pela dependência de entorpecentes, mas tem também um papel na difusão no país de armas leves, frequentemente repassadas em troca de um pouco de droga.
As organizações de narcotraficantes olham com interesse aos países da África oriental e meridional por causa de suas infra-estruturas portuárias e aeroportuárias, dos comprimentos de suas costas e dos fluxos turísticos.
Todos elementos que permitem esconder os tráficos de droga. O Quênia tem o maior porto comercial da região, Mombasa, que serve a maior parte dos países privados de acesso direto ao mar, enquanto o aeroporto de Nairóbi é um dos mais traficados da área. As redes do narcotráfico utilizam também os portos de Dar-es-Salaam (na Tanzânia), Djibuti, Durban (na África do Sul) e Maputo (em Moçambique) e estão expandindo suas atividades também na Etiópia, Mauritius, Tanzânia e Uganda. Esses últimos países são usados como pontos de trânsito para a droga enviada para o Quênia, a África do Sul e a África ocidental e dessas áreas para a Europa e a América do Norte.
A maior parte das substâncias entorpecentes chega à região via mar, escondida nas cargas dos containers transportados pelos navios mercantis que navegam o Oceano Índico. Em alguns casos, os navios dos narcotraficantes se encontram em alto mar com embarcações menores, que levam para a terra a carga ilícita. Grandes quantidades de heroína chegam assim à região, mas se recorre também a carteiros, homens e mulheres, que chegam com vôos comerciais, e ao envio por correio.
Entre os países da África oriental interessados pelo tráfico e pelo consumo de substâncias entorpecentes, está Uganda.
Segundo um recente relatório do UNODC, “Uganda se tornou o país líder no tráfico e no consumo de droga em relação ao restante dos Estados da África oriental”. Entre as drogas presentes no mercado ilícito ugandense, existem a cânabis, a heroína, a cocaína e o mandrax, além do khat. Segundo a agência anticrime da ONU, o aumento do consumo de substâncias entorpecentes é devido a “duas décadas de conflitos armados e à falta de lei, que prejudicaram gravemente a infra-estrutura policial”.
O relatório observa que as condições climáticas de todo o território ugandense são favoráveis ao cultivo da cânabis: “O cultivo ilícito da planta é, porém, relevante em áreas remotas das regiões meridional, ocidental, central, oriental e norte-oriental. As dimensões exatas dos cultivos da cânabis não são conhecidas, mas se notou um aumento da produção da cânabis sobretudo para a exportação”. O aeroporto de Entebbe é, por fim, utilizado como ponto de trânsito para o envio de heroína e de mandrax ao extremo Oriente e à África do Sul.

CONCLUSÕES
A África é um ponto de trânsito sempre mais importante para as organizações de narcotraficantes, apesar de, no momento, a maior parte das apreensões de entorpecentes ocorrer em outras partes do mundo.
Vista a escassa eficiência das polícias africanas e a relativa recente conscientização do problema por parte dos entes locais e internacionais, pode-se supor que a quantidade das apreensões de droga na África não corresponda à entidade efetiva das cargas que transitam pelo continente.
A África, porém, não é mais somente um ponto de passagem da droga proveniente da América Latina e da Ásia em direção à Europa e à América setentrional, mas já se tornou um mercado ainda talvez “residual”, mas em todo caso que não pode ser ignorado pelas redes de narcotraficantes.
Redes nas quais estão presentes africanos, em particular nigerianos, em papéis não somente de gregários, mas também de organizadores. O crescente consumo de drogas por via endovenosa em diversos países africanos, como Tanzânia e Quênia, agrava o problema da difusão da AIDS.
Na Nigéria, por exemplo, um estudo revelou que o consumo de drogas se expande no mesmo ritmo do aumento das pessoas infetadas com o vírus HIV, em cidades como Kano e Port Harcourt.

 
At 9/17/2007 3:10 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

A DROGA NA ÁFRICA: UM PROBLEMA MUNDIAL

A droga já é um problema na África e representa um ulterior obstáculo ao desenvolvimento do continente. É o que afirmam diversos organismos internacionais encarregados da luta ao tráfico de entorpecentes. Já em 2001, um relatório do Órgão Internacional de Controle das Drogas afirmava que “graças à sua experiência no campo do contrabando de haxixe e de heroína, os cartéis da droga da África ocidental buscam novos contatos na América Latina para estender o tráfico de cocaína a toda a região da África subsaariana”.
Trata-se de uma reviravolta fundamental na estratégia do narcotráfico mundial, que vê a África se tornar uma das áreas “fulcro” para a distribuição de drogas em todo o mundo. Até os primeiros anos da década de 90 do século passado, a África era mantida às margens das rotas da droga. A mudança ocorreu em 1993, quando foram apreendidos na Nigéria 300 quilos de heroína provenientes da Tailândia. É o sinal de uma mudança que vê a transformação de tantos pequenos contrabandistas africanos (a maioria nigerianos) de simples transportadores por conta de terceiros a membros de gangues guiadas por africanos, capazes de tratar no mesmo nível com análogas organizações de outros continentes.
A presença dessas organizações criminais, a forte urbanização, a perda dos valores tradicionais africanos e a difusão de uma cultura hedonista são todos fatores que criaram as premissas para um mercado africano da droga. A África, portanto, não é somente um local de trânsito dos entorpecentes, mas terreno “virgem” para o tráfico de droga.

PREMESSA METODOLÓGICA
Os dados apresentados são úteis para analisar a tendência (incremento ou decremento) do tráfico de entorpecentes, apesar de serem muito provavelmente aproximativos.
Segundo um estudo crítico efetuado pela associação ‘Libera’ do pe. Ciotti, com efeito os dados apresentados pelos entes antidrogas internacionais e de alguns Estados não relatam fielmente toda a produção mundial de cocaína. Segundo este estudo (referido somente à cocaína e não a outras drogas), existe uma discrepância entre a estimativa sobre a produção mundial de cocaína efetuada pela ONU e os dados relativos às apreensões e ao consumo de cocaína somente na América.
Segundo os elaboradores do relatório, com efeito, subtraindo das 937 toneladas de produção, indicada pelas Nações Unidas em 2004, as cerca de 450 consumadas nos Estados Unidos, Canadá, México e em toda a América do Sul e as cerca de 490 toneladas apreendidas em todas as Américas, se chegaria a um saldo negativo de 3 toneladas.
“A este ponto, não se saberia mais de onde subtrair as cerca de 99 toneladas de cocaína apreendidas no “resto do mundo”, afirma o relatório. Fazendo-o, se chegaria ao paradoxal saldo negativo de 102 toneladas de cocaína “não resultantes”, não tendo feito frente ainda à demanda de cocaína no “resto do mundo”, estimada em ao menos 300 toneladas, se chega a calcular uma espécie de buraco negro de aproximadamente 400 toneladas de cocaína não resultantes.
Este buraco negro assume proporções ainda mais macroscópicas, cerca de 700 toneladas, se calculado com base nos dados da Agência antidroga norte-americana.
Apesar dos seus limites, os relatórios dos organismos internacionais de luta contra a droga permanecem frequentemente os únicos instrumentos para analisar o fenômeno do narcotráfico.

A HEROÍNA NA ÁFRICA
A apreensão de opiáceos na África registrou um forte incremento nos últimos anos. Segundo dados da ONU, por exemplo, em 2004 ocorreu um incremento da apreensão de heroína de 60% em relação ao ano precedente.
A maior parte deste incremento é devido à apreensão ocorrida na África central e ocidental, que quase triplicou de 2003 a 2004. A heroína que passa pela África é destinada em primeiro lugar aos mercados europeus e, em segundo lugar, aos da América do Norte. A heroína provém dos países do sudoeste e sudeste da Ásia.
A quantia total dos opiáceos apreendida na África permanece ainda modesto (0,3% do total de apreensões em nível mundial). Porém, deve-se levar em consideração que não existem estatísticas confiáveis e que o nível das apreensões não reflete o verdadeiro fluxo de narcóticos que passa pela África por causa da debilidade da polícia local, que tem dificuldade em interceptar as cargas ilícitas.
No que concerne ao uso de opiáceos na África, segundo os dados do Departamento das Nações Unidas para a luta à criminalidade (UNODC), nota-se um aumento de seu consumo no continente africano, em particular na África oriental e naquela austral e em alguns países da África ocidental. Segundo os especialistas das Nações Unidas, o crescimento do consumo de heroína nessas áreas deriva do fato de que são utilizadas como locais de trânsito dos narcotraficantes, os quais, porém, não desdenham em criar um mercado local.
Na África do Sul, um dos poucos países africanos que dispõe de dados confiáveis, até os primeiros anos do novo milênio, o pedido de tratamentos por abuso de heroína representava somente 1% do total dos pedidos de cura por dependência de substâncias entorpecentes (incluído o álcool). Em 2005, esta porcentagem subiu para 7%.
Segundo o relatório do UNODC sobre o tráfico de entorpecentes de 2007, o mercado da heroína está dividido deste modo: a heroína afegã é destinada aos mercados da Ásia central, da Europa, do Oriente Médio e da África; aquela produzida no chamado “triângulo de ouro” alimenta o mercado chinês e o dos outros países asiáticos e da Oceania; aquela proveniente da América Latina serve o mercado norte-americano.
O relatório nota, porém, que “uma parte pequena, mas em crescimento, da produção de opiáceos afegãos é enviada à América setentrional, seja por meio da África oriental e ocidental, seja por meio da Europa”.
O relatório afirma que a demanda global de heroína permaneceu estável, “apesar de importantes incrementos nos países que se encontram no caminho das principais rotas do narcotráfico”.
Entre esses estão também diversos países africanos, afirma o documento, que destaca os efeitos prejudiciais da difusão da heroína e de outras substâncias entorpecentes nas populações já duramente provadas pela pobreza e pela difusão da AIDS.
Os últimos dados do UNODC mostram um forte incremento do uso de heroína em alguns países africanos como Moçambique, Zâmbia, Quênia, Tanzânia e Costa do Marfim, enquanto outros países tiveram um aumento mais contido. Entre esses, África do Sul, Madagascar, Gana, Libéria e Senegal.

