O TPC da Émièle

Não fosse a Émièle a fazer o convite e ela ser minha amiga e ainda por cima ter aceite o convite para inaugurar a nossa Coluna dos Convidados e eu fingia que não via. Tipo, sabes não tenho passado pelo Pópulo, muito trabalho, tás e ver??? nem dei por isso...que pobre vida a minha e etc., mais um choradinho de dez minutos e já tava. Problema resolvido. Agora já é tarde, tás a ver???olha, fica para outra vez. Problema para além de resolvido, arquivado com a certeza que não haveria réplica.

Mas é a Émièle. E não há como fugir. Então lá vamos nós. De partida para umas décadazitas atràs.

Como toda a gente, queria ser professora. Como toda a gente, queria ser médica. E, como toda a gente, tinha curtido ser bombeira. A professora, desisti logo num ano em que só me calharam professoras gordas e más comás cobras. Médica, quando vi sangue a primeira vez, no dedo da Fernanda da casa ao lado e desmaiei completamente, ficando com um galo na cabeça que ainda hoje canta. Bombeira, quando me convenci que se os pobrezinhos dos médicos tinham galos, os bombeiros deveriam ter direito a uma capoeira inteira.

Primeira etapa concluída. O meu altruísmo foi por água abaixo.

Então decidi-me por cabeleireira. Adorava fazer rabos de cavalo na única boneca com cabelo, que o dinheiro dos meus pais me permitiu ter até terem ido para França e me trazerem uma enorme com cabelo enorme que dizia mamã e fazia xi-xi. Nunca entendi muito bem porque é que para dizer mamã era preciso fazer xi-xi, mas para ser cabeleireira não era necessário perder muito tempo com esses problemas filosóficos.

Desisti do cabeleireira quando me começaram a dizer como é que eu passava horas a pentear a boneca e não me penteava a mim, que andava sempre como se tivesse visto bicho. Já na altura entendi que quando vimos bicho ficamos despenteadas. O futuro encarregar-se-ia de me mostrar a razão desse ensinamento.

Um tempo mais tarde, comecei a querer ter uma cabra em casa. Isto pode não parecer ter nada a ver com futuro, mas tinha. Partia do princípio que iria ter um futuro com muitos papéis e alguém me convenceu que as cabras comiam papel. Juntaria, portanto, dois futuros num só. Um futuro com qualquer coisa com muitos papéis e pastora de cabra.

Um dia, vi uma cabra a sério em casa da vizinha Alzira, dei-lhe uma folha de jornal e a gaja olhou para mim como se tivesse visto uma ave rara. Desviou-se do jornal, deu meia volta e foi-se embora. Acabou aqui o meu sonho de pastora.

Acho que, no meio destes sonhos, ainda tive tempo para um tempo em que queria ser costureira. Houve um curso da Singer lá na terra, para cachopos e cada um (uma, como é bom de ver) tinha que fazer um vestido. O meu foi o de noiva. Adorei fazer aqueles folhos todos, o véu em tule e umas flores noutro tule e pensei, cá tá o meu futuro. Tive o azar de a minha avó ser costureira e só fazer calças horríveis de homem. Cinzentas. Azuis escuras. Pretas. Castanhas. Nem umas com uma flor de tule que fosse. Desisti da costureira.

Entretanto, os anos foram passando e já devia estar naquela fase em que o que queria ser quando fosse grande era o Che Guevara. Imaginava-me a escrever: Profissão: Che Guevara. Local de Trabalho: Mundo.

Pronto. A seguir vieram sonhos ainda mais irrealizáveis. Mudar o mundo. Fazer a Revolução. Mas aí já era mais grandita e não precisei que me dessem razões para desistir deles. Fui descobrindo sozinha. Claro que como sou um bocado lerda tem demorado tempo. Ainda não me convenci totalmente...

Como não fui nem cabeleireira, nem bombeira, nem médica, nem professora, nem costureira de fatos de noiva, nem, sequer, Che Guevara e para não me convencer que andei uma vida inteira de cachopo enganada...fazer a Revolução talvez não para já...mas mudar o Mundo ainda sou gaja p'ra isso!!!!

...

Ah, pera aí...falta o convite. Ok, Então cá vai (desculpem lá, faxavor!!). Daniel;Trilby;José Palmeiro

Agora fujo para vocês não me baterem.