Tristes missionários

Recebi um mail, não solicitado, duma tal "Maria Silva" (smonteiro.maria@gmail.com) a que respondi. O texto da minha resposta é o seguinte:

Cara senhora,

Não sei porquê mas você resolveu perturbar a minha pacatez sem minguém lhe ter encomendado o sermão. Enviou-me um texto obscurantista, provinciano e completamente falho de quaisquer critérios esclarecedores.A senhora intitula-se médica e pediatra. Eu para lhe prestar atenção teria preferido que se considerasse apenas um ser humano. Enquanto médica ou pediatra não lhe vejo qualquer credencial especial para que me "atire" com a sua profissão para os olhos. Acontece que eu sei ver. E dispenso conselhos missionários ou proselitistas como os que me enviou. A senhora diz que é a favor da vida. Que vida? Pelos seus argumentos quer dar a sensação de se preocupar com a vida biológica. E daí? Será por acaso uma pessoa que pensa duas vezes antes de contribuir para tirar uma vida? Não me parece. Pois para isso teria que ser vegetariana e não se alimentar da morte dos animais. Ora eu sei de antemão que a esmagadora maioria dos cristãos deste país é tudo menos vegetariano. Por isso a senhora é hipócrita porque a vida para si não é a Vida. É a vida que lhe convém! Ao seu pensamento obscurantista, culposo e culpabilizante. Preocupa-se então com a vida humana dirá. Por isso é médica, pediatra. Será verdade? Ou é por causa do bom dinheiro que ganha com a sua profissão? Não sei. Não a conheço. Pode bem ser que seja médica para ganhar umas boas massas e pagar pouquinhos impostos. Preocupa-se então com a vida humana a ponto de me escrever a mim, um perfeito desconhecido? Naturalmente escreveu a mais gente. A muita gente. Mas olhe que eu estou bem de saúde e enquanto ser humano considero-me esclarecido e à frente do meu tempo. Em África, neste momento, estão milhares de crianças enfermas e a morrer pois não têm as condições que a senhora lhes pode prestar dada a sua profissão. A vida é tão importante para si ao ponto de ir para lá ajudar quem precisa? Certamente que não, senão não teria perdido o seu tempo querendo doutrinar-me. Está visto que a vida humana, para si, é uma coisa de sumenos. O seu objectivo é outro! Está aflita porque amanhã os portugueses e as portuguesas podem fazer com que o SIM ganhe no referendo. E então recorre a todos os estrategemas que consegue arrebanhar para tentar impedir que o Sim ganhe. É esse o seu verdadeiro objectivo. É esse o seu terror, o seu pesadelo. Se é que você é mesmo uma pessoa, pois para mim você pode bem ser um testa de ferro duma qualquer organização de fanáticos religiosos.

Mas entrando no seu campo, diz você que a vida de um feto é uma vida. Mas o que lhe parece mais importante a vida dum feto ou a vida da mãe do feto? Preocupa-se com a vida do feto e não se preocupa com a vida da mãe? O que é mais importante para si? E não venha dizer que é a mesma vida humana, não seja mentirosa! Deverá a vida humana da mulher acocorar-se, ou como você certamente mais gostará, ajoelhar-se ante a vida dum feto? Porquê? Se você acha que é a mesma vida então você deve ser fanaticamente comunista achando igual aquilo que é completamente diferente.

Deixo-lhe estas questões para a senhora reflectir. Onde quizer. Pode ser mesmo na sacristia. Porém não acredito que o faça num templo sagrado de consciência tranquila e limpa.

O seu texto visa confundir ao invés de esclarecer. Visa enfraquecer em vez de fortalecer. É abafadamente moralista em vez de ser libertador. É claramente condenatório em vez de ser misericordioso.

Estou certo que deve ser uma pessoa que acredita em Deus. Mas o seu coração é frio e deprimido. É o que acontece quando não se tem o amor e o carinho dos pais em pequena. Por isso ninguém pode julgar a consciência das mulheres que tem esse problema. Para que não haja gente muita gente como você: seca, crua, de coração carente e doente.

Um bom dia para si.