DOS ANDES AO KILIMANJARO: UM FLUXO DE COCAÍNA INVADE A ÁFRICA
O dado mais preocupante, porém, é o da cocaína que transita da África em direção principalmente à Europa e, secundariamente, à América setentrional.
A importância da África, e em particular da África ocidental, como ponto de trânsito da cocaína em direção aos ricos mercados ocidentais é demonstrada pelo nível das apreensões registradas nos últimos anos. As apreensões de cocaína em toda a África aumentaram três vezes entre 2003 e 2004, enquanto no mesmo período as apreensões na África ocidental e central aumentaram seis vezes. As apreensões mais importantes no período 2000-2004 se registraram em Cabo Verde, seguido por África do Sul, Quênia, Gana e Nigéria. Mas as apreensões de cocaína na África representam somente 1% do total mundial das apreensões desta substância entorpecente. Também neste caso, porém, o dado é prejudicado devido à debilidade das polícias locais, incapazes de interceptar a maior parte dos fluxos de cocaína proveniente da América do Sul.
Em 2004, 50% das apreensões de cocaína no continente ocorreram na África ocidental e central. A zona de passagem mais utilizada pelos traficantes de cocaína é o Golfo da Guiné, de onde a substância entorpecente é transportada para a Europa em pequenas quantidades, através dos chamados “mulas”, pessoas que assumem o risco de ingerir óvulos de cocaína com a esperança de superar as alfândegas nos aeroportos de destinação. Nos últimos anos, também na África oriental aumentou a quantia de cocaína apreendida, indicando uma tendência a utilizar em medida crescente esta área como ponto de trânsito para a cocaína destinada à Europa e à Ásia.
Um dos países mais atingidos pelo fenômeno é o Quênia, onde em 2004 foi apreendida uma tonelada de cocaína. Em termos gerais, o crescimento da difusão da cocaína na África é demonstrada pelo fato que dos 32 países africanos que fornecem estatísticas sobre as apreensões de entorpecentes na UNODC, 23 (72%) relataram apreensões de cocaína, contra 34% em 1990.
Os traficantes de cocaína tendem a servir-se da África cada vez mais como ponto de trânsito por dois motivos. O primeiro deriva do melhoramento dos sistemas de inspeção utilizados pelas autoridades locais e por aquelas norte-americanas na área caribenha e centro-americana, tradicional rota utilizada pelos traficantes. Nos últimos anos, por exemplo, surgiram bases de inspeção norte-americanas dos Andes às ilhas caribenhas. Também as autoridades holandesas intensificaram a inspeção com patrulhas aéreas baseadas nas ilhas de Curaçao e Saint Martin.
O segundo fator está ligado à diminuição do consumo de cocaína, que se registrou nos Estados Unidos diante de um aumento da demanda na Europa. Se na América do Norte há o mais alto número de consumidores mundiais (6 milhões e meio, correspondente a cerca da metade do consumo mundial), a tendência é diminuir a demanda.
De 1998 a 2004, de fato, se registrou uma queda de 20% da difusão desta substância. No mesmo período, na Europa ocidental, onde os consumidores de cocaína são 3 milhões e meio (26% do total mundial), se notou um aumento do consumo e da difusão do “pó branco”. Na Espanha e no Reino Unido, este dado é de 2%.
A África, portanto, é uma cômoda e segura rota para alcançar um mercado em crescimento.
Além disso, como efeito colateral criou-se um mercado africano que está registrando nos últimos anos preocupantes aumentos.
A crescente disponibilidade de cocaína se traduz, com efeito, em um aumento do consumo desta substância na África. Segundo os dados do UNODC, no período 1992-2004 o abuso da cocaína na África cresceu em um ritmo mais sustentado do que no restante do mundo. Este incremento é mais remarcado nos países da África meridional e nos da África ocidental.
Se forem analisados os dados das pessoas que recorrem aos tratamentos de desintoxicação, o aumento do consumo de cocaína emerge com evidência. No início dos anos 90, as pessoas em tratamento por abuso de cocaína eram pouquíssimas, no final de 1996 constituíam 1.5% dos casos tratados pelas estruturas de recuperação dos toxicômanos, no biênio 1999-2000 eram 6%. No período 2001-2004, notou-se uma inflexão na porcentagem de pessoas que pediam para ser tratadas da dependência de cocaína (menos de 5%).
A partir do final de 2004, este dado está em crescimento: de 7,5% em 2004 passou-se a 8,5% nos primeiros meses de 2005.

A COCAÍNA NA ÁFRICA OCIDENTAL
O país tradicionalmente mais envolvido no narcotráfico é a Nigéria. Lá, com efeito, em 1993 houve a primeira grande apreensão de cocaína na África e as organizações criminais nigerianas estão perfeitamente inseridas no sistema criminal global e transnacional. A afirmação das máfias nigerianas deriva também da pertença da Nigéria ao Commonwealth, que permitiu abrir estreitas relações comerciais com o subcontinente indiano, produtor de ópio e de heroína, e com o mundo anglo-saxão consumidor.
No final dos anos 80, registrou-se um incremento importante no papel de centro estratégico e, em 1992, as apreensões de cocaína no aeroporto de Lagos foram tão relevantes que as autoridades nigerianas suspenderam os vôos diretos para o Rio de Janeiro. Desde então, os traficantes nigerianos são considerados os principais transportadores da droga, uma verdadeira indústria a serviço do comércio de heroína e da coca. Eles estão presentes em todos os pontos-chaves da produção e do tráfico de drogas. Graças aos compatriotas residentes no exterior, formaram clãs criminais comparáveis aos colombianos, turcos e chineses.
As organizações mafiosas nigerianas, como as outras, se baseiam na solidariedade étnica, de clã e de famílias. Já em 1995 as autoridades norte-americanas estimavam que 50% da heroína circulante em seu país era introduzida pelos nigerianos, os quais usam a Polônia e a Hungria como pontos de trânsito para a cocaína destinada à Europa ocidental.
Um dos países da África ocidental dos quais se têm estatísticas confiáveis sobre o incremento do tráfico de cocaína é Gana. Segundo os dados divulgados pelas autoridades locais, em um único ano as apreensões de cocaína aumentaram 40 vezes, passando dos 15 quilogramas de 2003 aos 617 quilos de 2004. A maior parte da cocaína é destinada ao mercado britânico.
Trata-se de um dado significativo, levando-se em consideração que, em termos porcentuais, as apreensões de cocaína aumentaram 18% em nível mundial e 4.000% em Gana de 2003 a 2004. No mesmo período, na África, as apreensões de cocaína aumentaram 3 vezes, passando das 1,1 tonelada para 3,6 toneladas.
Nos anos sucessivos, emergiram outros fatos que demonstram que Gana se tornou um importante ponto de passagem da cocaína na África ocidental. Em novembro de 2005, a polícia ganense apreendeu 588 quilos no decorrer de uma perquirição em uma habitação em East Lagon. Em abril de 2006, foram descobertos a bordo do navio MV Benjamin, atracado no porto de Tema, 2.310 quilos de cocaína.
Segundo um responsável do UNODC, as organizações de narcotraficantes tendem a fazer transitar a droga por meio da África ocidental porque, até agora, as autoridades alfandegárias européias e norte-americanas controlam com menos atenção as mercadorias e as bagagens provenientes da África em relação àquelas provenientes da América Latina. No caso de Gana, como de outros países da região, o fato de não estar inserido na lista dos países produtores de cocaína significa que as suas mercadorias não são sujeitas a inspeções detalhadas. Mas nos últimos anos, as coisas mudaram e Gana foi inserida na lista dos países “de alta prioridade” de inspeção.
Os traficantes buscam corromper os policiais e a polícia para permitir o trânsito das cargas de entorpecentes. Para investigar casos de corrupção de policiais, o Ministério da Fazenda de Gana criou uma Comissão de investigação, que recebeu o nome da sua Presidenta, Georgina Wood, que desempenhou importantes cargos na polícia e na magistratura local. O “Georgina Wood Committee” nasceu após duas importantes apreensões de cocaína citadas precedentemente, nas quais resultaram envolvidos alguns policiais. Entre as recomendações apresentadas pelo Comitê, está reforçar o patrulhamento das costas do país por meio seja da potenciação dos meios da marinha e da aeronáutica, seja com a criação de um serviço de guarda-costas independente.
A Guiné-Bissau é um outro país que se tornou ponto de trânsito da cocaína da América Latina à Europa, como demonstrado numa recente operação que levou à captura de 674 quilos de cocaína e à detenção de alguns narcotraficantes sul-americanos. Na África ocidental, os países mais envolvidos pelos fluxos de droga, além de Gana, são Costa do Marfim, Senegal e Nigéria.
Os traficantes de cocaína na Guiné-Bissau estão ligados aos que passam através do vizinho Senegal, como emergiu da operação efetuada no final de junho de 2007 pela polícia de Dakar, que levou à apreensão de mais de duas toneladas de cocaína. Parte da droga se encontrava em um veleiro que estava à deriva diante das costas senegalesas, e uma outra em uma habitação na área balneária de Mbour, a sul de Dakar.
No veleiro os investigadores encontraram uma documentação que comprova que os narcotraficantes utilizam a Guiné-Bissau como depósito de trânsito da cocaína proveniente da América Latina e destinada à Europa. Também a nacionalidade dos detidos demonstra o grau de internacionalização das organizações criminais dedicadas ao narcotráfico. Além de três cidadãos sul-americanos (um colombiano, um venezuelano e um equatoriano) e de uma cidadã francesa, a polícia deteve três senegaleses. A partir dos documentos detidos, além disso a polícia senegalesa descobriu que os narcotraficantes efetuaram diversas viagens aos países limítrofes: Serra Leoa, Guiné Conakry, Guiné-Bissau e Gâmbia.
As autoridades senegalesas reiteraram que em seu país não existem depósitos de cocaína, mas admitiram a infiltração de grupos criminais estrangeiros, que utilizam o aeroporto de Dakar para enviar cocaína à Europa. No período de janeiro a junho de 2007, a polícia senegalesa afirma ter apreendido no aeroporto de Dakar 44 quilos de cocaína e detido cerca de 30 “mulas” da droga, a maior parte dos quais nigeriano.
Está em aumento também o número de “mulas” da Guiné-Bissau detidos no momento do embarque para Portugal, onde podem entrar sem visto. Além disso, foram descobertas algumas operações de reciclagem de dinheiro sujo por parte de organizações estrangeiras. A apreensão recorde efetuada pela polícia senegalesa, equivalente ao total de apreensões de cocaína na África ocidental de setembro de 2006 a maio de 2007, é somente o último de uma série efetuada nos primeiros seis meses de 2007 em várias localidades da África ocidental.
Entre essas, há 800 quilos de cocaína recuperados no mar diante das ilhas Canárias, e uma quantia análoga apreendida pela marinha francesa no largo da Costa do Marfim. Além dos navios, as organizações criminais recorrem a aviões para alimentar seus tráficos ilícitos.
Na Venezuela foi bloqueado um avião com 2,5 toneladas de cocaína, que se preparava a partir para Serra Leoa, enquanto em maio de 2007 foram apreendidos 600 quilos de cocaína a bordo de um Cessna, matriculado na Venezuela, que efetuou uma aterrissagem de emergência em Nouadhibou, na Mauritânia.
Segundo um responsável do ONUDC, para a África ocidental o aumento de confiscos das cargas de cocaína na região é devido mais a incidentes de percurso que a uma maior eficácia da polícia.
O funcionário considera que a cada dez expedições de droga em direção à Europa, nove chegam a seu destino sem problemas.

