No meu professor de português, a manifestação desta tarde
Hoje. ao subir a Avenida lembrei-me do meu professor de Português do Liceu de Santarém. Quando voltei para casa, abri o Esquerda.Net, li este texto e voltei a lembrar-me do meu professor de portugués do Liceu de Santarém.
Ele ensinou-me a gostar de escrever. Era um ser humano excepcional. Mágico. A forma como nos conseguia fazer gostar de ler os Lusiadas, a forma como nos conseguia transmitir a beleza de ler os Lusiadas, naqueles anos de brasa de 74 e 75, servir-me-á sempre de ensinamento de que a vida só vale mesmo a pena ser vivida de não lhe /nos fecharmos portas. Perante o meu terror de ir ao quadro, chamou-me um dia para me tentar convencer que "o quadro pode ser tão branco como as páginas do teu caderno, onde escreves coisas tão bonitas", disse-me. "Imagina-o, apenas, branco".
Não resultou na parte do quadro. Mas ainda hoje, muitas vezes quando aqui aqui deixo um post ou escrevo um texto para qualquer outro fim, por um fugaz momento que seja, me pergunto o que pensaria dele o Professor Zacarias. Ainda hoje, por um fugaz momento que seja, quando escrevo um erro de ortografia ou uma frase deixa de fazer sentido porque a pontuação está mal colocada, me pergunto o que pensaria o Prof. Zacarias.
...
Tinha-se formado já adulto e a trabalhar. Já passaram muitos, muitos anos, o meu Professor de Português já não deve cá estar para subir a Avenida. Nunca soube o que ele pensava do divórcio. Ou se se achava mais inteligente que os outros. Não faço ideia se usava um cachecol grená, por gostar de cachecóis grenás, ou para dar nas vistas. Do meu professor Zacarias guardei a forma como me ensinou a gostar de Camões no intervalo da Revolução que eu ia fazer à noitinha, ou o mais tardar no dia seguinte, a tentativa de me convencer que os quadros negros podem ter as cores que a gente lhes quiser dar, o orgulho que senti quando me felicitou por um texto sobre o Barranco de Cegos e, sobretudo, a paixão por escrever. Às vezes penso que sem ele, eu nunca teria começado a escrever. Não que as coisas que escreva tenham muita importância para os outros. Para mim fazem parte das minhas necessidades básicas. Como respirar ou amar.
Hoje, ao subir a Avenida, sei que em muitos daqueles homens e mulheres que a encheram, está o Prof. Zacarias de algum de nós, do filho de algum de nós. A melhor homenagem que me apetece fazer à sua luta pela dignidade é recordar a dignidade de um homem que nunca esqueci. Que me disse um dia, muito depois de ter deixado o liceu, numa altura damática da minha vida, quando muitos anos depois, voltei a Santarem, depois de ter desistido (acabei por concluir que apenas tinha interrompido) de salvar o mundo, apenas, apostanto em salvar alguém que amava muito: "Não te esqueças, Iasbel. O quadro preto poder ter as cores que lhe quiseres dar".
Não o voltei a ver depois disso. Com excepção de cada vez que escrevo um texto ou de hoje ao subir a Avenida, claro.
Etiquetas: Isabel Faria
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A nossa geração tem um Professor Zacarias que guarda na memória. O meu Zacarias era a Professora de Desenho a Piedade e que tinha a "ousadia" de tomar café com os alunos em 1973 e nas aulas deixava tocar Zeca Afonso (baixinho) e Sérgio Godinho. É por estas e por outras que havia uns gajos de gabardina sempre à hora a que lá íamos... Histórias do meu Zacarias aliás da Piedade
Os professores que mais me marcaram foram o José Manuel Mendes a português ( escritor e refundador comunista actualmente), em 78 e em 79, Conceição Silva de geografia que me fez ingressar nessa licenciatura no Porto.
Hoje há bons docentes, mas como os de antigamente...
Pos é Nando, eu tenho outros...mas nenhum que se aproxime do Prof. Zacarias. Não sei se hoje os miudos não têm (sinceramente penso que têm menos Prof. Zacarias ou Piedades que nós tinhamos), por "culpa" dos professores, se por culpa do sistema de ensino, se por culpa da quantidade de fontes de informação e de formação que leva a que o papel do professor acabe por se diliuir e por se uniformizar.
A avaliação que se pretende impôr é mais uma passo de gigante para essa uniformização...e para matar os professores que nos falam de quadros brancos ou nos metem a ouvir o Zeca, baixinho.
José Manuel, ers isso que eu dizia no comentário ao comentário do Nando. Haverá piores professores ou as causas de eles não "ficarem" são outras e ultrapassam-nos.
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