O SAHEL: NOVA FRONTEIRA DO NARCOTRÁFICO?
Das costas da África ocidental as organizações de narcotraficantes estão progressivamente se expandindo aos países do Sahel, cujo papel estratégico entre o Atlântico e o Magreb, e, portanto o Mediterrâneo, é apreciado também pelos traficantes de seres humanos e, provavelmente, pelo terrorismo internacional. Não se pode excluir a priori uma interconexão entre essas realidades criminais, de que são cúmplices a debilidade dos Estados e a vastidão dos territórios a controlar. Um realidade que suscita o alarme dos governos interessados.
Em abril deste ano, depois da apreensão de três caminhões cheios de droga e armas, o Presidente do Níger, Mamadou Tandja, declarou que o exército local pretende aumentar os esforços para impedir que o seu país seja “circundado” pelos traficantes de armas e de droga, que são uma “ameaça real” para o país.
Também Burkina Fasso não foge ao fenômeno. Segundo o Coordenador do Comitê contra os tráficos ilícitos de droga em Burkina Fasso, o volume das cargas de droga interceptadas nos primeiros três meses de 2007 é “incrível”. O funcionário indica a existência de uma nova rota de trânsito da droga no oeste e no sudoeste do país. No início de abril de 2007, 49 quilos de cocaína, num valor de 10 milhões de dólares, foram interceptados pela polícia de Burkina Fasso na fronteira com o Mali, que é um importante ponto de trânsito para o tráfico de seres humanos. Países como Mali e Níger são há milênios atravessados por vias de caravanas, que agora se converteram num uso criminal: para o tráfico de seres humanos, mas também de armas, droga e cigarros de contrabando. “Nos últimos meses notamos um aumento da utilização dos países do Sahel, como Mali e Níger, para o tráfico de cocaína”, disse Antonio Razzitelli, Diretor do departamento do UNODC para a África ocidental.
Segundo o órgão anticrime da ONU, os traficantes importam a droga por meio das cidades costeiras como Conakry, na Guiné, Dakar, no Senegal, e Lomé, no Togo, e depois a transportam para as cidades do interior, como Bamako, no Mali, e Ouagadougou, em Burkina Fasso. Dessas localidades, a cocaína prossegue a sua viagem até a Europa.
Segundo o responsável do Comitê contra os tráficos ilícitos de droga em Burkina Fasso, é preciso coordenar os esforços entre as polícias dos Estados da região. “Há uma necessidade urgente de reunir todos os entes nacionais antidroga da região para encontrar o modo de cooperar entre si, para tentar deter as redes criminais”, disse, destacando que a escassa cooperação entre as fronteiras dos países do Sahel e a falta de meios das polícias locais constituem problemas adjuntos para uma eficaz ação de contraste às redes criminais.

O MERCADO DA CÂNABIS
Enquanto a África permanece, no momento, somente um local de trânsito e um mercado residual para drogas como cocaína e heroína, a principal produção local de substâncias entorpecentes é representada pela cânabis.
O cultivo da cânabis foi introduzido na África oriental pelos mercantes árabes, pérsios e indianos no século XII. De lá se difundiu primeiramente na África austral, no século XV, e depois no Congo e em Angola no século XIX. Somente depois da Segunda Guerra Mundial a cânabis chegou à África ocidental, levada por soldados nigerianos e ganenses que combateram com as tropas britânicas na Birmânia (atual Mianmar), onde adquiriram o hábito de fumar marijuana. Este fato explica porque nos países onde a cânabis é conhecida há mais tempo, ela é utilizada na medicina tradicional, enquanto na África ocidental é usada para fins “recreativos”. Até os anos 80, porém, a produção africana da cânabis permaneceu limitada. A partir daqueles anos, porém, notou-se um incremento notável da superfície cultivada com a cânabis para fins comerciais.
A produção desta substância se divide em três categorias: a erva da cânabis (flores e folhas), resina ou haxixe (secreções emitidas pela planta durante a fase de florescimento) e óleo de haxixe, o menos utilizado. Segundo o World Drug Report 2006, a erva da cânabis é cultivada, sobretudo de modo ilegal, em 176 países em todo o mundo. A África representa 27% da produção mundial e os principais produtores são Marrocos (3.700 toneladas), África do Sul (2.200 toneladas) e Nigéria (2 mil toneladas).
No que concerne ao haxixe, o principal produtor mundial é Marrocos, que fornece os mercados norte-africanos e europeus. Graças ao esforço das autoridades marroquinas nos últimos anos, deu-se a diminuição da produção local da cânabis, à qual corresponde um aumento da produção em outros países, da Ásia ocidental (Afeganistão, Paquistão) à Albânia. O UNODC reconhece que desde 2003 o governo de Rabat conduziu uma campanha para estimar a produção de resina da cânabis no país, em cooperação com a Agência anticrime das Nações Unidas. Segundo uma investigação efetuada em 2003, a produção da cânabis foi de 3.060 toneladas, cultivada em 134 mil hectares de terra na região do Rif (norte do país) por 96.600 famílias de camponeses. A investigação feita em 2004 registrou uma diminuição de 10% das terras cultivas com a cânabis, que passaram a 120.500 hectares, com uma produção estimada de 2.760 toneladas.
Em 2005 notou-se uma ulterior diminuição de 37%, sendo a superfície cultivada com a cânabis de 72.500 hectares, enquanto a produção diminuiu para 1.070 toneladas. Quanto às apreensões da cânabis, nos últimos 12-15 anos se registrou um aumento da porcentagem mundial de apreensões no continente africano desta substância. Enquanto em 1990 16% do total mundial das apreensões da cânabis ocorria na África, em 2002 este dado subiu para 20%, para alcançar 31% em 2004. O aumento das apreensões na África é determinado sobretudo pelo aumento dos controles policiais e alfandegários efetuados pela Nigéria e pela África do Sul.
O principal mercado de consumo da cânabis é a Europa ocidental, e 80% da cânabis consumada na Europa provém do Marrocos, passando pela Espanha e pela Holanda e dali distribuída aos outros países. O terceiro mercado mundial de consumo é representado pelos países do norte da África, onde a cânabis provém principalmente do Marrocos. Parte da cânabis produzida no Afeganistão e Paquistão, além disso, alimenta o mercado dos países da África oriental.
No que concerne às problemáticas sociais ligadas ao consumo da cânabis, é preciso recordar que esta substância é a droga mais difundida e usada em nível mundial. Estima-se que, em 2004, 162 milhões de pessoas a tenham usado, o equivalente a 3,9% da população mundial entre 15 e 64 anos. Em termos relativos (a porcentagem de habitantes que faz uso da cânabis em relação a outras substância entorpecentes), a cânabis é prevalentemente utilizada na Oceania, seguida por América do Norte e África. Desde 1992, na África, notou-se também uma tendência ao aumento do seu consumo, em particular na Argélia, Nigéria e Zâmbia.
É provável que a tendência ao uso desta droga seja subestimada em diversos países da África, que não têm uma capacidade de coleta de dados adequados para seguir o fenômeno. Segundo dados parciais, notou-se nos últimos anos um forte incremento do abuso da cânabis na África ocidental, oriental e no norte da África, em sintonia com a tendência em nível global de uma ulterior expansão do consumo desta substância.
Até os anos 80, porém, a produção africana da cânabis permaneceu limitada. A partir daqueles anos, porém, notou-se um incremento notável da superfície cultivada com a cânabis para fins comerciais.
A produção africana de droga subtraiu terras e recursos à agricultura, isso porque naquele período se registrou uma forte queda dos preços dos produtos agrícolas em todo o mundo. A agricultura africana, já frágil, entrou em crise. Diversos camponeses, portanto, deixaram-se tentar pelo cultivo da cânabis em detrimento do cultivo de produtos lícitos.
Um simples cálculo econômico demonstra o forte poder de atração de uma semelhante produção; já em 1995, na Guiné, um saco de 20-25 quilos de marijuana tinha o valor de aproximadamente a renda anual média de uma famílias de oitos pessoas que se dedica à produção de cultivo lícito. No mercado de Kinshasa, na República Democrática do Congo (RDC), um saco de 25 quilos de marijuana é vendido por mil dólares, enquanto um saco de 80 quilos de mandioca vale somente 10 dólares.
Compreende-se, assim, que o cultivo desta substância entorpecente tem sérias repercussões na auto-suficiência alimentar de diversos países africanos. Segundo a associação de luta à toxicomania de Kinshasa, LIPILDRO, por causa do abandono dos cultivos legais por aqueles da cânabis, até 2010 a maior parte das cidades congolesas será atingida por um crise alimentar.
Além disso, na RDC se verificaram experiências para o cultivo da papoula de ópio (na província do Equador) e da cocaína (na região do Shaba). O mais importante produtor da cânabis na África subsaariana permanece, porém, a África do Sul. Importante produções são sinalizadas também em Lesoto e em Malauí.

DROGAS SINTÉTICAS
A produção de drogas sintéticas é limitada na África, com exceção da África do Sul, onde a fabricação de metanfetaminas e methaqualone aumentou nos últimos anos. Os dados sobre a descoberta de laboratórios clandestinos confirmam esta tendência.
Com efeito, se passou da descoberta à destruição de um laboratório por ano no período 1995-1999, aos 17 no período 2000-2003, até aos 28 destruídos somente em 2004. Um outro dado que demonstra o incremento do uso de drogas sintéticas na África do Sul é o aumento das apreensões de ecstasy: em 2004, houve um incremento de 385% das apreensões em relação ao ano precedente.
Além disso, as drogas sintéticas faziam parte do programa de guerra secreta química e biológica aplicado pelo regime do apartheid. Segundo os testemunhos reunidos durante o processo contra o responsável do programa, doutor Wouter Basson (definido “Doutor Morte” pela imprensa local), no âmbito do chamado “Project Coast”, entre 1992 e 1993 os laboratórios relacionados aos serviços secretos sul-africanos tinham produzido mais de 900 quilos de cristais de ecstasy (correspondente a 73 milhões de pílulas). No ano precedente, uma empresa de serviços do regime do apartheid tinha importado 500 quilos desta substância da Croácia.
Essas quantidades de drogas sintéticas foram importadas e produzidas para serem usadas como agente incapacitador para o controle da multidão (e talvez também para drogar secretamente os líderes da oposição para desacreditá-los, fazendo-os cometer gestos ridículos em público) e para serem distribuídas nas favelas habitadas pela população negra para promover o abuso de droga e a dependência.
O fim do regime do apartheid bloqueou este e outros projetos criminais aplicados no âmbito do “Project Coast”. Antes da queda do regime, porém, o dr. Basson tinha organizado a venda das empresas de cobertura dos serviços secretos sul-africanos, alguns dos quais fabricavam armas químicas e biológicas e drogas sintéticas.
Além disso, desapareceram centenas de quilos de substâncias químicas usadas na produção desses instrumentos de morte.
O dr. Basson é suspeito de ter aberto um empresa privada e, com efeito, quando foi detido em 1997 foi encontrado em posse de pílulas de ecstasy num valor de 20 mil dólares.

ÁFRICA ORIENTAL: UMA SITUAÇÃO PREOCUPANTE
Na África oriental, o Quênia é o principal ponto de trânsito da cocaína. Somente em 2004 foi apreendida 1,1 tonelada de cocaína entre a capital Nairóbi e o centro costeiro de Malindi. No decorrer da operação da polícia, que levou à descoberta desta importante carga de droga, foram detidos diversos funcionários da companhia aérea local (que resultou estranha ao narcotráfico), alguns dos quais foram capturados em Londres.
Das investigações emergiu que a droga que passava pelo Quênia era inserida no mercado britânico com a colaboração de alguns funcionários infiéis da companhia aérea. Além do Quênia, os países da África oriental interessados pelo narcotráfico são Etiópia, Botsuana, Zâmbia e África do Sul. Neste último, segundo o South African Institute of International Affaire, existem 500 mil pessoas que fazem uso de cocaína, enquanto 1/3 dos adolescentes utiliza entorpecentes. Segundo o centro de estudos sul-africano, no país atuam 300 organizações criminais internacionais envolvidas no narcotráfico.
Os países da região se tornaram não somente uma região de trânsito, mas também um novo mercado para os entorpecentes e, em particular, para a cocaína. Na Zâmbia, por exemplo, 80% da cocaína que chega ao país é transferida para a Europa e o restante 20% é consumado localmente.
A Interpol lançou o alarme sobre o crescente consumo de entorpecentes na África. “As drogas não somente transitam nos países, mas permanecem lá”, disse um responsável da organização internacional de polícia diante dos delegados de 150 organismos de polícia de todo o mundo, reunidos para o encontro anual da Interpol no Rio de Janeiro (Brasil). “Já se tornaram habituais as cargas de diversas toneladas de cocaína que passam pela África”, acrescentou.
Segundo um analista presente no seminário, se a tendência ao incremento do uso de entorpecentes continuar avançando, a África deverá enfrentar uma grave crise social derivante da droga.
As condições climáticas da maior parte da África são favoráveis ao cultivo da cânabis. Trata-se de um cultivo que permite um alto lucro para o agricultor e necessita de um trabalho menos intensivo em relação aos outros cultivos.
Inteiras famílias de agricultores podem viver, assim, de modo decente e permitir-se comprar alimento e medicamentos e enviar seus filhos à escola.
A cânabis é cultivada na África principalmente para o mercado local, mas nos últimos anos notou-se um aumento dos tráficos da cânabis originados na África subsaariana. Os maiores cultivos da cânabis se encontram em Comores, Etiópia, Quênia, Madagascar, Tanzânia e Uganda.
No Quênia, o cultivo da cânabis tem uma antiga tradição, mas nos últimos anos se tornou primeiramente uma produção limitada ao mercado local, para depois transformar-se em uma verdadeira empresa comercial ilícita estendida internacionalmente.
A cânabis é cultivada na região ocidental e naquela do Monte Quênia, onde, segundo alguns relatórios, existem cerca de 1.500 hectares cultivados com a cânabis. Os cultivos de droga estão escondidos entre aqueles tradicionais destinados à alimentação, mas há também cultivos menores em algumas áreas protegidas da reserva natural nacional.
Também as regiões costeiras se tornaram produtores da cânabis. Lá, com efeito, se instalaram diversos agricultores provenientes do interior, que lá encontraram áreas férteis e pouco controladas pela polícia, e um mercado constituído pela população local, pelos turistas e pelos residentes estrangeiros que preferem as costas do país.
Quanto ao ópio, no passado foram sinalizados alguns cultivos no Quênia e nas costas de Madagascar. Desde 1993 não foram sinalizados cultivos de opiáceos na África oriental, mas a vastidão do território e os escassos controles das autoridades locais tornam sempre possível uma retomada do cultivo da papoula de ópio.
No que diz respeito à produção local de drogas sintéticas, a África oriental é o ponto de trânsito do methaqualone (Mandrax) proveniente da Índia e destinado ao mercado sul-africano.
Nos últimos anos, a redução do Mandrax proveniente da Índia gerou uma produção local desta substância. Com efeito, foram descobertos laboratórios químicos clandestinos utilizados para a fabricação desta droga sintética em alguns países da África oriental e meridional.
Nos casos dos laboratórios descobertos no Quênia e na Tanzânia, se tratava somente de pequenos centros onde o pó do Mandrax ainda proveniente da Índia era transformado em pílulas, mas em outros casos deparou-se com verdadeiras oficinas para a fabricação do Mandrax com precursores químicos, cuja proveniência permaneceu desconhecida. A este propósito, as substâncias que mais causam preocupação são as efedrinas, as pseudo-efedrinas, o anidrido acético e o ácido N-acetilantranílico (utilizado na fabricação do Mandrax) e o pergamenato de potássio.
O mais famoso cultivo de planta entorpecente local é o khat, que é uma produção legal em diversos países da África oriental. O khat é cultivado na Etiópia e no Quênia e, em medida menos extensa, na Tanzânia, Comores e na parte setentrional de Madagascar. É exportado para os principais mercados da área (Djibuti, Eritréia, Somália e Iêmen), além da Europa e da América setentrional.
O uso do khat continua a expandir-se no Chifre da África e tem um papel-chave na contínua instabilidade da Somália, onde se calcula que a população gasta todos os anos 64 milhões de dólares por ano para comprar o khat. Trata-se de um quantia que é quase o dobro do total das ajudas internacionais doadas ao país. O khat não somente contribui para provocar problemas na sociedade, criando pessoas afetadas pela dependência de entorpecentes, mas tem também um papel na difusão no país de armas leves, frequentemente repassadas em troca de um pouco de droga.
As organizações de narcotraficantes olham com interesse aos países da África oriental e meridional por causa de suas infra-estruturas portuárias e aeroportuárias, dos comprimentos de suas costas e dos fluxos turísticos.
Todos elementos que permitem esconder os tráficos de droga. O Quênia tem o maior porto comercial da região, Mombasa, que serve a maior parte dos países privados de acesso direto ao mar, enquanto o aeroporto de Nairóbi é um dos mais traficados da área. As redes do narcotráfico utilizam também os portos de Dar-es-Salaam (na Tanzânia), Djibuti, Durban (na África do Sul) e Maputo (em Moçambique) e estão expandindo suas atividades também na Etiópia, Mauritius, Tanzânia e Uganda. Esses últimos países são usados como pontos de trânsito para a droga enviada para o Quênia, a África do Sul e a África ocidental e dessas áreas para a Europa e a América do Norte.
A maior parte das substâncias entorpecentes chega à região via mar, escondida nas cargas dos containers transportados pelos navios mercantis que navegam o Oceano Índico. Em alguns casos, os navios dos narcotraficantes se encontram em alto mar com embarcações menores, que levam para a terra a carga ilícita. Grandes quantidades de heroína chegam assim à região, mas se recorre também a carteiros, homens e mulheres, que chegam com vôos comerciais, e ao envio por correio.
Entre os países da África oriental interessados pelo tráfico e pelo consumo de substâncias entorpecentes, está Uganda.
Segundo um recente relatório do UNODC, “Uganda se tornou o país líder no tráfico e no consumo de droga em relação ao restante dos Estados da África oriental”. Entre as drogas presentes no mercado ilícito ugandense, existem a cânabis, a heroína, a cocaína e o mandrax, além do khat. Segundo a agência anticrime da ONU, o aumento do consumo de substâncias entorpecentes é devido a “duas décadas de conflitos armados e à falta de lei, que prejudicaram gravemente a infra-estrutura policial”.
O relatório observa que as condições climáticas de todo o território ugandense são favoráveis ao cultivo da cânabis: “O cultivo ilícito da planta é, porém, relevante em áreas remotas das regiões meridional, ocidental, central, oriental e norte-oriental. As dimensões exatas dos cultivos da cânabis não são conhecidas, mas se notou um aumento da produção da cânabis sobretudo para a exportação”. O aeroporto de Entebbe é, por fim, utilizado como ponto de trânsito para o envio de heroína e de mandrax ao extremo Oriente e à África do Sul.

CONCLUSÕES
A África é um ponto de trânsito sempre mais importante para as organizações de narcotraficantes, apesar de, no momento, a maior parte das apreensões de entorpecentes ocorrer em outras partes do mundo.
Vista a escassa eficiência das polícias africanas e a relativa recente conscientização do problema por parte dos entes locais e internacionais, pode-se supor que a quantidade das apreensões de droga na África não corresponda à entidade efetiva das cargas que transitam pelo continente.
A África, porém, não é mais somente um ponto de passagem da droga proveniente da América Latina e da Ásia em direção à Europa e à América setentrional, mas já se tornou um mercado ainda talvez “residual”, mas em todo caso que não pode ser ignorado pelas redes de narcotraficantes.
Redes nas quais estão presentes africanos, em particular nigerianos, em papéis não somente de gregários, mas também de organizadores. O crescente consumo de drogas por via endovenosa em diversos países africanos, como Tanzânia e Quênia, agrava o problema da difusão da AIDS.
Na Nigéria, por exemplo, um estudo revelou que o consumo de drogas se expande no mesmo ritmo do aumento das pessoas infetadas com o vírus HIV, em cidades como Kano e Port Harcourt.

 
At 9/17/2007 3:11 da manhã, Anonymous Anónimo escreveu...

A DROGA NA ÁFRICA: UM PROBLEMA MUNDIAL

A droga já é um problema na África e representa um ulterior obstáculo ao desenvolvimento do continente. É o que afirmam diversos organismos internacionais encarregados da luta ao tráfico de entorpecentes. Já em 2001, um relatório do Órgão Internacional de Controle das Drogas afirmava que “graças à sua experiência no campo do contrabando de haxixe e de heroína, os cartéis da droga da África ocidental buscam novos contatos na América Latina para estender o tráfico de cocaína a toda a região da África subsaariana”.
Trata-se de uma reviravolta fundamental na estratégia do narcotráfico mundial, que vê a África se tornar uma das áreas “fulcro” para a distribuição de drogas em todo o mundo. Até os primeiros anos da década de 90 do século passado, a África era mantida às margens das rotas da droga. A mudança ocorreu em 1993, quando foram apreendidos na Nigéria 300 quilos de heroína provenientes da Tailândia. É o sinal de uma mudança que vê a transformação de tantos pequenos contrabandistas africanos (a maioria nigerianos) de simples transportadores por conta de terceiros a membros de gangues guiadas por africanos, capazes de tratar no mesmo nível com análogas organizações de outros continentes.
A presença dessas organizações criminais, a forte urbanização, a perda dos valores tradicionais africanos e a difusão de uma cultura hedonista são todos fatores que criaram as premissas para um mercado africano da droga. A África, portanto, não é somente um local de trânsito dos entorpecentes, mas terreno “virgem” para o tráfico de droga.

PREMESSA METODOLÓGICA
Os dados apresentados são úteis para analisar a tendência (incremento ou decremento) do tráfico de entorpecentes, apesar de serem muito provavelmente aproximativos.
Segundo um estudo crítico efetuado pela associação ‘Libera’ do pe. Ciotti, com efeito os dados apresentados pelos entes antidrogas internacionais e de alguns Estados não relatam fielmente toda a produção mundial de cocaína. Segundo este estudo (referido somente à cocaína e não a outras drogas), existe uma discrepância entre a estimativa sobre a produção mundial de cocaína efetuada pela ONU e os dados relativos às apreensões e ao consumo de cocaína somente na América.
Segundo os elaboradores do relatório, com efeito, subtraindo das 937 toneladas de produção, indicada pelas Nações Unidas em 2004, as cerca de 450 consumadas nos Estados Unidos, Canadá, México e em toda a América do Sul e as cerca de 490 toneladas apreendidas em todas as Américas, se chegaria a um saldo negativo de 3 toneladas.
“A este ponto, não se saberia mais de onde subtrair as cerca de 99 toneladas de cocaína apreendidas no “resto do mundo”, afirma o relatório. Fazendo-o, se chegaria ao paradoxal saldo negativo de 102 toneladas de cocaína “não resultantes”, não tendo feito frente ainda à demanda de cocaína no “resto do mundo”, estimada em ao menos 300 toneladas, se chega a calcular uma espécie de buraco negro de aproximadamente 400 toneladas de cocaína não resultantes.
Este buraco negro assume proporções ainda mais macroscópicas, cerca de 700 toneladas, se calculado com base nos dados da Agência antidroga norte-americana.
Apesar dos seus limites, os relatórios dos organismos internacionais de luta contra a droga permanecem frequentemente os únicos instrumentos para analisar o fenômeno do narcotráfico.

A HEROÍNA NA ÁFRICA
A apreensão de opiáceos na África registrou um forte incremento nos últimos anos. Segundo dados da ONU, por exemplo, em 2004 ocorreu um incremento da apreensão de heroína de 60% em relação ao ano precedente.
A maior parte deste incremento é devido à apreensão ocorrida na África central e ocidental, que quase triplicou de 2003 a 2004. A heroína que passa pela África é destinada em primeiro lugar aos mercados europeus e, em segundo lugar, aos da América do Norte. A heroína provém dos países do sudoeste e sudeste da Ásia.
A quantia total dos opiáceos apreendida na África permanece ainda modesto (0,3% do total de apreensões em nível mundial). Porém, deve-se levar em consideração que não existem estatísticas confiáveis e que o nível das apreensões não reflete o verdadeiro fluxo de narcóticos que passa pela África por causa da debilidade da polícia local, que tem dificuldade em interceptar as cargas ilícitas.
No que concerne ao uso de opiáceos na África, segundo os dados do Departamento das Nações Unidas para a luta à criminalidade (UNODC), nota-se um aumento de seu consumo no continente africano, em particular na África oriental e naquela austral e em alguns países da África ocidental. Segundo os especialistas das Nações Unidas, o crescimento do consumo de heroína nessas áreas deriva do fato de que são utilizadas como locais de trânsito dos narcotraficantes, os quais, porém, não desdenham em criar um mercado local.
Na África do Sul, um dos poucos países africanos que dispõe de dados confiáveis, até os primeiros anos do novo milênio, o pedido de tratamentos por abuso de heroína representava somente 1% do total dos pedidos de cura por dependência de substâncias entorpecentes (incluído o álcool). Em 2005, esta porcentagem subiu para 7%.
Segundo o relatório do UNODC sobre o tráfico de entorpecentes de 2007, o mercado da heroína está dividido deste modo: a heroína afegã é destinada aos mercados da Ásia central, da Europa, do Oriente Médio e da África; aquela produzida no chamado “triângulo de ouro” alimenta o mercado chinês e o dos outros países asiáticos e da Oceania; aquela proveniente da América Latina serve o mercado norte-americano.
O relatório nota, porém, que “uma parte pequena, mas em crescimento, da produção de opiáceos afegãos é enviada à América setentrional, seja por meio da África oriental e ocidental, seja por meio da Europa”.
O relatório afirma que a demanda global de heroína permaneceu estável, “apesar de importantes incrementos nos países que se encontram no caminho das principais rotas do narcotráfico”.
Entre esses estão também diversos países africanos, afirma o documento, que destaca os efeitos prejudiciais da difusão da heroína e de outras substâncias entorpecentes nas populações já duramente provadas pela pobreza e pela difusão da AIDS.
Os últimos dados do UNODC mostram um forte incremento do uso de heroína em alguns países africanos como Moçambique, Zâmbia, Quênia, Tanzânia e Costa do Marfim, enquanto outros países tiveram um aumento mais contido. Entre esses, África do Sul, Madagascar, Gana, Libéria e Senegal.

DOS ANDES AO KILIMANJARO: UM FLUXO DE COCAÍNA INVADE A ÁFRICA
O dado mais preocupante, porém, é o da cocaína que transita da África em direção principalmente à Europa e, secundariamente, à América setentrional.
A importância da África, e em particular da África ocidental, como ponto de trânsito da cocaína em direção aos ricos mercados ocidentais é demonstrada pelo nível das apreensões registradas nos últimos anos. As apreensões de cocaína em toda a África aumentaram três vezes entre 2003 e 2004, enquanto no mesmo período as apreensões na África ocidental e central aumentaram seis vezes. As apreensões mais importantes no período 2000-2004 se registraram em Cabo Verde, seguido por África do Sul, Quênia, Gana e Nigéria. Mas as apreensões de cocaína na África representam somente 1% do total mundial das apreensões desta substância entorpecente. Também neste caso, porém, o dado é prejudicado devido à debilidade das polícias locais, incapazes de interceptar a maior parte dos fluxos de cocaína proveniente da América do Sul.
Em 2004, 50% das apreensões de cocaína no continente ocorreram na África ocidental e central. A zona de passagem mais utilizada pelos traficantes de cocaína é o Golfo da Guiné, de onde a substância entorpecente é transportada para a Europa em pequenas quantidades, através dos chamados “mulas”, pessoas que assumem o risco de ingerir óvulos de cocaína com a esperança de superar as alfândegas nos aeroportos de destinação. Nos últimos anos, também na África oriental aumentou a quantia de cocaína apreendida, indicando uma tendência a utilizar em medida crescente esta área como ponto de trânsito para a cocaína destinada à Europa e à Ásia.
Um dos países mais atingidos pelo fenômeno é o Quênia, onde em 2004 foi apreendida uma tonelada de cocaína. Em termos gerais, o crescimento da difusão da cocaína na África é demonstrada pelo fato que dos 32 países africanos que fornecem estatísticas sobre as apreensões de entorpecentes na UNODC, 23 (72%) relataram apreensões de cocaína, contra 34% em 1990.
Os traficantes de cocaína tendem a servir-se da África cada vez mais como ponto de trânsito por dois motivos. O primeiro deriva do melhoramento dos sistemas de inspeção utilizados pelas autoridades locais e por aquelas norte-americanas na área caribenha e centro-americana, tradicional rota utilizada pelos traficantes. Nos últimos anos, por exemplo, surgiram bases de inspeção norte-americanas dos Andes às ilhas caribenhas. Também as autoridades holandesas intensificaram a inspeção com patrulhas aéreas baseadas nas ilhas de Curaçao e Saint Martin.
O segundo fator está ligado à diminuição do consumo de cocaína, que se registrou nos Estados Unidos diante de um aumento da demanda na Europa. Se na América do Norte há o mais alto número de consumidores mundiais (6 milhões e meio, correspondente a cerca da metade do consumo mundial), a tendência é diminuir a demanda.
De 1998 a 2004, de fato, se registrou uma queda de 20% da difusão desta substância. No mesmo período, na Europa ocidental, onde os consumidores de cocaína são 3 milhões e meio (26% do total mundial), se notou um aumento do consumo e da difusão do “pó branco”. Na Espanha e no Reino Unido, este dado é de 2%.
A África, portanto, é uma cômoda e segura rota para alcançar um mercado em crescimento.
Além disso, como efeito colateral criou-se um mercado africano que está registrando nos últimos anos preocupantes aumentos.
A crescente disponibilidade de cocaína se traduz, com efeito, em um aumento do consumo desta substância na África. Segundo os dados do UNODC, no período 1992-2004 o abuso da cocaína na África cresceu em um ritmo mais sustentado do que no restante do mundo. Este incremento é mais remarcado nos países da África meridional e nos da África ocidental.
Se forem analisados os dados das pessoas que recorrem aos tratamentos de desintoxicação, o aumento do consumo de cocaína emerge com evidência. No início dos anos 90, as pessoas em tratamento por abuso de cocaína eram pouquíssimas, no final de 1996 constituíam 1.5% dos casos tratados pelas estruturas de recuperação dos toxicômanos, no biênio 1999-2000 eram 6%. No período 2001-2004, notou-se uma inflexão na porcentagem de pessoas que pediam para ser tratadas da dependência de cocaína (menos de 5%).
A partir do final de 2004, este dado está em crescimento: de 7,5% em 2004 passou-se a 8,5% nos primeiros meses de 2005.

A COCAÍNA NA ÁFRICA OCIDENTAL
O país tradicionalmente mais envolvido no narcotráfico é a Nigéria. Lá, com efeito, em 1993 houve a primeira grande apreensão de cocaína na África e as organizações criminais nigerianas estão perfeitamente inseridas no sistema criminal global e transnacional. A afirmação das máfias nigerianas deriva também da pertença da Nigéria ao Commonwealth, que permitiu abrir estreitas relações comerciais com o subcontinente indiano, produtor de ópio e de heroína, e com o mundo anglo-saxão consumidor.
No final dos anos 80, registrou-se um incremento importante no papel de centro estratégico e, em 1992, as apreensões de cocaína no aeroporto de Lagos foram tão relevantes que as autoridades nigerianas suspenderam os vôos diretos para o Rio de Janeiro. Desde então, os traficantes nigerianos são considerados os principais transportadores da droga, uma verdadeira indústria a serviço do comércio de heroína e da coca. Eles estão presentes em todos os pontos-chaves da produção e do tráfico de drogas. Graças aos compatriotas residentes no exterior, formaram clãs criminais comparáveis aos colombianos, turcos e chineses.
As organizações mafiosas nigerianas, como as outras, se baseiam na solidariedade étnica, de clã e de famílias. Já em 1995 as autoridades norte-americanas estimavam que 50% da heroína circulante em seu país era introduzida pelos nigerianos, os quais usam a Polônia e a Hungria como pontos de trânsito para a cocaína destinada à Europa ocidental.
Um dos países da África ocidental dos quais se têm estatísticas confiáveis sobre o incremento do tráfico de cocaína é Gana. Segundo os dados divulgados pelas autoridades locais, em um único ano as apreensões de cocaína aumentaram 40 vezes, passando dos 15 quilogramas de 2003 aos 617 quilos de 2004. A maior parte da cocaína é destinada ao mercado britânico.
Trata-se de um dado significativo, levando-se em consideração que, em termos porcentuais, as apreensões de cocaína aumentaram 18% em nível mundial e 4.000% em Gana de 2003 a 2004. No mesmo período, na África, as apreensões de cocaína aumentaram 3 vezes, passando das 1,1 tonelada para 3,6 toneladas.
Nos anos sucessivos, emergiram outros fatos que demonstram que Gana se tornou um importante ponto de passagem da cocaína na África ocidental. Em novembro de 2005, a polícia ganense apreendeu 588 quilos no decorrer de uma perquirição em uma habitação em East Lagon. Em abril de 2006, foram descobertos a bordo do navio MV Benjamin, atracado no porto de Tema, 2.310 quilos de cocaína.
Segundo um responsável do UNODC, as organizações de narcotraficantes tendem a fazer transitar a droga por meio da África ocidental porque, até agora, as autoridades alfandegárias européias e norte-americanas controlam com menos atenção as mercadorias e as bagagens provenientes da África em relação àquelas provenientes da América Latina. No caso de Gana, como de outros países da região, o fato de não estar inserido na lista dos países produtores de cocaína significa que as suas mercadorias não são sujeitas a inspeções detalhadas. Mas nos últimos anos, as coisas mudaram e Gana foi inserida na lista dos países “de alta prioridade” de inspeção.
Os traficantes buscam corromper os policiais e a polícia para permitir o trânsito das cargas de entorpecentes. Para investigar casos de corrupção de policiais, o Ministério da Fazenda de Gana criou uma Comissão de investigação, que recebeu o nome da sua Presidenta, Georgina Wood, que desempenhou importantes cargos na polícia e na magistratura local. O “Georgina Wood Committee” nasceu após duas importantes apreensões de cocaína citadas precedentemente, nas quais resultaram envolvidos alguns policiais. Entre as recomendações apresentadas pelo Comitê, está reforçar o patrulhamento das costas do país por meio seja da potenciação dos meios da marinha e da aeronáutica, seja com a criação de um serviço de guarda-costas independente.
A Guiné-Bissau é um outro país que se tornou ponto de trânsito da cocaína da América Latina à Europa, como demonstrado numa recente operação que levou à captura de 674 quilos de cocaína e à detenção de alguns narcotraficantes sul-americanos. Na África ocidental, os países mais envolvidos pelos fluxos de droga, além de Gana, são Costa do Marfim, Senegal e Nigéria.
Os traficantes de cocaína na Guiné-Bissau estão ligados aos que passam através do vizinho Senegal, como emergiu da operação efetuada no final de junho de 2007 pela polícia de Dakar, que levou à apreensão de mais de duas toneladas de cocaína. Parte da droga se encontrava em um veleiro que estava à deriva diante das costas senegalesas, e uma outra em uma habitação na área balneária de Mbour, a sul de Dakar.
No veleiro os investigadores encontraram uma documentação que comprova que os narcotraficantes utilizam a Guiné-Bissau como depósito de trânsito da cocaína proveniente da América Latina e destinada à Europa. Também a nacionalidade dos detidos demonstra o grau de internacionalização das organizações criminais dedicadas ao narcotráfico. Além de três cidadãos sul-americanos (um colombiano, um venezuelano e um equatoriano) e de uma cidadã francesa, a polícia deteve três senegaleses. A partir dos documentos detidos, além disso a polícia senegalesa descobriu que os narcotraficantes efetuaram diversas viagens aos países limítrofes: Serra Leoa, Guiné Conakry, Guiné-Bissau e Gâmbia.
As autoridades senegalesas reiteraram que em seu país não existem depósitos de cocaína, mas admitiram a infiltração de grupos criminais estrangeiros, que utilizam o aeroporto de Dakar para enviar cocaína à Europa. No período de janeiro a junho de 2007, a polícia senegalesa afirma ter apreendido no aeroporto de Dakar 44 quilos de cocaína e detido cerca de 30 “mulas” da droga, a maior parte dos quais nigeriano.
Está em aumento também o número de “mulas” da Guiné-Bissau detidos no momento do embarque para Portugal, onde podem entrar sem visto. Além disso, foram descobertas algumas operações de reciclagem de dinheiro sujo por parte de organizações estrangeiras. A apreensão recorde efetuada pela polícia senegalesa, equivalente ao total de apreensões de cocaína na África ocidental de setembro de 2006 a maio de 2007, é somente o último de uma série efetuada nos primeiros seis meses de 2007 em várias localidades da África ocidental.
Entre essas, há 800 quilos de cocaína recuperados no mar diante das ilhas Canárias, e uma quantia análoga apreendida pela marinha francesa no largo da Costa do Marfim. Além dos navios, as organizações criminais recorrem a aviões para alimentar seus tráficos ilícitos.
Na Venezuela foi bloqueado um avião com 2,5 toneladas de cocaína, que se preparava a partir para Serra Leoa, enquanto em maio de 2007 foram apreendidos 600 quilos de cocaína a bordo de um Cessna, matriculado na Venezuela, que efetuou uma aterrissagem de emergência em Nouadhibou, na Mauritânia.
Segundo um responsável do ONUDC, para a África ocidental o aumento de confiscos das cargas de cocaína na região é devido mais a incidentes de percurso que a uma maior eficácia da polícia.
O funcionário considera que a cada dez expedições de droga em direção à Europa, nove chegam a seu destino sem problemas.

O SAHEL: NOVA FRONTEIRA DO NARCOTRÁFICO?
Das costas da África ocidental as organizações de narcotraficantes estão progressivamente se expandindo aos países do Sahel, cujo papel estratégico entre o Atlântico e o Magreb, e, portanto o Mediterrâneo, é apreciado também pelos traficantes de seres humanos e, provavelmente, pelo terrorismo internacional. Não se pode excluir a priori uma interconexão entre essas realidades criminais, de que são cúmplices a debilidade dos Estados e a vastidão dos territórios a controlar. Um realidade que suscita o alarme dos governos interessados.
Em abril deste ano, depois da apreensão de três caminhões cheios de droga e armas, o Presidente do Níger, Mamadou Tandja, declarou que o exército local pretende aumentar os esforços para impedir que o seu país seja “circundado” pelos traficantes de armas e de droga, que são uma “ameaça real” para o país.
Também Burkina Fasso não foge ao fenômeno. Segundo o Coordenador do Comitê contra os tráficos ilícitos de droga em Burkina Fasso, o volume das cargas de droga interceptadas nos primeiros três meses de 2007 é “incrível”. O funcionário indica a existência de uma nova rota de trânsito da droga no oeste e no sudoeste do país. No início de abril de 2007, 49 quilos de cocaína, num valor de 10 milhões de dólares, foram interceptados pela polícia de Burkina Fasso na fronteira com o Mali, que é um importante ponto de trânsito para o tráfico de seres humanos. Países como Mali e Níger são há milênios atravessados por vias de caravanas, que agora se converteram num uso criminal: para o tráfico de seres humanos, mas também de armas, droga e cigarros de contrabando. “Nos últimos meses notamos um aumento da utilização dos países do Sahel, como Mali e Níger, para o tráfico de cocaína”, disse Antonio Razzitelli, Diretor do departamento do UNODC para a África ocidental.
Segundo o órgão anticrime da ONU, os traficantes importam a droga por meio das cidades costeiras como Conakry, na Guiné, Dakar, no Senegal, e Lomé, no Togo, e depois a transportam para as cidades do interior, como Bamako, no Mali, e Ouagadougou, em Burkina Fasso. Dessas localidades, a cocaína prossegue a sua viagem até a Europa.
Segundo o responsável do Comitê contra os tráficos ilícitos de droga em Burkina Fasso, é preciso coordenar os esforços entre as polícias dos Estados da região. “Há uma necessidade urgente de reunir todos os entes nacionais antidroga da região para encontrar o modo de cooperar entre si, para tentar deter as redes criminais”, disse, destacando que a escassa cooperação entre as fronteiras dos países do Sahel e a falta de meios das polícias locais constituem problemas adjuntos para uma eficaz ação de contraste às redes criminais.

O MERCADO DA CÂNABIS
Enquanto a África permanece, no momento, somente um local de trânsito e um mercado residual para drogas como cocaína e heroína, a principal produção local de substâncias entorpecentes é representada pela cânabis.
O cultivo da cânabis foi introduzido na África oriental pelos mercantes árabes, pérsios e indianos no século XII. De lá se difundiu primeiramente na África austral, no século XV, e depois no Congo e em Angola no século XIX. Somente depois da Segunda Guerra Mundial a cânabis chegou à África ocidental, levada por soldados nigerianos e ganenses que combateram com as tropas britânicas na Birmânia (atual Mianmar), onde adquiriram o hábito de fumar marijuana. Este fato explica porque nos países onde a cânabis é conhecida há mais tempo, ela é utilizada na medicina tradicional, enquanto na África ocidental é usada para fins “recreativos”. Até os anos 80, porém, a produção africana da cânabis permaneceu limitada. A partir daqueles anos, porém, notou-se um incremento notável da superfície cultivada com a cânabis para fins comerciais.
A produção desta substância se divide em três categorias: a erva da cânabis (flores e folhas), resina ou haxixe (secreções emitidas pela planta durante a fase de florescimento) e óleo de haxixe, o menos utilizado. Segundo o World Drug Report 2006, a erva da cânabis é cultivada, sobretudo de modo ilegal, em 176 países em todo o mundo. A África representa 27% da produção mundial e os principais produtores são Marrocos (3.700 toneladas), África do Sul (2.200 toneladas) e Nigéria (2 mil toneladas).
No que concerne ao haxixe, o principal produtor mundial é Marrocos, que fornece os mercados norte-africanos e europeus. Graças ao esforço das autoridades marroquinas nos últimos anos, deu-se a diminuição da produção local da cânabis, à qual corresponde um aumento da produção em outros países, da Ásia ocidental (Afeganistão, Paquistão) à Albânia. O UNODC reconhece que desde 2003 o governo de Rabat conduziu uma campanha para estimar a produção de resina da cânabis no país, em cooperação com a Agência anticrime das Nações Unidas. Segundo uma investigação efetuada em 2003, a produção da cânabis foi de 3.060 toneladas, cultivada em 134 mil hectares de terra na região do Rif (norte do país) por 96.600 famílias de camponeses. A investigação feita em 2004 registrou uma diminuição de 10% das terras cultivas com a cânabis, que passaram a 120.500 hectares, com uma produção estimada de 2.760 toneladas.
Em 2005 notou-se uma ulterior diminuição de 37%, sendo a superfície cultivada com a cânabis de 72.500 hectares, enquanto a produção diminuiu para 1.070 toneladas. Quanto às apreensões da cânabis, nos últimos 12-15 anos se registrou um aumento da porcentagem mundial de apreensões no continente africano desta substância. Enquanto em 1990 16% do total mundial das apreensões da cânabis ocorria na África, em 2002 este dado subiu para 20%, para alcançar 31% em 2004. O aumento das apreensões na África é determinado sobretudo pelo aumento dos controles policiais e alfandegários efetuados pela Nigéria e pela África do Sul.
O principal mercado de consumo da cânabis é a Europa ocidental, e 80% da cânabis consumada na Europa provém do Marrocos, passando pela Espanha e pela Holanda e dali distribuída aos outros países. O terceiro mercado mundial de consumo é representado pelos países do norte da África, onde a cânabis provém principalmente do Marrocos. Parte da cânabis produzida no Afeganistão e Paquistão, além disso, alimenta o mercado dos países da África oriental.
No que concerne às problemáticas sociais ligadas ao consumo da cânabis, é preciso recordar que esta substância é a droga mais difundida e usada em nível mundial. Estima-se que, em 2004, 162 milhões de pessoas a tenham usado, o equivalente a 3,9% da população mundial entre 15 e 64 anos. Em termos relativos (a porcentagem de habitantes que faz uso da cânabis em relação a outras substância entorpecentes), a cânabis é prevalentemente utilizada na Oceania, seguida por América do Norte e África. Desde 1992, na África, notou-se também uma tendência ao aumento do seu consumo, em particular na Argélia, Nigéria e Zâmbia.
É provável que a tendência ao uso desta droga seja subestimada em diversos países da África, que não têm uma capacidade de coleta de dados adequados para seguir o fenômeno. Segundo dados parciais, notou-se nos últimos anos um forte incremento do abuso da cânabis na África ocidental, oriental e no norte da África, em sintonia com a tendência em nível global de uma ulterior expansão do consumo desta substância.
Até os anos 80, porém, a produção africana da cânabis permaneceu limitada. A partir daqueles anos, porém, notou-se um incremento notável da superfície cultivada com a cânabis para fins comerciais.
A produção africana de droga subtraiu terras e recursos à agricultura, isso porque naquele período se registrou uma forte queda dos preços dos produtos agrícolas em todo o mundo. A agricultura africana, já frágil, entrou em crise. Diversos camponeses, portanto, deixaram-se tentar pelo cultivo da cânabis em detrimento do cultivo de produtos lícitos.
Um simples cálculo econômico demonstra o forte poder de atração de uma semelhante produção; já em 1995, na Guiné, um saco de 20-25 quilos de marijuana tinha o valor de aproximadamente a renda anual média de uma famílias de oitos pessoas que se dedica à produção de cultivo lícito. No mercado de Kinshasa, na República Democrática do Congo (RDC), um saco de 25 quilos de marijuana é vendido por mil dólares, enquanto um saco de 80 quilos de mandioca vale somente 10 dólares.
Compreende-se, assim, que o cultivo desta substância entorpecente tem sérias repercussões na auto-suficiência alimentar de diversos países africanos. Segundo a associação de luta à toxicomania de Kinshasa, LIPILDRO, por causa do abandono dos cultivos legais por aqueles da cânabis, até 2010 a maior parte das cidades congolesas será atingida por um crise alimentar.
Além disso, na RDC se verificaram experiências para o cultivo da papoula de ópio (na província do Equador) e da cocaína (na região do Shaba). O mais importante produtor da cânabis na África subsaariana permanece, porém, a África do Sul. Importante produções são sinalizadas também em Lesoto e em Malauí.

DROGAS SINTÉTICAS
A produção de drogas sintéticas é limitada na África, com exceção da África do Sul, onde a fabricação de metanfetaminas e methaqualone aumentou nos últimos anos. Os dados sobre a descoberta de laboratórios clandestinos confirmam esta tendência.
Com efeito, se passou da descoberta à destruição de um laboratório por ano no período 1995-1999, aos 17 no período 2000-2003, até aos 28 destruídos somente em 2004. Um outro dado que demonstra o incremento do uso de drogas sintéticas na África do Sul é o aumento das apreensões de ecstasy: em 2004, houve um incremento de 385% das apreensões em relação ao ano precedente.
Além disso, as drogas sintéticas faziam parte do programa de guerra secreta química e biológica aplicado pelo regime do apartheid. Segundo os testemunhos reunidos durante o processo contra o responsável do programa, doutor Wouter Basson (definido “Doutor Morte” pela imprensa local), no âmbito do chamado “Project Coast”, entre 1992 e 1993 os laboratórios relacionados aos serviços secretos sul-africanos tinham produzido mais de 900 quilos de cristais de ecstasy (correspondente a 73 milhões de pílulas). No ano precedente, uma empresa de serviços do regime do apartheid tinha importado 500 quilos desta substância da Croácia.
Essas quantidades de drogas sintéticas foram importadas e produzidas para serem usadas como agente incapacitador para o controle da multidão (e talvez também para drogar secretamente os líderes da oposição para desacreditá-los, fazendo-os cometer gestos ridículos em público) e para serem distribuídas nas favelas habitadas pela população negra para promover o abuso de droga e a dependência.
O fim do regime do apartheid bloqueou este e outros projetos criminais aplicados no âmbito do “Project Coast”. Antes da queda do regime, porém, o dr. Basson tinha organizado a venda das empresas de cobertura dos serviços secretos sul-africanos, alguns dos quais fabricavam armas químicas e biológicas e drogas sintéticas.
Além disso, desapareceram centenas de quilos de substâncias químicas usadas na produção desses instrumentos de morte.
O dr. Basson é suspeito de ter aberto um empresa privada e, com efeito, quando foi detido em 1997 foi encontrado em posse de pílulas de ecstasy num valor de 20 mil dólares.

ÁFRICA ORIENTAL: UMA SITUAÇÃO PREOCUPANTE
Na África oriental, o Quênia é o principal ponto de trânsito da cocaína. Somente em 2004 foi apreendida 1,1 tonelada de cocaína entre a capital Nairóbi e o centro costeiro de Malindi. No decorrer da operação da polícia, que levou à descoberta desta importante carga de droga, foram detidos diversos funcionários da companhia aérea local (que resultou estranha ao narcotráfico), alguns dos quais foram capturados em Londres.
Das investigações emergiu que a droga que passava pelo Quênia era inserida no mercado britânico com a colaboração de alguns funcionários infiéis da companhia aérea. Além do Quênia, os países da África oriental interessados pelo narcotráfico são Etiópia, Botsuana, Zâmbia e África do Sul. Neste último, segundo o South African Institute of International Affaire, existem 500 mil pessoas que fazem uso de cocaína, enquanto 1/3 dos adolescentes utiliza entorpecentes. Segundo o centro de estudos sul-africano, no país atuam 300 organizações criminais internacionais envolvidas no narcotráfico.
Os países da região se tornaram não somente uma região de trânsito, mas também um novo mercado para os entorpecentes e, em particular, para a cocaína. Na Zâmbia, por exemplo, 80% da cocaína que chega ao país é transferida para a Europa e o restante 20% é consumado localmente.
A Interpol lançou o alarme sobre o crescente consumo de entorpecentes na África. “As drogas não somente transitam nos países, mas permanecem lá”, disse um responsável da organização internacional de polícia diante dos delegados de 150 organismos de polícia de todo o mundo, reunidos para o encontro anual da Interpol no Rio de Janeiro (Brasil). “Já se tornaram habituais as cargas de diversas toneladas de cocaína que passam pela África”, acrescentou.
Segundo um analista presente no seminário, se a tendência ao incremento do uso de entorpecentes continuar avançando, a África deverá enfrentar uma grave crise social derivante da droga.
As condições climáticas da maior parte da África são favoráveis ao cultivo da cânabis. Trata-se de um cultivo que permite um alto lucro para o agricultor e necessita de um trabalho menos intensivo em relação aos outros cultivos.
Inteiras famílias de agricultores podem viver, assim, de modo decente e permitir-se comprar alimento e medicamentos e enviar seus filhos à escola.
A cânabis é cultivada na África principalmente para o mercado local, mas nos últimos anos notou-se um aumento dos tráficos da cânabis originados na África subsaariana. Os maiores cultivos da cânabis se encontram em Comores, Etiópia, Quênia, Madagascar, Tanzânia e Uganda.
No Quênia, o cultivo da cânabis tem uma antiga tradição, mas nos últimos anos se tornou primeiramente uma produção limitada ao mercado local, para depois transformar-se em uma verdadeira empresa comercial ilícita estendida internacionalmente.
A cânabis é cultivada na região ocidental e naquela do Monte Quênia, onde, segundo alguns relatórios, existem cerca de 1.500 hectares cultivados com a cânabis. Os cultivos de droga estão escondidos entre aqueles tradicionais destinados à alimentação, mas há também cultivos menores em algumas áreas protegidas da reserva natural nacional.
Também as regiões costeiras se tornaram produtores da cânabis. Lá, com efeito, se instalaram diversos agricultores provenientes do interior, que lá encontraram áreas férteis e pouco controladas pela polícia, e um mercado constituído pela população local, pelos turistas e pelos residentes estrangeiros que preferem as costas do país.
Quanto ao ópio, no passado foram sinalizados alguns cultivos no Quênia e nas costas de Madagascar. Desde 1993 não foram sinalizados cultivos de opiáceos na África oriental, mas a vastidão do território e os escassos controles das autoridades locais tornam sempre possível uma retomada do cultivo da papoula de ópio.
No que diz respeito à produção local de drogas sintéticas, a África oriental é o ponto de trânsito do methaqualone (Mandrax) proveniente da Índia e destinado ao mercado sul-africano.
Nos últimos anos, a redução do Mandrax proveniente da Índia gerou uma produção local desta substância. Com efeito, foram descobertos laboratórios químicos clandestinos utilizados para a fabricação desta droga sintética em alguns países da África oriental e meridional.
Nos casos dos laboratórios descobertos no Quênia e na Tanzânia, se tratava somente de pequenos centros onde o pó do Mandrax ainda proveniente da Índia era transformado em pílulas, mas em outros casos deparou-se com verdadeiras oficinas para a fabricação do Mandrax com precursores químicos, cuja proveniência permaneceu desconhecida. A este propósito, as substâncias que mais causam preocupação são as efedrinas, as pseudo-efedrinas, o anidrido acético e o ácido N-acetilantranílico (utilizado na fabricação do Mandrax) e o pergamenato de potássio.
O mais famoso cultivo de planta entorpecente local é o khat, que é uma produção legal em diversos países da África oriental. O khat é cultivado na Etiópia e no Quênia e, em medida menos extensa, na Tanzânia, Comores e na parte setentrional de Madagascar. É exportado para os principais mercados da área (Djibuti, Eritréia, Somália e Iêmen), além da Europa e da América setentrional.
O uso do khat continua a expandir-se no Chifre da África e tem um papel-chave na contínua instabilidade da Somália, onde se calcula que a população gasta todos os anos 64 milhões de dólares por ano para comprar o khat. Trata-se de um quantia que é quase o dobro do total das ajudas internacionais doadas ao país. O khat não somente contribui para provocar problemas na sociedade, criando pessoas afetadas pela dependência de entorpecentes, mas tem também um papel na difusão no país de armas leves, frequentemente repassadas em troca de um pouco de droga.
As organizações de narcotraficantes olham com interesse aos países da África oriental e meridional por causa de suas infra-estruturas portuárias e aeroportuárias, dos comprimentos de suas costas e dos fluxos turísticos.
Todos elementos que permitem esconder os tráficos de droga. O Quênia tem o maior porto comercial da região, Mombasa, que serve a maior parte dos países privados de acesso direto ao mar, enquanto o aeroporto de Nairóbi é um dos mais traficados da área. As redes do narcotráfico utilizam também os portos de Dar-es-Salaam (na Tanzânia), Djibuti, Durban (na África do Sul) e Maputo (em Moçambique) e estão expandindo suas atividades também na Etiópia, Mauritius, Tanzânia e Uganda. Esses últimos países são usados como pontos de trânsito para a droga enviada para o Quênia, a África do Sul e a África ocidental e dessas áreas para a Europa e a América do Norte.
A maior parte das substâncias entorpecentes chega à região via mar, escondida nas cargas dos containers transportados pelos navios mercantis que navegam o Oceano Índico. Em alguns casos, os navios dos narcotraficantes se encontram em alto mar com embarcações menores, que levam para a terra a carga ilícita. Grandes quantidades de heroína chegam assim à região, mas se recorre também a carteiros, homens e mulheres, que chegam com vôos comerciais, e ao envio por correio.
Entre os países da África oriental interessados pelo tráfico e pelo consumo de substâncias entorpecentes, está Uganda.
Segundo um recente relatório do UNODC, “Uganda se tornou o país líder no tráfico e no consumo de droga em relação ao restante dos Estados da África oriental”. Entre as drogas presentes no mercado ilícito ugandense, existem a cânabis, a heroína, a cocaína e o mandrax, além do khat. Segundo a agência anticrime da ONU, o aumento do consumo de substâncias entorpecentes é devido a “duas décadas de conflitos armados e à falta de lei, que prejudicaram gravemente a infra-estrutura policial”.
O relatório observa que as condições climáticas de todo o território ugandense são favoráveis ao cultivo da cânabis: “O cultivo ilícito da planta é, porém, relevante em áreas remotas das regiões meridional, ocidental, central, oriental e norte-oriental. As dimensões exatas dos cultivos da cânabis não são conhecidas, mas se notou um aumento da produção da cânabis sobretudo para a exportação”. O aeroporto de Entebbe é, por fim, utilizado como ponto de trânsito para o envio de heroína e de mandrax ao extremo Oriente e à África do Sul.

CONCLUSÕES
A África é um ponto de trânsito sempre mais importante para as organizações de narcotraficantes, apesar de, no momento, a maior parte das apreensões de entorpecentes ocorrer em outras partes do mundo.
Vista a escassa eficiência das polícias africanas e a relativa recente conscientização do problema por parte dos entes locais e internacionais, pode-se supor que a quantidade das apreensões de droga na África não corresponda à entidade efetiva das cargas que transitam pelo continente.
A África, porém, não é mais somente um ponto de passagem da droga proveniente da América Latina e da Ásia em direção à Europa e à América setentrional, mas já se tornou um mercado ainda talvez “residual”, mas em todo caso que não pode ser ignorado pelas redes de narcotraficantes.
Redes nas quais estão presentes africanos, em particular nigerianos, em papéis não somente de gregários, mas também de organizadores. O crescente consumo de drogas por via endovenosa em diversos países africanos, como Tanzânia e Quênia, agrava o problema da difusão da AIDS.
Na Nigéria, por exemplo, um estudo revelou que o consumo de drogas se expande no mesmo ritmo do aumento das pessoas infetadas com o vírus HIV, em cidades como Kano e Port Harcourt.

 

Enviar um comentário

<< Home